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A Rádio Comunitária e a Liberdade de expressão e informação em Lospalos: A

No documento Rádios comunitárias e desenvolvimento local (páginas 119-122)

Secção 4. As Rádios Comunitárias em Timor-Leste – Um exercício de liberdade e

4.8. A Rádio Comunitária e a Liberdade de expressão e informação em Lospalos: A

conflito

Durante o período em que o país esteve subjugado à Indonésia, a rádio, nomeadamente nas suas versões clandestinas, tinha um papel importante ao serviço do movimento de resistência.

Actualmente, é importante verificar se este média mantém ou reforça a sua importância enquanto motor da reconstrução, que tem por base a participação da própria população. Desde o seu aparecimento que, em situações de pós-conflito ou de reconstrução na paz, a RC desempenha um importante papel, seja a nível social no reencontro de famílias que com a guerra se perderam, separando pais e filhos, maridos e mulheres e assim se conseguem voltar a reunir famílias dispersas pelos quatro cantos do país. A Rádio Comunidade Maliana, no distrito de Bobonaro, fronteira com a Indonésia, depois da independência juntou centenas de familiares de refugiados, através de um programa diário nocturno, durante o ano de 2001.

Num contexto de recente conflito armado, um dos contributos reconhecidos como sendo dos mais importantes de uma RC é o de vigilância, como refere um dos entrevistados:

“no pós-conflito o papel da rádio é de vigilância, porque dá voz e aprecia também o que o governo faz” (E2)

De acordo com Virgílio Guterres, as RC em Timor assumiram um papel fundamental durante os primeiros tempos da reconstrução:

“nos primeiros tempos de construção e preparação do povo, da população,

o meio de comunicação mais efectivo é a rádio, num contexto pós-conflito, é importantíssimo, porque o nível da iliteracia é enorme e a rádio vai preencher este papel de podermos em diferentes dialectos às comunidades; educação política, problemas de reconciliação, precisamos da RC para isto.” (Virgílio Guterres, Director geral interino da Radiotelevisão)

Numa situação como a de reconstrução pós-conflito, importa utilizar a RC, em tempo de eleições, enquanto veículo promotor de debate e de apelo ao voto, a uma campanha política equitativa e sem violência, preparando os eleitores e os próprios jornalistas. Este papel é reconhecido pelos entrevistados como sendo de extrema importância em países instáveis, como é o caso de Timor-Leste.

“o ano passado (2002) antes da eleição da assembleia constituinte, do

presidente, houve um processo muito grande de educação, onde participou a UNDP, a comissão eleitoral independente, faziam estes programas na rádio indo aos distritos e sub-distritos explicando como votar.” (Virgílio

Guterres, Presidente do Conselho de Administração da Rádio Difusão Pública)

Verifica-se que em Timor-Leste as RC assumiram um papel importante na ajuda à reconstrução do país, no sentido em que os media podem desempenhar um papel de extrema importância em termos sociais, económicos e políticos. O seu papel é de agente de mudança, auxiliando nas transformações que ocorrem na sociedade. Mudar mentalidades é algo que requer tempo e não é um processo fácil. As RC podem aqui ter um impacto tendencial em toda a comunidade, apelando à participação e fortalecendo a democracia.

No caso da RCL, a grande alteração introduzida prende-se com a concretização da liberdade de expressão em Timor:

“No regime indonésio as pessoas que davam informações (fontes) ficavam

receosos, agora é livre, não há opressão, agora resta aperfeiçoar.”

(FG/AC/PT)

A comunidade reconhece a RCL como um espaço de participação democrático e de liberdade,

“A população percebe que está a viver em democracia, a prova está nas

entrevistas que são feitas, por exemplo, aos vendedores do mercado, em que as pessoas falam sem se sentirem oprimidas. Outro exemplo é um grupo de agricultores que difunde o seu próprio programa.” (FG/AC/CR)

Um dos aspectos que configuram o novo espaço de liberdade timorense prende-se com o facto da RCL ser um projecto de e para toda a população e não apenas para as classes mais abastadas:

“A rádio no tempo da Indonésia era dominada pela classe alta, agora é

propriedade de todos, incluindo a classe baixa”. (FG/AC/CR)

O facto de a RCL se esforçar por incluir todas as franjas da população e as comunidades mais longínquas é vista pelos actores auscultados como sendo de suma importância para

alcançar os objectivos quer da rádio, quer de desenvolvimento da nação:

“Se eles não têm informações como sabem qual é o plano de Timor para o

futuro? O povo precisa de participar no desenvolvimento? Em qualquer parte do mundo o povo é importante para o desenvolvimento de uma nação porque havendo o povo é que existe o Estado”. (E3)

De acordo com os participantes no grupo de discussão, a RCL é um duplo motor de desenvolvimento, quer pelo seu papel enquanto informador/ formador da comunidade,

“A população conhece a democracia mas na verdade como é esta

democracia? Este é o papel da rádio para que a população saiba melhor como viver em democracia. Por exemplo, esses termos como presidencial e semi-presidencial, quem esclarece? É através da rádio que nos chegam essas informações.” (FG/AC/PT)

“Sim, muitas pessoas ouvem. Muitas vezes pelo caminho as pessoas abordam para fazer comentários. Dizem o que querem, o que precisam, daquilo que estão à espera. Por isso muita gente gosta de ouvir a rádio comunidade, porque sentem que é uma fonte de informação onde quer que eles estejam ouvem sempre.” (E3)

quer por ser voz activa da população junto dos órgãos de decisão:

“É um meio democrático para o povo; uma peça de controle da sociedade,

o que quer dizer que já se pode fazer críticas a quem trabalha mal para que se mudem atitudes, por exemplo.” (FG/AC/CR)

“O povo não fala directamente com o governo, é como se fosse uma ponte (…) Recolhem depoimentos onde expressam livremente o que pensam e depois difundem aqui na rádio.” (E3)

Um dos entrevistados resume esta dupla função da RCL e das RC em geral, de forma muito clara:

“a rádio é comunidade por isso é de todos (…) a rádio comunidade é

também ajudar o governo (… )no sentido de quando ele tem uma divulgação nós difundimos para a população (…) Quanto à comunidade, vamos saber quais as suas dificuldades e transmitir ao governo, de forma a

que este saiba quais as suas necessidades.” (E3)

A RC surge aqui como o meio que materializa a possibilidade de uma democracia participativa. Como nos diz Virgílio Guterres,

“Estou consciente de que Timor, como qualquer sociedade que está a

sonhar e a decidir o seu futuro em direcção à democracia, esta implica a participação da população, e esta não é a população estar toda ela a falar no parlamento, temos lá apenas 88 deputados, mas não queremos que a nossa população só participe nos processos de eleições, de 5 em 5 anos, mas sim no dia a dia. Um meio de garantir a participação do povo é a comunicação social, a RC - oportunidade da comunidade participar num processo de desenvolvimento da democracia” (Virgílio Guterres, Presidente

do Conselho de Administração da Rádio Difusão Pública)

Informar e formar a sociedade sobre os direitos democráticos é também, de acordo com os entrevistados, fazer chegar à população os seus deveres enquanto cidadãos e os limites que o próprio sistema democrático encerra:

“O jornalista deve manter a sua conduta à ética jornalística, por exemplo,

na divulgação de palavrões – referente às limitações da participação e da própria democracia. Nós entendemos isso muito bem, mas o que devemos fazer para que aqueles que não sabem os limites?” (E3)

De acordo com os entrevistados, Timor tem potencial para se tornar uma nação verdadeiramente democrática:

“tenho esta ideia (…) a democracia é liberdade de expressão e a liberdade

de expressão é liberdade de informação e se estamos numa sociedade em que há livre circulação de informação. Timor não precisa muito tempo para entrar nesta situação, o que é preciso é capacidade de adaptarmos à nova situação” (Virgílio Guterres, Presidente do Conselho de Administração da

Rádio Difusão Pública)

4.9. RCL, futuro e Sustentabilidade: Avaliação permanente e investigação-acção

No documento Rádios comunitárias e desenvolvimento local (páginas 119-122)