• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 5 A PESQUISA NA ESCOLA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO

5.2 As vozes dos sujeitos

5.2.1 A formação profissional

No que se refere à formação profissional, para maior compreensão podemos dividi-la em formação inicial e formação em serviço.

Os sujeitos da pesquisa nessa unidade escolar possuem a seguinte formação inicial.

Quadro 9 - Formação inicial dos sujeitos da pesquisa

Magistério Pedagogia Outras licenciaturas

Gestor 1 X X Gestor 2 X X Professor 1 X X LETRAS Professor 2 X Professor 3 X HISTÓRIA Professor 4 X X

Além dos cursos de formação inicial, todos possuem cursos de especialização que variam de 180 a 360 horas, bem como o curso de formação do município de 180 horas, oferecido aos professores ingressantes pela SEDUC.

Esses profissionais sujeitos de nossa pesquisa possuem entre cinco e vinte anos no exercício da profissão. Desses, apenas um não fez magistério.

Quando questionados a respeito de sua formação inícial e inicio da carreira, não trazem boas lembranças. Os professores sentem que sua formação inicial foi muito teórica e não conseguiram fazer relação com a prática.

A prática é totalmente diferente da teoria que aprendemos na faculdade. Deparei-me com uma sala de aula problemática, que me deixou doente, tendo de me afastar por dois meses por depressão. Havia alunos cujos pais bebiam ou que estavam presos, eu me vi perdida e quase desisti. (Professor 1)

Assumi uma quarta série pela qual já haviam passado três professores; era uma sala difícil de trabalhar, pensei em desistir, ia para a escola angustiada, sem prazer, pois era algo novo. Eu tinha que trabalhar a questão do comportamento, além da aprendizagem e eu nunca havia entrado em sala de aula. Tinha muitas dúvidas se era isso o que eu realmente queria, pois saí de um curso cheia de teorias, de ideais e percebi que a realidade é diferente, mesmo já sabendo que há salas de aulas problemáticas. (Professor 2)

Foi um choque muito grande. Eu gostava dos estágios, fazia da mesma forma que a professora havia ensinado. Mas a prática foi muito diferente. Assumi uma quarta série, com alunos desinteressados, todos grandes. (Professor 3)

Os cursos de formação inicial não estão conseguindo aproximar os futuros professores da realidade escolar. Aproximação essa que deveria possibilitar o conhecimento dos maiores problemas da escola e de práticas possíveis de serem realizadas com alunos reais e não ideais. Como afirma Tardif (2002, p. 51),

[...] uma distância critica entre os saberes experienciais e os saberes adquiridos na formação. Alguns docentes vivem essa distancia como um choque (o choque da “dura realidade” das turmas e das salas de aula) quando de seus primeiros anos de ensino. Ao se tornarem professores, descobrem os limites de seus saberes pedagógicos.

Para Tardif31, “As interações com os alunos não representam, portanto, um aspecto secundário ou periférico do trabalho dos professores: elas constituem o núcleo [...]”. É preciso saber mais da escola e dos alunos. Não basta apenas identificar as problemáticas escolares é preciso vivenciar, analisar e refletir buscando alternativas de trabalho. A formação inicial deveria ser capaz de formar o professor para lidar com mais segurança com a realidade escolar.

Uma pista foi oferecida pelo professor 4, “tanto o Magistério como a faculdade estão fora da nossa realidade. Estão muito fora da realidade. Apesar de que o fato de estar trabalhando me ajudou na faculdade, pude associar a prática com a teoria”. Aliar o trabalho com a formação parece-nos uma possibilidade importante para fazer a relação teoria e prática. É o que acredita também o Gestor 2:

Só temos noção da teoria quando desenvolvemos a prática, só nesse momento é que percebemos sua importância. Aprendemos muito com a teoria, mas a relação de troca de experiência com os colegas mais experientes, somada com a teoria e com sua habilidade permitem que nossa prática seja construída. Essa prática também está associada às nossas crenças e resultados; portanto, buscamos coisas novas, estudamos para ter sucesso naquilo em que acreditamos.

Apenas quando os professores se deparam com a prática em sala de aula, enquanto professores que iniciam sua carreira, é que começam a julgar a sua formação inicial. Como nos aponta ainda o Gestor 2, fazendo uma análise dos cursos de formação inicial e, esses em sua visão,

[...] continuam trabalhando muita teoria. São poucos os professores universitários que fazem junção da prática com a teoria, mesmo porque para falarem da prática eles precisam dessa vivência, da experiência pessoal, que muitos deles não possuem.

Os professores conhecem a teoria e não a prática; quando questionados, não sabem transformar a teoria em prática porque não têm vivência de sala de aula. Hoje, para trabalhar com formação de professores é necessário ter experiência de sala de aula, caso contrário, esse trabalho ficará incompleto.

31

Tenho visto muitos professores recém-formados com uma visão romântica da educação, imaginando que chegarão à sala de aula e os alunos estarão sentados quietos, tudo que for trabalhado vai ser aprendido e, quando surge a primeira dificuldade, eles não sabem o que fazer porque faltou, no momento da teoria, a experiência de sala de aula do professor universitário, que estava orientando e auxiliando. Nem sempre o estágio garante essa aprendizagem, o professor estagiário passa poucos momentos com os alunos e não tem a responsabilidade que o professor titular tem de fazer a criança aprender. Por esses motivos, é diferente quando se assume uma sala de aula, quando se é responsável pelo aprendizado das crianças.

Esta análise traz uma questão importante: poucos professores universitários responsáveis pela formação inicial conseguem, como afirma Montero (2005, p. 70), “encurtar o distanciamento de comunicação existente entre a linguagem dos teóricos e a linguagem dos práticos”. Isso se dá pelo fato de terem passado pela experiência de sala de aula como professores, porque para os professores pesquisados, assim como afirma Montero (2005, p.171), “o conhecimento prático é aquele que os professores extraem das situações da aula e dos dilemas práticos com os quais se confrontam ao desenvolverem o seu trabalho”.

Esse conhecimento prático é conceituado por Schon, e é aqui ressaltado nos estudos de Montero (2005, p.179),

[...] o conhecimento prático resulta da participação e da reflexão sobre a ação e a experiência; é condicionado pela situação, e o contexto em que emerge a sua expressão imediata Pode ou não adotar uma forma oral ou escrita. O conhecimento prático está, assim, estreitamente relacionado com a ação, com os lugares e tempos em que a mesma ocorre e com as interpretações que elaboramos sobre o que fazemos.

Daí a importância que os professores conferem a esse conhecimento. Sentem eles que, se tivessem acesso a ele na formação inicial, teriam melhores condições de iniciarem seu trabalho sem tantos “choques” de realidade, traumas e vontade de desistir, dada a carga de dificuldades encontradas.