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A idéia de paz no imaginário social

CAPÍTULO 2 IMAGINÁRIO DE PAZ

2.5 A idéia de paz no imaginário social

A idéia da paz no ocidente tem sido representada no imaginário social como algo pobre, exaurido, se comparado à guerra, que desponta repleta de fantasia e vem sendo glorificada ao longo das civilizações.

A paz foi negociada em curtos períodos históricos, como uma pausa dos conflitos bélicos, mas sempre como ação de minorias. Umberto Eco (2006) refere- se a esses breves momentos: “Consideremos o mais célebre, ou seja, a pax

romana, resultante de uma imensa potência militar que garantiu o equilíbrio, uma condição de paz no centro do Império. (...) Reflitamos na pretensa pax americana: a paz baseada na Guerra Fria era o resultado de uma série de conflitos periféricos, de uma guerra permanente entre serviços secretos, além de uma exibição pública do poderio nuclear para convencer o adversário a evitar o primeiro ataque; da mesma natureza, era a pax soviética que conseguiu manter sob controle, durante 70 anos, alguns territórios que, abandonados a si mesmos, revelaram-se como espaços de contínua efervescência.”(idem : 40)

Segundo Eco, “esses períodos estavam respaldados por um constante poder destruidor, sempre pronto a ser desencadeado”, (ibidem: 40) o que revela que a paz tem sido ao longo da história algo efêmero, ou mesmo fruto de simples acordos políticos que servem para conservar, pelo menos aparentemente, o equilíbrio do sistema.

A história também tem glorificado os guerreiros como heróis de grandes feitos, geralmente quando esses são hábeis em manejar as armas, mas, em contraposição, o imaginário social é pobre quando representa indivíduos e cidadãos que contribuíram para a paz, pois exemplos de pacifistas patrióticos são mais raros.

Uma outra relação que se estabelece no imaginário é a representação que os agentes sociais fazem comparando a paz com o feminino, que espera, que resiste passivamente, enquanto a guerra é masculina, ativa, age, conduz, o que muitas vezes impede uma ação mais propositiva, como assinala Colombo (2006): “A tal ponto que, até mesmo o sagrado teria tendência a revestir-se com o aparato da guerra; e a sacralidade da paz é considerada, quase exclusivamente como uma forma de ascese individual.”. (idem: 77)

Desse modo, quando se fala de imaginário de paz está se fazendo referência a uma concepção de algo construído, que se manifesta no simbólico e, que, muitas vezes, passa a ter existência real. Assim, a construção que os agentes sociais costumam fazer da paz, representando-a como algo ou alguém que resiste passivamente, se manifesta no nível simbólico, e essa imagem construída passa a ter existência real e pode provocar reações de desprezo ou

rejeição, pois vai de encontro aos valores preconizados pela sociedade capitalista, que valoriza sobretudo o vencedor, aquele que dirige ou conduz.

Ocorre também que, muitas vezes, a paz é representada no imaginário como algo inalcançável, abstrato, o que pode impedir que seja assimilada como prática no cotidiano ou mesmo incorporada às políticas sociais, até como programas de ação de governos.

Esse aspecto é destacado por Colombo: “Apesar de celebrada como um valor, ela é vivenciada como um intervalo, no melhor dos casos, intervalo entre a dor do nascimento e a da morte.Todas as metáforas da paz estão baseadas no repouso ou em uma condição superior, espiritual, celestial, inumana.”(ibidem: 74).

Por outro lado, a paz aparece em vários documentos da literatura, dos contos de fada, das lendas e textos sagrados, a exemplo da Bíblia, associada a um mundo utópico, ou seja, onde reina a harmonia universal, em que as relações entre os homens e a natureza são aprazíveis, sem violência.

Em contrapartida, ao longo da história, e especialmente após a Declaração Universal dos Direitos Humanos e do Manifesto da Unesco, a paz passou a ser representada, no imaginário social, com uma conotação mais política e de caráter reivindicatório, como expressão dos movimentos sociais, religiosos e políticos, associada à justiça social, à liberdade, aos direitos humanos, à democracia.

Apesar da paz ter se constituído ação de minorias, por breves períodos históricos, não há como ignorar o poder do imaginário de paz, pois muitas vezes ele é incorporado à realidade, na medida em que as concepções e crenças culturais tem também contribuído para mudar o curso da história.

Assim, surgiram vários episódios de resistência pacífica, que não aparecem com tanta freqüência na mídia, ou mesmo não são valorizados se comparados com os da guerra: as lutas do Solidariedade, na Polônia (1980-1989), a revolução popular nas Filipinas(1986), a derrota do golpe da “linha dura”, em Moscou (1991), a liberação da Alemanha Oriental (1989-90) e a da Tchecoslováquia(1989), a transição pacífica, na África do Sul, contra o apartheid, empreendida por Nelson Mandela, entre outras.

Tais episódios não encontram respaldo nos valores preconizados pela sociedade contemporânea, pois os agentes sociais são estimulados cotidianamente para a competição desenfreada, para serem melhores do que os outros, como afirma Colombo: “Todos nós amamos a paz, mas esta não se encontra no nosso pensamento; pelo contrário, estamos sempre pensando na resposta, na maneira de reagir”. (idem:74).

A própria mídia, em particular a televisão, reforça e estimula os comportamentos violentos, a competitividade, o predomínio do mais forte e do mais esperto, enquanto os sentimentos relativos à paz, como, por exemplo, o senso de justiça, de solidariedade, dos direitos humanos, não são valorizados ou aparecem de forma fragmentada e descontextualizada.

Desse modo, o Capítulo 3 trata da importância que as imagens televisivas têm na vida dos jovens e na construção do imaginário de paz, tendo em vista que seus receptores não são completamente passivos diante da veiculação e difusão dessas imagens. Nessa medida, ganha destaque o papel da programação televisiva no processo de socialização e de formação do imaginário de paz nas sociedades contemporâneas.

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