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A escolarização dos descendentes de imigrantes – estado da

Este capítulo é dedicado ao mapeamento do conhecimento produzido sobre a problemática dos descendentes de imigrantes. Confrontamos os contributos teóricos de vários autores de referência nesta área de estudo, na procura de compreender qual é o estado da questão. Centramo-nos na revisitação de estudos realizados além fronteira e

37 focados nos respetivos contextos, procurando identificar no conhecimento aí produzido contributos para uma melhor compreensão da realidade portuguesa.

.III.1. Filhos de imigrantes: escolarização e coesão social

A presença de alunos de origem imigrante é significativa nas escolas de muitas cidades europeias, chegando a constituir a maioria da população escolar em cidades como Roterdão e Amesterdão, um terço em Londres, ou 40% em Bruxelas (Crul, 2007). Para Portugal, só dispomos de dados por nacionalidade. Os 71884 alunos de nacionalidade estrangeira matriculados no ano letivo de 2009/201044 constituem cerca de 5% da população estudantil nacional, mas não há dados para Lisboa. Este valor não inclui os alunos descendentes de imigrantes que, por terem nascido em Portugal ou por terem-na adquirido, têm nacionalidade portuguesa. Aliás, esta lacuna de dados relativos à origem nacional dos alunos filhos de imigrantes fragiliza um pouco os estudos sobre esta população, já que deixa de fora uma parte significativa de indivíduos que só administrativamente não a integram.

O sucesso escolar desses alunos constitui um aspeto fundamental para o êxito da integração das comunidades imigrantes nas sociedades de acolhimento. Na produção científica alusiva a esta temática, os níveis de sucesso escolar são habitualmente adotados como indicadores na avaliação do grau de assimilação e adaptação dos imigrantes nos países onde estes se estabelecem. Numa alusão a esta realidade, Suet- ling Pong afirma “school success, often measured by academic achievement and school persistence, has been used as a marker of immigrant assimilation and adaptation on the immigrant literature (Pong, 2003, p. 5), enquanto Portes e McLeod (1996) defendem que as taxas de escolarização atingidas pelos filhos são mais ilustrativas dos níveis de integração das populações imigrantes nos países de acolhimento do que outros indicadores, como a atividade profissional dos adultos.

A realidade tem demonstrado que a escolarização dos descendentes de imigrantes constitui uma tarefa que coloca vários problemas às sociedades de acolhimento e às famílias. Os seus resultados escolares ficam, quase sempre, muito

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38 aquém dos resultados obtidos pelos alunos autóctones, causando preocupações não só às próprias famílias e às escolas, mas também aos decisores políticos, pelo impacto socioeconómico negativo que tal fenómeno causa nas sociedades. Para Maurice Crul (2007), não restam dúvidas de que a diferença educacional fragiliza a coesão social e prejudica o bem-estar, tanto dos indivíduos como das nações.

Pong (2003) atribui a importância do sucesso na escolarização das crianças e dos jovens, neste caso de origem imigrante, aos seus efeitos em três domínios: a educação constitui um instrumento que dota os indivíduos de competências valor de inestimável para a sua mobilidade socioeconómica; permite reduzir as desvantagens frequentemente associadas à condição de imigrante; sendo ainda um indicador de como os descendentes de imigrantes são assimilados pelas sociedades de acolhimento ou a ela se adaptam. A escolarização dos descendentes de imigrantes é, do ponto de vista de Suárez-Orozco e associados (2008), particularmente importante porque o ingresso no sistema educativo dos países onde agora residem as suas famílias consiste na sua primeira participação sustentada, significativa e duradoura numa instituição dessa sociedade. Quando essas crianças ou jovens ingressam no sistema educativo, não aprendem apenas sobre os saberes oficiais vão, também, aprender o “currículo oculto” que os idiomas e códigos culturais dessa sociedade encerram. Aprendido essencialmente com os colegas, esse currículo é fundamental para a sua integração escolar e social. É por esta via que estes alunos iniciam a aprendizagem da linguagem da cultura vigente na escola, mas também se constituem como pares da comunidade escolar e, por essa via, atores reconhecidos da sociedade (jovens, estudantes).

Um dos maiores obstáculos à objetivação da integração escolar destes alunos reside na dificuldade da escola em lidar com a heterogeneidade que representa a sua presença na população estudantil. Esta heterogeneidade nem sempre é devidamente valorizada ou tida em conta pelas comunidades educativas e pelos decisores políticos; por vezes, há mesmo uma perceção negativa. Assistimos atualmente a uma crescente heterogeneidade em consonância com a contínua diversificação das origens geográficas e socioeconómicas da população escolar; dados oficiais mostram que a população escolar portuguesa integra atualmente alunos de cerca de noventa nacionalidades diferentes, como foi referido anteriormente. Mesmo não sendo a única fonte a concorrer para a diversidade da população escolar, é inegável tratar-se de um fator preponderante

39 nesse aspeto. João Barroso (1999) defende uma mudança na cultura da escola, no sentido do reconhecimento da homogeneidade da sua população como uma falsa realidade. Domingos, Barradas, Rainha e Neves (1985) referem que ao iniciar a escolarização a criança deve ver a sua experiência de socialização familiar, isto é a sua socialização primária, sujeita a uma contextualização e recontextualização, sob pena de a experiência educativa formal não resultar. Ainda do ponto de vista de Barroso (1999), a heterogeneidade da população escolar deve assumir-se como parte estruturante do sistema educativo e ser concebida como um recurso ao invés de ser encarada como um problema para o sistema. Nesse sentido, justificar-se-ia segundo Crul (2007) a introdução de alterações estruturais que passariam por adaptações a vários níveis: idade de início da escolarização, carga horária da atividade letiva durante o ensino obrigatório, momento da seleção das opções educacionais, mas também ao nível da formação dos professores e dos próprios curricula.

Em maio de 2011, durante a sua lição de encerramento do Congresso “Educação e Sociedade”45, Albino Lopes , professor de Gestão do ISCSP, referia que a massificação do ensino iniciada no princípio dos anos setenta, confrontou a escola portuguesa com a necessidade de empreender uma transformação que fizesse face a uma conjuntura para a qual a instituição não estava estruturada. O autor considerava que essa mudança ainda não se consumou devido ao facto de se ter procurado a integração no mesmo espaço de públicos bastante diferentes na relação que estabelecem com o saber escolar, sem ter sido posto em causa um modelo organizacional tradicional que não se encontra preparado para a mudança. Este modelo estaria estruturado para responder a um público com uma cultura de envolvimento com êxito num processo de mobilidade social, mas não para acolher os públicos tradicionalmente mais alheados do esforço educativo e para os quais a instituição escolar e tudo o que ela representa continuavam a ser estranhas.

Os alunos de origem imigrante enfrentam a dificuldade de conciliarem os dois processos de socialização: socialização familiar e socialização escolar. Família e escola, dois dos mais importantes agentes de socialização, nem sempre coincidentes naquilo

45 Uma iniciativa conjunta do Instituto Superior de Ciências Educativas e do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas. Lisboa, 20-21 de maio de 2011

40 que uma e outra adotam como cultura legítima, entram frequentemente em contradição em relação aos valores que devem ser transmitidos aos alunos e à forma como os mesmos devem ser veiculados. Do ponto de vista de P.W.Musgrave, o facto de cada classe social se reger por um sistema de valores próprio potencia “a possibilidade de algumas crianças virem para a escola com valores que chocam com os aceites pelos professores” (Musgrave, 1979, p. 35). Para Domingos e associados, a escola, ao fazer apelo a “significados universalistas em contextos retirados de um mundo simbólico da classe média”(Domingos et al., 1985, p. 4), coloca dificuldades aos alunos das classes baixas; estas podem ser interpretadas como uma reação à “confrontação entre ordens de significação, relações sociais e valores diferentes” (Domingos et al., 1985, p. 4).

Estes processos de socialização, dessa forma, tornam-se contraditórios, deixando os alunos numa situação de fragilidade, geradora de insegurança. Oscilando continuamente entre duas legitimidades culturais, procuram apropriar-se dos benefícios de uma e de outra, já que não conseguem identificar-se com qualquer delas. Estas crianças e jovens acabam por se sentir deslocados tanto na escola, onde a linguagem herdada da família não é entendida, como em casa, onde o código escolar que vão adquirindo, com maior ou menor esforço, só é decifrado por si próprios.

Confrontados com as divergências que emergem da sua exposição simultânea a uma cultura familiar – agente de socialização endógena - e a uma cultura escolar – agente de socialização exógena - estes alunos podem, nos casos mais extremos, desenvolver comportamentos de oposição à última, como forma de reação à posição em que se encontram. A família e os seus valores passam, nesses casos, a ser adotados como as únicas referências, face a “um mundo exterior que consideram mau e hostil na sua globalidade” (Lahire, 2008, p. 78). Esses alunos desenvolvem, portanto, aquilo que este autor qualifica como uma oposição da “legitimidade familiar (moral e religiosa) a uma legitimidade da instituição escolar” (ib., idem). Tal comportamento constitui uma barreira à sua integração escolar e, consequentemente, ao seu sucesso educativo. Sendo uma realidade mais evidente em França, será pertinente ter um olhar atento para o caso português e verificar até que ponto o mesmo tipo de atitude dos jovens não poderá ajudar a explicar os maus resultados escolares. Um dos efeitos visíveis desta descontinuidade, segundo Musgrave, é o posicionamento em desvantagem dos alunos pertencentes aos grupos socioeconomicamente mais desfavorecidos em relação à cultura

41 dominante da escola (Musgrave, 1979). Ainda a este respeito, Alejandro Portes lembra que “crescer no seio de uma família migrante foi, desde sempre, um difícil processo de conciliação da língua e das orientações culturais de pais nascidos no estrangeiro com solicitações para a assimilação da sociedade de acolhimento” (1999, p. 97).

Quando se trata de famílias migrantes pertencentes a classes sociais desfavorecidas, existe frequentemente uma grande distância entre a sua cultura e a cultura dominante, bem como poucos pontos de contacto entre os modos de “inculcação” das famílias e os da escola. Nos casos em que essa divergência é demasiadamente vincada, pode acontecer que até a própria relação com a escola e com o saber escolar sejam postos em causa. Para esses agregados, os instrumentos indispensáveis à apropriação dos bens simbólicos e dos códigos sociolinguísticos necessários ao seu entendimento nem sempre se encontram disponíveis. Impossibilitadas de aceder a estes recursos, como referem Bourdieu e Passeron (1982), as famílias veem as suas próprias ações pedagógicas, destinadas à transmissão da cultura dominante aos seus descendentes, condenadas ao insucesso e limitadas as oportunidades da sua ascensão social pela via escolar. Esta distância cultural afeta na sua generalidade as famílias com menores recursos, mas agudiza-se no caso das de origem migrante, constituindo-se como a causa principal da dificuldade de articulação entre as duas instituições (Lahire, 1995).

Do ponto de vista de Albino Lopes (2011), a escola concebida para formar uma elite não pode servir de modelo estrutural para uma organização massificada, sem causar “equívocos a vários níveis”. Esta ideia corrobora a de Crul (2007) e Barroso (1999) de que a presença dos descendentes das famílias imigrantes no sistema educativo, principalmente das pertencentes a camadas socialmente mais desfavorecidas, justificaria a introdução de algumas alterações na estrutura organizativa escolar visando a sua integração. Pese embora os sucessivos governos da República tenham ensaiado políticas educativas, tanto preventivas como paliativas, orientadas para a integração desses alunos, não se identificam alterações verdadeiramente estruturantes na organização escolar, eminentemente ditadas pelas políticas em função da heterogeneidade e das necessidades específica da população estudantil de origem imigrante em Portugal.

42 Na perspetiva de Bourdieu e Passeron (1982),

Uma instância oficialmente encarregada de transmitir os instrumentos de apropriação da cultura dominante que se esquece de fornecer metodicamente os instrumentos necessários ao êxito da sua empresa de transmissão, está condenada a tornar-se o monopólio das classes sociais capazes de fazerem a transmissão pelos próprios meios, isto é, por meio da ação educativa contínua, difusa e implícita que se exerce no seio das famílias cultas […]; as classes dominantes confirmam assim o seu monopólio dos instrumentos de apropriação da cultura dominante e, por extensão, o monopólio dessa cultura (p. 333).

III.2. Fatores suscetíveis de influenciar o rendimento escolar dos alunos descendentes de imigrantes

Vimos no ponto anterior que as trajetórias escolares dos descendentes de imigrantes podem ser afetadas por uma constelação de fatores associados à sua condição. Articulando entre si, esses fatores dão origem a percursos escolares de maior ou menor sucesso. Os fatores familiares têm sido destacados face a outros, pelo seu alcance na influência nos comportamento e atitudes dos jovens face à escola e na disponibilização de condições objetivas de realização dos percursos escolares. Dedicamos o próximo ponto à abordagem dos fatores familiares habitualmente focados nos estudos desta temática.

III.2.1. Fatores familiares

Nas sociedades modernas a família46 é chamada a desempenhar um papel fundamental na educação das crianças e dos jovens. Ela assume o papel de agente

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O conceito de família é um conceito polissémico que poderá admitir várias definições. No entanto a esta definição de Maria Leandro parece-nos o suficientemente abrangente para as configurações familiares abrangemos no presente estudo: “conjunto de indivíduos que vivem em coabitação, que partilham um conjunto de atividades, de elementos e de modos de vida, e que estão unidos por uma rede de laços que integram a consanguinidade e a aliança” (Leandro, 2004: p.42).

“…la famille moderne ressemble, malgré tout, à la famille traditionnelle dans fonction universelle. L’une et l’autre ont pour fonction de contribuer à la reproduction biologique et sociale de la société en tentant d’une génération à l’autre de maintenir, et si possible, améliorer la position de la famille dans l’espace social ”. (Singly, 2010, p. 91),

43 educativo tendo a seu cargo a transmissão de valores da família e do grupo social de pertença. Esses valores, sujeitos a mudanças ao longo do tempo e em função do espaço, constituem a base social na qual crianças e jovens, alvo dessa ação familiar, se transformarão em adultos. Do ponto de vista de François de Singly, (2010), [la] famille, quelle que soit l’époque, quelle que soit sa forme, contribue à la reproduction de l’ordre social en mettant de l’ordre entre les générations. Les enfants doivent conserver, voir si possible améliorer la position occupée à la génération précédente (Singly, 2010, p. 87)

A transmissão de valores e de normas encontra uma primeira barreira no ritmo com que tanto umas como outras sofrem mutações, num tempo em que nada é estático e as mudanças se sucedem numa cadência de difícil acompanhamento, quer pelas famílias quer por outras instituições.

A divisão das sociedades modernas em classes deu azo à emergência de estilos de vida muito diversificados; as migrações acentuaram essas clivagens de classe trazendo outras desigualdades baseadas, por exemplo, na religião, na nacionalidade ou na língua. Esta diversidade manifesta-se numa pluralidade de sistemas de códigos e de conhecimento heterogeneamente distribuídos pelos diversos grupos sociais; a missão de transmissão de valores das famílias torna-se assim mais complexa; a escola, a quem era cometida a missão de formar um corpo homogéneo em relação à sociedade nacional ignorando os particularismos locais, regionais ou familiares enfrenta as mesmas dificuldades.

Na perspetiva de P.W. Musgrave o facto de as classes sociais reconhecerem sistemas de valores diferentes umas das outras cria condições para que à escola cheguem crianças “com valores que chocam com os aceites pelos seus professores” (Musgrave, 1979, p. 35).

A passagem de saberes, assegurada por vários agentes e através de diferentes mecanismos, constitui a forma de os grupos sociais assegurarem a perpetuação dos conhecimentos adquiridos ao longo da sua história, a continuidade no tempo de um conjunto de ideias e de sentimentos, mas também da sua própria sobrevivência como organização social (P.W. Musgrave, 1979; Durkheim, 2001). Se entendermos a educação como “a acção exercida pelas gerações adultas sobre aquelas que ainda não

44 estão maduras para a vida social [tendo] por objecto suscitar e desenvolver na criança um certo número de estados físicos, intelectuais e morais que exigem a sociedade política no seu conjunto e o meio especial ao qual está particularmente destinada (Durkheim, 2001, p. 52) ou, por outras palavras, como o ato através do qual uma cultura rejeita a sua própria morte, reproduzindo-se a cada geração de jovens (Hubert Hannoun, 1997), ela adquire um papel de destaque no conjunto dos mecanismos de transmissão do referido conjunto de ideias e de sentimentos.

É comum considerar-se a família, a escola, os grupos de pares e os meios de comunicação social como os principais agentes de socialização. É, sobretudo, através destes que se criam as condições para que as gerações se possam suceder uma às outras sem que se registem descontinuidades fraturantes nas estruturas sociais ou, como refere Hubert Hannoun, “de faire en sorte que l’individu soit aidé en vue d’acquérir les moyens techniques, relationnels et intellectuels pour répondre de façon autonome aux sollicitations de son environnement physico-bio-social” (Hannoun, 1987, p. 11).

É esse conjunto de ideias de práticas e de sentimentos contextualizados que constituem o património de cada sociedade; é esse património que se procura incutir nas crianças através dos sistemas educativos, transformando o ser indivíduo - a criança quando entra para a sociedade - em ser social. (Durkheim, 2001). Trata-se da passagem de um código acerca do ser Homem, que é necessário perpetuar, pois essa é a forma de garantir a própria existência humana enquanto organização social. A educação é a via que garante que esse sistema seja passado das gerações adultas para as juvenis, ao fixá- lo nas consciências dos mais novos, independentemente da sua origem social.

A família assumiu desde sempre um papel fundamental na socialização das crianças tanto em termos primários como secundários; ao nível dos primeiros, e de forma consciente ou não, são transmitidos os conhecimentos relativos às rotinas diárias que fazem delas seres sociais; quanto aos secundários, a família proporciona a aquisição de técnicas indispensáveis à sua sobrevivência. Contudo, e sobretudo na era pós revolução industrial, esta última função passou a ser levada a cabo por outro agente, a escola. Enquanto a família primitiva funcionava como uma unidade económica, obrigada a garantir a sua autossubsistência (Musgrave, 1979), a industrialização dos países fez com que o trabalho familiar passasse a ser realizado nas grandes fábricas,

45 onde os indivíduos vão continuar a exercer uma função económica para a qual são remunerados, mas fora do contexto da família; nessa perspetiva, a família vê-se desapropriada dessa função, nomeadamente a de ensinar o ofício aos membros mais novos, como antes acontecia na família primitiva. Como refere Shorter (1995), “a família tradicional era muito mais uma unidade produtiva e reprodutora do que uma unidade emocional. Era um mecanismo destinado a transmitir património e posição social de geração em geração” (Shorter, 1995, p. 11).

O desenvolvimento tecnológico, associado à necessidade de produção de bens e disponibilização de serviços exige o domínio de técnicas e conhecimentos cada vez mais complexos, de tal forma que as famílias já não conseguem ser elas a criar condições para que os jovens os possam adquirir, a prepará-los para um mercado de trabalho cada vez mais diverso e, ao mesmo tempo, especializado. Um mercado de trabalho que exige do indivíduo uma crescente capacidade de adaptação, de flexibilidade técnica e mental; que obriga o indivíduo a uma especialização na

generalidade, nunca podendo dar como adquirido a especialização no desempenho de

uma determinada função. Responder à necessidade de transmissão de conhecimentos técnicos que torne o indivíduo num trabalhador, a esse nível, não está ao alcance da família moderna. Assim, esta tem essencialmente duas funções relativamente aos seus membros juvenis: assegurar o seu bem-estar físico e emocional e assegurar a socialização primária.

É no seio da família que a criança, enquanto ser biológico e graças a um complexo processo de controlo exercido pelos adultos, “adquire uma identidade cultural específica e responde ou reage a essa identidade” (Domingos, Barradas, Rainha & Neves, 1985, p. 91), transformando-se num ser culturalmente específico. A família imprime na criança os padrões de comportamento necessários à adaptação ao meio em que vive, como prevê Durkheim (2001), os quais a ajudam no desenvolvimento de

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