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4. A regulação da indústria do gás natural

4.5 A França e o controlo estatal

A abertura do mercado francês é ainda muito ténue, já que em 2006, as organizações tradicionais como a GDF e a Total asseguram cerca de 95% das importações através de contratos de longo prazo. Até 1 de Junho de 2006 as empresas entrantes controlavam apenas 4,5% do mercado e de um modo geral, 50% dos consumidores ignoravam que podiam mudar de comercializador. Os mercados financeiros de gás são também denominados pelos operadores tradicionais que controlam as actividades de produção/importação e a comercialização, bem como as actividades de rede (transporte e distribuição).

Este mercado tipicamente fechado é mantido através de tarifas com preços significativamente inferiores aos de mercado livre e impedindo o acesso de terceiros a novos operadores, o que contraria as Directivas europeias e protege os interesses dos operadores tradicionais.

De uma análise efectuada pela CE os poderes da entidade reguladora (CRE – Commission de Regulation de L’energie) são insuficientes, não podendo decidir à data do estudo as tarifas de forma autónoma, já que o governo tem direito de veto sobre as tarifas definidas pela CRE. Desprovida ainda de meios no que compete à supervisão de mercado, não tem poder para impor uma concorrência eficaz no sector. Para evitar esta situação seria necessário um alargamento do âmbito de actuação e da autonomia da entidade reguladora, quer para a definição de tarifas, quer para a condução da temática das interligações entre Estados-membros. A capacidade de interconexão com os países vizinhos é hoje em dia

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insuficiente para que se possa atingir a integração plena desejada pela Comunidade Europeia.

No que compete ao unbundling de actividades, a separação jurídica do transporte está já em vigor mas a actividade de distribuição continua integrada. O facto de os operadores incumbentes abrangerem o fornecimento e o transporte de gás, confere-lhes uma posição de supremacia face às empresas entrantes. A ausência de um mercado verdadeiramente livre é indiciada também por um reduzido grau de transparência, nos quais os novos operadores são discriminados quanto ao acesso à informação.

A própria CRE em 2005 alertou para o incumprimento dos códigos de conduta das empresas de distribuição e de transporte no que compete ao acesso não discriminatório às redes, já que se verificavam atrasos nos processos das empresas entrantes, e à independência dos gestores destas empresas.

A GDF tem uma imagem corporativa idêntica para as actividades de comercialização e distribuição, o que pode condicionar as escolhas dos consumidores, já que estes temem uma alteração na sua segurança de fornecimento, aquando dum processo de mudança de comercializador.

A Comissão Europeia enviou para França em 2006 uma carta relativa a infracções cometidas no mercado de gás, nomeadamente pelo impedimento à entrada de novas empresas nos mercados, o que aliado a uma insuficiente separação funcional das empresas, não garante a independência dos operadores no mercado.

As segundas Directivas comunitárias de electricidade e gás foram transferidas para a legislação nacional a 9 de Agosto de 2004 e o mercado foi aberto a consumidores não domésticos. Uma segunda lei aprovada em Novembro de 2006 previa a abertura do mercado a clientes a 1 de Julho de 2007, a separação jurídica para os operadores de distribuição com mais de 100000 clientes, um agravamento do sistema de tarifas reguladas, um reforço do poder do regulador e uma série de medidas de protecção do consumidor. No entanto, o nível anormalmente baixo das tarifas reguladas constitui também um obstáculo à constituição de novas empresas no mercado livre, podendo também ser um entrave ao investimento em capacidade de rede adicional. No quadro das obrigações dos

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serviços públicos previstos nas Directivas o acesso de terceiros às redes e a existência de tarifas reguladas para os clientes mais vulneráveis estabeleceu-se no regulamento tarifário e está plenamente reconhecido pela Comissão, desde que não implique a criação de um regime discriminatório. Assim, a legislação francesa não pode recorrer da cláusula de “serviço público”, uma vez que o fornecimento a preços baixos, regulados, não faz partes das regras de fornecimento, mas antes é uma medida de protecção de consumidores que deve estar limitada a circunstâncias particulares, não discriminando/competindo com os preços de mercado, que deverão estar associados aos verdadeiros custos das empresas. Os próprios clientes industriais são a favor da existência de tarifas reguladas, insistindo na necessidade de estabilidade da tarifa e evitando as revisões trimestrais (realizadas pela GDF até 2006). A título de exemplo, a lei adoptada em Novembro de 2006 permitiu o regresso às tarifas reguladas dos grandes consumidores, o que é ilustrativo da resistência à abertura do mercado tal como preconizado pela Directivas Europeias. De acordo com o Regulamento europeu 1775/2005, os mecanismos de use-it-or-loose-it devem ser aplicados para que seja libertada capacidade dos operadores históricos para as empresas entrantes, pelo que ao abrigo do dossier Marathon, a GDF assumiu o compromisso de reduzir de quatro para dois o número de zonas dependentes do GRTgaz, o mais tardar até Janeiro de 2009.

Tal como referido, o mercado francês de gás apresenta um elevado nível de concentração, inclusive na actividade de transporte o que é um claro obstáculo ao alargamento da concorrência. A capacidade de transporte está mais desenvolvida a norte do país, onde é acessível o gás proveniente do Norte da Europa, mas em contrapartida a insuficiência de capacidade no sul impede a entrada de concorrentes, nomeadamente do mercado ibérico, sendo os programas de disponibilização de capacidade (open seasons) insuficientes.