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DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS SÃO PAULO 2008

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Vera Lúcia Rolim Salles

Jovens, Imaginário de Paz e Televisão

DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Vera Lúcia Rolim Salles

Jovens, Imaginário de Paz e Televisão

DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

Tese apresentada á Banca Examinadora como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Ciências Sociais pela Pontifícia universidade Católica de São Paulo, sob orientação da Professora Doutora Leila Maria da Silva Blass

SÃO PAULO

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Banca Examinadora

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“A força gerada pela não violência é infinitamente maior do que a força de todas as armas inventadas pela engenhosidade

do homem”

“Se queremos progredir, não devemos repetir a história, mas fazer uma história nova”

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AGRADECIMENTOS

À minha orientadora Professora Dra. Leila Maria da Silva Blass, sempre presente que ajudou com seu zelo e dedicação a transpor barreiras e a enfrentar os muitos obstáculos no caminho que conduziu à realização desta tese.

À minha família, especialmente a minha irmã Tereza e ao meu cunhado José Roberto que me acolheram com carinho e atenção e foram presenças indispensáveis na fase de conclusão desse estudo.

Ao Venceslau Alves de Souza (Vinny), amigo de sempre, de todas as horas, que me acompanhou desde o início desta trajetória, com dedicação e amizade. Ao Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), na pessoa do seu chefe, Prof. Dr. Franscisco Gonçalves e aos colegas, Profa. Dra. Joanita Mota Atayde e Prof. Dr.Christian Delon, pela colaboração e compreensão na fase de elaboração desta tese.

Aos alunos de Jornalismo da UFMA, Luis Victor Saldanha dos Santos e Anna Nicolle Exposito Nunes, pela preciosa ajuda na realização desse trabalho. Ao ex-aluno de jornalismo da UFMA, Celso Serrão, amigo e colaborador. Ao Marcelo Amorim, da Agência de Notícias dos Direitos da Criança - Matraca, (MA) sempre solícito em atender meus chamados, seja para pesquisa de dados ou qualquer outro

tipo de ajuda.

À Natinha, secretaria de educação do município de Humberto de Campos (MA) pelo incentivo e exemplo de força de viver.

À Nazaré do Retiro Nossa Senhora Aparecida (Centro de Terapias Bio-energéticas, São Luís-MA), ao Hanniery Maciel e Francisco Coelho, que me auxiliaram a equilibrar corpo, mente e espírito.

Ao Cláudio Lima, Marilda Mascarenhas, Soran, Dedê Paiva que também prestaram colaboração no processo de elaboração desta tese.

Aos jovens do Adolescentro, pela atenção e disponibilidade que aceitaram tomar parte desta pesquisa.

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Resumo

SALLES, Vera Lúcia Rolim. Jovens, imaginário de paz e televisão. Tese de doutorado em Ciências Sociais, Pontifícia Universidade Católica, São Paulo, 2008.

Esta tese trata do papel da televisão aberta no processo de socialização dos jovens em geral, enfocando a relação das juventudes e imaginário de paz e as mensagens transmitidas nas telenovelas e telejornais.

Neste estudo, foram analisados os depoimentos de jovens com idade entre 15 e 24 anos moradores da Vila Embratel, um bairro da cidade de São Luís, capital do estado do Maranhão. Foram realizadas entrevistas individuais complementadas com a técnica de discussão informal com grupos focais com o objetivo de averiguar como se dava à produção de sentido no processo de recepção da telenovela “Duas Caras” e do “Jornal Nacional”, veiculados pela TV Globo

Os resultados desse estudo mostram que, esses jovens, embora já tragam consigo a idéia de paz e a reconheçam, tanto na telenovela, quanto no telejornal, revelam que o discurso da violência é o que predomina nesses gêneros televisivos.

Esta tese chama a atenção, de um lado, dos responsáveis pelos programas televisivos sobre o papel fundamental das juventudes na construção do imaginário social, principalmente nas sociedades contemporâneas. Este poderia constituir um dos critérios para a seleção das mensagens a serem transmitidas pela televisão aberta, particularmente, as telenovelas e os telejornais. De outro lado, aponta a ausência de pesquisas na área de Ciências Sociais que abordam essas temáticas.

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Abstract

SALLES, Vera Lúcia Rolim. Young people, imaginary of peace and television. PhD in Social Science, Catholic University of São Paulo (PUC-SP), 2008.

This thesis deals with the role television plays in the process of

socialization young people, focusing the relation between youths and

imaginary of peace and the messages transmitted in the soap operas and

TV news.

This study we carried through individual interviews complemented

with the technique of informal quarrel with focal groups to inquire a

number of 15 to 24 year-old young people (living of the Village Embratel,

a neighborhood of the city of São Luís, capital of the state of Maranhão),

about the soap opera “Duas Caras” and TV news “Jornal Nacional”.

The results of this study show that, these young, even so already

bring their own idea of peace, and recognize it in both the soap opera and

the TV news; they disclose that the speech of the violence is the one that

predominates in these televising sorts.

On one hand, this thesis adverts the creators of TV programs to the

fundamental role young people have in construction of social imaginary

TV programs have in the construction of the social imaginary, particularly

in the contemporary societies. This could constitute one of the criteria for

the election of the messages to be transmitted for the television,

particularly, the soap operas and TV news. On the other hand, it points

the absence of research in the area of Social Sciences that approach this

theme.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 03

COLETA DE DADOS... 11

1a PARTE JOVENS, IMAGINÁRIO DE PAZ E TELEVISÃO 20 CAPÍTULO 1 – JUVENTUDES E PROCESSO DE SOCIALIZAÇAO 1.1 Jovens ou juventudes... 20

1.2 Condição juvenil e estigmas ... 22

1.3 Jovens, lazer e televisão... 27

1.4 Televisão e processo de socialização... 29

CAPÍTULO 2 - IMAGINÁRIO DE PAZ 2.1 Violência, paz e suas definições... 33

2.2 Cultura de paz e a Unesco... 36

2.3 Intelectuais e pacifistas... 40

2.4 Imaginário social... 42

2.5 A idéia de paz no imaginário social... 46

CAPÍTULO 3 - TELEVISÃO E MUNDOS IMAGINÁRIOS 3.1 Imagens televisivas... 50

3.2 Televisão: inconstâncias e descontinuidades... 53

3.3 Os programas televisivos e audiência... 58

3.4 Indústria da mídia 62 CAPÍTULO 4 – A TELEVISÃO E OS GÊNEROS TELEVISIVOS 4.1 Rede Globo de televisão... 65

4.2 Telenovelas: algumas características... 67

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2ª PARTE

JOVENS DA VILA EMBRATEL,TELEVISÁO E IMAGINÁRIO DE PAZ

CAPÍTULO 1 – UM OLHAR SOBRE OS JOVENS

1.1 O bairro da Vila Embratel, São Luis - MA... 76

1.2 Os jovens moradores de Vila Embratel: valores e estigmas... 79

1.3 Televisão e processo de socialização... 87

1.4 O olhar do rapper... 93

1.5 Imaginário de paz: telenovela e telejornal... 94

CAPITULO 2 - JOVENS, TELENOVELA E TELEJORNAL 2.1 Cenas da telenovela Duas Caras... 99

2.2 Comentários sobre cenas da telenovela Duas Caras... 101

2.3 Jornal Nacional e os “blocos” informativos ... 103

2.4 Comentários sobre edição do Jornal Nacional ... 106

2.5 Idéia de paz: a telenovela e o telejornal... 108

CONSIDERAÇÕES FINAIS... 114

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS... 119

ANEXOS ANEXO 1 – Oficina Itapecerica da Serra... 126

ANEXO 2 – Questionário preliminar... 127

ANEXO 3 – Roteiro entrevista semi-estruturada... 128

ANEXO 4 – Grupos familiares da televisão... 129

ANEXO 5 – O enredo da telenovela Duas Caras... 130

ANEXO 6 – Perfil dos telespectadores da TV Mirante... 133

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INTRODUÇÃO

Esta tese procura verificar qual é o imaginário de paz construído por um determinado grupo de jovens e se esse imaginário tem alguma relação com os conteúdos da programação da televisão1 (canal aberto2) na sociedade brasileira e como se manifesta em sua vida cotidiana.

Importa, para esta investigação, o ponto de vista dos jovens, qual a idéia que eles expressam como sendo a paz, o que ela significa, mas tendo como referência dois gêneros de programas, as telenovelas e os telejornais, veiculados pela TV Globo3, entre 20 e 22 horas (horário nobre). Essa emissora teve a preferência do grupo de jovens pesquisados, bem como ambos os gêneros citados.

É importante destacar uma característica desses dois gêneros televisivos, mencionada por autores tais como Eugênio Bucci, José Arbex Jr. e Marilena Chauí, que é justamente a inversão pelos produtores dos programas de televisão entre a ficção e a realidade: o noticiário, que deveria relatar os fatos, os acontecimentos, acaba desinformando, o mundo real desaparece, enquanto a telenovela cria um sentimento de realidade.

A capacidade de percepção dessa diferença contribui para fornecer dados interessantes sobre o perfil dos jovens pesquisados, em que medida, por exemplo, aceitam esses gêneros de programas, sem restrições, se constatam essa distinção entre eles e, se ao fazê-lo, exercem a crítica, ou ainda, se percebem em seu conteúdo, a idéia de paz.

O interesse em desenvolver esta pesquisa surgiu quando passei a integrar

1 A televisão é um termo amplo que se aplica a uma gama de possibilidades de produção, distribuição e

consumo de imagens e sons eletrônicos: compreende desde aquilo que ocorre nas grandes redes comerciais, estatais e intermediárias, sejam elas nacionais ou internacionais, abertas ou pagas, até o que acontece nas pequenas emissoras locais de baixo alcance, ou o que é produzido por produtores independentes ou por grupos de intervenção em canais de acesso público. (MACHADO, 2005:19)

2 Canal aberto é a referência à televisão comercial, que não é paga, e atinge, sem distinção, ao contrario da

televisão a cabo, a grande maioria dos lares brasileiros. Pesquisa feita pelo Centro de Estudos sobre as tecnologias da informação e comunicação numa mostra de 17.000 domicílios coletada em todas as regiões do país, revela que 98% das casas têm televisão (canal aberto). Disponível em: http://www.cetic.br acesso em 14 de março.de 2008.

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vários movimentos pela paz, em São Paulo, no período de 2002 a 2006. Fiz parte de inúmeros debates, discussões e palestras sobre o papel da mídia, especialmente da televisão, apontada, quase sempre, como uma das principais responsáveis pelo aumento da violência. No período de 2003 a 2005, ingressei como membro do Conselho Parlamentar pela Cultura de Paz (Conpaz), da Assembléia Legislativa de São Paulo e participei do Comitê Paulista pela Década da Cultura de Paz.

De 2004 a 2006, passei a integrar a diretoria da organização não-governamental, Ipaz (Agência Internacional de Comunicação pela Paz)4, que é formada por profissionais da área de comunicação interessados em construir uma mídia da paz.

Em novembro de 2001, a Ipaz realizou uma pesquisa de opinião5 (técnica delphy) denominada “Paz Não Paz, o que significam?” em cinco capitais do País. Uma das questões propostas era saber qual o significado da paz. O resultado apontou a mídia, principalmente a televisão, como principal responsável pela propagação do medo e da violência, e as respostas não fizeram referência a outras causas desse fenômeno.

A maioria não soube dizer o que era paz. Referia-se somente aos seus símbolos (uma pomba, pessoas de branco, etc.). Os entrevistados só se expressaram sobre o significado da não paz: criança na rua, fome, falta de moradia, falta de justiça, etc. Uma das conclusões do estudo é que existe um discurso de paz a ser construído.

A participação em todas essas atividades, bem como o resultado da pesquisa da Ipaz, levou-me a fazer algumas indagações que, à primeira vista, podem parecer óbvias: será que as pessoas não puderam dizer o que é paz porque ela não é vivenciada em sua vida cotidiana? Nesse caso, qual o papel da mídia, particularmente da televisão? Em que medida os programas televisivos

4 É uma agência de comunicação pela paz, sem fins lucrativos, fundada em 2003 por profissionais de

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podem colaborar na construção de um discurso sobre a paz, e como fica a idéia de paz para os jovens em geral?

A partir desse momento, passei a refletir a respeito do papel da televisão na construção de um discurso sobre a paz e, particularmente, sobre o imaginário

6de paz que é construído pelo segmento jovem e mais, se essa idéia de paz tem

alguma relação com os conteúdos dos programas televisivos sintonizados pelos jovens.

O contato que tive com várias organizações não-governamentais e o interesse pelos jovens trouxe a oportunidade de realizar, em 2003, três oficinas. Uma delas no Instituto Pólis7 e as outras duas na Associação Barracões Culturais da Cidadania, localizada no Município de Itapecerica da Serra (SP). 8

O objetivo dessas oficinas era verificar como a imagem do jovem da periferia é vista por ele mesmo em diversos gêneros dos programas veiculados pela televisão aberta. No sentido de obter um resultado mais imediato e que também motivasse os participantes, utilizei a análise das fotos produzidas pelos próprios jovens, com câmera digital. (Anexo 1)

O resultado revelou imagens estigmatizadoras: jovens do sexo masculino, retratados como “bandidos” ou usuários de drogas nos telejornais, discriminados pela cor da pele (negros) ou posição social (pobres), ou mesmo mostrados como tolos ou fúteis, nas telenovelas, enquanto as jovens se apresentavam exibindo partes do corpo (seios, nádegas) nos programas de auditório e nas telenovelas, com forte apelo sexual.

Para os jovens que participaram dessas oficinas, a imagem que a televisão projeta é irreal e estereotipada:

7 O Instituto Pólis, Instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais, fundado em 1987, é uma

organização não-governamental de âmbito nacional, dedicada ao estudo e à formulação de políticas públicas municipais e estratégias de desenvolvimento local.

8 O projeto Barracões Culturais da Cidadania, lançado em 1997 por um grupo de educadores e artistas,

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A cara do jovem na televisão depende do canal. Alguns programas destacam o jovem que “malha”, os politicamente corretos, os certinhos ecológicos. Eles atuam num universo irreal, de maneira fútil nada realista. (jovem da Associação Barracões Culturais da Cidadania, 2003).

É importante ressaltar que os jovens participantes dessas oficinas já tinham opinião formada e visão crítica do papel da televisão, o que, provavelmente, não seria observado em outros grupos dessa faixa etária. Essa é uma característica do projeto da Associação Barracões Culturais da Cidadania, que se baseia numa metodologia participativa, na qual os jovens são levados a redefinir seus olhares sobre si mesmos e sobre os outros, valorizando a troca de saberes, promovendo a auto-estima e o sentimento de pertencimento.

Entre os vários depoimentos coletados durante essas oficinas, registrei um deles que traduz essa visão redutora e excludente do jovem por parte dos programas veiculados pela televisão aberta:

A mídia televisiva costuma exibir imagens estereotipadas de jovens derrotados, vítimas da violência, das drogas e não proporciona uma visão da realidade, seja na família, no trabalho, nas questões da sexualidade. A violência está explícita, tanto nas telenovelas, nos filmes seriados, nos telejornais. O jovem geralmente aparece como causador do problema ou a vítima, mas não lhe apontam saídas.

(Depoimentos de jovens da Associação Barracões Culturais da Cidadania, 2003)

Depois dessa experiência com a Associação dos Barracões Culturais da Cidadania, a relação dos jovens com a televisão e com certos programas que ela veicula passou a ser considerada fator determinante para a realização da presente pesquisa. Decidi, então, aprofundar e encontrar respostas para alguns dos questionamentos: o imaginário de paz para os jovens e a possibilidade da televisão contribuir para a construção de um discurso sobre a paz.

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Por outro lado, esta pesquisa chama a atenção dos responsáveis pelas políticas sociais direcionadas ao segmento jovem e dos agentes sociais em geral, sobre a necessidade de propor mudanças na programação da televisão aberta, dando espaço para outra forma de tratá-lo, valorizando e contextualizando suas ações.

Outro aspecto diz respeito às teses, publicações, monografias, etc., consultadas, que, em sua maioria, abordam a violência em seus diversos ângulos, inclusive relacionada à mídia em geral, enquanto as obras sobre paz, geralmente aparecem associadas à educação ou filosofia, mas dificilmente exploram a relação com os jovens, e destes com a televisão.

Quando falo de jovens – objetos desta pesquisa –, tomo por referência a experiência9 de atores e atrizes que se encontram segmentados por classes sociais, mas que podem se interrogar sobre valores, normas e visões de mundo que lhes são transmitidos no decorrer do seu processo de socialização. Este estudo pretende mostrar que juventude no singular é apenas uma palavra, na medida em que essa fase da vida não é homogênea, mas depende do contexto sócio-histórico-cultural ao qual pertencem e se formam as múltiplas juventudes.

Este estudo busca ainda conceituar a paz, de acordo com alguns autores como Galtung, Edgar Morin e Gandhi (1860-1948), além de fazer referência a outros documentos sobre a cultura de paz, enfatizando, entre eles, o Manifesto da Unesco (2000).

Paz pode ser conceituada como a ausência de violência de todos os tipos – direta, física, e também verbal, cultural – dirigida contra o corpo, a mente ou o espírito de outro ser, humano ou não (Galtung, 2003).

Para se compreender o imaginário de paz, cabe também, entender o imaginário social. De acordo com Castoriadis (1982: 414), “o imaginário social ou a sociedade instituinte é na e pela posição-criação de significações imaginárias sociais e da instituição; da instituição como “presentificação“ destas significações

9 Entendo por experiência, na perspectiva de Thompson (1981:189) ao afirmar que, “a experiência

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como instituídas”. Essas significações instituídas se presentificam na forma como os indivíduos se organizam na sociedade, nas relações entre os sexos, no fazer das atividades sociais, entre outros tantos, traduzindo-se na maneira pela qual a sociedade se refere a si mesma, ao seu presente, passado, futuro e o modo de ser de outras sociedades com relação a ela (idem: 416).

Portanto, quando se fala de imaginário de paz, se está fazendo referência a uma concepção de algo construído que se manifesta no plano simbólico. O imaginário de paz refere-se a um conjunto de crenças, valores e visões de mundo que ganha, muitas vezes, expressão de um concreto. Existem vários exemplos que mostram como determinadas crenças e valores de paz passaram a se manifestar de forma real: a queda do Muro de Berlim, a organização da sociedade para enfrentar o apartheid na África do Sul, o movimento dos negros nos Estados Unidos pela igualdade civil, entre outros.

No entanto, as imagens projetadas pela mídia, particularmente a televisão, que tem caráter mobilizador, não vêm contribuindo para reforçar o imaginário da paz e sim, o da violência. As oficinas realizadas com a Associação dos Barracões Culturais da Cidadania, por exemplo, mostram a difusão do estigma de jovens “violentos”, “baderneiros”, etc.

Importante destacar que focalizo nesta pesquisa a televisão como um dos principais meios de comunicação de massa das sociedades contemporâneas. Bourdieu (1997) ressalta o papel e a influência desse meio de comunicação na vida dos agentes sociais. “Por sua amplitude, por seu peso absolutamente extraordinário, a televisão produz efeitos que, embora não sejam sem precedente, são inteiramente inéditos.” (idem: 62)

O termo mídia10 é usado neste estudo, para fazer referência aos meios de comunicação de massa. Portanto, adoto a conceituação proposta por Thompson (1997) sobre a comunicação de massa, ou seja, “é a produção institucionalizada e a difusão generalizada de bens simbólicos através da transmissão e

10 Mídia - quer dizer “meios”, plural de meio, que vem do latim medium. Os primeiros teóricos dos meios de

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armazenamento da informação / comunicação”. (idem: 288)

Além disso, acrescenta esse autor que “a recepção das mensagens desses meios é um processo ativo, inerentemente crítico e socialmente diferenciado”. (idem: 287)

Thompson (1997) assinala que o aparecimento da televisão contribuiu para ampliar horizontes, trazendo novas formas de conhecimento não locais, para além daquelas adquiridas face a face, permitindo aos indivíduos “uma reflexão crítica sobre si mesmos e sobre suas próprias condições de vida”. (idem:27)

O mesmo autor considera que a televisão deu origem a uma nova categoria de ação, que é desenvolvida com a finalidade de ser televisável: “Pelo fato de ser televisionada, a ação (e as pessoas que a praticam) adquire um novo tipo de visibilidade que simplesmente não era possível antes da chegada da comunicação de massa em geral e da televisão em particular”. (idem: 27).

Barbero & Rey (2001) reportam-se ao papel cultural e social da televisão nas sociedades contemporâneas, principalmente entre o segmento jovem: “As mídias de massa cooptadas pela televisão se converteram em poderosos agentes da cultura-mundo, que se configura, atualmente, de maneira mais explícita na percepção dos jovens e na emergência de culturas sem memória territorial, ligadas à expansão do mercado da televisão, do disco ou do vídeo”. (idem: 43)

Logo, a televisão assume um importante papel no processo de socialização dos jovens investigados, que se consubstancia nas várias posições em que estão distribuídos, promovendo a construção de diferentes tipos de capitais (social, simbólico, cultural, econômico), que, conforme sugere Bourdieu (2000), configura o poder simbólico.

Esse poder é invisível e é exercido com a cumplicidade daqueles que não sabem que a ele estão sujeitos, nem que o exercem. É um poder quase mágico, através do qual se obtém o equivalente daquilo que só se consegue pela força (física ou econômica).

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que não se pode tocar –, e social – que corresponde à situação do indivíduo na sociedade em função dos outros dois capitais) que detém e pela estrutura desse capital, mas também pelo "campo dos possíveis" que se lhe apresenta, do seu ponto de vista, conforme a posição social de cada um.

A própria conservação do estado de coisas num dado campo social11 é produto de uma dinâmica que os sujeitos intervêm, e não resultado de pura inércia, pois resulta de uma ação (ou reação), pelo menos reiterativa, do estado de coisas, efetuada pelos próprios atores que compõem o campo segundo a interpretação que fazem do seu "campo de possíveis" e segundo seus próprios interesses individuais e grupais.

Assim, os jovens investigados ocupam uma posição na sociedade (capital social), em função dos outros dois capitais (simbólico e material) que acumulam, e, através dos quais, são legitimados ou reconhecidos pelo grupo ao qual pertencem. Nesse espaço social, os jovens transitam em vários mundos: família, igreja, amigos, locais de lazer, trabalho.

Mas, a televisão desempenha papel importante na vida cotidiana desses jovens, que dedicam parte do seu tempo, de quatro a seis horas diárias, que dedicam parte do seu tempo, de quatro a seis horas diárias, assistindo a programação e, desse modo, adquirem também capital cultural (informações, conhecimento).

Este estudo aborda, nesse sentido, os jovens do bairro da Vila Embratel12, distante 3 km do centro de São Luís, capital do Estado do Maranhão. A razão da escolha é que, na década de 90, quando trabalhei para o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), nessa cidade, tive a oportunidade de acompanhar o nascimento de um projeto direcionado a adolescentes e jovens, situado no

11 Campo social refere-se a um espaço no interior do qual há uma luta pela imposição da definição do jogo e

dos trunfos necessários para dominar nesse jogo que regem as relações entre seus componentes, que põem limites ou fronteiras aos movimentos possíveis em seu interior. Exemplos: campo religioso, campo científico, campo de produção cultural. (BOURDIEU, Pierre. A dissolução da religião. In: Coisas Ditas, São Paulo: Brasiliense, 1990).

12 Em 2000, segundo informações colhidas no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), contidas

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referido bairro.

Financiado pelo Unicef, inicialmente, o projeto estava voltado para trabalhar a saúde do adolescente, mais diretamente com a prevenção e o atendimento à gravidez precoce, e, posteriormente, recebeu recursos da Petrobras, do Banco do Brasil e da Plan International, organização não-governamental de origem canadense. Essas instituições apoiaram a construção das instalações de um telecentro, bem como ajudaram a ampliar e equipar o prédio original.

A partir de 2005, o projeto passou a ser chamado de Adolescentro e a desenvolver o programa Jovens de Bem com a Vida que compreende o Núcleo de Extensão da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), com atendimento docente-assistencial envolvendo vários departamentos da própria universidade; o telecentro, atividades artístico-culturais (capoeira, teatro, hip-hop), cursos de línguas (inglês, espanhol), profissionalizantes (bijuterias, manicura, culinária, informática) e, ainda, um curso preparatório para o vestibular. Há também um ambulatório destinado à prevenção e atendimento à gravidez na adolescência e ao aconselhamento e tratamento das Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs).

Assim, quando voltei a visitar o Adolescentro, no início de 2007, escolhi esse local porque reúne as características que considero interessantes investigar desde o momento em que venho acompanhando o segmento jovem, seja em organizações não-governamentais, em São Paulo, seja no trabalho que desenvolvi para o Unicef. São elas: jovens das camadas populares do bairro da Vila Embratel de ambos os sexos, que freqüentam esse centro onde tem acesso aos cursos profissionalizantes e às atividades artístico-culturais, que costumam ver televisão diariamente (até no próprio espaço do Adolescentro), que estão na faixa etária de 15 a 24 anos.

Coleta de dados e metodologia de análise

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acordo com relatório elaborado pela Prefeitura de São Luís e Unicef (1988), apresentava as seguintes características: grande número de habitantes, numerosos pequenos comércios, saneamento precário, falta de asfaltamento, lixões na avenida principal, meios de transporte e oportunidades de trabalho insuficientes, a pesca como principal fonte de renda, numerosas escolas comunitárias (instaladas com ajuda da população local) que atendem 65,4% dos escolares e a existência de várias instituições e lideranças, envolvidas com projetos educacionais, culturais, desportivos e sociais.

O bairro se localiza na área denominada Itaqui–Bacanga, onde moram cerca de 200 mil habitantes, agregando cerca de 56 comunidades urbanas e rurais. Entre os seus principais problemas, são apontados, no relatório produzido pela Prefeitura de São Luís, com o apoio do Unicef, e denominado Convivência Familiar e Comunitária: de Direito Assegurado a Direito Conquistado (1988), o envolvimento de crianças e adolescentes com consumo de drogas, a existência de pontos de tráfico, a exploração do trabalho infantil e crianças em idade escolar fora do sistema de ensino.

Outro fator diz respeito à violência urbana que a pesquisa13 elaborada pela Plan International registra: “Os próprios moradores relatam situações relacionadas a essa modalidade de violência, imbuídos de um forte sentimento de medo e revolta”, e atribuem “os inúmeros episódios de mortes, brigas de gangues, estupros e assaltos, à falta de segurança pública”.

A situação do bairro da Vila Embratel, que se caracteriza pela falta de planejamento de ocupação da área urbana, o que traz, como conseqüência, uma grande concentração populacional distribuída sem a menor infra-estrutura, é resultado, em parte, da forma como se deu a expansão da população urbana de São Luís, atualmente uma cidade com aproximadamente um milhão de habitantes (959.124 habitantes, IBGE-2006).

A partir da década de 70, a configuração urbana aconteceu de forma desordenada, na medida em que grandes contingentes populacionais vieram do

13 Violência Doméstica, pesquisa elaborada pela

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interior do Estado, a maioria pequenos trabalhadores rurais expulsos de suas terras pelos grandes proprietários e sem condições mínimas de sobrevivência.

Em uma publicação sobre o perfil de São Luís, Santo (2006) retrata essa situação: “Uma intensa urbanização, verificada principalmente a partir da década de 70, acelerou a ocupação espacial da cidade, dificultando o controle municipal sobre o ordenamento do território. Esse fato estimulou o adensamento populacional ao longo das áreas concentradoras de trabalho e áreas periféricas, em função do baixo custo dos terrenos.” (idem : 28)

A referida publicação menciona, inclusive, a segregação espacial da população periférica: “A valorização dos terrenos próximos à região das praias, e das áreas bem servidas de equipamentos urbanos, justifica o crescimento horizontal da cidade para além do município de São Luís e a existência de baixas densidades populacionais nas áreas privilegiadas, pois a segregação espacial está nitidamente ligada ao poder aquisitivo da população”. (ibidem: 28)

Dessa forma, a ocupação do “Conjunto Ambiental de São Luís é caracterizada por um duplo processo de assentamento populacional. De um lado espontâneo, sem planejamento físico territorial e sem seguir normas estabelecidas pela legislação urbanística vigente, e por outro, induzido pela implantação de infra-estrutura urbana”. (ibidem: 28)

Por outro lado, a cidade de São Luís é capital de um dos estados mais pobres do País. Dados do Relatório Mundial da Infância, publicado pelo Unicef (2006), revelam que o Maranhão, localizado na região Nordeste, e que se limita com os Estados do Pará e do Piauí, lidera o ranking das unidades da federação que apresenta os menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil (0,636).

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cresceu 416%.

De acordo com o último censo demográfico do IBGE (2005), a população do Estado do Maranhão era de 6.109.684 habitantes, dos quais 3.986.124 se distribuem na zona urbana e 2.123.560 na zona rural. Desse total, o contingente que abrange o segmento jovem, que se situa na faixa de 15 a 24 anos, é de 1.358.958.

Oitavo Estado brasileiro em extensão territorial, o Maranhão dispõe de 33,12 milhões de hectares, sendo 9.648 milhões de hectares utilizados na agricultura e na pecuária (Ibidem: IBGE). Desse total, apenas 1,6 milhões de hectares estão ocupados com a produção agrícola e 4 milhões de hectares são destinados à pecuária. Há uma concentração de terras nas mãos de grandes proprietários, enquanto os pequenos sobrevivem praticamente da agricultura de subsistência, adotando parcos recursos técnicos para o cultivo de suas terras.

Segundo artigo de Luís Antonio Câmara Pedrosa, “as formas capitalistas de apropriação da terra trouxeram também estatísticas negativas: as quatorze maiores propriedades controlam um milhão e seiscentos mil hectares de terras. Os latifúndios por exploração constituem 39% do total de imóveis. 73,9% dos estabelecimentos rurais estão abaixo dos cinco hectares.”14

O PIB de 2005 é de R$ 25.336.000,00, que se distribui em 53,60% para serviços, 26,10% para a indústria e 20,30% para a agricultura. A maior produção do Maranhão está na cana-de-açúcar e na soja, sendo que esta é destinada à exportação, assim como outros produtos, como o minério de ferro, que é exportado pela Vale e o alumínio, pela multinacional Alumar. (IBGE, 2005) Essas grandes empresas têm sede em São Luís, capital do Estado, que se situa em uma ilha.

Conforme já foi exposto, o Adolescentro foi o local selecionado para realizar a pesquisa porque costuma reunir quantidade expressiva do segmento jovem. Em média, passam por lá, diariamente, cerca de 200 jovens.

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aula, além de um pátio interno onde os jovens se reúnem para conversar, trocar experiências, etc.

Elegi como critério estudar somente os jovens moradores da periferia de São Luís, que visitam regularmente esse local, o qual, conforme pude observar, representa um espaço de sociabilidade, de desenvolvimento com arte, de oportunidade de capacitação para o trabalho e mesmo de entretenimento.

Os depoimentos dos jovens moradores da Vila Embratel, de ambos os sexos, que estão na faixa etária dos 15 aos 24 anos e que freqüentam o Adolescentro, são, portanto, a principal fonte de informação desse estudo que focaliza a televisão como um dos agentes do processo de socialização desses jovens, qual a idéia que fazem da paz e como determinados programas que eles assistem (telenovelas e telejornais), contribuem para construir o imaginário de paz e, ainda, como a paz é vivida no cotidiano.

Antes de realizar as entrevistas, fiz inúmeras visitas o Adolescentro procurando uma aproximação com os jovens que participavam das diversas modalidades de atividades, observando como interagiam, como era o ambiente interno do Núcleo de Extensão e até participando de algum evento comemorativo ou, também, procurando a colaboração dos funcionários responsáveis pela direção e funcionamento dos cursos.

O primeiro contato aconteceu durante reunião no Adolescentro quando expliquei qual era o objetivo da pesquisa e apliquei questionário simplificado (Anexo 2) por meio do qual pude levantar os seguintes dados: de uma amostra de 16 jovens, sendo oito do sexo masculino e oito do feminino, a maioria assistia televisão, em média, de cinco a seis horas por dia; os programas mais vistos eram as telenovelas e os telejornais e as emissoras preferidas eram, em primeiro lugar, a Globo e, em segundo, a Record,no horário das 19h às 22h.

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A maioria participava de várias atividades que são oferecidas pelo Núcleo, que vão desde cursos de línguas, informática, hip-hop, capoeira, confecção de bijuterias e até de um cursinho comunitário pré-vestibular.

Para coletar os depoimentos dos jovens, procurei reunir os que já haviam respondido ao questionário inicial e com os quais já tinha maior facilidade de comunicação. Para tanto, elaborei roteiro de entrevista semi-estruturada (Anexo 3) e realizei seis entrevistas qualitativas.

Portanto, este é um estudo de caso que contextualiza as falas dos jovens entrevistados de um bairro periférico de São Luís (MA). Nesse sentido, foram realizadas entrevistas qualitativas, como também coletadas letras de música e material audiovisual que registram parte do universo pesquisado. De acordo com Pais (2003), “uma boa parte dos métodos qualitativos procura justamente dar voz aos que a tem sufocada por aquelas outras vozes, que a custa de tanto se fazerem ouvir, abafam todas as demais”(idem: 134).

Os métodos qualitativos, segundo Pais, “são emergentes e em cascata, uma vez que vão sendo elaborados à medida que a investigação avança. Os questionamentos são contínuos e as reformulações constantes, em função da descoberta de novos dados e de novas interpretações”, (ibidem: 143,144) o que possibilita uma adequação às múltiplas realidades que vão sendo descobertas .

Assim, o contexto social em que emerge a fala dos jovens moradores da Vila Embratel, aplica-se, conforme Pais, o pretexto para “a análise das entrevistas ou a observação de determinadas ações sociais em que, boa parte do que o autor ou o entrevistado quer dizer nos escapa (...)” (ibidem: 115). Para tanto, na leitura dos depoimentos coletados, procurei evitar a posição de receptividade passiva e construir toda realidade mental não dita diretamente, mas que é imprescindível para entender o texto satisfatoriamente.

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regularmente o Jornal Nacional, enquanto outros preferiam sintonizar mais as telenovelas. Por isso, foram apresentados o Jornal Nacional e um dos capítulos da novela “Duas Caras”, ambos veiculados no dia 27 de maio e previamente gravados. Toda experiência foi fotografada e registrada em áudio e vídeo, e serviu de subsídio para a análise da pesquisa.

Essa técnica de pesquisa teve como objetivo realizar uma discussão para obter depoimentos mais apurados sobre a relação dos jovens com os programas preferidos, além de mostrar se esses gêneros de programa contribuiriam ou não para a construção de um imaginário de paz desse grupo pesquisado, pois a interação em grupo produz dados que seriam menos acessíveis ao pesquisador sem esse tipo de interação,como lembra Morgan (1997).

Na análise dos dados e informações coletados nesta pesquisa, apoiei-me também em John Thompson (2007), quando trata do receptor e da forma de apropriação quotidiana dos produtos de comunicação de massa. Assim, as maneiras de apropriação identificam, por exemplo, algumas características quanto ao modo de assistir aos programas de televisão e as relações possíveis com as condições e competências que fazem parte do contexto social dos receptores.

Para esse autor, as pessoas, ao receberem as mensagens, as interpretam e reinterpretam com base em convenções de vários tipos e em crenças que as possibilitam decodificar e tornar compreensíveis as mensagens. Assim, como afirma Thompson (2007), “ao procurar analisar o significado das mensagens, da maneira como são recebidas e interpretadas, estamos tentando entre outras coisas, reconstruir o sentido que esses receptores dão às mensagens que recebem, tornar explícitas as convenções implicitamente usadas na decodificação das mensagens, e examinar as atitudes que eles tomam explícita ou implicitamente,diante dessas mensagens. (idem: 406, 407),”

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mesmos como pessoas que entendem, possuem opiniões, necessidades e desejos, pessoas inseridas em relações sociais de determinados tipos.” (Ibidem: 409)

As falas dos jovens da Vila Embratel apontam nessa direção. Eles recebem as mensagens dos programas (telejornais e telenovelas), discutem, entendem, reinterpretam como parte de um processo contínuo de entendimento e re-entendimento de si mesmos.

Todos os depoimentos foram gravados em áudio e vídeo e representam fonte de dados para a pesquisa, sendo possível, através desses recursos, registrar detalhes, sinais, que muitas vezes passam despercebidos, quando se coletam somente depoimentos orais. Pais (2003) quando se refere à tradução de textos em “tecno-imagens”, ressalta a importância desses recursos para complementar a análise das fontes escritas.

Além das fontes orais, foi realizada pesquisa bibliográfica em torno de algumas noções, como, por exemplo, juventudes, televisão como agente de socialização, violência e paz, imaginário social e imaginário de paz.

A presente tese se divide em duas partes. A primeira, trata da questão dos jovens relacionada ao imaginário social e do papel da televisão na vida do segmento jovem. O Capítulo 1 aborda as noções de juventudes no plural e dos estigmas socialmente construídos em torno dos jovens em geral, como também discorre sobre programas televisivos que ocupam o centro das atividades de lazer dos jovens entrevistados.

O Capítulo 2 versa sobre a questão do imaginário de paz e sua relação com o imaginário social no contexto das sociedades contemporâneas, enquanto o Capítulo 3 enfoca a televisão como meio de comunicação de massa e um dos agentes importantes no processo de socialização dos jovens, e, o Capítulo 4 discorre sobre a televisão brasileira, a TV Globo, os gêneros televisivos e suas respectivas características.

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processo de socialização desses jovens e do imaginário de paz que constroem a partir desses contatos.

O Capítulo 2, que complementa o estudo de caso, relata o resultado da discussão com os grupos focais dos jovens da Vila Embratel, que girou em torno da apresentação do Jornal Nacional e da telenovela “Duas Caras”, veiculados no dia 27 de maio de 2008, apresentando as características da recepção do telejornal e da telenovela,

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1ª PARTE – JOVENS, IMAGINÁRIO DE PAZ E TELEVISÃO

CAPÍTULO 1 - JUVENTUDES E PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO

Neste capítulo, analiso o que são jovens, a condição juvenil, aponto para a necessidade do emprego do termo “juventudes”, considerando que não há uma única juventude, mas várias, dependendo do contexto sócio-histórico-cultural no qual ela se insere. Discuto questões como estigma, vulnerabilidade social, pobreza, etiquetagem e mostro que a maioria dos jovens brasileiros preenche o chamado “tempo livre” assistindo aos programas de televisão (canal aberto) e que, por esse meio de comunicação de massa, formam, conforme Bourdieu, seu capital social ou simbólico e cultural.

1.1 Jovens ou Juventudes

É preciso salientar, que, quando falo de jovens, tomo por referência a experiência de atores e atrizes, que se encontram segmentados por classes sociais, mas que podem se interrogar sobre valores, normas e visões de mundo que lhes são transmitidos no decorrer do seu processo de socialização. Juventude deve ser entendida não como uma etapa, um fim predeterminado, mas como parte de um processo mais amplo, de constituição de sujeitos, que tem sua especificidade, que marca a vida de cada um.

Assim, a noção de condição juvenil se refere, de acordo com Abramo (2005), a uma etapa do ciclo de vida, de ligação entre a infância, tempo da primeira fase de desenvolvimento corporal e da primeira socialização, de quase total dependência e necessidade de proteção, para a idade adulta, salientando que “os conteúdos, a duração e a significação social desses atributos dessa fase da vida são culturais e históricos.

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contextos históricos, e a história não se repete. Dessa forma, para pensar a condição juvenil contemporânea, devemos considerar a rapidez e as características no mundo de hoje”. (idem: 119)

Juventude também não quer dizer pertencer a certa faixa etária, pois a idade em si não pode ser considerada a única referência de pertencimento ao mundo juvenil ou adulto. Bourdieu (1983) salienta que “a idade é um dado biológico socialmente manipulado e manipulável; e que o fato de falar dos jovens como se fosse uma unidade social, um grupo constituído, dotado de interesses comuns, e relacionar esses interesses a uma idade definida biologicamente já constitui uma manipulação evidente”. (idem: 113)

Enfatizo o termo juventudes no plural, no sentido de que não só a fase de vida chamada juventude não é homogênea, mas, principalmente, se configura de acordo com as condições sócio-histórico-culturais.

Abramo (2004) recomenda utilizar o termo “juventudes”, que significa não esquecer as diferenças e desigualdades sociais que atravessam uma condição juvenil: “Essa mudança de alerta revela uma transformação importante na própria noção social: a juventude, mesmo que não explicitamente, é reconhecida como condição válida, que faz sentido, para todos os grupos sociais, embora apoiada sobre situações e significações diferentes.” (idem: 44)

Desse modo, não há propriamente uma juventude, mas várias, definidas e caracterizadas segundo situações, vivências e trajetórias.

Nascimento (2006) assinala a esse respeito: “viver a juventude é estar em consonância com atitudes, situações consideradas características próprias de determinadas fases da vida, em determinada sociedade, que lhe conferem certa estrutura”. (idem: 52)

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1.2 Condição juvenil e estigmas

No espaço urbano, os jovens moradores, que pertencem às camadas populares, distribuem-se pelos bairros mais afastados, ou nas favelas, em locais geralmente denominados por periferia15. Esses locais não possuem infra-estrutura adequada de saúde, educação, cultura, as habitações são precárias, etc. Como assinala Novaes (2006), o local de moradia, ou seja, o bairro onde se vive, pode ser critério de diferenciação, abona ou desabona, amplia ou restringe acessos: “Hoje, certos endereços, também trazem consigo o estigma das áreas urbanas subjugadas pela violência e a corrupção dos traficantes e da polícia - chamadas de favelas, subúrbios, vilas, periferias, morros, conjuntos habitacionais, comunidades”. (idem: 106)

Em contraponto, para Magnani (2006), periferia seria “uma categoria operativa em termos de dicotomia espacial (pois há condomínios de luxo em bairros afastados, assim como a presença de pobres e moradias precárias em regiões centrais)”. (idem: 39) Contudo, em alguns bairros da cidade de São Paulo, por exemplo, a denominação periferia também aparece no discurso dos rappers, enfatizando não a carência, mas o pertencimento. Configura-se assim, “uma certa visão propositiva, segundo a qual, “ser da periferia” significa participar de um certo ethos que inclui tanto uma capacidade para enfrentar as duras condições de vida, quanto pertencer às redes de sociabilidade, a compartilhar certos gostos e valores”. (ibidem 39)

Essa capacidade dos jovens de enfrentar as dificuldades inerentes a sua condição social, criando redes de sociabilidade e de integração social nos bairros onde vivem, reagindo às condições adversas é que faz a diferença e se contrapõe à visão muitas vezes preconceituosa e homogeneizante de quem olha os moradores dos bairros distantes, de fora e de longe.

15 “Ser da periferia” palavra que vem do grego peri “em volta de” - pode estar associado a um processo de

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Nesse caso, são caracterizadas pela situação de pobreza, que nem sempre é determinante, pois há a presença de pobres nas regiões centrais ou que se distribuem em outras localidades, nem sempre localizadas em bairros distantes. Assim, pobreza deve ser entendida como um conceito comparativo, e sua qualidade relativa aos outros gira em torno das desigualdades sociais. Para tanto, referendamos a abordagem da pesquisadora Zaluar (2000) quando afirma que “(a pobreza) não é uma conseqüência de sua cultura, mas o resultado de políticas sociais que provocam uma real privação material e uma real exclusão dos pobres nos campos ocupacional, educacional e político”. (idem 41)

Entretanto, os adeptos da corrente da “cultura da pobreza”, segundo essa autora, “acreditam que os pobres desenvolvem uma cultura exclusiva que se caracterizaria pelo mínimo de organização acima da família e pela falta de integração às instituições da sociedade mais ampla” (ibidem:42). Ou seja, uma forma discriminatória de encarar os segmentos sociais populares, pois há diferentes formas de organização familiar, que nem sempre obedecem ao modelo de família tradicional, mas que são igualmente legítimas, dependendo do meio social onde se vive.

Outra questão que se coloca é que, geralmente, as organizações governamentais e não-governamentais atribuem o fato dos jovens moradores das áreas periféricas estarem vivendo em situação de risco e/ou vulnerabilidade social. Para Abramovay (2003), o conceito de vulnerabilidade social, comumente empregado em certos estudos realizados na América Latina e elaborado a partir de critérios econômicos, baseia-se na carência de recursos, tanto materiais como simbólicos, que impedem atores sociais de terem acesso às oportunidades sociais, econômicas e culturais. É uma carência que atingiria, principalmente, os jovens das classes populares, podendo conduzi-los a uma situação de violência social.

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sociedade, de forma a ascender a maiores níveis de bem-estar ou diminuir probabilidades de deteriorização das condições de vida de determinados atores sociais”. (idem : 30)

É preciso admitir que existe a dificuldade do acesso, mas esse tipo de abordagem não leva em consideração a forma como esses jovens vivem, como enfrentam as situações de carência ou privação dos recursos materiais e simbólicos, quais são suas escolhas, ou mesmo qual a percepção que têm dos serviços que lhes são oferecidos.

De outra parte, considerar que os jovens das camadas populares vivem em permanente situação de “risco”, é, segundo Pais (1999), “favorecer um “pânico social” ocasionado pelo consumo de drogas ilícitas e manifestações e condutas consideradas como “rebeldes”, aliadas aos lazeres marcados por excessos e transgressões”.(idem 9)

Assim, surge para esse autor um processo social de “etiquetagem” desses jovens, geralmente aliados à noção de “desvio”, que ignora quais são suas formas de expressão, suas trajetórias de vida, seus desejos e frustrações.

A propósito dessa prática de confundir a realidade com as representações sociais construídas sobre os jovens, é que Pais (2004) afirma: “Os jovens são o que são, mas também são (sem que o sejam) o que deles se pensa, os mitos que sobre eles se criam. Esses mitos não refletem a realidade, embora a ajudem a criar. O importante é não nos deixarmos contagiar por equívocos conceptuais que confundem a realidade com as representações que dela surgem”. (idem: 11)

As palavras, conforme Pais (2004), “nos tribalizam”, pois têm um poder mágico, mas apenas representam coisas. “O modo como este poder opera parece razoavelmente óbvio, manifestando-se na construção de um mundo feito de palavras, qualificativos, etiquetas. Uma vez que uma coisa é concebida como palavra, algo surge que transcende ambas.”. (ibidem: 11)

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confundindo a realidade com as representações sociais.

Assim, a associação dos jovens pertencentes aos segmentos populares com a violência é uma imagem disseminada e elaborada pelos agentes sociais, e, mais acentuada, quando se menciona a existência do comércio de drogas nos bairros da periferia.

Soares (2004) pontua sobre a situação que envolve esses jovens, principalmente entre os do sexo masculino e que estão na faixa etária entre 18 e 24 anos: “Cerca de 45 mil brasileiros são assassinados por ano no Brasil. Em algumas regiões das grandes cidades, marcadas pelo drama da desestruturação familiar, do desemprego, da degradação da auto-estima, da falta de acesso à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer, os números chegam a patamares mais alarmantes”. (idem: 131)

Esse ponto de vista atribui à falta de oportunidades de acesso aos bens e serviços e à ausência de políticas sociais o comportamento violento dos jovens dos bairros periféricos, fatores que nem sempre são determinantes. A pobreza condiciona as vivências pessoais na medida em que limita as oportunidades de escolha e pode até dificultar a integração social.

Porém, essa forma de generalizar, afirmando que o jovem da periferia será um “futuro marginal” ou “bandido” não se aplica a todos e não justifica que esse seja o único caminho, conforme argumenta Miraglia (2006): “Ao mesmo tempo não dá para acreditar que essas são as únicas escolhas, uma vez que num mesmo lugar, numa mesma região, há pessoas que vivem sob as mesmas condições e não necessariamente estão envolvidas em padrões violentos de sociabilidade”. (idem:115).

Portanto, a relação direta entre pobreza e violência parece bastante problemática, porque há locais onde há pobreza e não são violentos, enquanto há outros, em situação de melhores condições de vida, onde os jovens apresentam atitudes violentas.

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pesquisa16 sobre a Vila Embratel. Esse relatório aponta o bairro como “violento” e justifica que essa violência resulta do envolvimento de crianças e adolescentes com o consumo de drogas, da exploração do trabalho infantil, das crianças em idade escolar fora da escola e da existência de pontos de tráfico.

Mas há também outras formas de rotular as juventudes, justificando suas ações no mundo contemporâneo, quando se costuma associá-las a “problema” ou a “fator de risco” A esse respeito, Abramo (2007) corrobora: “A juventude só está presente para o pensamento ou para ação social como “problema”, como objeto de falha, disfunção ou anomia no processo de integração social e numa perspectiva mais abrangente, como tema de risco para própria continuidade social”. (idem : 80)

Essa visão passa a ser uma projeção da sociedade que acaba canalizando seus medos, suas angústias, suas esperanças, encarando os jovens como “problema”, o que dificulta, muitas vezes, enxergá-los da forma como eles se apresentam na realidade, ou seja, ressalta Abramo “como a encarnação de todos os dilemas e dificuldades que a sociedade, ela mesmo, tem se enfrentado, eles nunca podem ser vistos, ouvidos e entendidos, como sujeitos que apresentam suas próprias questões para além dos medos e das esperanças dos outros”. (ibidem: 80)

Essa forma de encarar os jovens como incapazes de qualquer ação propositiva, dificulta interpretar “o significado das tendências sociais do nosso presente e de enxergar saídas e soluções para esse segmento social.” (ibidem: 81)

Apesar dessa visão predominante nas pesquisas sociais, a partir dos anos 90, valoriza-se mais a participação juvenil. Nesse momento, ela é vista “como parte da solução”, conforme assinala Novaes (2007): “Hoje, contudo, as pesquisas apontam para a necessidade de pensar de maneira articulada, tanto os “problemas”, quanto as “soluções”. (idem: 116)

Nessa mesma época, os “etiquetados” como “jovens da periferia” e

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estigmatizados como “marginais”, pelos agentes sociais, começaram a ter maior visibilidade ao se apresentarem nos espaços públicos com uma proposta contestadora dos valores da sociedade contemporânea, dando origem ao movimento hip-hop, ao rap, ao funk, ao reggae, mostrando outras formas de enxergar esses jovens, que não somente através do “olhar preconceituoso”.

A expansão dos meios de comunicação de massa, como o rádio, o cinema e, particularmente, a televisão, favorece o aparecimento de uma “cultura juvenil” que se baseia em novos padrões de comportamento centrados em valores como a liberdade, a autonomia e no prazer imediato, entre outros. É nesse contexto que surgem, na década de 80, grupos juvenis, como os teds, mods ou rockers, e outros, com uma proposta alternativa de sociedade, como os beats e os hippies, que, conforme assinala Dayrell (2005), “se organizam e criam um estilo próprio”.(idem: 30)

Daí a importância de se considerar as atividades sociais dos jovens durante as chamadas horas de lazer17.

1.3 Jovens, lazer e televisão

A programação da televisão ocupa, ao lado da família, um espaço cativo nos lares brasileiros. Esse aspecto é o que predomina entre os jovens do bairro da Vila Embratel.

A televisão é parte integrante de suas vidas, eles recorrem a ela, seja para se informar através dos telejornais, ou para vivenciar outros dramas mostrados nas telenovelas, ou seja, as aspirações e emoções individuais se misturam e novas subjetividades podem ser elaboradas.

Pesquisa realizada pela Organização das Nações Unidas para a Educação. a Ciência e a Cultura (Unesco), com jovens na faixa etária de 15 a 24 anos, no período de 1º a 12 de julho de 2004, aponta a televisão aberta como a maior fonte de informação e lazer para a maioria dos jovens brasileiros. Assim, 35% declararam que, para ocupar as horas de lazer, preferem assistir televisão.

17 Lazer deve ser compreendido como “o conjunto de atividades que ocupam o tempo “livre”, ou seja, aquela

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Da amostra pesquisada, 95% dos jovens afirmaram que costumam assistir televisão e a maioria (81%) disse que assiste todos os dias; 4,6% vêem televisão praticamente todos os dias (de cinco a seis vezes por semana), enquanto apenas 3,3% raramente assistem programas de televisão. (UNESCO: 2006)

De acordo com essa pesquisa, quase um terço dos jovens apontou a telenovela como o seu programa predileto, sendo que 19% preferem assistir filmes, 18% noticiários informativos (jornais) e 11,8% programas esportivos (A Voz dos Adolescentes, UNICEF: 2002).

Outro aspecto a ser considerado é que dados estatísticos informam que os segmentos jovens que habitam os bairros da periferia vêem os programas da televisão aberta com maior freqüência do que os jovens de maior poder aquisitivo.

Pesquisa feita pelo Unicef (2002) indica que 51% dos jovens na faixa de 12 a 17 anos declararam ver televisão como a principal forma de entretenimento. Outro levantamento, denominado Jovem Brasil, feito pela CPM Market Research, com jovens de 12 a 20 anos, registra que 74% “sempre” assistiam televisão, sendo que essa porcentagem aumenta com relação às classes de menor poder aquisitivo: 69% na classe A; 75% na B; 78% na C e 76% na classe D.

É preciso considerar que os dados estatísticos por si só nem sempre traduzem a realidade vivida pelos jovens. Porém, a precariedade dos equipamentos e espaços de lazer existentes nos bairros da periferia, dificulta, e muitas vezes impede, que sejam oferecidas outras oportunidades ao segmento jovem, como sessões de cinema, teatro, quadras de esporte, bibliotecas, etc.

A maioria dos jovens entrevistados da Vila Embratel disse que nunca foi a um cinema ou a um teatro, sendo que a biblioteca que freqüenta funciona no próprio Adolescentro e é bastante deficiente.

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equipamento, enquanto em 64%, não há uma livraria.” (IBGE 1999, it. In: Castro et. al., 2001: 55).

A pesquisa da Unesco (2004) também revela que três quartos dos jovens brasileiros nunca foram a um teatro ou museu. Quase a metade da amostra investigada nunca foi ao cinema, a bibliotecas ou estádios e ginásios esportivos.

De certo modo, essa ausência de maiores oportunidades de lazer pode justificar a preferência em ocupar o tempo livre em casa, assistindo à programação da televisão, por cerca de 35% dos jovens brasileiros pesquisados (UNESCO, 2004).

Entretanto, há muitas outras formas de preencher esse tempo livre, que são adotadas pelos moradores que pertencem às camadas populares e que protagonizam soluções criativas, como lembra Magnani (2006): “as pessoas não apenas “sobrevivem”, mas vivem nela, protagonizam soluções criativas e arranjos coletivos em sua prática de devoção, de encontros, de religiosidade, de ocupação do tempo livre, etc.”.(idem: 39 e 40)

1.4 Televisão e processo de socialização

A escolha de determinados gêneros de programa, como, por exemplo, telejornais e telenovelas, fazem com que esse tipo de mídia se torne, ao lado da família, da escola, da rua, dos amigos, do trabalho, da igreja, um dos agentes do processo de socialização nas sociedades contemporâneas.

Segundo Bourdieu (2000), os diferentes capitais (econômico, cultural ou social e simbólico), que os agentes sociais adquirem durante a vida, dependem, por exemplo, da aquisição de títulos de propriedade econômica, cultural ou social, ou por herança ou pela condição de classe social. Conforme Bourdieu, “as classes que podemos recortar no espaço social não existem como grupos reais embora expliquem a probabilidade de se constituírem em grupos práticos, famílias, clubes, associações e mesmo “movimentos” sindicais ou políticos”. (idem: 137)

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social, por meio, sobretudo, das propriedades e das suas distribuições, tem acesso, na própria objetividade, ao estatuto do sistema simbólico que, à maneira de um sistema de fonemas, se organiza segundo a lógica da diferença, do desvio diferencial, constituído assim em distinção significante”. (ibidem: 144)

Desse modo, o espaço social e as diferenças que nele se desenham “espontaneamente”, tendem a funcionar como espaço de estilos de vida, ou grupos de estilos de vida diferentes. Nesse sentido, os jovens da Vila Embratel, que se reúnem em específico “espaço social”, em determinados grupos, freqüentam um espaço (o Adolescentro e outros), segundo a lógica da diferença, ou seja, “é a diferença inscrita na própria estrutura do espaço social quando percebida segundo as categorias apropriadas a essa estrutura.” (ibidem 144).

As marcas de distinção compõem o capital simbólico, explica Bourdieu: “As distinções, enquanto transfigurações simbólicas das diferenças de fato, e mais geralmente, os níveis, ordens, graus ou quaisquer outras hierarquias simbólicas, são produto de aplicação de esquemas de construção que, como, por exemplo, os pares de adjetivos empregados para enunciar a maior parte dos juízos sociais, são produto da incorporação das estruturas, a que eles se aplicam.” (ibidem: 145)

As relações objetivas de força tendem a reproduzir-se, segundo Bourdieu, nas relações simbólicas de força, nas visões do mundo social que contribuem para a permanência dessas relações de força. Assim, os agentes sociais, no caso, os jovens da Vila Embratel, detêm um poder na proporção do seu capital simbólico, ou seja, na proporção do reconhecimento que recebem de um grupo.

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Assim é que a televisão também faz parte do processo de socialização, na medida em que ocupa um tempo significativo na vida cotidiana dos jovens. As quatro ou seis horas diárias que assistem à programação televisiva contribuem para a construção do seu capital cultural (informações, conhecimento).

De acordo com Pais (2001), “o processo de socialização acontece nos quotidianos juvenis que rodopiam entre tempos monocromáticos e tempos policromáticos: no primeiro, os jovens desenvolvem relações com instituições onde se faz necessário à atenção com os horários, com a segmentação das atividades, com a pontualidade, com a hierarquia, como por exemplo, a família, as escolas, as igrejas, os espaços profissionais etc., ao mesmo tempo, os jovens estabelecem uma inter-relação com os tempos policromáticos, que tem ênfase na aleatoriedade, nos sentimentos, na experimentação, na conviviabilidade. Esses tempos que se entrecruzam, gerando fluências múltiplas e híbridas, as quais os jovens interagem ou se integrando ou entrando em conflito são vividos nas ruas, nas festas, nos jogos, nos relacionamentos com amigos, namorados, etc.” (idem 71)

Pais recorre à metáfora do ioiô para mostrar como os jovens têm suas trajetórias assinaladas por movimentos oscilatórios e reversíveis. “Perante estruturas sociais cada vez mais fluídas, os jovens sentem a sua vida marcada por crescentes inconstâncias, flutuações, descontinuidades, reversibilidades, movimentos do vaivém: saem da casa dos pais para um dia qualquer voltarem; abandonam os estudos para os retomar depois; encontram um emprego e em qualquer momento se vêem sem ele; suas paixões são como “vôos de borboleta”, sem pouso certo, casam-se, não é certo que seja para toda a vida...” (ibidem: 72)

Assim, os jovens vivem uma condição social em que as setas do tempo linear se cruzam com o enroscamento do tempo cíclico, ou seja “temporalidades velozes, ziguezagueantes, na qual os tempos fortes se cruzam com os fracos e, em ambos, se vivem os chamados contratempos”, lembra Pais (ibidem:9)

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jovens mergulhem em um mundo virtual, um refúgio na ilusão, como estratégia de fuga, como os jogos virtuais, e, no caso analisado, há o exemplo dos programas de televisão, as telenovelas, onde os personagens fictícios são vividos como se fossem reais, suas vidas passam a ser incorporadas ao cotidiano dos jovens.

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CAPÍTULO 2 - IMAGINÁRIO DE PAZ

Neste capítulo, abordo o imaginário de paz, mostrando qual a sua relação com o imaginário social e as representações sociais. Para tanto, apresento conceitos como paz, violência, a partir de documentos históricos e autores que falam de paz, além de contextualizar o debate em torno da construção de uma cultura de paz nas sociedades contemporâneas.

2.1 Violência, paz e suas definições

A percepção do significado da violência pode variar, de acordo com o contexto sócio-histórico-cultural onde manifestações e ações consideradas como violência se expressam.

Violência, segundo o dicionário Houaiss, pode ser entendida como um ato brutal e antinatural de transgressão e violação da natureza, do direito, da justiça, das leis, dos costumes, do sagrado, das mulheres e dos mais fracos.

Chauí (2006) pontua que “quando a relação entre dois ou mais seres se realiza através da força física, psíquica ou moral, dizemos que há violência, identificando-a com a coerção, coação ou repressão”. Entretanto, há pluralidades de critérios para avaliar a própria identificação da violência com a força, pois diferentes culturas definem de diferentes maneiras a margem que separa o natural e o desnaturado, o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o legítimo e o ilegítimo. (Idem:120)

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