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4. O ASSOCIATIVISMO EM PAUTA NA REVISTA PORTUGUESA

4.2 A esgrima, “fidalgo esporte” do Clube Português

A secção de Esgrima, a cargo do consócio, Snr. Carlos Ferreira Mesquita, tem redobrado de animação, sendo apreciavel o vulto de atiradores que frequentam a nossa excelente sala de armas, e lisongeiro, o mais possivel, o aproveitamento dos estreantes cujas provas têm sido dadas, com grande brilho, nas "poules" realisadas sob a direcção do mestre, Snr. José Pereira Botanico.

Como necessario Complemento desta Sala, foi construido um ótimo balneario destinado, em especial aos atiradores, mas cuja utilisação é facultada aos sócios, nas horas livres dos epereicios de Esgrima. (SALA..., 1930, p. 174)

Dentre as escassas referências às atividades associativas na Revista Portuguesa, as únicas que recebem um maior grau de elaboração são os textos relativos à esgrima, que debatem sua natureza, suas características, seus valores e seus aspectos técnicos. A maior parte deles é de autoria do brasileiro Fortunato Julio Neto, jornalista esportivo do Correio

Paulistano e considerado “português honorário” pela revista (JULIO NETO, 1937, p. 99). Alguns desses textos são, de fato, republicações do jornal, o que nos permite deduzir que foram cedidos pelo autor ou pelo próprio Correio Paulistano mediante solicitação da redação da Revista Portuguesa58.

Em um de seus artigos publicados na revista, em 1937, Julio Neto cita um texto publicado previamente no jornal e, partindo de sua afirmada insuficiência de ordem técnica, oferece ao leitor um longo complemento produzido pelo mestre de armas do Clube Português, José Pereira Botânico.

Quando publicámos no “Correio Paulistano” de 30 de julho último, um artiguete, intitulado “A Esgrima”, sentimos pairar em nosso espírito certa dúvida quanto à exactidão de algumas considerações de ordem técnica, então expendidas. Não que ignorássemos o assunto, que serviu de tema ao nosso modesto e despretensioso trabalho. E’ que sobre essas considerações não tínhamos ainda o indispensável “o. k.” do nosso distinto mestre de armas, sr. José Pereira Botânico, instrutor de esgrima do Clube Português, e um dos mais competentes técnicos do esporte fidalgo. (Ibid., p. 99)

O texto de Botânico, extenso, é de ordem puramente técnica. Caracteriza as três armas da esgrima – florete, espada e sabre –, destacando no florete um instrumento de estudo. Retoma o histórico da esgrima em São Paulo, citando a influência da Escola de Joinville-le-Pont59 e do oficial francês Delphin Balancier60, sob cuja instrução formaram- se vários mestres de armas na Força Pública de São Paulo. Por fim, ressalta a importância dos clubes paulistanos para o desenvolvimento da modalidade, utilizando o Clube Tietê como exemplo, e parte às considerações últimas sobre as dificuldades técnicas enfrentadas pela Federação Paulista de Esgrima e por suas instituições filiadas na implementação e utilização dos equipamentos elétricos para registro de pontuação, tecnologia trazida pela delegação brasileira nas Olimpíadas de Berlim, em 1936.

Embora a autoridade do mestre de armas do Clube Português seja levantada na abertura do texto, em seu restante nada mais se comenta do clube em questão, de seu caráter, de seu protagonismo ou de seus valores. O assunto fica restrito aos problemas específicos da modalidade esportiva esgrima, não guardando aparente relação nem com

58 Segundo informação constante na contracapa dos números da Revista Portuguesa, toda colaboração

publicada na revista era previamente solicitada.

59 A Escola de Joinville-le-Pont, fundada na França em 1852, objetivava a formação de professores de

ginástica de acordo com o método francês. No século XX, sua maior influência foi a abordagem científica de Georges Demeny.

60 Delphin Balancier foi um dos oficiais capitães responsáveis pela missão francesa em São Paulo a partir

de 1906, cujo objetivo era treinar militarmente a Força Pública do estado. Junto ao capitão Louis Lemaitre, Balancier dirigiu o “Curso de Esgrima e Gymnastica” (GÓIS JUNIOR, 2016).

as questões internas do Clube Português, nem com questões mais amplas relativas à colônia portuguesa.

Em outro texto, de 1938, Fortunato Julio Neto relata os acontecimentos de uma disputa amistosa entre a equipe do Clube Português e a equipe da Gile, a Gioventù Italiana del Littorio all'Estero, grupo de inspiração fascista vinculado à associação italiana Opera Nazionale Dopolavoro. Com o objetivo de “estimular os seus esgrimistas novos e o intercâmbio inter-clubes” (JULIO NETO, 1938, p. 438), o encontro contou com entusiasmada torcida e ocorreu na sala de armas do Clube Português, dirigida pelo jovem esgrimista Walter de Paula61, aluno do mestre José Pereira Botânico. Novamente, pouco se diz sobre o caráter do clube, sobre a colônia portuguesa ou sobre a identidade luso- brasileira, ficando o texto restrito a comentários de ordem técnica sobre a equipe, inclusive com avaliações individuais de cada esportista.

Júlio Costa – Bom atirador, com grande futuro, distingue-se pela técnica, delicadeza e lealdade.

Erasmo de Castro – Apresentou-se adoentado; tem óptimas qualidades para ser um forte atirador.

Odilon Baptista – Iniciante, muito calmo, sabe aproveitar as falhas do adversário, sendo sua especialidade a espada.

Augusto Moreira – Apesar de novato, com muito futuro, é atirador pouco agressivo, mas de óptima defensiva, da qual sabe tirar sempre proveito. Aurélia Dendi – Bôa atiradora e já ambientada para se exibir em público. Soube corresponder à expectativa; atirou com bastante agressividade.

Selma Bocater – Defende as côres do Clube Português há pouco tempo; promete muito, pois mesmo destreinada demonstrou ter qualidade que a recomendam. (Ibid., p. 438)

O artigo finaliza exaltando a importância da fraternidade entre os clubes de esgrima e destacando o ambiente de camaradagem esportiva e social que o encontro havia propiciado. Continua o autor: “Desporto que, a par dos conhecimentos técnicos, exige dos seus praticantes e assistentes elevada dose de dotes espirituais e esmerada educação, a esgrima é um forte elo de sociabilidade a ligar homens e entidades” (Ibid., p. 439). Das demais atividades associativas que, nos grandes jornais, eram associadas à camaradagem entre portugueses e brasileiros e à contribuição lusa à cidade de São Paulo, passa-se agora para uma dada representação da esgrima, em teor mais sóbrio e dentro de uma revista de um clube português, associando-a ao intercâmbio e à sociabilidade entre pessoas e entidades. Não se fala, por exemplo, que o encontro amistoso citado no artigo teria

61 Walter de Paula havia participado em 1936, com então 20 anos de idade, da seletiva para integrar a

promovido a confraternização entre portugueses e italianos, como era de se esperar pela natureza das associações participantes.

O último artigo de Julio Neto, publicado no número final da revista, não foge a essa linha, resumindo-se a fazer um comentário geral sobre as características da esgrima e seus benefícios para o corpo e para as faculdades morais. Frisa que, na prática da esgrima, “a fôrçabruta pouco ou quási nada representa; requer, sim, agilidade, destreza, golpe de vista e cavalheirismo” (JULIO NETO, 1938, p. 52).

Para dar conta de interpretar essa separação entre os debates identitários e a principal prática esportiva do Clube Português, entendemos que um possível caminho de análise seja pensar nas próprias características que definem o esporte moderno. Como destacam Assmann (2015) e Silva (2015) nas considerações que tecem sobre o associativismo esportivo e imigrante no Rio Grande do Sul, o esporte, pelo seu caráter de busca da modernidade, tende a produzir um certo grau de ruptura com o passado e com as tradições. Isso não significa dizer que as práticas esportivas carecem totalmente de diálogo com as identidades étnicas e nacionais, mas sim que elas promovem uma certa flexibilização do jogo identitário, promovendo mais abertura e mais contato com identidades outras que habitam o mesmo campo esportivo. Em termos, não haveria uma esgrima portuguesa, uma esgrima italiana, ou mesmo uma esgrima luso-brasileira, ao contrário das danças de um rancho folclórico, por exemplo, que são fortemente vinculadas a determinadas tradições nacionais.

De modo geral, a Revista Portuguesa, ainda que operasse na chave do reforço de uma identidade imigrante pautada na luso-brasilidade, pouco impunha dessa interpretação sobre as práticas associativas, recreativas e esportivas da colônia. Pouco as mencionava e muito pouco as articulava em torno de debates identitários, notadamente em se tratando da esgrima. Essa constatação sobre os conteúdos da revista exige que os comparemos com o que era publicado na grande imprensa no mesmo período.

Nos grandes jornais, como já levantamos, aos clubes e às suas programações eram atribuídas valorações relativas à identidade lusa ou luso-brasileira. Para os periódicos, os trabalhos e as conquistas das associações eram meios de elevar o nome luso na cidade de São Paulo e no Brasil, além de promover o intercâmbio e a fraternidades entre os chamados povos irmãos. Talvez essa diferença de tratamento, existente ao menos em um nível mais explícito, derivasse da necessidade de reafirmar o prestígio e a distinção dos clubes e associações portuguesas, como uma forma de legitimar sua existência e suas atividades perante toda a sociedade paulistana. Para isso, a tiragem, a circulação e o perfil

de leitor dos grandes jornais pareciam ser mais eficientes do que os de uma revista direcionada a portugueses de camadas intelectualizadas. Entretanto, mesmo nos jornais foi possível observar uma gradação na intensidade do discurso da luso-brasilidade quando observados os diferentes objetos: estava mais presente no tratamento das instituições associativas do que em suas atividades; dentre estas, era mais presente naquelas de caráter recreativo e social, como bailes e solenidades, do que nas de caráter esportivo, como o futebol da Lusa ou a esgrima do Portugal Clube e do Clube Português. Esse fato parece apontar para uma conclusão provisória sobre nossa pergunta de pesquisa.

Tendo por base a difusão de representações nas imprensas, podemos dizer que as práticas corporais e recreativas em si e, principalmente, aquelas de caráter esportivo, não pareciam ter, quando tomadas isoladamente, um caráter de centralidade na negociação de identidades luso-brasileiras entre os imigrantes lusos em São Paulo. Por outro lado, eram expressões de algo que parecia ser mais importante no processo de negociação identitária dos imigrantes portugueses: suas associações e seus clubes, tomando em conta sua estrutura, seu funcionamento, suas disputas, suas lideranças e sua visibilidade social nas páginas dos jornais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Retomemos, por um breve instante, as perguntas iniciais que motivaram este estudo. Qual papel tiveram os clubes e associações de caráter recreativo e esportivo da colônia portuguesa em São Paulo nos processos de negociação da identidade nacional dos imigrantes lusos? Que instituições eram essas, como surgiram e quais eram suas características? De que forma elas influenciavam política e culturalmente na vida desses imigrantes e de seus filhos? Como as imprensas – tanto a grande quanto a étnica, na figura da Revista Portuguesa – representavam em suas páginas essas entidades e suas programações, e como se situavam em relação ao imaginário de uma identidade luso- brasileira? As perguntas são complexas e, findada esta pesquisa, não temos a pretensão de respondê-las senão parcial e provisoriamente, apontando possíveis caminhos para uma interpretação do associativismo recreativo e esportivo dos portugueses em São Paulo.

A opção por centralizar nossa interpretação nos anos 1930 vem do fato deste ter sido um período de efervescência de discursos sobre identidades nacionais no Brasil e em Portugal e, de fato, em boa parte do mundo. No cenário paulistano, foi também um momento de abundância das atividades clubísticas e associativas de modo geral, dentro do qual prosperaram diversas associações de origem imigrante, algumas das quais ainda em funcionamento nos dias atuais. A década representou ainda um período politicamente turbulento, no qual seriam constantemente reconfigurados os papeis dos estrangeiros e de suas atividades associativas no país, exigindo constantes renegociações em seus modos de vida e em sua própria identidade nacional.

A opção por realizar uma pesquisa sobre clubes de origem portuguesa da primeira metade do século XX impôs certas dificuldades ao processo de constituição das fontes. É comum encontrar relatos de diversas barreiras em pesquisas que lidam com instituições dessa natureza: escassez de documentos, inexistência ou desorganização de acervos, documentos extraviados ou mal conservados, relutância em autorizar o acesso aos acervos, ingerências política do clube no direcionamento da pesquisa, entre outras. Em nosso caso particular enfrentamos, além da escassez de documentos, situações complicadas em relação às três principais associações com que trabalhamos. Das duas ainda existentes, que passam por dificuldades financeiras, uma fechou seu acervo e não permite mais o acesso a pesquisadores, e outra não respondeu às nossas insistentes tentativas de comunicação. Da terceira, extinta desde o início dos anos 1940, pouco se sabe, pouco se escreveu, pouco sobreviveu ao tempo, muito embora fosse uma importante

instituição da colônia portuguesa no período. Tais condições exigiram desta pesquisa um certo grau de criatividade e adaptação.

Nesse sentido, optamos por constituir como nossas principais fontes os veículos da grande imprensa e, como contraponto a eles, um periódico produzido por um dos clubes. O olhar para jornais e revistas se mostra muito produtivo pois permite ao pesquisador acessar uma gama de representações que circulavam no contexto do recorte estudado, além de fornecer ainda o acesso a informações pontuais sobre aquele cotidiano: personagens, datas, locais, acontecimentos marcantes, etc. O quê, quem, quando, onde. Entretanto, a imprensa se mostra insuficiente se quisermos pensar nas dimensões mais sensíveis do cotidiano, isto é, nas experiências vividas e praticadas pelas pessoas que de fato habitavam os espaços dos clubes e associações. Como forma de amenizar essa lacuna, recorremos a outros tipos de fontes que, ainda que escassas, pudessem complementar de alguma forma a interpretação das fontes de imprensa, como legislações, páginas do diário oficial, livros do período, fotografias e documentos diversos obtidos em acervos físicos e online. Do mesmo modo, recorremos amplamente à historiografia produzida recentemente sobre imigração portuguesa e associativismo em São Paulo, principalmente, mas também Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.

Definidas as fontes, tivemos como um dos primeiros passos da pesquisa o esforço em compreender melhor o lugar da imigração portuguesa no Brasil. Trata-se de um processo migratório que, embora volumoso, é menos estudado que outros processos do mesmo período, tais quais as imigrações de italianos, japoneses e alemães. Vimos que, embora tivessem que lidar com preconceitos e dificuldades no Brasil – notadamente uma lusofobia herdada dos períodos pós-independência, no século XIX –, os portugueses tiveram melhores condições de se adaptar à vida no Brasil, muito em decorrência das semelhanças linguísticas, culturais e religiosas que tinham em relação aos brasileiros. Outro fator essencial foi a estruturação de redes de apoio, como apontado por Matos (2013) e outros autores, pelas quais os portugueses já estabelecidos no Brasil forneciam suporte para o bom estabelecimento dos recém imigrados. Na composição dessas redes, as diferentes associações étnicas tiveram grande protagonismo, dentre as quais destacamos aquelas de teor recreativo, esportivo e cultural, grande parte fundada nas primeiras décadas do século XX. Foi nessas experiências associativas que demos o nosso enfoque, especificamente as localizadas na cidade de São Paulo, fundadas em sua maioria na década de 1920 e com intensa atividade na década de 1930.

As três principais associações que investigamos, com forte presença na grande imprensa e, excetuando-se uma delas, também bastante presentes na historiografia, foram a Associação Portuguesa de Desportos, o Clube Português e o Portugal Clube. Abordamos também, de maneira tangencial, as casas regionais, como o Centro Trasmontano, e uma iniciativa de maior abrangência, ligada a um projeto político unificador e de inspiração salazarista, que foi a Casa de Portugal.

A Associação Portuguesa de Desportos, fundada em 1920 a partir da fusão de cinco outros clubes de futebol de origem lusa e menor porte, caracterizou-se principalmente pelas práticas esportivas, com destaque para o time de futebol e suas conquistas dos anos 1930, além de outra modalidades como hóquei, bola ao cesto e pingue-pongue. Realizava anualmente, a partir de 1925, festas joaninas de grande porte e com grande divulgação na imprensa paulistana. Quando comparada aos outros dois clubes que abordamos, a Lusa tinha um perfil relativamente mais popular e possuía um quadro de associados mais volumoso. A associação ainda existe e encontra-se em funcionamento, embora passe por um período difícil em termos administrativos e financeiros.

O Clube Português, fundado em 1920, e o Portugal Clube, em 1921, tinham, por sua vez, um perfil mais elitizado e eram de caráter predominantemente social e recreativo, dedicando-se a realizar solenidades, conferências, comemorações de efemérides, bailes, festas e jantares. Os dois clubes eram bastante parecidos e possuíam em suas fileiras vários portugueses proeminentes da colônia, fossem intelectuais ou homens de negócios bem sucedidos. Suas atividades esportivas resumiam-se à prática da esgrima, tanto masculina como feminina. O Português ainda existe, sendo citado com frequência na historiografia sobre imigração portuguesa e em obras de memória. O Portugal, pelo contrário, encerrou suas atividades em 1941, e quase nada se fala dele na bibliografia existente, muito embora nossas fontes tenham mostrado que ele era tão prestigioso quanto o Clube Português. Entre os dois clubes parecia haver um certo grau de rivalidade, pouco elucidado em nossa pesquisa, mas suficientemente evidente. Localizados na região central de São Paulo durante os anos 1930, distantes por cerca de um quarteirão, realizavam atividades muito similares mas, estranhamente, pouco interagiam ou pouca referência faziam um ao outro em seus escritos, discursos e eventos. Essa tensão entre duas instituições próximas e parecidas contrasta com o discurso de uma unidade portuguesa, de inspiração salazarista e impulsionado pelos consulados, demonstrando que a colônia em São Paulo não era absolutamente coesa nem homogênea.

A ação consular sobre os clubes e associações mostrava que tais locais eram estratégicos para a disputa política dos imigrantes portugueses. Para o salazarismo, era importante ter a presença de aliados ou, no mínimo, a ausência de opositores na direção das associações lusas no Brasil. Os presidentes e diretores das instituições que abordamos na pesquisa possuíam bastante influência sobre a colônia, e também, em geral, eram homens de distinção e prestígio na sociedade paulistana. Muitos eram intelectuais com capacidade de pautar os debates e as causas dos portugueses de São Paulo.

No caso específico de que nos ocupamos, foi possível notar que os clubes e associações de caráter recreativo e esportivo não se resumiam a divertimentos e trivialidades, muito embora a nomenclatura pudesse sugerir algo do tipo. Para além das festas e das competições esportivas, tais instituições atuavam politicamente e de forma muitas vezes integrada, estruturando redes de atuação política. Essa integração podia ser a nível externo, com a união de duas ou mais associações em torno de pautas, que iam desde a realização de solenidades para a recepção de autoridades salazaristas que visitavam a cidade, até o auxílio às tropas constitucionalistas rebeladas de São Paulo em 1932, ou mesmo o envio de correspondências e petições ao governo português. Junto a instituições de caráter explicitamente político, os clubes e associações recreativas e esportivas participaram também de iniciativas como a Federação das Associações Portuguesas do Brasil, fundada no Rio de Janeiro em 1932, e da frustrada tentativa de uma confederação de associações portuguesas de São Paulo, em 1934.

Evidentemente, não havia coesão e consenso absolutos entre as associações, mas a sua conjugação para a realização de atividades políticas era, de toda forma, frequente.

A nível interno, a integração dava-se a partir da circulação de portugueses proeminentes dentro de cargos de liderança em diferentes associações. Alguns desses homens, por exemplo, chegaram a ocupar cargos em duas ou até três associações simultaneamente, enquanto outros passaram por várias delas ao longo da vida. Esses imigrantes ilustres recebiam tratamento privilegiado da grande imprensa, tornando-se símbolos do sucesso luso em São Paulo e marcadores de distinção para as próprias instituições de que faziam parte.

Ainda que atuassem politicamente, as associações das quais nos ocupamos manifestavam constantemente em seus estatutos, publicações e falas de seus dirigentes