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4. A ESCOLA ITINERANTE DO MST

4.3 A escola no acampamento do MST

A educação, como atividade participe das relações sociais contraditórias, é então uma instabilidade mais ou menos aberta à ação social. Se sua função social esteve mais comprometida com os interesses dos grupos dominantes do que com os interesses e valores das classes subalternas, isto não é uma fatalidade e nem é a sua sina. Se coopera com a reprodução das estruturas vigentes, ela se mescla no conjunto de uma ação social transformadora que se opõe à organização capitalista de produção, mediante a aceleração da consciência de classe. E para tanto é preciso erigir sobre a prática educativa uma teoria mais elaborada que revele, no caráter hegemônico, mediador e contraditório dessa prática, os elementos decisivos de sua superação. (CURY, 2000, p. 130).

Na análise aqui desenvolvida, partimos da premissa da escola ocupada como necessidade política-social do MST para assegurar o processo de escolaridade à juventudade acampada. Para o movimento, a escola expressa uma vontade política de seus sujeitos que, na trajetória da luta pela terra, projeta uma educação para a formação do novo homem, de um ser coletivo, cuja base social é o socialismo. Antes de analisar os estudos empreendidos pelos pesquisadores da academia, cabe uma pergunta: O que é acampamento? O acampamento é, na verdade, uma cidade de lona preta, conforme o caracteriza Stédile e Frei Sérgio, para quem,

[...] Um acampamento é uma verdadeira cidade de barracos de lona, com uma população variável entre quinhentas e oitocentas pessoas, homens, mulheres e crianças organizado após uma ocupação de terra, com o objetivo de levar a luta iniciada com a ocupação. [...]. (STÉDILE e FREI SÉRGIO, 1993, p. 61).

Portanto, o acampamento é um território em disputa pelos movimentos sociais em luta pela terra no Brasil. Sua origem está na ocupação do latifúndio, que tem por objetivo, segundo Stédile e Frei Sergio “negociar com os governantes saídas para os problemas dos sem-terra e tornar produtivas terras ociosas”. (STÉDILE, FREI SÉRGIO, 1993, p. 59). Bahniuk nos traz que o “acampamento compreende uma área ocupada e que não se encontra legalizada judicialmente. É uma forma característica de pressão exercida pelo MST, com vistas a garantir a desapropriação de terras e, conseqüentemente, o assentamento de diversas famílias”. (BAHNIUK, 2008, p. 12).

A ocupação em si é um ato de desobediência civil diante das leis estabelecidas no país. Mas, a ocupação, também, é um ato de insurgência pela preservação da vida material dos camponeses, que têm na posse da terra os meios necessários à sua reprodução social. Como toda ocupação do espaço traz uma institucionalidade, o acampamento estudado traz sua forma de instituição, no qual há uma construção coletiva na sua organização “a partir de núcleos de base64

Para Weide,

, que envolvem de 10 a 30 famílias, quase sempre a partir do município de onde vieram os acampados”. (STÉDILE, FREI SÉRGIO, 1993, p. 68). Não é por acaso que Weide afirmou que “Ocupações e acampamentos de Sem-Terra são atitudes coletivas que têm a intenção de resolver um problema social, fruto da concentração e da falta de uma política agrária que resgate o valor social da terra”. (WEIDE, 1998, p. 72).

A organização de um acampamento não é algo que acontece de uma hora para outra. Não basta reunir um grupo de camponeses dizer-lhes que são Sem Terra. O trabalho é lento e perseverante. Passa por um processo de conscientização dos agricultores, começando antes do Acampamento. A condição para que se organize um Acampamento é o reconhecimento do homem do campo como um Sem Terra, o que é difícil. Exige a superação de traços marcantes da ideologia dominante que durante anos foi incutida como vergonhosa, sendo ilegal e subversivo organizar-se em grupos para reivindicar seus direitos. (WEIDE, 2009, p. 09).

As ações da frente de massas do MST, no trabalho de emulação à ocupação, a construção do acampamento pressupõem o rompimento do silêncio ideológico imposto aos

64 Nestes núcleos organizam-se os principais serviços e tarefas do acampamento: alimentação, saúde, higiene, educação, religião, lenha, animação, finanças, lazer e esportes etc. Para cada função escolhe-se um responsável. Estes responsáveis formam as equipes de serviço do acampamento (equipe de alimentação, saúde etc.) e se organizam regularmente para avaliar e planejar suas atividades. (STÉDILE; FREI SÉRGIO, 1993, p. 68).

pobres do campo pelo domínio do medo, cuja centralidade é sua submissão aos dogmas religiosos de uma igreja que conforta os pobres para a reprodução do capital enquanto relação social dominante. Este rompimento é o ponto chave da luta social na organização política dos Sem Terra. Neste sentido, Gehrke, escreveu que

[...] O acampamento, a expressão mais visível da exclusão social que o sistema capitalista produziu, contraditoriamente, a expressão mais forte da organização e da resistência deste povo, que não aceitava isso como sendo o fim da história, juntava- se para lutar pela terra e transformar esse sistema. (GEHRKE, 2010, p. 75).

Dessa forma, imprimir uma nova concepção de relação de trabalho e de sociedade é parte constitutiva do ideário do MST na luta pela terra. “A ocupação era e é a primeira ação de itinerância, pois a família decide, ou melhor, é levada a entrar na luta, por necessidade, a qual exige organização das famílias”. (GHERKE, 2010, p. 53). Neste sentido, Fernandes nos traz que “ocupação de terra é uma criação histórica. É um acontecimento resultado de um conjunto de causas, que contém a necessidade, o interesse e a resistência dos camponeses. É, portanto, um fato criado pelas pessoas e suas causas. E a principal causa é a defesa da vida”. (FERNANDES, 2000, p. 56).

Para Bahniuk,

Os acampamentos vinculados ao MST são, em sua maioria, frutos de uma organização prévia, que emerge logo após uma ocupação. Caracterizam-se por barracas de lonas pretas que servem de moradia para as famílias acampadas e também pela presença de símbolos do MST, em especial as bandeiras do Movimento, que demarcam a terra ocupada. (BAHNIUK, 2008, p. 31).

Para esse fim, no acampamento do MST, em conformidade com o movimento, sua organização se centra nos princípios da democracia direta, com a participação de todos no processo de tomada de decisão, que é sempre coletiva, na divisão das tarefas e das responsabilidades de cada núcleo, possuindo uma direção coletiva. Além disso, o acampamento se sustenta com trabalho dos próprios acampados, cujo resultado se converte em alimento para sustentar a luta e a dignidade dos habitantes da cidade de lona preta. (STÉDILE; FREI SÉRGIO, 1993, p 69). Por isso, Abramovay traz que “o acampamento não é apenas o produto da revolta e do desespero. Ao contrário, a decisão de acampar supõe grande maturidade política, organização, coesão, disciplina e sobretudo fé e esperança”. (ABRAMOVAY, 1985, p. 56).

A pesquisa mostrou que no processo de ocupação, que traz a luta pela resistência e produção da vida material, há também a organização interna do acampamento vinculada à

política do MST, que tem a democracia interna como pressuposto organizacional. Os princípios que orientam a luta pela terra guiam também a organização interna, e este processo mantém o direcionamento político do MST a partir das bases que projetam as lideranças do acampamento. Morissawa vê, neste sentido, o movimento interno no cotidiano do acampamento e as relações externas que as coordenações devem realizar como processo de organização e encaminhamento das lutas sociais por terra. Diante disso, ela assegura que

Há ainda um sistema de coordenação geral do acampamento, responsável por dar unidade ao trabalho das várias equipes, encaminhar as lutas, negociar com o governo e relacionar-se com a sociedade. Essa organização envolve: a Assembléia Geral do acampamento (órgão máximo de decisão que se reúne periodicamente); os líderes dos núcleos que se reúnem também de tempos em tempos, encaminham o dia-a-dia do acampamento, mantêm os núcleos informados das negociações; e a Coordenação do Acampamento, eleita pelos acampados (MORISSAWA, 2001, p. 200).

Dessa forma, na luta por sobrevivência, também há a luta pelo rompimento da cerca que impede o acesso à educação. A educação no acampamento, associada à reforma agrária, é um momento singular na formação do MST enquanto uma organização de massas, pois consegue apontar outros caminhos de luta por dignidade para os Sem Terra e, dentre estas, a escola como processo de sociabilidade e de apropriação do conhecimento que a humanidade produziu na sua totalidade, isto é, sem os elementos ideológicos existentes na escola burguesa, que está a serviço da reprodução do capital enquanto hegemonia social. E escola é, para o MST, o polo que traz a formação do novo homem para a construção da nova sociedade, integrando os Sem Terra na unidade coletiva, mesmo vivendo uma diversidade política e religiosa distintas entre si. Traz, consigo as contradições presentes na sociedade. Contradições estas que Cury assim sintetizou:

[...] A contradição sempre expressa uma relação de conflito no devir do real. Essa relação se dá na definição de um elemento pelo que ele não é. Assim, cada coisa exige a existência do seu contrário, como determinação e negação do outro. As propriedades das coisas decorrem dessa determinação reciproca e não das relações de exterioridade. (CURY, 2000, p. 30).

Por isso, Stédile e Frei Sérgio traz que no MST, “há uma consciência crescente”, “da importância estratégica da educação na luta pela reforma agrária, na viabilização dos assentamentos, na construção de novas formas de convivência, na capacidade para exercer os direitos de cidadão” para poderem “participar democraticamente na vida política do país e na luta por um homem novo e uma nova sociedade democrática e socialista”. (STÉDILE; FREI SÉRGIO, 1993, p. 91).

latifúndio do saber. Tal qual o latifúndio da terra, o latifúndio do saber é vasto, está concentrado em poucas mãos e é altamente improdutivo para o conjunto da sociedade”.Para isto, “é preciso cortar a cerca que o protege, para que as massas se apossem dele, tornem-no produtivo e o transformem em um instrumento para conquistar formas mais dignas e alegres de viver”. (STÉDILE; FREI SÉRGIO, 1993, p. 92).

E,

Este esforço educativo começa na luta pela escola para todas as crianças; na busca de uma nova formar de educar adequada à realidade dos sem-terra, assentados, pequenos agricultores; na formação e capacitação dos professores do próprio meio; n organização da comunidade para assumir, como sua, a tarefa de educar; e na luta com os poderes públicos ─ municipal, estadual e federal ─ para que cumpram suas obrigações constitucionais em relação à educação. (STÉDILE; FREI SÉRGIO, 1993, p. 92-93.)

Neste sentido, está presente a luta pela escola nos territórios do MST em sua totalidade, isto é, nas áreas de acampamento e de assentamento, como processo de formação do homem novo, do homem em sua totalidade humano-social. E que escola cumpriria este papel social? A escola “diferente65

Dessa organização escolar no acampamento dos sem-terra à luta pela escola pública teve início a ocupação da escola e, com ela, a legalização da escola conquistada no acampamento. Camini assim escreveu sobre esta escola, conforme segue:

” que falava Roseli Salete Caldart e Bernadete Schwaab. A conquista da escola para o MST começa “debaixo da lona preta” e começa como uma escola oficial do MST, para daí, ser conquistada como uma escola pública. Neste sentido, “a escola itinerante é basicamente uma escola de acampamento. Essas escolas foram criadas para acompanhar as crianças, jovens e adolescentes que vivem nos acampamentos”. (TAKAU JUNIOR, 2009, p. 04). E este processo teve início na Encruzilhada Natalino, em Ronda Alta, no RS, nos idos de 1980, quando no acampamento dos sem-terra “começaram a organizar as atividades educativas e culturais devido à preocupação com a formação, pois os pequenos se encontravam ausentes das escolas oficiais”. (CAMINI, 2009, p. 115).

[...] No grupo havia cento e oitenta crianças em idade escolar, das quais cento e doze para ingressar na primeira série. Isso preocupava os pais delas, pois novamente os filhos estavam impedidos de entrar na escola oficial. Após muitas idas e vindas para reuniões e reivindicações, já em maio, a Secretaria da Educação autorizou a construção da escola, e imediatamente as duas professoras, Maria Salete Campigotto e Lúcia Webber iniciaram as aulas. Porém, a legalização da escola só se completou

65 Diferente em quê? Diferente por ser uma escola pensada pelo MST e para o MST, com uma pedagogia da luta pela terra.

bem mais tarde, em abril de 1984, daí já no assentamento Nova Ronda Alta, que surgiu seis meses antes. Sendo assim, a “primeira escola do acampamento” passou a ser legalmente a primeira escola do assentamento Nova Ronda Alta, pois se encontrava na mesma área ocupada pelas famílias. Foi, a primeira conquista de escola de acampamento/assentamento no Brasil. (CAMINI, 2009, p 116).

A conquista da escola pública traz a experiência da luta pela ocupação da escola. A primeira escola conquistada recebeu o nome de Margarida Maria Alves66

Por isso, uma escola pública no acampamento sim, mas dirigida e coordenada pelo MST. Sobre esta escola, Geherke se manifestou assim:

e, por meio dela, a vida escolar das crianças acampadas foi regularizada. A escola cumpriu, assim, com sua função social, pois reconheceu o processo de escolarização das atividades escolares realizadas no acampamento. E como se deu a construção dessa escola? Camini nos traz a resposta da seguinte forma: “chegando março do ano seguinte (1986) e vendo que a promessa ainda não se transformara em realidade, a comunidade acampada se pôs a construir um grande barracão de lona preta para que se iniciassem as aulas”. (CAMINI, 2009, p. 118). Assim, o período de 1982 a 1986 foi marcado por conquista e implantação de escolas no RS e em outros Estados onde o MST estava organizado, como no Paraná. A escola, neste caso, entra na pauta de conquistas no território do MST, quer seja nos acampamentos, quer seja nas áreas de assentamento. É a escola do MST, ou seja, a escola diferente que os Sem Terra se colocaram a construir.

A Escola Itinerante só se materializou na ocupação do latifúndio da terra, pelo povo organizado e passou a ser compreendida como uma escola presente no processo de reforma agrária, e nela fez sua trajetória, mediada por relações de contradição com ela mesma, o Estado e o próprio Movimento. Remeteu-se o olhar para Escola Itinerante, buscando perceber possíveis vínculos entre o Movimento e as culturas ali presentes (que vão se tornando uma cultura comum) e que, na relação com a escola, constituíram a Escola Itinerante. (GEHRKE, 2010, p. 69).

No documento oficial do MST, intitulado “nossa concepção de educação e de escola”, o Movimento traz que

Educação não é sinônimo de escola. Ela é muito mais ampla porque diz respeito à complexidade do processo de formação humana, que tem nas práticas sociais o principal ambiente dos aprendizados de ser humano. Mas a escolarização é um componente fundamental neste processo e um direito de todas as pessoas. Desde os primeiros acampamentos e assentamentos esta é uma das lutas do MST. (MST, 2005, p. 233).

66 Margarida Maria Alves foi uma líder sindical na luta contra o latifúndio. Paraibana, virou símbolo da luta pelo direitos dos trabalhadores rurais. Foi assassinada em 12 de agosto de 1983, por um pistoleiro com um tiro de escopeta calibre 12 no rosto.

Reconhecendo a importância da escola, o MST luta pela sua organização no acampamento, como processo de apropriação do conhecimento produzido socialmente pela humanidade, como mecanismo de autonomia para a emancipação humana. Para isso, criou na ocupação da Fazenda Anoni o Setor de Educação, pois a necessidade de organização da educação assim o exigia. Camini (2009) relata que “a primeira equipe foi constituída por Selete Campigotto, Lúcia Webber, Bernadete Schwaab e Roseli Salete Caldart, além de outras pessoas do próprio acampamento”. Este “grupo se constituiu por força das circunstâncias da realidade dos acampados, para dar resposta imediata à falta de escola para um grande número de crianças que acompanhavam suas famílias”. (CAMINI, 2009, p. 120). Oficialmente, o Setor de Educação do MST nasceu em 1987, no primeiro Encontro Nacional de Educação do MST, em São Mateus, no Espírito Santo, com a participação de educadores do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Espirito Santo e Bahia, portanto, de educadores onde o MST estava se organizando. (CAMINI, 2009, p.120). Nasceu com uma forte disposição de encaminhar a luta no sentido de ocupar a escola, produzir os princípios pedagógicos e filosóficos da escola diferente que o MST se propôs a construir.

Esta escola, construída e reavaliada de forma permanente pelo MST, é a escola que acompanha o acampamento, não só nos casos de despejo, mas também nas suas lutas diárias pela reforma agrária. Esta escola foi chamada carinhosamente de Escola Itinerante pela comunidade Sem Terra. E o que é Escola Itinerante? Adelmo Iurczaki nos dá a resposta dessa maneira, “A Escola Itinerante é o loco da transformação a partir da conscientização. A mesma tem importância tanto para o MST quanto para a população que acredita libertar-se através da escola”. (IURCZAKI, 2007, p. 93). E onde está esta escola, que se pretende ser diferente? Segundo Iurczaki,

O acampamento é o lugar onde está a denominada Escola Itinerante. O acampamento não é um local fixo, pois se constitui numa das formas de luta pela reforma agrária que os sem-terra utilizam até que haja a desapropriação do terreno, para que eles permaneçam de forma definitiva no local, que será, então, denominado assentamento. Muitas vezes, a desapropriação não acontece e os acampados são forçados a migrar para outras áreas. Isso ocorre muitas vezes, daí a importância da Escola Itinerante, pois, pela sua mobilidade, ela poderá acompanhar o acampamento em todos os locais onde este vier a se fixar. (IURCZAKI, 2007, p. 91).

Para Camini,

[...] os acampados passaram a olhar e a pensar a escola como sendo sua, próxima de seu cotidiano. O aspecto físico não era a maior preocupação e nem impedimento para a sua existência neste meio. O importante eram os recursos didáticos e pedagógicos que nasciam do dia-a-dia, dinâmico e novo ao mesmo tempo. Ou

seja, de uma experiência de educação rural distante de sua realidade, as pessoas passaram a vivenciar uma escola próxima, colada à luta pela terra e à organização do acampamento. Nessa escola ocupada por eles, os acontecimentos diários, os impasses nas negociações com o governo, as assembleias, ou mesmo a decisão de continuar a itinerância, foram construindo os elementos da pedagogia se serem trabalhados. [...]. (CAMINI, 2009, p. 119).

Podemos inferir que é no acampamento do MST que esta escola se faz presente, que se mobiliza junto aos Sem Terra para a conquista da reforma agrária e, assim, libertar-se do jugo do capital para construir uma nova hegemonia social, a hegemonia do trabalho como nova expressão de relações sociais de produção. O acampamento expressa dessa forma a luta singular pela terra, que é orientada pela palavra de ordem ocupar, resistir, produzir. Mas esta luta, por si só, era incompleta.

A busca por um educandário pautado nos interesses e vivências dos grupos humanos que viviam nos acampamentos do Movimento Sem Terra no Rio Grande do Sul, geralmente localizados à beira de estradas, iniciou com o próprio movimento. A percepção da necessidade de uma escola e de uma pedagogia própria para suas crianças nos acampamentos impulsionou-os a criação das Escolas Itinerantes. (MARCON et al, 2013, p. 06).

Para o MST, construir uma unidade educacional e, com isso, formar uma nova consciência humana nos acampamentos é fundamental para seu projeto social, procurando dar ao trabalho uma nova dimensão social, estimulando o trabalho coletivo como modo de produção da vida material. Aliado a isso, a EI, com suas atividades ligadas a temas geradores ou porções da realidade intencionam a formação de um novo sujeito, no interior da sociedade capitalista. Neste sentido, Gehrke escreveu que

A Escola Itinerante fora determinada por um momento histórico, pensada, projetada desde uma necessidade histórica; por isso, a ausência de políticas públicas de educação para os trabalhadores do campo marcou o movimento de luta pelo direito à educação e escola, e as formas de luta foram marcando a organização do trabalho escolar itinerante. (GEHRKE, 2010, p. 69).

E Weide nos traz que

Nos Acampamentos de Sem-Terra do estado do Rio Grande do Sul, busca-se construir um Fazer Pedagógico onde as atividades educativas estejam numa constante interação com a prática social e política desenvolvida na histórica caminhada de luta dos acampados. [...] (WEIDE, 1998, p. 07).

Mas esta escola, diferente no seu jeito de se fazer, de ser e de caminhar, é uma escola que se institucionalizou junto ao Estado, isto é, obteve sua legalidade na esfera pública, sendo reconhecida oficialmente pelos órgãos normatizadores da educação, no âmbito do Estado. A partir da Constituição Federal de 1988 e da LDB 9394/96, a educação do campo ganhou força política com as diretrizes operacionais para a educação do campo, de 2002.