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3 O CRITÉRIO JURÍDICO DE APROPRIAÇAO DO CONHECIMENTO

3.1.6 A Lei n 11.484/2007 Topografia e circuitos integrados

A Lei n. 11.484 de 31 de maio de 2007 tratou, inicialmente, do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Indústria de Semicondutores (PADIS), estimulando as pessoas jurídicas que fizerem investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) mediante projetos vinculados à área de semicondutores. Referida lei estabeleceu uma série de

incentivos fiscais nesta seara, como a redução da contribuição ao Programa de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público - PIS/PASEP e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - COFINS, além de redução da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico - CIDE destinada a financiar o Programa de Estímulo à Interação Universidade-Empresa e do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI.

Igualmente, a referida Lei estabeleceu o Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Indústria de Equipamentos para a TV Digital, com semelhantes incentivos, alterando-se, apenas, o foco do desenvolvimento tecnológico que se pretendia estimular, dado que a implementação do sistema de TV Digital no Brasil, naquela época, exigia o desenvolvimento da indústria do respectivo setor enquanto sustentação do programa governamental.

Ocorre que, no corpo desta lei, e como é praxe no processo legislativo brasileiro acerca da união de temas nem sempre correlatos no mesmo diploma legal, vieram previstas no Capítulo III as condições de proteção das topografias de circuitos integrados. Desde já se torna fundamental mencionar que a matéria em apreço é extremamente técnica, com previsão na lei de conceitos e aspectos de ordem técnica não usualmente estabelecidos em lei, assim como acontece com a questão das cultivares, nos termos acima apresentados. Neste sentido, prevê o artigo 26 da mencionada lei:

Art. 26. Para os fins deste Capítulo, adotam-se as seguintes definições:

I – circuito integrado significa um produto, em forma final ou intermediária, com elementos dos quais pelo menos um seja ativo e com algumas ou todas as interconexões integralmente formadas sobre uma peça de material ou em seu interior e cuja finalidade seja desempenhar uma função eletrônica;

II – topografia de circuitos integrados significa uma série de imagens relacionadas, construídas ou codificadas sob qualquer meio ou forma, que represente a configuração tridimensional das camadas que compõem um circuito integrado, e na qual cada imagem represente, no todo ou em parte, a disposição geométrica ou arranjos da superfície do circuito integrado em qualquer estágio de sua concepção ou manufatura.

Já no aspecto da titularidade do direito em comento, partindo da ideia de reciprocidade de tratamento aos estrangeiros nos moldes das Convenções e Tratados internacionais, conforme será abordado no Capítulo 3.2 215 é garantido ao criador da topografia de circuito

                                                                                                                         

215

O artigo 24 da lei menciona que:

“Art. 24. Os direitos estabelecidos neste Capítulo são assegurados: I - aos nacionais e aos estrangeiros domiciliados no País; e

integrado o registro para a devida proteção, podendo ser requerida, além, é claro, do próprio criador e seus herdeiros “(...) pelo cessionário ou por aquele a quem a lei ou o contrato de trabalho, de prestação de serviços ou de vínculo estatutário determinar que pertença a titularidade (...)”, nos moldes do §3º do artigo 27 da Lei em apreço.

Percebe-se que, a estrutura normativa sobre a titularidade e o respectivo pedido de registro para fins de proteção legal está assentada na ideia da autonomia da vontade, não estabelecendo a lei uma norma cogente que proteção ao inventor/empregado. Pelo contrário. É assim que o artigo 28 da lei traz a previsão de que:

Art. 28. Salvo estipulação em contrário, pertencerão exclusivamente ao empregador, contratante de serviços ou entidade geradora de vínculo estatutário os direitos relativos à topografia de circuito integrado desenvolvida durante a vigência de contrato de trabalho, de prestação de serviços ou de vínculo estatutário, em que a atividade criativa decorra da própria natureza dos encargos concernentes a esses vínculos ou quando houver utilização de recursos, informações tecnológicas, segredos industriais ou de negócios, materiais, instalações ou equipamentos do empregador, contratante de serviços ou entidade geradora do vínculo.

A redação deste artigo acompanha a diretriz já comentada no tocante à Lei de Propriedade Industrial e a Lei de Proteção das Cultivares, quando os critérios de apropriação do conhecimento humano são, justamente, o objeto do contrato de trabalho e a utilização dos recursos materiais disponibilizados pelos empregadores ou entidades estatais. É evidente, também, que a abertura concedida logo no início da redação do dispositivo em favor da liberdade de contratar, pela própria relação desigual entre empregado e empregador, mesmo neste nível de colaborador, é letra morta no sentido de não alcançar o objetivo pretendido.

Neste caso, de titularidade exclusiva do empregador, o parágrafo 1º do mesmo artigo menciona que “(...) a compensação do trabalho ou serviço prestado limitar-se-á à remuneração convencionada.”, novamente possibilitando o ajuste contratual em sentido contrário.

A possibilidade de a titularidade sobre os circuitos integrados pertencer exclusivamente ao empregado está prevista no § 2º deste artigo 28, que aduz:

§ 2o Pertencerão exclusivamente ao empregado, prestador de serviços ou servidor público os direitos relativos à topografia de circuito integrado desenvolvida sem relação com o contrato de trabalho ou de prestação de serviços e sem a utilização de recursos, informações tecnológicas, segredos industriais ou de negócios, materiais,                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                            

II - às pessoas domiciliadas em país que, em reciprocidade, conceda aos brasileiros ou pessoas domiciliadas no Brasil direitos iguais ou equivalentes.

Art. 25. O disposto neste Capítulo aplica-se, também, aos pedidos de registro provenientes do exterior e depositados no País por quem tenha proteção assegurada por tratado em vigor no Brasil.”

instalações ou equipamentos do empregador, contratante de serviços ou entidade geradora de vínculo estatutário.

Verifica-se, novamente, o regramento comum nestas matérias relatadas, quando o empregado ou prestador de serviços ou mesmo o servidor público apenas adquire plenos direitos sobre os circuitos integrados na hipótese de não realizar as tarefas atinentes ao desenvolvimento no ambiente de trabalho ou em qualquer momento em que esteja prestando seu labor em benefício do empregador, tomador do serviço ou entidade pública, além de não poder fazer uso de qualquer aspecto de ordem material disponibilizado por estes.

Apesar deste regramento padrão, o artigo 29 da lei faz expressa referência à importância do “esforço intelectual do seu criador”, como elemento indispensável para que a topografia seja considerada original e, assim, passível de proteção, além do caráter incomum e não vulgar no aspecto da técnica.

O lapso temporal de proteção dos direitos sobre os circuitos integrados de apenas 10 anos, conforme previsão do artigo 35 da lei, já demonstra a velocidade com que as alterações são perpetradas nesta matéria de alta tecnologia, onde o desenvolvimento é constante e extremamente acelerado. Logo, torna-se, nesta perspectiva, ainda mais importante o elemento criador existente neste processo, qual seja: o homem com seu espírito inventivo.

Vale destacar que, a lei em comento trouxe, no artigo 48, a possibilidade de se realizar a concessão de licenças compulsórias para “(...) assegurar a livre concorrência ou prevenir abusos de direito ou de poder econômico pelo titular do direito, inclusive o não atendimento do mercado quanto a preço, quantidade ou qualidade.” O interesse do mercado interno, na diretriz do artigo 219 da CF/88, foi destacado no inciso VI deste referido artigo, realçando que as licenças compulsórias serão concedidas para suprir “predominantemente” este mercado.

Por fim, a lei foi detalhista nos aspectos procedimentais deste pedido de licença compulsória, que tramitará perante o Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI), nos artigos 50 e seguintes 216, do que se pode depreender que o legislador prestigiou o direito de

                                                                                                                         

216

Vide as disposições da lei sobre a matéria na ótica processual:

“Art. 50. O pedido de licença compulsória deverá ser formulado mediante indicação das condições oferecidas

ao titular do registro.

§ 1o Apresentado o pedido de licença, o titular será intimado para manifestar-se no prazo de 60 (sessenta) dias, findo o qual, sem manifestação do titular, considerar-se-á aceita a proposta nas condições oferecidas.

§ 2o O requerente de licença que invocar prática comercial anticompetitiva ou desleal deverá juntar documentação que a comprove.

propriedade do titular do registro de circuito integrado, na perspectiva da ampla proteção do direito de propriedade em face desta expropriação, nos termos do inciso XXII do artigo 5 da CF/88, mas o mesmo cuidado não foi dedicado ao próprio criador/inventor do circuito.