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8 DESENVOLVENDO A INTERVENÇÃO NO GRUPO

8.2 O Processo grupal

8.2.1 A interação dos membros do grupo

De acordo com Loomis (1979), o enfrentamento de uma situação nova pode gerar em muitas pessoas sentimentos de incerteza e ansiedade. Ao iniciar um trabalho com grupos, o enfermeiro deve estar atento ao desenvolvimento de papéis que poderão ser utilizados pelos membros na interação com os outros participantes e com o coordenador do grupo, para controlar essas preocupações.

Nesse sentido, percebeu-se que “Maria Brasil 8”, desde seu primeiro dia no grupo, apresentou-se com um semblante triste. Ao relatar que sua família não tinha lhe apoiado em sua gravidez, expulsando-a de casa, usou um tom de voz infantil que permaneceu por muitas sessões. Sempre era a última a concluir as atividades, não porque não as compreendesse, mas porque se demonstrava insatisfeita com o que realizava, fosse desenho ou colagem. Parecia querer chamar atenção e ouvir da coordenadora e das outras mães aprovação e elogios sobre sua produção. Apesar das participantes tentarem lhe apoiar lembrando-lhe da pessoa que a tinha acolhido, “Maria Brasil 8” parecia não desistir de seu papel de criança abandonada. Desenvolveu esse papel até sua última sessão, quando recebeu a notícia de que iria acompanhar seu bebê na enfermaria mãe-canguru, no hospital. Nesse dia, “Maria Brasil 8” pareceu não se conformar com a conduta e questionava por que ela teria que ir para esse local. A coordenadora do grupo e as outras mães tentaram lhe explicar, mas ela não quis aceitar e fez expressão de uma criança contrariada.

Segundo Loomis (1979), os membros procurarão desenvolver um papel que lhes é familiar e que está relacionado ao seu desconforto e incerteza experimentada por estar em um grupo novo. Outro fenômeno que está intimamente relacionado ao desenvolvimento de papéis é o desenvolvimento de padrão de poder e influência. A maioria dos grupos de cuidado de saúde tem um líder que normalmente é um profissional de saúde. No entanto, outros tipos de grupos, ou mesmo grupos que tenham um profissional como coordenador, elegerão um líder para um período específico.

Na atividade de construção do desenho grupal, programada para a sessão VI, percebeu-se certo poder de influencia de “Maria Brasil 6”. Ela era uma das únicas participantes que tinha escolaridade de Nível Superior e melhor poder aquisitivo. Apesar de não ser uma das mães que mais falava, sempre se colocava nas discussões, sem ofender ou menosprezar as outras integrantes do grupo. Conduziu a atividade, sugerindo o que deviam desenhar, mas deixando que as outras tomassem a iniciativa e procurou estimular as mães para que todas participassem. Entende-se que “Maria Brasil 6” foi eleita pelo grupo como líder, quando exerceu seu poder de referência, pois as participantes, ao se identificarem com “Maria Brasil 6”, desejavam ser como ela. Com a saída de “Maria Brasil 6”, “Maria Brasil 9” assume esse papel de líder. Esta era uma pessoa comunicativa, que se interessava pela história de cada uma das mães, escutava todas atentamente e compartilhava com facilidade seus sentimentos. Falava de sua vida e de sua maneira de viver. “Maria Brasil 9” não tinha receio que as outras mães tivessem preconceito em relação a ela, pelo contrário, por ser a mais espontânea, sempre positiva e alegre e a que falava mais, parecia ter ganhado a simpatia da outras mães. Dessa forma, conseguia exercer certa influência sobre o grupo.

Para Loomis (1979), o grau e o tipo de poder e influência exercitados pelo líder e os membros do grupo estarão diretamente relacionados à facilidade de cada pessoa para ajudar o grupo a alcançar seus objetivos. Entretanto, o enfermeiro precisa reconhecer quando um dos membros se autoproclama líder ou o único expert no assunto, pois esses extremos são prejudiciais ao processo do grupo. É importante que o enfermeiro perceba a contribuição de cada membro e modele este compartilhamento de poder e influência.

Para Monteiro, Pinheiro e Souza (2008), os papéis desenvolvidos e o poder de influência entre as puérperas parecem estar relacionados com fatores como o nível de instrução, a faixa etária e a capacidade de oferecer apoio/suporte.

Frequentemente os papéis e os tipos de poder e influência demonstrados pelos membros do grupo coincidem com o padrão de comunicação destes. O desenvolvimento de

padrões de comunicação é outro assunto importante que deve ser considerado na fase inicial

de um grupo. A comunicação é um ponto crucial em grupos de saúde. Quem fala com quem e sobre o que. Uma abordagem sociométrica pode ser realizada para analisar as interações do grupo, sendo um dos métodos mais precisos e também que mais consome tempo do coordenador do grupo. Nessa abordagem é quantificada a frequência das interações iniciadas e recebidas por cada membro. Para um líder iniciante na condução de grupo pode haver várias questões que merecem atenção: Quem tem a tendência a fazer perguntas? Quem dá respostas? Quem não diz nada? Quem pergunta para obter atenção do líder? Quem muda de assunto

quando os sentimentos são expressos? Qual é o humor utilizado no grupo? Quem se emociona ao que está sendo dito? As questões são infinitas e não existem as mais importantes, o que deve ser observado pelo coordenador é como emerge o padrão de comunicação do grupo (LOOMIS, 1979).

Figura 1 – Configuração do grupo/Sessão I Figura 2– Configuração do grupo/Sessão III

Na sessão preparatória, as mães estavam em silêncio e não queriam falar. A partir das sessões seguintes é que essa realidade vai se modificando, sendo a necessidade de socialização e interação suscitadas pelas próprias participantes. Entretanto, observa-se na figura 1, que as mães ainda não interagiam entre si e que a coordenadora do grupo dominou a fala na maior parte do tempo. Nessa sessão “Maria Brasil 2” falou que queria que as mães estivessem mais animadas, que conversassem mais, pois segundo a mesma, ainda estavam muito tímidas.

“Maria Brasil 3”, desde a sessão I, apesar de ter chegado à Casa da Mamãe há apenas dois dias, mostrou-se participativa, descreveu sua experiência anterior (internação do outro filho em Fortaleza-CE), como foram importantes as amizades, os laços que se firmaram com as outras mães; era comunicativa e propositiva, mantendo esse padrão de comunicação durante toda a sua participação no grupo.

A partir da sessão III, a coordenadora procurou conduzir o momento, permitindo que as participantes se colocassem mais no grupo, falando um pouco sobre suas vidas, de forma que elas pudessem se conhecer melhor. Nota-se que, embora os membros ainda não demonstrassem uma integração, eles estavam se posicionado mais nas discussões do grupo,

com exceção de uma das “Marias” (M) novatas. Verifica-se também na sessão III certa proximidade entre “Maria Brasil 1” e “Maria Brasil 2”.

Figura 3 – Configuração do grupo/Sessão IV Figura 4 – Configuração do grupo/Sessão V

Pela figura 3 percebe-se que uma “Maria” recém-chegada dominou parte da fala. A mesma, como “Maria Brasil 3”, já tinha vivenciado essa experiência anteriormente, entretanto, o fato dela ter tido um bebê prematuro que necessitou ser hospitalizado, e por ela também já ter ficado na Casa da Mamãe, despertou ainda mais o interesse no grupo. Esta “Maria” compartilhou sua experiência, verbalizando seus sentimentos; relatou positivamente como foram seus dias na Casa, enfatizando a recuperação de seu filho, que naquele período estava com quase dois anos. Tal depoimento constituiu-se em apoio para as outras mães, na medida em que pode trazer-lhes esperança.

Ressalta-se que as “Marias”, que aparecem no gráfico representadas pela letra M não se constituíram sujeitos do estudo, mas são citadas por se compreender que se configuraram em pessoas importantes para os resultados do grupo.

A figura 4 mostra que, na sessão V, os membros do grupo apresentavam-se mais integrados. Pareciam sensibilizadas com a situação de “Maria Brasil 4” que tinha parido trigêmeos. Conversavam com “Maria Brasil 4” sobre as dificuldades desta para cuidar dos três filhos. Todas demonstravam cuidado com ela, pela sua limitação para compreender as coisas, em especial, a “Maria” que estava desde o encontro anterior. Observa-se que as duas “Marias” participantes dessa sessão se colocaram com frequência nesse encontro, falando até mais do que “Maria Brasil 2”, cuja participação correspondia ao quinto encontro. Considera- se, portanto, que o número de participações pode ou não influenciar no padrão de

comunicação, sendo este também determinado pela característica pessoal de cada membro do grupo.

Figura 5 – Configuração do grupo/Sessão XI Figura 6 – Configuração do grupo/Sessão XII

Na figura 5, verifica-se que “Maria Brasil 7”, “Maria Brasil 8” e “Maria Brasil 9” pareciam estar bem integradas e desenvolviam um bom padrão de comunicação no grupo. As mesmas estavam fazendo parte do grupo desde a sessão VI, compartilhando sentimentos entre elas há mais de quatro sessões. Acredita-se que isso também se deva à positividade, espontaneidade e facilidade de expressão, características pessoais, especialmente de “Maria Brasil 7” e “Maria Brasil 9”, fazendo com que estas monopolizassem o espaço para a fala.

Percebe-se pelas figuras (5 a 8) que “Maria Brasil 10” mantinha-se em silêncio e quase não falava, somente respondia ao que lhe era perguntado, mas demonstrava satisfação em participar do grupo. “Maria Brasil 10” manteve esse padrão de comunicação durante toda as sessões em que participou. Ao contrário, “Maria Brasil 14”, desde que chegou ao grupo, era sempre séria, calada, cabisbaixa e parecia estar sempre de mau humor. A partir da sessão XII, ficou mais próxima de “Maria Brasil 12”, que também era adolescente, passou a participar das atividades e melhorou seu humor no grupo. As duas riam muito de “Maria Brasil 7”, que desenvolvia o papel de atrapalhada do grupo. Esta última era a alegria do grupo. Até “Maria 13”, que era triste e chorava o tempo todo com saudade da filha de um ano que tinha deixado em casa, se divertia com as palavras de “Maria Brasil 7”. “Maria Brasil 13” conseguiu se integrar ao grupo e era uma das que mais participava das discussões. No primeiro momento acreditava-se que “Maria Brasil 7” era motivo de risadas no grupo, pejorativamente, no entanto, depois se percebeu o carinho que os membros do grupo tinham por ela. “Maria Brasil 7” parecia não se importar com a atitude das outras mães, sorria também e dizia que “falava muito para que elas também falassem”. A maioria dos encontros manteve esse clima de alegria e descontração.

Observa-se também pelas figuras (figura 5 a 8) a evolução de “Maria Brasil 15” e “Maria Brasil 16” no que diz respeito ao padrão de comunicação desenvolvido pelas mesmas. Ambas chegaram ao grupo aparentemente tristes e choravam muito, mas nas sessões seguintes foram se integrando. Nota-se na figura 6 a interação de “Maria Brasil 11” com essas duas mães. Ela compartilhou sua experiência em relação ao enfrentamento da hospitalização do filho, contribuindo para que “Maria Brasil 15” e “Maria Brasil 16” se integrassem ao grupo, interagindo com as demais participantes, melhorando seu padrão de comunicação.