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A Fotografia causadora do interesse

3 FOTOGRAFIA

3.3 A FOTOGRAFIA NA PUBLICIDADE

3.3.1 A Fotografia causadora do interesse

Como afirma Barthes (1984, p. 115), na fotografia jamais se pode negar que “a coisa esteve lá”. A partir do momento em que o olhar do consumidor voltava-se para tal premissa, a confiança dele no que era mostrado ali aumentava. Se a fotografia que ele tirava de seu similar representava exatamente as características físicas presentes no fotografado, então a imagem fotográfica que ele observava nas revistas, jornais e outdoors também eram as características de determinado produto, não haveria como não ser. Tudo se tratava de uma lógica bem simples para aquele que via, e mais simples ainda para quem anunciava.

[...] já que costumeiramente asseguramo-nos das coisas antes de declará-las “verdadeiras”, sob o efeito de uma experiência nova, a da intensidade, eu induzira, da verdade da imagem, a realidade de sua origem; eu confundira verdade e realidade em uma emoção única, na qual eu colocava doravante a natureza – o gênio – da Fotografia, já que nenhum retrato pintado, supondo que ele me parecesse “verdadeiro”, podia impor-me que seu referente tivesse realmente existido (BARTHES, 1984, p. 116).

A linguagem publicitária agora era segmentada, pautada em estudos de comportamento do consumidor, e gastava tempo e recursos a fim de saber o que a sociedade precisava ver. A fotografia, agora parte importante da mensagem publicitária, servia como suporte principal para convencer todos aqueles que antes não tinham meios de confirmar a veracidade daquelas representações feitas em traços à mão.

Tal convencimento era antecedido pelo que Barthes (1984) chama de aventura:

[...] não tenho necessidade de interrogar minha comoção para enumerar as diferentes razões que temos para nos interessarmos por uma foto; podemos: seja desejar o objeto, a paisagem, o corpo que ela representa; seja amar ou ter amado o ser que ela nos dá a reconhecer; seja espantarmo-nos com o que vemos; seja admirar ou discutir o desempenho do fotógrafo, etc; mas esses interesses são frouxos, heterogêneos; tal foto pode satisfazer a um deles e me interessar pouco; e se tal outra me interessa muito, eu gostaria de saber o que, nessa foto, me dá o estalo. Assim, parecia-me que a palavra mais adequada para designar (provisoriamente) a atração que sobre mim exercem certas fotos

era aventura. Tal foto me advém, tal outra não (BARTHES, 1984, p. 35).

O consumo das imagens deixou de ser uma atitude para poucos e foi se transformado em atividade comum do sujeito contemporâneo. Em decorrência, era cada vez mais necessário criar essa atração, ou aventura, como Barthes denomina, entre o consumidor e o produto anunciado. Posteriormente, tal aventura foi chamada por Barthes de Studium, um meio de vincular-se afetivamente com a fotografia:

[...] e por essas fotos posso, certamente, ter uma espécie de interesse geral, às vezes emocionado, mas cuja emoção passa pelo revezamento judicioso de uma cultura moral e política. O que experimento em relação a essas fotos tem a ver com um afeto

médio, quase como um amestramento [sic]. [...] é o studium, que

não quer dizer, pelo menos de imediato, “estudo”, mas a aplicação a uma coisa, o gosto por alguém, uma espécie de investimento geral, ardoso, é verdade, mas sem acuidade particular. É pelo studium que me interesso por muitas fotografias, quer as receba como testemunhos políticos, quer as aprecie como bons quadros históricos: pois é culturalmente que participo das figuras, das caras, dos gestos, dos cenários, das ações (BARTHES, 1984, p. 45).

Em dado momento, a fotografia passou a ser sinônimo dos anunciantes que queriam imprimir a beleza em seus anúncios. Não bastava demonstrar o produto; haveria de ser um produto esteticamente agradável rodeado de signos outros que causassem a empatia e o desejo. Fora do mundo publicitário, o ato de fotografar o que fosse bonito chegava às casas de toda a sociedade, e a publicidade apoderou-se disso. Enxergar que o consumidor somente interessava-se pelas fotografias de tudo o que fosse belo e deleitoso foi o que impulsionou a linguagem publicitária a seduzir um maior número de indivíduos.

Ninguém jamais descobriu a feiúra por meio de fotos. Mas muitos, por meio de fotos, descobriram a beleza. Salvo nessas ocasiões em que a câmera é usada para documentar, ou para observar ritos sociais, o que move as pessoas a tirar fotos é descobrir algo belo. [...] Ninguém exclama: “Como isso é feio! Tenho de fotografá-lo”. Mesmo se alguém o dissesse, significaria

o seguinte: “Acho essa coisa feia... bela” (SONTAG, 2004, p. 101).

A densidade simbólica do que era visto nas fotografias publicitárias atingiu os mais variados produtos e marcas, ganhando voz. Meios impressos recebiam um volume cada vez maior de imagens esteticamente perfeitas, e tal perfeição era buscada mais fortemente conforme o tempo passava. De acordo com Newton Cesar (2006, p. 39), “o anúncio em revista e jornais é visto como uma possibilidade poderosa de vitrine”, e por esta razão estes sentiam essa necessidade do perfeito. A iluminação ideal já não supria as expectativas, era preciso incluir cores que tivessem a ver com o produto. Alcançado isto, deveria então criar efeitos óticos inovadores, e assim caminhou a evolução fotográfica publicitária. O Operator decifrava o querer do Spectador28 e trabalhava para melhor servi-lo, ou seja, despejar nele a visão desejada.

A reprodução em massa das imagens para saciar as expectativas dos anunciantes e consumidores consolidou, junto com o anseio de que a fotografia tornasse as pessoas fisicamente e humanamente mais próximas, o que Walter Benjamin chama de perda da aura.

O conceito de aura de acordo com Benjamin, é uma figura singular, composta de elementos espaciais e temporais: a aparição única de uma coisa distante, por mais perto que ela esteja.

É aos objetos históricos que aplicaríamos mais amplamente essa noção de aura, porém, para melhor elucidação, seria necessário considerar a aura de um objeto natural. Poder-se-ia defini-la como a única aparição de uma realidade longínqua, por mais próxima que esteja. Num fim de tarde de verão, caso se siga com os olhos uma linha de montanhas ao longo do horizonte ou a de um galho, cuja sombra pousa sobre o nosso estado contemplativo, sente-se a aura dessas montanhas, desse galho (BENJAMIN, 1955).

Todavia, ao citar a perda da função ritualística como fator importante da perda da aura da obra de arte, percebe-se um paradoxo. Se o que faz uma imagem servir

28 Roland Barthes, em seu livro A Câmara Clara denomina como Operator o fotógrafo, e Spectador

ao culto é o fato de ser inatingível (“longínqua, por mais próxima que esteja”), então a fotografia publicitária estaria inserida neste grupo. Ela ainda teria sua aura, mesmo que evocada quantas vezes necessária à reprodução, para atingir seus fins lucrativos. Seu caráter sedutor, que transforma tantos indivíduos em devotos da “verdade” difundida por certo anunciante, a converte em modelo a ser seguido, em resultado a ser alcançado. O consumidor trata aquela imagem como se fosse um signo venerável e tivesse o poder de fazê-lo ser como ela: belo, atraente, sedutor.

A imagem de qualquer objeto ou situação documentada pode ser dramatizada ou estetizada, de acordo com a ênfase pretendida pelo fotógrafo em função da finalidade ou aplicação a que se destina.No universo da moda tem-se uma personagem-modelo representando no interior de um cenário criado: uma representação teatral. Não deixa de ser uma realidade imaginada, é verdade, mas também, ao mesmo tempo, se constitui num fato social que ocorre no espaço e no tempo. Temos agora uma segunda realidade que é a do mundo das imagens, dos documentos, das representações. Temos portanto uma fantasia que é tornada realidade concreta uma vez que veiculada pela mídia e consumida enquanto produto (KOSSOY, 2009, p. 52).

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