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A imagem impressa na Idade Média – a função da igreja católica

No documento Análise da imagem em manuais escolares (páginas 171-173)

9. Alguns marcos prévios às questões da análise e avaliação de imagens

9.2. A imagem impressa e didáctica – resenha histórica

9.2.2. A imagem impressa na Idade Média – a função da igreja católica

Quanto ao que diz respeito propriamente aos livros, (ou manuais), e desde a Baixa Idade Média, claro que a temática recorrente neles impressa a partir do momento em que começou a haver autores, copistas e ilustradores era de tipo religioso tendo a ver com a divulgação dos evangelhos e da vida de Jesus. A sua forma de gravação era a manuscrita e a do desenho único e pontualmente elaborado em cada suporte. Eram as chamadas iluminuras, miniaturas ornamentais e ilustrativas também. É curioso saber que a maior parte das vezes não eram os que copiavam ou escreviam os textos quem tinha a tarefa da ilustração. O copista ou escriba deixava um espaço em branco para esta e podia chegar a escrever um breve apontamento com advertências em letra fina e facilmente raspável, após o que o trabalho era entregue aos miniaturistas ou iluminadores, com a sua caixa de cores em que imperavam o vermelho, “minium” em latim, e o ouro. Com uma pena esboçavam levemente a ilustração antes de pintá-la ou dourá-la. Muitos destes manuscritos eram obras de anos e tal trabalho quase só seria possível num mosteiro, dada a dedicação e concentração que requeria a sua elaboração. Por vezes, os mosteiros possuíam, nas suas dependências um “scriptorium”, lugar reservado à

cópia e à decoração dos manuscritos (Labarre, 2005, p. 21). Particularmente esta última tarefa e o trabalho de elaboração da capa eram feitos neste “scriptorium” (ibid., p. 23). Era também vulgar uma obra ser fruto de vários intervenientes na sua produção. Obras mais simples foram também produzidas em menor tempo e arranjada maneira da sua divulgação. A chamada Bíblia dos Pobres (Bíblia Pauperum), impressa em 1430 conheceu grande incremento no fim da Idade Média e contava, de acordo com Ferro (1987, p. 22), os episódios bíblicos essencialmente através da “banda desenhada”, permitindo a acessibilidade dos grupos sociais mais baixos. Segundo Sousa (1999, p. 76), foi também o primeiro livro (em sentido de formato moderno) europeu a ser impresso pelo processo da xilogravura.

Pela sua riqueza e diversidade pictórica são de realçar os Comentários ao Apocalipse, do abade do mosteiro de Valcabado, S. Beato de Liébana, cujo texto se prestava extraordinariamente à representação pictórica. Estas miniaturas anunciam a arte vindoura que honraria toda a história clássica, renascentista espanhola. Como importantes apontamentos da arte da ilustração podem ainda certamente citar-se as iconografias do Império Romano do Oriente, as célebres imagens Bizantinas e a renovação e alguma normalização de estilos do império de Carlos Magno que, mesmo assim, ficou marcada pela normalização dada à letra, em estilo Carolíngio, que anunciava uma postura ao gosto gótico.

Mais tarde, em pleno período gótico, havia já iluminadores para além dos monges e que, embora trabalhando para igrejas e mosteiros, faziam obra para príncipes e outras personagens seculares. Ficaram famosos os breviários e os livros de horas que, embora de formato reduzido, dada a sua função eminentemente prática, possuíam variadas ilustrações, a maior parte executadas sem relação com o texto e que traduziam a vida campestre e burguesa bem como representavam paisagens ou cenas de acção de guerra, festividades e cenas do quotidiano. No mais conhecido destes livros, “Les trés riches heures” de Jean Duc de Berry, ficaram patentes e registados de forma vívida muitos dos costumes daquela época. Para além de uma função artística, estes suportes, passam então a ter uma função documental, testemunhal inigualável de um período. Em Portugal temos um belíssimo documento no “Livro de Horas” dito de “D. Manuel”, conservado no Museu de Arte Antiga, com iluminuras atribuídas a António de Holanda. Possivelmente estes livros aproximavam-se, ao menos no seu formato e usualidade, àquilo que são os manuais da actualidade: algo prático, transportável e sempre à mão quando solicitado... Um artista importante da segunda metade do séc. XV, Jean Fouquet de Tours, ilustrou em França um precioso devocionário, do tesoureiro Etienne Chevalier, com preciosas ilustrações concebidas numa relação directa com o texto, e integrando muitas figuras, paisagens, cenas urbanas e de caça muito fidedignas. Em dado momento, devido ao sucesso destes livros e de outros, embora mais toscos, mas mais populares, emergiu um negócio alargado que era suportado por copistas e iluminadores profissionais, que vendiam os seus livros piedosos ilustrados nos mercados e em locais junto ou no interior das igrejas. As ilustrações, devido a alguma massificação, iam perdendo em esplendor e hieratismo mas aproximando-se às motivações mais comuns e integrando processos da própria arte pictórica que emergia como forma de expressão e registo. É preciso reconhecer que a ilustração dos iluministas nem sempre era original prestando-se, sobretudo na Alta Idade Média, a replicar muitas vezes os modelos que lhes colocavam à frente, mas,

progressivamente foram integrando na sua confecção uma óptica específica que colhia directamente inspiração na realidade observada como diz Labarre (2005, p. 25) e, sendo assim, fazia uma aproximação didáctica mais efectiva e passou a ter um importante e indiscutível valor documental. Este autor usa dois termos diferentes, para se referir à imagem construída no período medieval um é “decoração”, correspondendo ao período mais antigo e outro, num período posterior, correspondendo a maior sofisticação elaborativa e comunicativa, a que chama “ilustração” (ibid., p. 26). Aqui, por exemplo, a aplicação das cores “é mais aberta do que na época Carolíngia, mas mantém-se um maior sentido do matizado...” (ibid., p. 27). Mais tarde ainda no período gótico, em pleno século XIII, ao tempo de S. Tomás de Aquino, no tocante ao modo como se passava a fazer o registo do mundo pela imagem “devido ao alargamento da perspectiva e ao restabelecimento das proporções, a visão do mundo retomou a escala humana. Os iluminadores deixaram de exprimir a ideia que tinham dos seres e das coisas e passaram a exprimir o aspecto segundo o qual os viam”, (Labarre, ibid., p. 33).

De modo geral poder-se-á comentar como Hébutterne-Poinssac (2000)que a imagem de cariz formativo, potenciada e divulgada à sombra da igreja, se foi organizando e tornando mais sofisticada de molde a permitir “um ensino organizado onde a imagem representava o veículo permanente do conteúdo com um vasto corpo sumariamente acessível. (p. 5).

9.2.3. A imagem e as novas tecnologias de impressão no período Renascentista e períodos

No documento Análise da imagem em manuais escolares (páginas 171-173)