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A intervenção do Estado e do 3º Sector em Timor Leste

Secção 4. As Rádios Comunitárias em Timor-Leste – Um exercício de liberdade e

4.1. Breve caracterização da mais recente nação do mundo

4.1.1. A intervenção do Estado e do 3º Sector em Timor Leste

Timor-Leste está dividido em 13 distritos e 65 sub-distritos baseados nas divisões herdadas das administrações portuguesa e indonésia. A Constituição Nacional estabelece a importância da descentralização mas, pelo menos nestes primeiros anos, será difícil desenvolver muita da autoridade central às regiões. Assim, a descentralização poderá tomar a forma de desconcentração à medida que os departamentos centrais (como a educação, saúde, agricultura, habitação, água e saneamento básico) estabeleçam escritórios regionais para fornecer serviços básicos locais.

O governo indonésio mostrou-se sempre relutante em autorizar o crescimento de organizações autónomas, no entanto, a independência de Timor-Leste é o culminar de uma longa luta contra o colonialismo, levada a cabo por diversos grupos da sociedade civil, tais como organizações da comunidade, grupos religiosos, estudantis e outros. Algumas das instituições mais eficientes neste movimento pró-independência encontravam-se ligadas à Igreja Católica. Movimentos de jovens e de estudantes também se mostraram muito activos, arriscando a sua própria vida. Um desenvolvimento importante ocorrido em 1998 foi a criação do ‘Fórum das ONG’ (Organizações não Governamentais) em Timor-Leste, que mais tarde se transformou na Plataforma das ONG, com 77 membros nacionais e 33 internacionais.

Na era democrática todas as Organizações da Sociedade Civil (OSC) têm de se adaptar às novas e diferentes circunstâncias e construir novas relações, tanto com o Estado, como com as organizações congéneres nacionais e internacionais.

As OSC devem trabalhar em estreita parceria, pois muitos dos obstáculos e armadilhas potenciais podem ser evitados quando estão assegurados canais abertos de comunicação no interior e entre as organizações. E ainda mais importante, as OSC devem comunicar de perto com as comunidades pelas quais existem e com as quais trabalham.

Nesta fase de reconstrução, ainda existem muitas organizações internacionais com forte representação no país. Sendo que a maioria dos doares oficiais preferem canalizar pelo menos parte dos seus fundos directa ou indirectamente para as ONG, é importante o estabelecimento de relações cordiais com as organizações internacionais.

As OSC em Timor-Leste estão a actuar em diferentes áreas, seja como arquitectos do desenvolvimento, a trabalhar em parceria construtiva com o governo; seja na área da

advocacia, influenciando as acções de diversos actores; na monitorização, assegurando que o governo, o sector privado e as organizações internacionais mantêm padrões elevados na sua acção; a nível dos serviços, por exemplo, na saúde, habitação e educação, preenchendo lacunas deixadas pelo governo ou complementando-as, como é o caso da educação não formal; na informação, desempenhando um papel importante no fornecimento de informação e no estímulo ao debate, ocupando uma posição intermédia entre o governo e as comunidades locais.

Estas instituições devem, por um lado, pressionar o governo a tomar medidas sobre assuntos prementes, mas, simultaneamente, devem também procurar maximizar a participação pública na construção e funcionamento da democracia.

Nos primeiros anos de independência o povo de Timor-Leste dependeu bastante da competência e da capacidade dos serviços governamentais. Qualquer falha destes serviços representa, ainda hoje, um sério obstáculo ao progresso do desenvolvimento humano. Apesar de, em muitos aspectos, Timor se encontrar a construir uma administração pública de raiz, também carrega a herança das estruturas e ética do passado colonial.

A estrutura indonésia era autocrática, o que na perspectiva do desenvolvimento humano, criou uma função pública com fraquezas graves. Excesso de pessoal, uma complexa forma de administração e uma cultura de dependência que deixou a população com baixa confiança, limitando-se a esperar por ordens superiores. Esta estrutura também incentivou a corrupção a todos os níveis.

À herança da estrutura indonésia, acrescem 25 anos de resistência e, mais recentemente, a forma de trabalhar da administração da ONU. O que, de acordo com as conclusões do relatório “Media and People in East Timor” (INDE, 2002), pode conduzir os líderes timorenses a ignorar conceitos como os de “opinião pública”, “governança”, “democracia local” ou, simplesmente, a contornar a necessidade de transparência na tomada de decisões.

Neste contexto, urge a criação de programas de formação que permitam motivar e capacitar tanto os líderes nacionais e locais como as OSC – incluindo os média em geral e os média comunitários, em particular – onde se trabalhem os temas supracitados e o equilíbrios nas relação entre poderes públicos, lideranças tradicionais e a sociedade civil organizada.

Figura 2 – Sistema tripartido de negociação

Fonte: Realizado com base na reflexão sobre o sistema de negociação e poder em Timor-Leste.

Sem a harmonização das três componentes deste sistema dinâmico, não será possível superar o défice democrático, alcançar os índices desejáveis de desenvolvimento humano e incorporar de forma efectiva, positiva e sustentável um quarto actor de extrema importância para a reconstrução do país: a ajuda internacional.

As ONG internacionais presentes no país apostam em projectos de base comunitária, pois acreditam que é através da formação da população local que se responde às necessidades locais e que este é um instrumento valioso para evitar que os media contribuam para o aumento do conflito.

Recrutar e dar formação a formadores locais pode, a longo prazo, contribuir para a capacitação do média comunitário, adaptado às condições específicas em que se insere. Para trabalhar eficazmente com os média comunitários é necessário ter uma atitude pragmática no sentido em que estes devem ser utilizados não para difundir moralismos ou valores, mas para fomentar consensos e multiplicidade de opiniões.

Relativamente à ajuda internacional e ao conceito de desenvolvimento subjacente a estas intervenções, urge questionar se a perspectiva de desenvolvimento veiculada pelas organizações internacionais é partilhada pelo Governo e sociedade civil timorenses. No que respeita aos princípios de desenvolvimento preconizados pelo Governo Timorense, estes têm por base o Plano de Desenvolvimento Nacional elaborado e

Poderes Públicos Sociedade Civil Organizada Lideranças Tradicionais

aprovado em 2002. Neste plano, a ser implementado por todos os intervenientes do diagrama (apresentado na Figura 2) e pelos doadores internacionais (que devem, de acordo com a Carta de Roma, conciliar os seus projectos com os objectivos dos Estados onde é feita a intervenção), o Governo timorense traça como objectivos até 2020:

• Ser um país democrático, com uma cultura tradicional vibrante e um ambiente sustentável;

• Construir uma sociedade próspera com comida e roupa adequada, para todos; • As comunidades viverão em segurança, sem discriminação;

• As pessoas serão letradas, com capacidades e perícias. Serão saudáveis e terão uma esperança de vida longa. Serão participantes activas no desenvolvimento social, político e económico promovendo a igualdade social e a unidade nacional;

• As populações não estarão mais isoladas porque haverá boas estradas, transportes, electricidade, comunicações entre as cidades e aldeias, em todas as regiões do país; • A produção e o emprego crescerá em todos os sectores;

• Serão proporcionadas, a todos os timorenses, boas condições de vida e acesso a bens e serviços;

• Os padrões de vida e os serviços irão melhorar para todos os timorenses e o rendimento será distribuído de um modo justo e equitativo;

• Os preços serão estáveis, e o fornecimento da alimentação constante, com base numa boa gestão e numa utilização sustentável dos recursos naturais;

• A economia e as finanças do Estado serão geridas de forma eficiente, transparente e livre de corrupção;

• O Estado cumprirá a lei. Governo, sector privado, sociedade civil e líderes das comunidades serão responsáveis por todos os que são eleitos ou escolhidos.