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Na segunda metade do século XX, o Brasil apresentou um intenso processo de urbanização cuja tendência foi o rápido crescimento da população urbana e a redução da população rural no país. No ano de 2000 esta proporção passou a ser de 81% da população vivendo em áreas urbanas, enquanto em meados dos anos 1940 correspondia a pouco mais de 25% da população total do país (BRANCO, 2007).

É neste contexto de avanço da urbanização que a então frágil rede urbana experimentou um forte incremento a partir do surgimento de novas cidades, consolidando centros intermediários que assumem nova importância no contexto da internacionalização da economia e intermediação entre níveis superiores, inferiores, e com outras cidades (BRANCO, 2007, p.90). Em suma, as cidades médias constituem marco temporal e espacial nesse sistema urbano que viria a constituir as transformações estruturais da rede urbana brasileira nos dias atuais.

52 Em relação à definição de cidades médias, de acordo com Sposito (2003, p. 21) o termo é adequado apenas para as cidades de porte médio que desempenham papéis regionais e/ou intermediários no conjunto da rede urbana em que se insere. Quanto a isso, de acordo com o REGIC (Região de Influência das Cidades) a cidade de São Carlos é um dos

Centros sub-regionais A39 que faz parte da rede definida como rede de São Paulo, Grande Metrópole Nacional e, a cidade de Marília que também compõem a rede de São Paulo é denominada como uma das Capitais Regionais C40.

De imediato, considera-se cidade média como aquela que abriga entre 100 e 500 mil habitantes (IPEA, 2001). Se o critério demográfico for considerado como definidor de uma cidade, necessariamente toda cidade média é em sua gênese de porte médio, porém com relações mais complexas que a definem. Entretanto, nem toda cidade de porte médio desempenha os papéis na rede urbana de uma cidade média. Isso demonstra que não há uma correspondência direta entre o tamanho demográfico e o conjunto de papéis desempenhados na rede urbana. No caso de Marília e São Carlos, ocorre justamente este processo, visto que em Marília, por exemplo, com população de pouco mais de 216 mil habitantes (216.745 habitantes IBGE Censo 201041) por conta de suas características socioespaciais e os papéis que desempenha na rede urbana é considerada cidade média.

A situação geográfica que significa a “localização de uma povoação em relação aos terrenos circundantes” (SMALL e WITHERICK, 1992, p.236), ou ainda segundo Sposito (2001) que indica a existência ou ausência de condições que podem facilitar as comunicações e interações e espaços que exercem maior ou menor centralidade interurbana na rede urbana. No caso da cidade de São Carlos, segundo Sposito (2004, p.80) situada na Aglomeração Urbana Não-Metropolitana de Araraquara - São Carlos tem nos estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços, nos centros universitários e

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Segundo REGIC (2008) um Centro sub-regional têm área de atuação reduzida, e sua relação com os demais centros se dá apenas com as três metrópoles nacionais. Esses centros são subdivididos ainda em Centro sub-

regional A (região constituída por 85 cidades, entre 95 mil habitantes e relações com outras 112 cidades) e Centro sub-regional B (região constituída por 79 cidades, entre 71 mil habitantes e relações com outras 71

cidades).

40 Segundo REGIC (2008) uma Capital regional abrange 70 centros e como as metrópoles, se relacionam com o

estrato superior da rede urbana, mas com área de influência de âmbito regional, com atividades referidas por grande número de municípios. Apresenta três subdivisões: Capital regional A (constituído por 11 cidades, com medianas de 955 mil habitantes e 487 relacionamentos), Capital regional B (constituído por 20 cidades, com medianas de 435 mil habitantes e 406 relacionamentos) e Capital regional C (constituído por 39 cidades com medianas de 250 mil habitantes e 162 relacionamentos).

53 tecnológicos, uma das determinantes na maior complexidade estrutural da cidade, além de seu porte populacional (221.950 habitantes IBGE censo 201042) que a assemelha às cidades médias, apesar das relações/papéis que desempenha na rede urbana regional não a caracterizar como tal, mas sim, de porte médio.

O distanciamento da metrópole paulista (aproximadamente 450 km a Oeste), atribuía às cidades no interior de São Paulo que - inicialmente se prestavam a pontos de armazenamento de produtos agrícolas -, uma centralidade de funções econômicas, políticas e sociais no âmbito da rede urbana regional. Marília, neste contexto concentrava atividades agrícolas, de comércio e posteriormente, industriais, abastecendo com produtos a escala local e regional. Com situação geográfica favorável enquanto Capital regional não- metropolitana, Marília desempenha papéis regionais ou intermediários além de acentuado nível de centralidade interurbana. Isso demonstra que cidades de mesmo porte populacional, ou semelhantes, podem desempenhar papéis que se diferem em grau de importância e alcance na rede urbana.

A posição geográfica ou localização relativa se refere a “situação locacional de uma cidade face a aspectos externos a ela, envolvendo o conteúdo natural e social das áreas circunvizinhas” (CORRÊA, 2004, p.317). Envolve aspectos como recursos naturais, produção, demanda e acessibilidade e na dinâmica de produção do espaço urbano, o cenário locacional de posicionamento geográfico reforça a relevância destes espaços urbanos na constituição das funções de entroncamento de meios de comunicação e acessibilidade.

O mais importante no contexto de produção do espaço urbano das cidades médias e de porte médio, é que é possível observar que estas passaram a reproduzir problemas sociais antes específicos de grandes metrópoles (BRANCO, 2007, p. 90) e, enquanto processo social contraditório permite o reconhecimento da formação de áreas com maior suscetibilidade intraurbana, na medida em que o conjunto de ações dos agentes econômicos, principalmente imobiliários, determina a organização do espaço com base no preço da terra e na distribuição das atividades. Em relação a estas contradições no contexto da urbanização recente e das cidades médias, Sposito (2007, p.244) reforça argumentando que:

54 Além disso, a alteração das lógicas de estruturação das cidades tem promovido ampliação das desigualdades socioespaciais. Têm sido reforçadas dinâmicas de segregação herdadas de períodos anteriores e se iniciado, em alguns casos, processos de estruturação que apontam para a fragmentação do tecido sociopolítico-espacial [...].

O espaço da cidade se organiza em função da própria lógica de urbanização e de um amplo processo de transformações no conjunto de papéis desempenhados pelas cidades e, e mais do que isso, de acordo com os interesses dos agentes na organização dos espaços, que em muitos casos passam pelo consentimento do poder público na materialização das formas urbanas da cidade e das relações que nela se estabelecem.

Marisco (2003) destaca que em muitos casos os instrumentos urbanísticos ou leis adotadas pelo poder público, podem atuar como legitimadores e ratificadores da desigualdade socioespacial no espaço urbano e, desta forma, não servem como instrumento de democratização do uso e ocupação do solo urbano. Rodrigues (2008) enfatiza que:

Apesar dos inúmeros agentes que produzem e reproduzem o espaço urbano, a resolução de problemas resultantes da urbanização capitalista é atribuição do poder público que, em geral, adota medidas praticamente inócuas, considerando-se a voracidade da especulação imobiliária, calcada no direito da propriedade privada da terra. Os problemas inerentes à urbanização capitalista são, cada vez mais, agravados pela forma e conteúdo da apropriação da renda da terra (RODRIGUES, 2008, p.14).

Diante disso, torna-se importante fundamentar o contexto de produção do espaço e expansão das áreas urbanas de Marília e São Carlos destacando suas especificidades. Essa análise é desenvolvida a seguir na caracterização geoambiental e urbana no capítulo 3.

Considera-se fundamental retomar a discussão histórica de como as cidades vem sendo produzidas, neste caso São Carlos e Marília, por considerar a indissociabilidade entre o clima e a produção do espaço, posto que as características do ambiente urbano possuam, em cada setor geográfico, uma lógica na sua constituição de cada um que os une. É da indissociabilidade da produção do espaço com o clima, que é dinâmico, que são condicionadas, também, as variáveis climáticas. E essa produção do espaço, por ser diferenciada de acordo com os segmentos sociais para quem elas se destinam, o que vai implicar em um clima urbano específico.

55 Ao localizar espacialmente o equipamento de registro de temperatura e umidade relativa, é preciso ter em vista que as características geoambientais (uso do solo, a densidade construtiva, o tipo de cobertura das edificações, a arborização, o sítio urbano) deste setor geográfico foram produzidas. Ou seja, é preciso avaliar e identificar a variedade dos tipos de ocupação do solo constituídos, resultantes de um processo histórico e recente de produção do espaço urbano.

E quando se retoma o conceito de produção do espaço urbano, a ideia genérica de cidade só se materializa concretamente quando são identificados esses indicadores/características em cada setor. A cidade além de ser considerada como um híbrido, cada setor geográfico considerado é um mosaico, que por sua vez, não é aleatório; existindo uma lógica nesta forma de organização espacial, a lógica da produção. Portanto, esta lógica não é aleatória, as características geoambientais vão condicionar esses resultados climáticos, porque uma área que tem um uso do solo variado, com densidade elevada, distribuição da vegetação ausente e baixo padrão construtivo, é diferente de uma área comercial, que é distinta de um setor com quadras largas, baixa densidade construtiva, arborização densa, vias de acesso mais largas favorecendo a circulação de ar e menor impermeabilização do solo. Os elementos do clima vão mudando de acordo com os elementos que compõem os setores da cidade, reforçando a ideia de que as características geoambientais são produzidas e na medida em que elas se transformam de um setor a outro da cidade, o clima também se altera.

Desvendar a relação e a gênese do clima urbano ajuda a perceber as diferenças que condicionam as medidas climáticas, mas, objetiva-se avançar nesta discussão ao dizer que é a produção do espaço que condiciona climas distintos. É fundamental descrever os elementos de um Condomínio fechado, e de um empreendimento “Minha Casa Minha Vida43” que são diferentes, mas não basta simplesmente constatá-las, é preciso mostrar a maneira com que elas foram produzidas. Construir o debate neste sentido permite refletir sobre a necessidade de produzir cidade de outra maneira. Em síntese, estas indagações justificam o porquê do uso da produção do espaço urbano neste trabalho.

43 Trata-se de um Programa federal de habitação do governo brasileiro que possibilita, via acesso financeiro, a

compra e a construção de moradias populares. O Programa popular acontece em parceria com estados, municípios, empresas e entidades sem fins lucrativos. Informações obtidas em: <http://www.programadogoverno.org/programa-minha-casa-minha-vida/>.

56 Considera-se pouco explorada a produção da climatologia brasileira que não pondera a contribuição destas discussões. A forma de produzir cidade que rebate socialmente em desigualdades tão extremas fazem alusão à constatação de que isso não afeta a vida das pessoas somente no acesso aos serviços públicos, no transporte, nos espaços de lazer, no consumo ou na localização. A questão está justamente no mosaico articulado, contraditório e indissociável que compõem a cidade, cujas localizações estão condicionando inclusive os climas urbanos.