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A GESTÃO LOCAL DOS RESÍDUOS DE EQUIPAMENTOS ELETROELETRÔNICOS

Para o entendimento da inserção do município estudado na cadeia produtiva de reciclagem, faz-se necessário elencar os principais instrumentos regulatórios, os atores, sobretudo, e apresentar considerações acerca desse sistema. Nesse sentido, procurou-se compreender a dimensão da cadeia de reciclagem a partir da fala dos atores envolvidos, e quais têm sido as motivações para a expansão do gerenciamento de REEE nos últimos anos13.

A cadeia pós-consumo de resíduos de equipamentos eletroeletrônicos é estudada por Rodrigues (2007, p. 6) que, para estruturar uma definição, parte do conceito de cadeia de suprimentos, “que tem seu ponto inicial onde não existem fornecedores primários e seu término é o ponto de consumo”. Para Rodrigues (2007), o cliente final dessa cadeia de suprimentos que é o consumidor de um produto novo, torna-se o ponto inicial do fluxo de produtos pós-consumo a partir do momento em que ele descarta o produto. Por isso é que se faz necessária a logística reversa, com vistas ao retorno dos resíduos à cadeia produtiva.

A partir desse ponto se estabelece uma outra rede ou cadeia de intervenientes (fornecedores, recicladores, gestores de resíduos, etc.), que se denominou “Cadeia Pós-consumo”, desenvolvem-se atividades e relações entre os diferentes elos (intervenientes) no sentido de se criar ou recuperar valores de partes ou materiais componentes dos produtos ao final de sua vida útil ou reintroduzi-los em um segundo ciclo de vida. O ponto terminal da “Cadeia Pós- consumo” é a “disposição final” dos resíduos ou rejeitos (RODRIGUES, 2007, p. 6).

Conforme Rodrigues (2007), os interesses dos atores e setores sociais, incluídos nessa cadeia direta ou indiretamente, são próprios e condicionam suas ações quanto aos REEE. Tal definição se alinha com as perspectivas da PNRS sobre a responsabilidade compartilhada dos atores.

13 Até o momento, a pesquisadora não encontrou estatísticas oficiais sobre a geração de REEE em

Setores da sociedade e atores sociais: fabricantes e importadores de produtos, consumidores (pessoas físicas e jurídicas), oficinas de assistência técnica e manutenção, catadores, sucateiros, empresas especializadas em gerenciamento de produtos excedentes ou defeituosos oriundos de fabricantes, indústrias de reciclagem (processamento final do material) e organizações sociais de inclusão digital. Envolve indiretamente também, os governantes, ONG’s, universidades e centros de pesquisa, com relação à formulação de políticas para a área de resíduos as políticas industriais e de desenvolvimento tecnológico e à busca de alternativas operacionais e tecnológicas para sua gestão adequada (RODRIGUES, 2007, p. 178).

Mazon (2014) argumenta que os resíduos de EEE estão inseridos em uma cadeia global e por isso são vistos como Commodities. Essa perspectiva é justificada, pela mencionada autora, pela possibilidade de retroalimentação da cadeia produtiva com materiais oriundos dos processos de reciclagem desses resíduos. Nesse sentido, Mazon (2014), afirma que:

A cadeia de reciclagem de REEE é formada por um conjunto de pré- processadores, refinadores e destinatários finais, em diferentes etapas de tratamento, cumprindo as tarefas de reciclar materiais secundários e de controlar as substâncias perigosas contidas nestes resíduos. Enquanto as etapas de coleta, desmontagem e separação (manual ou mecânica) requerem menores investimentos e tecnologia, as etapas de processamento final, as quais envolvem a recuperação metalúrgica de metais, requerem investimentos consideráveis [...] em infraestrutura e tecnologias avançadas para lidar com materiais heterogêneos e complexos (p. 2).

Assim, a inclusão em uma cadeia global de reciclagem implica flutuações de valor do resíduo devido a determinadas características, quer pela possibilidade de retorno econômico ou por haver menor potencial de aproveitamento (MAZON, 2014; FIGUEIREDO, 2012). Há uma relação entre a variação dessas características e a localização geográfica, o que se pode constatar pelo fato, por exemplo, de que a recuperação de resíduos que passam por processos simples ocorre em países menos desenvolvidos, enquanto que os materiais que envolvem processos mais complexos são direcionados a países como: “Bélgica, Alemanha, Japão, Estados Unidos (EUA), Canadá, Suécia e, apenas mais recentemente, China” (MAZON, 2014, p. 3). Assim:

Criar e incentivar demandas crescentes para a atividade implica em desenvolver uma indústria que se reproduz através da geração ampliada de resíduos (o que ocorre majoritariamente nos países centrais), e do trabalho informal dos separadores (sumamente observado em países periféricos, porém que volta a ser observada em países centrais devido o empobrecimento médio da população) [...] neste contexto, o êxito da reciclagem esvazia a crítica ao modelo que se disfarça de sustentável, mas que segue reproduzindo as contradições inerentes do sistema econômico capitalista (FIGUEIREDO, 2013b).

Compreende-se que as práticas de reciclagem de resíduos no âmbito de uma cadeia global podem gerar benefícios ambientais, econômicos e sociais. Entretanto, no caso do Brasil os materiais recicláveis são, prioritariamente, os que geram “possibilidades de elevados retornos econômicos e envia-se para os lixões, aterros controlados, aterros sanitários ou se tira à céu aberto os demais resíduos que possuem uma lucratividade baixa na cadeia econômica da reciclagem” (FIGUEIREDO, 2012). Tal possibilidade ocorre pela vulnerabilidade em que se encontra a cadeia de reciclagem em países como Brasil. A proximidade entre o econômico e o ambiental, denominada “ambientalismo econômico”, é justificada através do discurso socioambiental como forma de garantia da “reprodução do capital investido nas atividades relacionadas ao tratamento dos resíduos pela reciclagem” (FIGUEIREDO, 2013, p. 65).

O crescimento da reciclagem no Brasil tem aprofundado as contradições entre os agentes econômicos inseridos na cadeia produtiva da reciclagem [...] que a variável econômica conduz a reciclagem dos materiais no Brasil. Recicla-se o que é mais rentável no mercado nacional, e principalmente no mercado internacional da reciclagem. O discurso ambiental oficial e empresarial em prol da reciclagem perde relevância já que o fundamento desse discurso é o econômico, em detrimento do ambiental. E, mesmo o discurso propalado de entidades sociais como o movimento nacional dos catadores está fundamentado pela perspectiva de ganho econômico com a atividade da reciclagem (FIGUEIREDO, 2012).

Diante dessa reflexão sobre reciclagem de materiais, corrobora-se a perspectiva apresentada por Figueiredo (2012), de que “apesar das urgências no que se refere ao destino final adequado de certos resíduos, a reciclagem no Brasil é motivada pela possibilidade de ganho econômico”.

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