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A estrutura interna do DP

A hipótese DP permite separar o DP em duas partes, uma funcional e a outra lexical. Para a estrutura de DP delineada nesta dissertação, baseio-me na hipótese DP de Abney (1987). Baseando-se em fenómenos de várias línguas, Abney propõe que os nomes são na realidade dominados por determinantes, e que uma expressão nominal deve ser encarada como um DP. Para incorporar o DP na Teoria X-barra, Abney sugere que o D é um núcleo funcional —por oposição ao núcleo temático N°— que projecta, tomando o NP como complemento. O DP pode ter também um Especificador que, em Inglês, parece ser ocupado por um NP no caso possessivo. Esta ideia tem sido geralmente adoptada para várias línguas, com uma ou outra alteração, em especial quanto ao número de projecções funcionais que existem entre D e o seu complemento NP ,15

O modelo de DP para o Português e o Francês que vou seguir baseia-se em Brito (1993), Cinque (1993) e Sleeman (1996). Basicamente, estas propostas indicam que no DP existe um conjunto não definido de projecções funcionais acima de NP e sugerem a ideia de um movimento do nome para o núcleo Num° (Número), como forma de este verificar o seu traço de número. Por outro lado, Cinque (1993), Sleeman (1996) e implicitamente Brito (1993) sugerem que certos adjectivos são especificadores de

15 Ver por exemplo, Valois (1991),Cinque (1 993),Brito (1993).Uma das consequências mais úteis desta estrutura é que com as posições de especificador de DP e NP, existem mais posições estruturais para dar conta de vários tipos de constituintes que podem ocorrer no interior do DP. Ver no entanto os desenvolvimentos apontados a seguir neste capitulo.

categorias funcionais. Neste pressuposto, fica desde já afastada a proposta de Lobeck para o DP —ver capítulo 2, parágrafo 2.1—, na medida em que esta autora não prevê nenhum tipo de movimento do nome16, e considera os adjectivos como meros adjuntos do

núcleo N°, e não como especificadores de categorias funcionais.17 Embora Lobeck opte

pela presença de projecções funcionais como NumP, o seu modelo de DP parece-me no entanto desadequado para o Português e o Francês, tanto a nível da ordem dos constituintes do complexo nominal como a nível dos mecanismos de supressão do nome. Em alternativa, considero que a proposta de Lobeck sobre o paralelismo entre as elipses e os pronomes nulos deve ser conservada (ver parágrafo anterior).

Além de D°, outros núcleos funcionais devem ser considerados. Para Brito (1993), um desses núcleos funcionais é NumP, isto é, uma categoria funcional capaz de inserir na estrutura de constituintes o traço morfológico [±plural].18 A possibilidade de tratar o

número como uma categoria sintáctica funcional é baseada na ideia de que certas propriedades flexionais podem ser tidas em conta através de mecanismos sintácticos. Também outros autores (Valois 1991, Ritter 1991) propõem o Número como uma categoria que selecciona um NP como complemento.19 Na proposta de Brito (1993), a

posição D° é ocupada por determinantes demonstrativos e artigos definidos e indefinidos.20 Quanto aos quantificadores indefinidos e discretos, assume-se que podem

ser distribuídos complementarmente entre o núcleo D°, quando são [-defj, e como especificadores da projecção funcional NumP ou QP.

Para Abney (1987:323), os adjectivos atributivos são núcleos que tomam NP como complemento.21 Esta análise levanta no entanto dúvidas, já que, se os adjectivos são

núcleos no DP, o movimento de N para NumP faz com que o N seja incapaz de reger estritamente o seu próprio vestígio, violando o ECP 22. Para os adjectivos atributivos, é

assumido, em alternativa, por Cinque (1993), que são especificadores de núcleos funcionais que dominam o NP, sendo eles próprios complementos de D°. Este modelo é válido para os adjectivos intransitivos, podendo assumir-se que estão sempre em posição [Spec,XP], em que X' domina NP. Esta proposta explica-se, em primeiro lugar, pelas

16 Para Lobeck (1995),como vimos, o nome é basicamente engendradocomo núcleo de NP, e desta posição pode, no decurso da derivação, ser regido por um núcleo funcional. A ideia de subida do nome para o sistema funcional é estranha ao modelo de Lobeck.

17 Embora muitos modelos sugiram que os adjectivos podem ser adjuntos de NP ou de algumas das suas projecções funcionais (Valois 1991, Ritter 1 991, Bernstein 1 993 entre outros), esta proposta levanta inúmeras questões, nomeadamente em termos de concordância e de ordem de palavras.

18 A existência desta projecção funcional é um dos factores que sugerem que existe um paralelismo entre o DP e a frase (CP) (e a tese central de Valois 1 991, e uma sugestão do próprio Abney 1987).É referida esta simetria com evidência tanto em semelhanças estruturais (D corresponde a C, e há em ambos DP e CP uma categoria funcional de flexão: IP e NumP), como em processos sintácticos (movimento de núcleos N e V para ganhar flexão junto de um núcleo funcional).

19 Outras propostas existem no sentido de considerar como projecções funcionais determinadas características dos nomes. Eo caso, por exemplo, de Sánchez (1995),que propõe a projecção PredP em DPs com adjectivos restritivos, e de Brito & Oliveira (1995), que nos DPs com nomes eventivos sugerem a existência de AspP. Para Crisma (1995),todas estas projecções funcionais sao genericamente designadas NomIP.

20 Mas alguns destes constituintes legitimam nomes vazios, e outros não, sinal de que nem todos estarão em D°. Ver adiante.

21 No exemplo an alleged comunist, o significado do adjectivo altera o do NP de modo não intersectivo, e parece corresponder a uma estrutura em que NP é complemento do núcleo A.

22 Bernstein (1993) chega a apresentar adjectivos considerados como núcleos (como mero p.51)que de facto bloqueiam o movimento de N. Sobre o ECP, cf. p.l 6

Nomes nulos em Portuguese em Francês 83

fortes restrições que existem sobre a ordem relativa dos adjectivos dentro do DP, que sugerem que existe uma hierarquia de categorias funcionais onde os adjectivos são gerados, e em segundo lugar, porque existe um limite ao número de adjectivos, que pode ser atribuído ao limite máximo de categorias funcionais existentes. Para os adjectivos transitivos, isto é, aqueles capazes de ter complementos, Sleeman (1996) propõe que sejam gerados como adjuntos à direita de NP.

Outras propostas sobre a hierarquia nome/adjectivo existem. Para Kayne (1994), existe uma projecção intermédia entre nomes e modificadores —possessivos, adjectivos e relativas—, que pode explicar a ordem interna no DP. Kayne propõe que essa projecção é de tipo CP e é complemento de D°. Nesse caso, Kayne explica a ordem nome/adjectivo por um mecanismo de subida: em Inglês, o NP modificado está em [SpecJP], e o adjectivo está em Io, de onde sobe para [Spec,CP], o que explica à ordem final

adjectivo/nome. No caso do Francês, Kayne sugere que, além da subida do adjectivo para [Spec,CP], o próprio nome também sobe, primeiro para C°, e depois para uma projecção funcional superior, situada entre D° e CP, que corresponde talvez a NumP, de modo a que a ordem nome/adjectivo no DP Francês se verifique.

Para Sánchez (1995), as projecções funcionais cruciais são PredP (Sintagma Predicado) e AgrP, sendo a primeira complemento de D°. Neste sistema, o NP é complemento de AgrP, e o adjectivo está em [Spec,AgrP]. A ordem relativa entre nome e adjectivos restritivos —neste caso em Espanhol— pode ser explicada por um mecanismo de subida do NP da sua posição básica para [Spec,PredP]23. Quer em Kayne (1994),

quer em Sánchez (1995), os adjectivos considerados são unicamente os restritivos — geralmente pós-nominais—, não havendo para os outros tipos de adjectivos mecanismos adiantados, pelo que estes modelos só parcialmente podem descrever a estrutura interna do DP.

No modelo aqui adoptado, é assumido, de acordo com Cinque (1993) e Brito (1993), que NumP é uma projecção funcional intermédia central, e que N° se move para Num°, de maneira a verificar o seu traço [iplural], desencadeando, da sua posição em Num°, dois tipos de verificação de traços: Concordância Núcleo-Núcleo entre D° e N°+Num° e Concordância Especificador-Núcleo com os especificadores das várias projecções funcionais que possam existir.24 Dentro deste quadro, assumo, com Cinque

(1993), que os adjectivos atributivos são pré-nominais em Estrutura-P, tanto nas Línguas Românicas como nas Línguas Germânicas. A diferença em Estrutura-S explica-se pelo movimento de N em Sintaxe nas Línguas Românicas, isto é, pela sua incorporação no

23 Sánchez sugere também que a concordância afixada pelo nome é realizada pela incorporação de Agr° e Pred°, que permite seguidamente ao NP verificar a sua flexão por Concordância Especificador-Núcleo.

24 Bernstein (1 993)propõe uma variação desta ideia na qual a maioria dos adjectivos pré-nominais são adjuntos de categorias funcionais intermédias. Em ambos os casos, a posição relativa correcta de adjectivos e nomes nas Línguas Românicas e nas Línguas Germânicas é obtida assumindo que nas Línguas Românicas ocidentais, mas não nas Línguas Germânicas, o nome sobe em Estrutura-S para um dos núcleos funcionais intermédios, atravessando algum adjectivo.

núcleo Num°.2S Além de poder dar conta da assimetria da ordem de palavras —a

projecção NumP determina a posição do núcleo lexical em Estrutura-S—, as relações de concordância dentro do DP nas línguas Românicas constituem uma aplicação ao DP da hipótese Concordância Especificador-Núcleo, independentemente desenvolvida para justificar a relação de acordo entre a flexão verbal e o sujeito.

Dá-se a seguir uma representação simplificada do DP, em que XP representa uma projecção funcional cuja natureza não interessa para já especificar:

(37) DP pré-nom ras * NumP N u m ' adjectivos transitivos -N

Na sequência deste capítulo, irei propor que o mecanismo da elipse do nome deve ser tido em conta dentro deste modelo de projecção alargada da categoria nominal. Na representação em (37), assumo que o nome pode sistematicamente ser analisado como complemento de uma categoria funcional XP. Mas de forma a explicar o diferente comportamento da elipse nominal em Português e em Francês, teremos que completar e estender a análise (37). Será este o objectivo do parágrafo 3.3.

25 A incorporação do nome em Num0 não deixa de levantar alguns problemas. Sánchez (1995) faz notar que a subida de N

para Num0 está em contradição com dados como estes:

(i) Maria es una ladrona de joyas torpe (ii) 7? Maria es una ladrona torpe de joyas

Estes dados mostram que o núcleo N° não sobe para Num", já que não pode ser separado do seu complemento. Sánchez conclui que a posição pós-nominal de torpe não pode ser devida a um movimento de N. Cf. Também Lamarche 0 991).

Nomes nulos em Portuguese em Francês 85

3.3 Legitimação e identificação de nomes nulos em Português e em Francês