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A família

No documento paolalililucena (páginas 102-113)

4 REPRESENTAÇÕES SOBRE A FAMÍLIA E A FECUNDIDADE NAS

4.1 A família

A Igreja Católica sempre desejou manter algum controle ideológico sob a família. Desde a Idade Média, ela recrudesceu a sua vigilância sobre a vida doméstica, entendendo que os laços familiares ajudavam a Igreja a cumprir a sua função de fiscalizar as condutas e educar o povo. A família era entendida como uma instituição necessária ao homem, pois fazia parte da sua natureza estabelecer esse tipo de relação. Devido a esse caráter natural que lhe imputaram, consequentemente, família foi considerada pela Igreja como uma instituição divina. Existiam dois caminhos para o indivíduo obter a sua salvação: aderir à Igreja, fazendo parte do seu corpo clerical, ou estabelecendo um vinculo conjugal, que possibilitaria a criação de uma família e a reprodução da espécie (FLANDRIN, 1986).

Para alcançar seus objetivos no que concernia à normatização da organização e do comportamento familiar, a Igreja teve que alternar as suas estratégias de atuação nesse assunto, ao longo dos séculos (PIERUCCI, 1978). Nesse sentido, é possível detectar que os seus representantes produziram uma vasta literatura sobre a mesma, incluindo livros, jornais, revistas, folhetos e manuais (PIERUCCI, 1978). Todo esse material seria mobilizado para que representações positivas da família fossem veiculadas para toda sociedade, com o intuito de garantir a preservação de ambas (família e sociedade). O catolicismo identificou a família como a célula orgânica que dá sustentação à sociedade, sem a qual a última se esfacelaria. Entendida como a Igreja doméstica, a família deveria reproduzir os valores cristãos, construindo cidadãos cônscios de suas responsabilidades e de sua fé.65 Assim, mesmo se deparando com uma família que se modifica historicamente, a percepção sobre a sua importância na estruturação da sociedade não se modificou no discurso religioso. A comunidade familiar continuava sendo a superior a qualquer outra comunidade terrestre, pois era a única sancionada por um sacramento.66

Como um representante das aspirações do catolicismo, o Lar Católico divulgou suas impressões sobre a família, sempre se baseando nas representações milenares que a Igreja

65 LAR CATÓLICO. Juiz de Fora, p.12, 24 mar. 1986.

Católica produziu. Em um primeiro momento, seria interessante observar como o jornal trabalhou com a analogia entre a família humana e a divina, buscando interpretar quais seriam as interferências dessa comparação na estruturação de gênero presente no contexto familiar.

É importante entender que a família divina funcionava como uma metáfora para a família humana, idealizada pelo cristianismo. A partir dessa aproximação, esta última passou a adquirir status de instituição sacralizada. Na família divina, há a figura do pai, todo- poderoso, a quem se deve obediência, com pena de sofrer alguma espécie de castigo. Em contrapartida, a figura da mãe, nesse caso, Maria, representaria a obediência e a resignação (BIDEGAIN, 1996). A Igreja se identifica com a mulher no geral, e com Maria em particular, cuidando dos seus filhos na terra e desempenhando o papel de esposa de cristo, intercessora dos filhos junto ao pai (AZPITARTE, 2001).

Era comum aos primeiros cristãos estarem subordinados a uma figura masculina, seja do pai, do marido e do patrão. Assim, para implantação eficaz da ideia de um Deus único, foi necessário mobilizar a ideia de um pai protetor, que encarnasse essa figura masculina tão familiar para os cristãos primitivos. Portanto, pode-se concluir que a “mulher, por mais que se diga o contrário, nunca foi considerada na prática imagem deste Deus criador.” (MILEN, 1995, p.28).

É no interior da família que se forjam e reforçam as diferenciações de gênero. Estas são essenciais para que se possa entender como se constroem as relações familiares, uma vez que cada um dos gêneros parece adquirir uma função dentro da família ideal projetada pelo catolicismo. Como toda relação de gênero envolve necessariamente um jogo, uma disputa de poderes, também a família se transforma em um centro de poderes possíveis, pois se estabelece uma hierarquia, onde um manda e outro obedece ou um manda e outro transgride. Essa identificação da família divina com a humana projetava um poder mais efetivo para os homens, relegando às mulheres uma função mais direcionada para contenção dos conflitos no ambiente familiar.

A família ideal para o cristianismo estaria baseada no poder patriarcal, através do qual o homem tinha o controle da esposa e dos filhos. Dessa forma, a família real deveria refletir a família divina, composta pelo pai, pela mãe e pelo filho e enquadrada no modelo de

pater famílias (BIDEGAIN, 1996). A família divina estava conformada de forma nuclear,

com Maria desempenhando o papel de mãe resignada e sacrificada, que faz a mediação entre o pai (Deus) e os filhos. O pai, onipresente, dono das vidas e justo por natureza, que por sua própria posição, exigiria obediência dos seus dependentes.

Assim, até o princípio da década de 20, a Igreja desejava impor à mulher uma ação restrita ao espaço da casa e ao ambiente familiar. Segundo Azzi, na década de 20, a Igreja se posicionava ainda fervorosamente contra as transformações sociais que estavam em andamento, principalmente, no tocante às mulheres e à instituição familiar (AZZI, 1987). A ideia era proteger a família contra o avanço de ideologias como o comunismo e o processo de urbanização.

As mudanças de valores que incidiam sobre a família eram dignas de preocupação, pois repercutiriam na sociedade. Assim, durante as primeiras décadas do século XX, a Igreja Católica tentou preservar os valores familiares e estipulou isso como prioridade, “propugnando por uma ordem social conservadora que impedisse o quanto possível as transformações sociais e culturais em marcha no país.” (AZZI, 1987, p.95).

No entanto, a Igreja não foi capaz de impedir que maiores transformações viessem a afetar a estrutura familiar por ela desejada, cabendo-lhe apenas criar estratégias para amenizar os impactos das mesmas. A partir da década de 60, a instituição familiar começou a vivenciar alguns processos que a levariam a alterar determinados comportamentos no âmbito das relações de gênero. Foi justamente nessa década que a mulher buscou empreender um controle melhor do seu corpo, através da adoção dos métodos anticoncepcionais. As discussões sobre o aborto e o divórcio também trouxeram perceptivas libertadoras para as mulheres, que passaram a vivenciar de fato a sua autonomia através das conquistas no mercado de trabalho.

Essas mudanças provocaram uma alteração discursiva por parte da Igreja, no sentido de reafirmar o valor da família, reforçando a condenação dos seus fatores desestruturantes (divórcio, aborto e anticoncepcionais). Por outro lado, ela foi obrigada a aceitar melhor (com algumas ressalvas) a promoção feminina e a redefinição da hierarquia de poder dentro da família, podendo a mulher dispor dos mesmos poderem que o marido, na condução dos assuntos relativos ao cotidiano familiar.

No entanto, a Igreja persistiu em apontar que o lugar privilegiado da mulher era o espaço familiar. Destituída de sua ação neste sentido, a mulher se sentiria confusa, pois perderia o seu papel principal. Utilizando-se de linguagem eminentemente pedagógica, o Lar

Católico transcreveu uma carta de autoria de uma mulher transgressora, para servir de reforço

negativo para as leitoras que estivessem pretendendo exercer práticas semelhantes as que foram narradas na missiva. A autora se apresentou como uma mulher infeliz, que ao priorizar a sua própria beleza e os prazeres furtivos que dela advinham, decidiu deixar o seu marido legítimo para vivenciar outra paixão. Arrependida, anos depois percebeu o que tinha deixado

para trás: a tranqüilidade do lar e o prazer de ser mãe. Enfim, abdicou do modelo de mulher ideal e por isso passou a viver uma vida infeliz, por não estar mais inserida no contexto familiar67.

Assim, é possível perceber a permanência de alguns valores e padrões que diferenciam os gêneros, estabelecendo práticas e costumes próprios para cada um dos sexos na configuração familiar, mesmo diante de uma possibilidade de inserção feminina no mercado de trabalho. Nesse sentido, o jornalista expõe as suas impressões sobre o cotidiano de um casal comum de classe média, ao afirmar que

O homem moderno, envolvido com suas reuniões, almoços fora, viagens, seminários, congressos, decisões importantes, sempre carregando a sua pasta de executivo está tendo cada vez menos oportunidade de conviver com os filhos. [...] A mãe se trabalha fora, já não terá o mesmo tempo. Mas se não trabalha, ela está absorvida por múltiplas ocupações: a ginástica, a mercearia, o açougue, a costureira, os parentes, a correria o dia todo pelos afazeres de dona de casa. E, à noite, haverá inevitáveis compromissos de uma vida social.68

O Lar Católico considerou que famílias modernas, a autoridade marital já não era tão exercitada como outrora, sendo substituída pela parental, na qual a mulher também dispunha de algum espaço. Porém, o jornal ponderou que essa modalidade de autoridade era problemática, pois contava como duas fontes de poder, que poderiam diferir entre si. Assim, assinalou que como homem e mulher seriam diferentes por natureza, também teriam campos de atuação diferentes. Portanto, considerou mais sensato que em determinadas ocasiões a autoridade feminina deveria preponderar, sendo o contrário também válido. A partir disso, deve-se concluir que por mais que o jornal compreendesse que o momento histórico não era o mais favorável para a disseminação das famílias patriarcais, continua a considerar e defender a atuação dos gêneros em esferas separadas e demarcadas não por convenções sociais, mas sim por questões de naturalidade69.

Mesmo não conseguindo se desvencilhar das diferenciações de gênero cristalizadas que ela própria ajudou a criar para estruturar o seu projeto de família, a Igreja caminhou tentando interpretar o posicionamento dos gêneros dentro das relações familiares. Nos anos 80, a proteção à família não desapareceu, mantendo-se a analogia entre a família humana e a família sagrada (formada por Maria, José e Jesus). Porém, o jornal desenvolveu a plena consciência de que a sociedade atual não poderia mais abarcar a família patriarcal, da qual se

67 CARTA-TESTEMUNHO de uma esposa infeliz. Lar Católico, Juiz de Fora, p.1, 14 jul. 1974. 68 FRAGA, H. A família, último lugar. Lar Católico, Juiz de Fora, p.4, 19 maio 1985.

referem os evangelhos e as exortações de São Paulo70. Portanto, o poder exorbitante do pai já não consiste em uma realidade largamente aceita nesse período, pois a emancipação feminina já permitia às mulheres equilibrar melhor o jogo de poder no âmbito familiar.

Mas, apesar de apontarem para a historicidade da família, o jornal afirmou que existem alguns valores atrelados à família que seriam essenciais, pois deles os homens não poderiam prescindir. Esses valores estariam correlacionados com a necessidade de manter a família fundamentada no casamento estável, na responsabilidade na educação dos filhos e na obediência filial. A família também deveria valorizar o trabalho, não somente como fonte de sustento material, mas também enquanto campo para o desenvolvimento da inteligência e da realização pessoal.

O jornal ainda ponderou que em outros tempos a família era uma instituição que não sofria com determinadas formas de conflito, pois os jovens eram influenciados unicamente pelos pais. Contrariamente a essa realidade, nos anos 80, a presença dos meios de comunicação oferecia novas fontes de formação para os jovens. A televisão, principalmente as suas novelas, foi percebida pelo jornal como as grandes transmissoras de preceitos para os jovens, que acabam por tomar contato com assuntos não apropriados para a sua faixa etária. Esse fenômeno tornaria o trabalho dos pais mais árduo e necessário.

Para as famílias humanas, o Lar Católico apresentou como modelo perfeito a família sagrada71, da qual fariam parte Maria, José e o menino Jesus. Este último foi reconhecido como iluminado, pois era filho do próprio Deus. Maria foi esboçada pelo jornal como sendo uma mãe diferente, pois teve o “privilégio” de conceber sem ferir a sua virgindade. No próximo capítulo essa ideologia que envolve a maternidade mariana será mais bem examinada, já que reflete a acepção que a Igreja articulou acerca da função social da mulher. O pai foi representado pela figura exemplar de José, homem justo, humilde e capaz de tomar as decisões certas como qualquer chefe de família.

De fato, as mudanças ocorridas a partir da década de 60 tiveram uma determinada repercussão na organização familiar. Nesse sentido, proliferaram no jornal matérias que visavam a discutir a respeito dos vários fatores que interferiam na união familiar, buscando protegê-la contra os perigos da desestruturação.

Em certa oportunidade, o Lar Católico fez uma analogia entre o corpo e a sociedade. Assim como o corpo precisaria manter a integridade de todos os seus órgãos para continuar funcionando, a sociedade necessita fazer o mesmo, preservando a família (que constitui seus

70 COSTA, D. João Resende. Uma família diferente. Lar Católico, Juiz de Fora, p.10, 15 dez.1986. 71 COSTA, D. João Resende. Uma família diferente. Lar Católico, Juiz de Fora, p.10, 15 dez.1986.

órgãos)72 . Dessa forma, o periódico diagnostica que naquele contexto histórico (anos 60) a família não estava sendo devidamente observada e defendida. A união foi apresentada como um fator estruturante da família, que, na falta, acarreta na sua destruição.

O texto enfatizou que a vida econômica trouxe a necessidade de um trabalho árduo, que roubava os pais e mães da família. Com relação à mulher, foi identificada a dupla jornada de trabalho a qual estava submetida. Esse sistema debilitava o seu corpo e fazia com que ela tivesse pouca disponibilidade para as demandas dos filhos. Com o afastamento dos adultos da casa, as crianças se desenvolvem sem uma formação intelectual e moral adequada. Quando se trata dos filhos adolescentes, estes se apartavam por conta própria da presença dos pais, imersos em seus próprios programas e divertimentos. O jornal adverte que seriam raríssimos os momentos em que a maioria das famílias encontrava um tempo para reunir seus membros para orar, conversar, divertir-se. São esses momentos que mediriam a união familiar, pois cada integrante da família se sentiria apoiado em uma estrutura séria, segura e divina.

Diante de todos os problemas e transformações que cercavam a família, o ano de 1974 foi o escolhido pela Igreja para homenageá-la. Coincidentemente, aquele também havia sido ano estipulado pela ONU para trabalhar com a questão da população. A congregação desses dois fatores era de suma importância para que a Igreja pudesse construir um determinado discurso a respeito das relações sociais. Ainda que a defesa categórica em relação à família numerosa tenha decrescido nas páginas do Lar Católico durante os anos estudados, essa questão nunca deixou de povoar inteiramente o imaginário católico. Assim, a questão da limitação do crescimento populacional sempre foi tratada com extrema cautela e em muitas oportunidades, expressivamente criticada no que concernia ao seu teor moral.

Portanto, não desapareceram completamente as referências positivas a uma família com muitos filhos. Recorreu-se novamente a um discurso pedagógico, que teria por base a narrativa de uma história que serviria de modelo de conduta para os leitores. Em tempos de apologia a uma contenção do número de filhos, o Lar Católico apresentou a história de uma família numerosa bem sucedida, demonstrando a possibilidade concreta de um empreendimento como esse ser tornar viável, de acordo com a fé e a confiança dos envolvidos. Um casal da cidade de Curitiba, comemorando suas bodas de ouro, reuniu seus mais de doze filhos crescidos e bem formados: alguns se tornaram religiosos outros advogados e professores73. O Lar Católico considerou o exemplo dessa família como valoroso, em termos de união, estruturação e educação formal.

72 RUÍNA da família é origem de muitos males. Lar Católico, Juiz de Fora, p.1, 7 jan 1968. 73 BERRI, C. Famílias abençoadas. Lar Católico, Juiz de Fora, p.1, 15 dez. 1974.

O ano seguinte foi escolhido pelos bispos do Brasil como sendo dedicado à família. Havia a concepção de que naquele mesmo ano, essa instituição estava sofrendo um terrível ataque, com a tentativa de legalização do divórcio. Esse ataque era reforçado pelo exemplo apresentado em determinadas novelas, nas quais as práticas divorcistas apareciam como a resolução para os problemas do matrimônio. Assim, a Igreja procurava responder a esse ataque, protegendo a família e a união dos esposos e apresentando como modelo a família sagrada: Jesus, Maria e José.

Para superar a crise experimentada pelas relações familiares, o Lar Católico propôs que se fortificassem no ano da família (1974) as interações entre os grupos familiares. Na concepção do jornal, caberia à Igreja desenvolver métodos que visassem a ajudar as famílias a criarem um ambiente mais feliz e propício para a educação dos jovens. Para alcançar tais objetivos, não seria suficiente para a Igreja realizar a evangelização através dos meios de comunicação social. Era necessário que esse processo de evangelização se efetivasse por meio de uma interação mais pessoal, que seria fornecida através do intercâmbio de valores humanos, sociais e religiosos entre as famílias74. Nesse sentido, o Movimento Familiar Cristão proporcionaria esse espaço de encontro e interação entre as famílias, para que as mesmas pudessem discutir os seus problemas e encontrar possíveis soluções.

O Jornal ainda declarou que movimentos como esses desejavam reviver a autoridade paterna e as tradições familiares. Também esses movimentos desempenhariam uma função primordial no âmbito da preparação efetiva e formal dos jovens para o casamento, não somente através de cursos elaborados para essa finalidade, mas valorizando a família original do jovem. Caso o indivíduo conhecesse uma família segura, indissolúvel, tenderia a reproduzi-la em suas futuras experiências. Assim, o ideal de família se disseminaria por toda a sociedade, cumprindo o projeto tão almejado pela Igreja Católica.

A crise da família começou a ser mencionada e discutida com mais veemência a partir da década de 70 nas páginas do Lar Católico. Em certas oportunidades, a crise nas relações familiares foi creditada à queda de valores mais tradicionais e à ascensão de uma tendência que enaltecia e dava visibilidade a um apelo sensual. O jornal Lar Católico demonstrou uma preocupação em reverter essa tendência, articulando um discurso de condenação à onda de erotismo, afirmando que este seria um elemento que desestruturaria a família brasileira. Esse erotismo pressupunha o desenvolvimento de um amor descompromissado, não endossado pela convivência diária.

De acordo com o Lar Católico, um dos fatores que teriam contribuído para o afastamento de determinados grupos sociais em relação aos valores que apregoavam a família tradicional e a sexualidade regulada se referia ao relaxamento do homem em relação ao catolicismo. Percebe-se que o jornal não identificava que o processo de secularização tenha se iniciado devido a uma incompatibilidade dos valores do homem moderno para com aqueles estabelecidos pela doutrina católica. Na verdade, o periódico observou o fenômeno sob uma ótica inversa, acreditando que teria sido a separação do homem em relação à religião, que teria gerado o enfraquecimento dos valores que regiam a família e a sexualidade75.

O jornal ponderou que naquele momento (anos 70) a sociedade estava em pleno processo de transformação, reformulando mentalidades, questionando valores antes considerados inquestionáveis e refutando antigos tabus, principalmente aqueles referentes à sexualidade. Os motivos para essa mudança de percepção seriam encontrados nos conteúdos veiculados por determinadas publicidades, que segundo o jornal seriam agressivas e onipresentes, apelando para os instintos mais primitivos do homem, com o intuito de fazê-lo consumir o produto vendido. Nas palavras do jornal, o cinema também apareceu como portador de um novo comportamento, mais sexualizado:

Se os comportamentos sexuais divergem tanto da norma desejável, é porque sob o efeito de uma indústria, por vezes mais ou menos clandestina, como a pornografia, freqüentemente aberta como certo gênero de cinema, que explora a sexualidade por fins comerciais; ou ainda sob o efeito de teorias pseudocientíficas ou de fácil psicologia, sustentadas por interesses financeiros que parecem coincidir com a pseudolibertação sexual da clientela.76

No entanto, essa questão da liberação sexual não seria para o jornal o único fator que teria contribuído para a degradação da unidade familiar. Na verdade, havia uma percepção segundo a qual, outros elementos de cunho sócio-político estavam agindo de modo articulado,

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