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Lar Católico: mecanismos de divulgação e circulação

No documento paolalililucena (páginas 87-92)

3 A IGREJA CATÓLICA E OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO: O

3.4 Lar Católico: mecanismos de divulgação e circulação

O Lar Católico partia da premissa de que “uma família alheia a boa leitura, dificilmente se manterá fiel as práticas religiosas.”36 Assim, o jornal delineou estratégias para que o público tomasse consciência da sua existência, o consumisse e, portanto, entrasse em contato com o discurso religioso por ele proferido, através das suas colunas, artigos, mensagens de fé e notícias da Igreja.

Para atrair o público, o jornal procurou, ao longo das décadas estudadas, modernizar a edição, a estrutura e tratar de temas que seduzissem toda a família. Mas isso não seria suficiente se um plano que visasse a propagandear o jornal não fosse executado. Um método de divulgação adotado durante todo o período estudado foi a atuação dos padres viajantes, que consistiam em membros da Congregação do Verbo Divino que passavam de cidade em cidade renovando ou buscando novas assinaturas. Esse tipo de prestação de serviços ainda se encontra efetivo nos anos 60, pois os padres viajantes ainda desempenhavam esse papel, fazendo parte do cotidiano dos leitores, devido à periodicidade de suas visitas. Sobre isso, o depoimento de uma leitora e antiga assinante do jornal pode dar alguma indicação, quando ela afirma que “quando o irmão (o padre representante) passou aqui eu estava adoentada e meu marido na fazenda, e tive que mandar dizer ao irmão que não iria reformar a assinatura.”37.

Com o passar do tempo, a expansão do jornal para outros estados do Brasil e a falta de membros para realizar a função talvez tenham contribuído para o enfraquecimento do método de divulgação, embora nunca tenha desaparecido. Em meados da década de 70, as visitas dos padres aos lares para divulgar o Lar Católico se tornam cada vez mais escassas. Isso fica claro a partir da resposta que D. Madalena, conselheira do Intercâmbio com os

Leitores, confere a algum dos seus interlocutores da coluna. Segundo ela, “os leitores

reclamam muito a falta de visitas dos irmãos [...] infelizmente por falta de vocações, há dificuldades para a continuação dessas visitas das quais nós também sentimos falta.”38.

Porém, mesmo se tornando esporádicas, as visitas dos chamados irmãos ainda prosseguem até a década de 80. Pode-se concluir isso a partir do relato de um desse irmão que não participa mais da visitas, quando o mesmo fez a seguinte afirmação: “eu já saí do time dos representantes do Lar Católico. Outros ainda estão viajando com muita disposição

36 LAR CATÓLICO. Juiz de Fora, p.15, 18 abr. 1982.

37 INTERCÂMBIO COM AS LEITORAS. Lar Católico, Juiz de Fora, p.3, 9 out. 1966. 38 INTERCÂMBIO COM OS LEITORES. Lar Católico, p.3, 10 nov. 1974.

procurando que o nosso semanário penetre cada vez mais nas famílias.”39 A atuação dos irmãos viajantes (ou representantes) sempre foi muito valorizada pelo jornal (Figura 5), que em muitas vezes publicou seus nomes, lhes rendendo homenagens ou noticiando os seus atos.

Figura 5. Notícias sobre as funções dos irmãos representantes do Lar Católico

Fonte: Lar Católico40

Enquanto sua publicação ocorria na cidade de Juiz de Fora, o Lar Católico não teve a sua circulação restrita a essa cidade, sendo necessário que os irmãos representantes visitassem muitas outras cidades. O jornal vendia assinaturas em diversos estados do Brasil, o que pode ser comprovado pela participação de leitores de diferentes regiões do Brasil na coluna

Intercâmbio com os Leitores. Isso também foi revelado no anúncio comemorativo dos 63 anos

39 MÃE! O Lar Católico chegou! Lar Católico, Juiz de Fora, p.4, 14 fev. 1982. 40 LAR CATÓLICO, Juiz de Fora, p.3, 25 abr. 1982

de existência do jornal, que indicou a presença do Lar Católico nos estados de Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Goiás, Mato Grosso, Espírito Santo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Bahia, Pernambuco, e Rio Grande do Norte.41 Um depoimento deixado pelo vigário geral de Brasília em um espaço reservado aos leitores, a Tribuna dos Leitores, cujas funções começaram a ser exercidas no ano de 1968, elucidou que o Lar Católico encontrava- se difundido entre várias regiões do Brasil. Segundo ele, “tem sido inúmeras cartas que temos recebido, em que o nome do Lar Católico sai citado como órgão informador.”42.

Havia a percepção, por parte dos redatores, a respeito da impopularidade e da repercussão negativa que o um aumento no preço tanto da assinatura quanto dos números avulsos teria nas vendas do periódico. Em geral, os reajustes eram anunciados no final do ano, já preparando os leitores para as despesas futuras. Além disso, percebia-se uma necessidade de justificar esse aumento para que os leitores não o considerassem arbitrário. A argumentação era articulada de modo que o leitor refletisse a respeito da compensação adquirida através da manutenção da assinatura. Um exemplo pode ser verificado em um anúncio publicado no ano de 1974, que advertia a respeito da crise que assolava todos os setores da economia, tornado impossível para o jornal contornar a situação e conservar o preço antigo. O redator Pe. Edmundo Leschnhak então afirmou que “o preço do papel subiu no decorrer de 1974. O correio subiu. Os salários dos funcionários também subiram [...] Agora o preço das assinaturas do LC serão de Cr$ 45,00. É muito? Para alguns sim. Para outros será menos do que se gasta num mês com cigarros, cinemas, etc.”43 .

Desde então, novos aumentos foram sendo efetivados, embasados na situação econômica desfavorável do país. Assim, um novo aumento é justificado em 1985, pela inflação galopante que imperava no Brasil naquele momento.44 Segundo o que informa a edição do jornal do dia 30 de junho de 1985, o número avulso deverá custar Cr$ 978,00, enquanto para adquirir assinatura por um ano, o leitor deveria desembolsar Cr$ 50 mil. O jornal pondera que o aumento de preços é necessário e que o leitor deve ter a consciência de que o Lar Católico tenta se renovar, oferecendo um produto diferenciado para o seu público. Parecia ao jornal ser necessário que o leitor ponderasse e descobrisse que o jornal “custa pouco pelo beneficio que produz a coletividade”45.

41 63 ANOS do Lar Católico. Lar Católico, Juiz de Fora, p.1, 5 jan. 1975. 42 CARTA DOS LEITORES. Lar Católico, Juiz de Fora, p.5, 10 nov. 1968. 43 NOVO preço da assinatura. Lar Católico, Juiz de Fora, p.1, 19 jan. 1975.

44 ASSINATURA do Lar Católico com novo preço. Lar Católico, Juiz de Fora, p.13, 30 jun. 1985. 45 INTERCÂMBIO COM OS LEITORES. Lar Católico, Juiz de Fora, p.3, 3 mar.1985.

No limiar da década de 80, as questões como a inflação, a falta de “irmãos viajantes” representantes e o surgimento de novas publicações são apresentados como problemas aos quais o jornal deveria enfrentar durante essa década para se manter vivo. Esses fatores foram demonstrando o desgaste do jornal, frente a uma comunidade cada vez menos interessada em consumir o que o jornal oferecia.

Diante das questões do aumento e da manutenção do preço, é preciso verificar a questão da circulação e da tiragem do jornal. Em primeiro lugar, é preciso destacar que a maior parte das vendas realizadas se dava através das assinaturas, mas números avulsos também estavam disponíveis. Existem alguns dados, de fontes diversas, a respeito do número de exemplares vendidos. Não se constituem em números precisos, porém isso não inviabiliza a realização de algumas reflexões.

Em sua obra sobre os meios de comunicação católicos Ralph Della Cava e Paula Monteiro apresentam dados a sobre a tiragem desse periódico, afirmando ser de 35.000 exemplares (DELLA CAVA; MONTEIRO, 1991). Como eles não informam a qual período esses números se referem, pode-se chegar à conclusão de que se trata de uma média para os vários anos em que esse jornal circulou. Em outra fonte, dessa vez proporcionada pela pesquisa de José Reginaldo Prandi, é possível encontrar novos dados que remetem a uma tiragem de 48.000 exemplares (PRANDI, 1975). De qualquer forma, comparando os números de outros jornais católicos que foram publicados no Brasil, o Lar Católico é um dos que possui a tiragem mais alta, o que faz concluir que se tratava de um periódico católico com bastante penetração na sociedade brasileira.

Como foram várias décadas de existência, é natural que esse número tenha oscilado bastante, portanto, pode ser possível que na década de 70, a tipografia Lar Católico tenha emitido uma média de 65.000 mil exemplares, tal como consta em outra fonte (MISSIONÁRIOS DO VERBO DIVINO, 2002). Esse dado está em consonância com o que diz Paulino de Oliveira, intelectual de Juiz de Fora, que se dedica a descrever as efemérides da cidade, quando este afirma que o jornal em questão era o de maior circulação do estado de Minas Gerais na década de 60 (OLIVEIRA, 1966).

Baseando-se nos dados divulgados pelo próprio jornal, na década de 50 as assinaturas estavam em torno de 32 mil exemplares46. Na década de 60, o próprio semanário anuncia ter 47 mil assinantes47. Em meados da década de 80, quando o jornal já está quase iniciando o processo de transferência para a capital de Minas Gerais, os seus editores revelam

46 PÁGINA FEMININA. Lar Católico, Juiz de Fora, p.4, 18 abr. 1954. 47 LAR CATÓLICO. Juiz de Fora, p.1, 14 ago. 1966.

que o semanário contava com aproximadamente 30 mil assinaturas e 100 mil leitores48. No entanto, esses dados, apesar de bastante elucidativo, pois o contingente de assinaturas sempre foi muito significativo para a manutenção do jornal, não desvenda sua tiragem efetiva, uma vez que não foi relacionada a quantidade de exemplares avulsos vendidos na época.

Mas também não se pode considerar que o número de leitores se restringe ao número de exemplares que são produzidos. Um único exemplar pode ser manuseado por diversos membros de uma mesma família, por exemplo. Além disso, como afirma Chartier, a posse do periódico não constitui o único acesso possível à leitura (CHARTIER, 1996). Não foram raros os casos em que um leitor relatou ter emprestado o jornal a outro que não tinha condições de adquiri-lo. Nesse caso, verifica-se que o jornal também funcionava como um elo de sociabilidade entre os seus leitores.

O jornal sempre procurou incentivar seus leitores no sentido de que difundissem para familiares e conhecidos. Essas campanhas ganhariam mais força na década de 80, quando o jornal verificou que estava perdendo assinantes. Isso ficou claro a partir da seguinte afirmação: “Já tivemos 52 mil assinantes. Depois do Concílio Vaticano II, o número decresceu. Em BH já tivemos 5 mil assinantes. Perdemos muitos. Esperamos chegar novamente aos 50 mil assinantes”.49 Assim, o discurso do jornal no início dos anos 80 (antes da CNBB dominar o corpo redacional) deixa entrever a possibilidade de descrença e instabilidade geradas a partir dos debates e divergências de opinião que marcaram a história da Igreja após a realização do concílio. No entanto, isso pode ser também interpretado como um indício acerca do afastamento dos fiéis em relação aos ditames da Igreja, principalmente no plano da família e da sexualidade. Os antigos assinantes do jornal, que muitas vezes o acompanhavam há décadas, estavam envelhecendo na década de 80, possivelmente não sendo substituídos por novos leitores.

Diante desse processo, os redatores intensificaram as campanhas por novas assinaturas. Entre 1985 e 1986, verifica-se um empenho por parte do Lar Católico em angariar assinaturas. Para alcançar tal propósito, algumas campanhas são realizadas nas paróquias nos estados de Minas Gerais e Espírito Santo. Nesse sentido, foram enviados muitos materiais de divulgação para que os párocos pudessem disseminá-los entre a comunidade50.

48 LAR CATÓLICO. Juiz de Fora, p.1, 14 ago. 1966.

49 HÁ 71 anos somos mensageiros do evangelho. Lar Católico, Juiz de Fora, p.1, 2 jan. 1983.

50 LAR Católico realiza campanha junto com paróquias do Leste II. Lar Católico, Juiz de Fora, p.3, 24 mar.

Na década de 80, o jornal diagnosticou que o futuro da imprensa católica seria incerto, e por esse motivo, deveria ser mais bem planejado51. O jornais católicos vivenciavam momentos de crise, sendo que a maioria dos semanários estava desaparecendo, justamente por falta de público leitor, pois de acordo com o jornal, o povo estava se afastando cada vez mais da Palavra de Deus. Detectou-se que as instituições que até pouco tempo atrás dispunham do monopólio de produção de sentido e cultura, como a escola, a família e a Igreja, naquele momento, estavam perdendo espaço com o aparecimento de outros mecanismos formadores de cultura, como a televisão, por exemplo.

O texto prossegue indicando que se a imprensa católica quisesse continuar realizando seu trabalho, em um mundo no qual a primazia do jovem levava necessariamente à desqualificação da experiência e do tradicional, deveria reforçar a sua defesa aos oprimidos e enfatizar a passagem de uma mensagem positiva para o mundo, ou seja, acompanhar as demandas sociais. Messias Teixeira, o autor do artigo, afirma que as demais empresas de orientação católica poderiam destinar uma quantia para ajudar na reestruturação dos periódicos católicos, que poderiam desenvolver uma função de importante no desenvolvimento educacional da população.

No documento paolalililucena (páginas 87-92)