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As regiões andina e amazônica no narcotráfico continental

4. A CONFIGURAÇÃO DO NARCOTRÁFICO NA REGIÃO AMAZÔNICA:

4.2 As regiões andina e amazônica no narcotráfico continental

Após o desmantelamento bem sucedido de centros de produção de maconha, haxixe e heroína no México e na Jamaica, ao longo dos anos 1970, a Colômbia se consolidou como fornecedora de substâncias psicoativas nas Américas. A partir de então, os narcotraficantes colombianos – instalados em Sierra Nevada de Santa Marta, na região administrativa de la Guajira ao norte do país – se tornaram os principais exportadores de maconha para os centros urbanos norte-americanos. A produção de maconha na Colômbia alcançou seu pico em 1975 e se manteve vigorosa no início da década de 1980 132.

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Gonzáles, G. “Cooperação bilateral na questão das drogas” (Política Externa. Vol. 9, n° 3, 2000, p.58) observa que: “A Operação Condor foi considerada um dos exemplos mais eficazes de cooperação bilateral antinarcóticos. Os resultados foram impressionantes. A participação do México no mercado norte-

americano de maconha caiu de 75% em 1975 para 8 % em 1980. No caso da heroína, a participação do México caiu de 67% para 25% no mesmo período”.

131

GONZÁLES, 2000, p. 51.

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MARULANDA, M. La Política Norteamericana Contra Las Drogas Ilegales y su Apropiación en Colombia: Historia, cultura, ideología y política. Brasilia: Tese de Doutorado, UnB, 2004, pp. 34-5; IZQUIERDO, S. “Focalizando a fluidez: as vias transversais do narcotráfico na Colômbia”. In: Ana Maria

Entretanto, ao longo dos anos 1980, a produção de maconha perde importância para a produção de cocaína na Colômbia. Entre os países amazônicos, o plantio da folha de coca e produção de cocaína já eram comuns na Bolívia e Peru antes de 1980 133. Com o aumento extraordinário de importância da cocaína no mercado internacional – o chamado “boom” da cocaína de fim dos anos 1970, início dos anos 1980 – Bolívia, Colômbia e Peru passaram a ser fundamentais para o narcotráfico no continente. O narcotráfico tornou-se negócio gigantesco, e passaria a ser o maior negócio ilícito da história. Vários fatores ajudam a explicar o sucesso das regiões andina e amazônica para o fornecimento de cocaína em larga escala.

Primeiramente, a existência de organizações, sobretudo na Colômbia, que já se ocupavam de práticas ilegais (como o tráfico de maconha, pedras preciosas e variados contrabandos). Essas organizações estavam preparadas para o transporte e comercialização das substâncias ilícitas134.

Outro fator essencial foi o crescente mercado consumidor de cocaína. O mercado se expandiu rapidamente incluindo não só metrópoles estadunidenses, mas também européias e sul-americanas. Apesar da proliferação do consumo para outros países, o aumento do consumo nos Estados Unidos foi essencial para manter a demanda por cocaína sempre alta. Segundo Marulanda135 pesquisa apresentada em 1993 pelo NIDA (National Institute of Drug Abuse, um instituto estadunidense sobre o uso de psicoativos) demonstra o incremento de consumidores de cocaína de 4,3 milhões em 1979 para cerca de 5,3 milhões em 1986. Tal cifra correspondia a 2,7% da população dos Estados Unidos e significava aumento de 25% em seis anos136.

Também foi importante a grande disponibilidade de mão-de-obra barata a serviço do narcotráfico devido às difíceis condições econômicas de largas parcelas da população rural e urbana nos países sul-americanos. Destaquem-se os altos níveis de desemprego e

Ribeiro & Jorge Atílio Iulianelle (org.s) Narcotráfico e Violência no Campo. Rio de Janeiro: De Paulo Editora Ltda., 2000, p. 63.

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A importância da folha de coca na Região Amazônica é milenar. Séculos atrás, a coca foi elo entre sociedades ameríndias nos Andes e na Amazônia Continental. Para exemplos da importância da coca para as culturas ameríndias, ver 2.4, p. 37 e 3.7, pp. 59-60.

134

MARULANDA, 2004, p.34; IZQUIERDO, 2000, p. 69.

135

MARULANDA, 2004, p. 119.

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O aumento dos consumidores de cocaína contrastava com a diminuição dos consumidores de maconha e heroína, que foram de 24,3 milhões em 1979 para 22,3 milhões em 1985.

subemprego nos grandes centros urbanos das Américas Central e do Sul que facilitavam o recrutamento de mão-de-obra para a venda de psicoativos ilícitos no varejo137.

Ademais, a participação dos países americanos no regime internacional de restrição aos psicoativos que levou à proibição e estabelecimento de penas para produtores e consumidores de muitas substâncias. O fato de o consumo de cocaína se manter entre largas parcelas da população, mas a prática continuar ilícita tornou altamente rentáveis a produção e o comércio de cocaína. Como afirma Procópio138 a cocaína tem sido nas últimas décadas um dos poucos produtos amazônicos de valor agregado com larga aceitação no mercado internacional. As altas taxas de retorno permitiram às empresas narcotraficantes expandir seu poder econômico e político. Segundo Marulanda139:

“Posto que (...) o lucro advindo do comércio ilegal das drogas é essencialmente função do risco que correm seus empresários em seus esforços permanentes para pôr seus produtos no mercado, se deduz que a proibição, no cenário de forte demanda atual, se converte no marco eficaz de sua prosperidade. Quanto maior a repressão, maior é o lucro”.

Argumento semelhante é desenvolvido por Naím140:

“ ‘Controle na fonte’ [ou seja, a política de controle do narcotráfico na fonte de produção] e uma ênfase na repressão simplesmente adicionaram valor às drogas que conseguem chegar ao mercado. Guardas fronteiriços a se evitar, as batidas policiais das quais têm-se que fugir, e os subornos que se têm de pagar, todos são integrados aos custos do negócio, aumentando preços e os potenciais de lucros sem nenhum efeito demonstrável na demanda”.

Por fim, as condições geográficas, climáticas e culturais dos Andes. Os altiplanos frios e secos são ideais para o plantio da folha de coca, o que se alia à existência de vastas regiões inabitadas e pouco acessíveis nas regiões andina e amazônica facilitando a ocultação das lavouras ilegais e fábricas de processamento. Também o conhecimento adquirido entre as populações locais por seu costume milenar de consumir e plantar a folha de coca certamente foi útil para a produção em larga escala da folha de coca141.

137 MARULANDA, 2004, p. 36; RODRIGUES, 2003, p. 51. 138 PROCÓPIO, 2005, pp. 123; 132. 139 MARULANDA, 2004, p. 42. 140

Naím, M. Illicit – How Smugglers, Traffickers, and Copycats are Hijacking the Global Economy (New York: Doubleday, 2005, pp. 81-2).

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