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1. Localização, evolução histórica e a produção do espaço urbano de São Carlos

1.1 A expansão territorial urbana de São Carlos

A partir dos anos de 1960 e 1970, no âmbito das redefinições dos papéis das cidades diante das novas lógicas de produção dos espaços, São Carlos/SP (localizada no Centro-Leste do Estado de São Paulo) de acordo com Sposito (2004, p.80) situada na Aglomeração Urbana Não-Metropolitana de Araraquara-São Carlos, têm nos estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços, nos centros universitários e tecnológicos, uma das determinantes na maior complexidade estrutural da cidade.

Em relação à expansão territorial inicial e sua estrutura física é possível observar no Mapa 3 de expansão da área urbana, que o núcleo urbano central da cidade de São Carlos se configurou a partir do eixo principal Norte-Sul na atual Avenida São Carlos, sob uma malha quadrangular constituída através deste eixo. Foram estabelecendo-se os primeiros loteamentos e a expansão urbana no sentido leste, oeste e no sul, sendo a ferrovia a principal indutora da expansão (LIMA, 2007, p. 36) e, de acordo com Plano Local de Habitação de Interesse Social de São Carlos (PLHISSC, 2010), esses assentamentos se deram de forma independente de suas características topográficas pautadas nos eixos norte-sul.

Este primeiro período de expansão marcado pela área do Centro e oeste da malha urbana foram ocupados, predominantemente, pelos segmentos sociais de mais alto poder aquisitivo, e outros segmentos que ganhavam influência e ampliavam seu poder aquisitivo.

No contexto da economia cafeeira (séc. XIX), e eixo de passagem da ferrovia, segundo Lima (2007, p.29) a expansão ocorreu de forma concentrada e contínua. Este processo avançou a partir do deslocamento do sistema agrário-exportador para o sistema urbano-industrial entre os anos 1930 e 1940, pois atribuiu importância às atividades no município, associada ao complexo ferroviário, estabelecimentos bancários, equipamentos públicos, além da força de trabalho e de consumo apoiada na migração campo-cidade e a ascensão da indústria.

93 A partir de 1940 ocorrem significativas mudanças nos processos de configuração urbana que em termos de constituição do tecido urbano, aumentaram os problemas urbanos e o conflito entre os segmentos, acirradas pela diferenciação social. O aumento da urbanização neste período se associou à atividade industrial e migração campo-cidade, quando a área urbana mais que triplicou e continuou crescendo de forma exponencial (LIMA, 2007, p.75).

Tem início então um processo de expansão do tecido urbano, a partir da criação de novos loteamentos no entorno do centro e, simultaneamente a este processo, é importante salientar tal como já observado em Lima (2007), o PLHISSC (2010) e Dal Pozzo (2011), que a área central era inicialmente ocupada pela população de alta renda e elevado poder aquisitivo. Nos anos seguintes esta área foi sendo gradativamente ocupada por um conjunto de atividades de serviços (bancários, comércio de produtos, prestação de serviços, etc), deixando de ser o local de moradia daqueles segmentos da sociedade. Esses, por sua vez, a fim de se distanciar das camadas mais populares e do adensamento central se deslocaram para setores residenciais de mais elevado padrão nos sentidos Oeste (arredores da Santa Casa, do posterior São Carlos Clube e da Universidade de São Paulo) e Leste (Vila Elizabeth).

A partir dos anos de 1940, o espaço urbano de São Carlos passa por um processo mais intenso de diferenciação socioespacial, reforçando um padrão de segregação do tipo centro-periferia, configurando descontinuidades na mancha urbana, caracterizando o processo de periferização pelo surgimento de bairros a sudoeste do centro urbano principal.

Frente à decadência da cafeicultura na década de 1930, houve uma estagnação no crescimento populacional de São Carlos. E, em contraposição alavancou, paulatinamente, os fluxos migratórios do campo para a cidade sendo que, na década de 1940, mais de 50% da população residia na área urbana (LIMA, 2007, p. 33), o que estimulou à expansão urbana da cidade dada as novas demandas por moradias. Neste cenário, os parcelamentos de terras por proprietários imobiliários foram determinantes no desenvolvimento do tecido urbano.

Nas décadas seguintes este panorama se alterou significativamente, dadas as novas lógicas de produção do espaço que configuraram formas urbanas bastante distintas, tanto em termos de localização, quanto em relação ao padrão urbanístico empreendido. A partir de 1940 tem início um crescimento intenso e exponencial, conforme Lima (2007, p.79)

94 marcado pela implantação de vários loteamentos, dentre eles: Vila Jardim, Jardim Lutfalla, em 1949 surgiram os loteamentos Vila Elizabeth, Vila Pelicano, Vila Faria, entre outros.

Nos anos 1950, observa-se no Mapa 3 que a expansão urbana ocorreu no sentido leste (loteamentos como o Vila Arnaldo, Vila Nery, Vila Marques, entre outros) e no sentido sudeste, e passou a direcionar-se crescentemente junto à Rodovia Washington Luís, de 1930 a 1950 (verificados no Mapa entre os períodos de 1857 a 1940 e 1940 a 1960). Este contexto marca o segundo período de expansão do espaço urbano, que era orientado no eixo norte- sul (a partir da Avenida São Carlos), tendo a Rodovia Washington Luís como uma importante via de acesso. De acordo com Lima (2007, p.82), neste segundo período a expansão urbana de São Carlos também se direcionou nos sentidos noroeste, sudoeste e leste, de forma menos acentuada. De acordo com a autora (2007, p.92) as características de implantação destes loteamentos eram marcadas pela deficiência em infraestrutura, agravadas pela distância e descontinuidade em relação à malha urbana, dificultando a acessibilidade da população residente. Esses loteamentos, segundo Dal Pozzo (2011, p.118) eram destinados para os segmentos sociais da população de menor renda.

Segundo Lima (2007, p.132), dentre os eixos de expansão urbana consolidados a partir dos anos 1960 e 1970 destacam-se aqueles dispostos nos sentidos sul, sudoeste e noroeste, sendo este o terceiro período marcante de expansão urbana. Em relação aos loteamentos implantados no sentido noroeste, Dal Pozzo (2011, p.119) destaca que mantinham continuidade com a malha urbana compacta, e em torno da Escola de Engenharia de São Carlos receberam infraestrutura básica e foram destinados aos segmentos sociais de médio a alto poder aquisitivo. Estes setores geográficos receberam principalmente professores universitários e profissionais especializados. Em contrapartida, segundo Lima (2007, p.140), os loteamentos implantados a noroeste, muitos em descontinuidade à malha urbana compacta e ao longo da Rodovia Washington Luís em sentido oposto à malha urbana constituída, foram ocupados majoritariamente pelos segmentos sociais de baixo a médio poder aquisitivo.

A partir dos anos 1960 a expansão urbana de São Carlos contou com o apoio do planejamento urbano e administração municipal a partir da intervenção estatal na produção de habitações e, principalmente, na institucionalização de um novo padrão de moradia popular, o da casa própria. O crescimento da população urbana ocorreu de forma acelerada,

95 incentivado pelos fluxos migratórios, e a população passou de 62 mil habitantes em 1960 para 119 mil habitantes em 1980. A expansão urbana nos anos 1960 (observa-se no Mapa 3) foi incentivada pela implantação do transporte coletivo que passou a ser feito por ônibus, possibilitando um maior dinamismo, diminuindo a dificuldade de acesso aos bairros descontínuos à malha urbana (LIMA, 2007, p. 124).

Neste período destacam-se os interesses especulativos do mercado imobiliário e as novas dinâmicas industriais, responsáveis pelo aprofundamento da segregação urbana (LIMA, 2007). Segundo Dal Pozzo (2011, p.118), durante a década de 1960 foram implantados quatorze novos loteamentos caracterizados por ocupar grandes dimensões de áreas enquanto que, os loteamentos implantados na década de 1970 (34 loteamentos), possuíam dimensões médias a pequenas. Ainda os anos 1970, de acordo com o autor, foram marcados pelo estabelecimento de dois novos tipos de habitat urbano, caracterizado pelas chácaras de recreio em áreas rurais, localizadas próximas às áreas de expansão urbana e os espaços residenciais fechados. Neste contexto foram implantadas oito chácaras de recreio, com morfologia urbana marcada por lotes de cerca de cinco mil metros quadrados. Estes empreendimentos se destinavam, sobretudo, a servir como segunda moradia e como espaço de lazer aos segmentos da população de alto poder aquisitivo.

Segundo o Plano Local de Habitação de Interesse Social de São Carlos (2010) a expansão urbana de São Carlos foi marcada pela valorização induzida de espaços vazios e pela carência total ou parcial de serviços públicos em bairros residenciais distantes do centro, aqueles destinados à população de baixa renda, caracterizando um processo conflituoso de expansão territorial. Este problema se acentuou nos anos 1970 e 1980 com o agravamento de ocupação em áreas ambientalmente frágeis, associada ao aumento populacional significativo.

Nos anos 1980 ocorre a implantação do loteamento Cidade Aracy na área Sul da malha urbana que surgiu em 1982 (área esta que hoje integra os bairros Cidade Aracy I, Cidade Aracy II, Antenor Garcia e Presidente Collor) e é caracterizado por sua distância em relação à malha urbana consolidada de São Carlos (de aproximadamente 9 km), e segundo informações do PLHISSC (2010, p.49) é o setor geográfico do município com maior concentração da pobreza urbana, precariedade habitacional e vulnerabilidade social, além de estar situada em área de preservação permanente. Este setor geográfico, justamente

96 pelas características citadas, foi um dos pontos selecionados para monitoramento climático, destaca-se também a influência do sítio urbano e do fibrocimento na dinâmica de liberação de calor por estas superfícies.

Em relação a um quarto período de expansão urbana dentre os anos 1980 até meados da década de 1990, tendo o ano de 1996 como referência, a expansão territorial urbana foi orientada a partir de três eixos, sendo eles: eixo noroeste, eixo sudoeste e eixo leste. Além destes, de acordo com Dal Pozzo (2011, p.121), esta expansão também ocorreu em menor proporção no eixo norte, a noroeste da Rodovia Washington Luís. Em relação a esta área o autor destaca um aspecto interessante que é a difusão do primeiro período de implantação de espaços residenciais fechados em São Carlos (de 1976 a 1982). Dentre estes empreendimentos, destacam-se o Residencial Samambaia (implantado em 1982), o Parque Sabará e aos loteamentos de chácaras de recreio Tibaia de São Fernando I e II (aprovados em 1980), no Setor Norte.

Com relação ao aumento da população neste período, observa-se na Tabela 8 que São Carlos passou de 119.012 habitantes em 1980, para 157.549 habitantes em 1991 (SEADE57, 2012). Já em 2000, a população aumentou para 192.565 habitantes, e atualmente ultrapassou duzentos mil habitantes segundo IBGE Censo 2010 (221.936 habitantes).

Tabela 8 – Aumento da população total

em São Carlos entre os anos de 1980 a 2010

Anos Habitantes

1980 119.012

1991 157.549

2000 192.565

2010 221.936

Fonte: IBGE Cidades@ (2010) e Fundação SEADE (2013).

Organizado pela autora.

Na década de 1980 até 1990, sobretudo em 1996, a expansão da malha urbana de São Carlos foi orientada aos eixos Noroeste, Sudoeste e Leste a partir da implantação de

57Dados obtidos no SEADE - Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados. Memorial das Estatísticas

Demográficas. Disponível em: <http://www.seade.gov.br/produtos/500anos/index.php?tip=esta>. Acesso em: 10 de dezembro de 2012.

97 inúmeros loteamentos e condomínios residenciais fechados. As residências dos segmentos sociais de maior poder aquisitivo concentraram-se nos eixos Norte e Noroeste de expansão urbana, enquanto os empreendimentos com residências da população de baixo poder aquisitivo foram mais expressivos nos setores Sudoeste e Sul e, em menor proporção, na zona Norte e Leste (DAL POZZO, 2011).

De acordo com Dal Pozzo (2011, p.126) o processo de segregação em São Carlos nos anos 1990 alcança níveis tão complexos que o autor denomina de auto-segregação denotando novas formas de habitat urbano, marcado pela atuação de grandes empresas de empreendedores imobiliários como o grupo Encalso, na viabilização de novos espaços residenciais fechados, produzindo a autossegregação em São Carlos, marcadamente a partir do ano 2000, conforme se observa no Mapa 3.

Ainda segundo o autor, com relação aos loteamentos instalados nesta época destaca- se a implantação de 18 espaços residenciais fechados, sobretudo nos setores noroeste e norte, sendo treze empreendimentos de médio a grande porte e cinco de pequeno porte, demonstrando que, assim como em Marília, ocorreu uma intensificação da autossegregação. Além disso, no Setor Noroeste, foram implantados sete novos espaços residenciais de médio a grande porte, sendo eles: Parque Faber-Castell II (aprovado em 2002), Condomínio Residencial Montreal (aprovado em 2002), Swiss Park São Carlos (aprovado em 2003), Residencial Eldorado (aprovado em 2003), Jardim Vista Alegre (aprovado em 2007), Terra Nova São Carlos (aprovado em 2008) e o Condomínio Moradas São Carlos I (aprovado em 2009). No Setor Norte, o autor ainda destaca a implantação de seis novos espaços residenciais de médio e grande porte, dentre eles: o Parque Residencial Damha I (aprovado em 2002), o Parque Residencial Damha II (aprovado em 2002), o Village São Carlos I (aprovado em 2006) e o Village São Carlos II (aprovado em 2006) destinados aos segmentos sociais de alta renda.

Com relação aos principais segmentos da população que habitam o espaço urbano de São Carlos, com base no observado anteriormente, de acordo com Lima (2007, p.131) e Dal Pozzo (2011, p.128) os setores sudoeste e sul, e em menor proporção na zona Norte e Leste, se destacam pela concentração de residências dos segmentos sociais de mais baixo poder aquisitivo reforçando a segmentação do espaço no âmbito da diferenciação socioespacial e a expansão da malha urbana de forma descontínua, além da periferização fragmentada da

98 urbanização e aumento da carência de infraestrutura urbana, acabando por se caracterizar como as duas áreas mais pobres e precárias de São Carlos.

Conclui-se que desde os anos 1950, efetivamente a partir do crescimento exponencial da população e de expansão urbana de São Carlos, o espaço urbano já apresentava traços de descontinuidade rumo à periferia e criação de loteamentos fechados, associado às novas formas de habitats urbanos marcados pela criação de áreas de recreação, em contraposição ao estabelecimento de loteamentos periféricos em relação à malha urbana com novos padrões urbanísticos irregulares carentes de infraestrutura, com tendência a periferização, sobretudo a partir de 1997. O poder executivo neste momento, enquanto agente social controlava a expansão urbana, com leis e parâmetros urbanísticos de incentivo à expansão, zoneamento e aumento do poder de ação dos loteadores.

A produção do espaço urbano de São Carlos, como observado, contém elementos que configuraram historicamente diferenciações e desigualdades sociais, o que explica o fato dos segmentos de mais baixa renda da população terem ocupado áreas mais vulneráveis e precárias, dadas as desigualdades que diferenciam os segmentos na sociedade, em que a renda não é a única, mas, uma importante variável de distinção neste contexto.

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