• Nenhum resultado encontrado

Capítulo 2 A música e os festivais

2.1 A Música como Indústria Cultural

A música é um importante elemento artístico-cultural presente na vida das pessoas, pois ela consegue desenvolver diferentes sensações nos indivíduos, como: alegria, emoção e tristeza, além de promover o equilíbrio, bem-estar, facilitar a concentração e raciocínio, reflexão, etc. Para Arthur Schopenhauer, “a música exprime a mais alta filosofia numa linguagem que a razão não compreende” (Apud Gomes, 2011, p. 3); ela comunica através de palavras e notas musicais, encanta, inspira e emociona. Muitas vezes, é difícil explicar o efeito que causa nas pessoas.

A música é a arte mais próxima dos indivíduos devido à facilidade que têm de compreender e de se aproximar dela, ou seja, se pararmos para pensar, a música pode ser experienciada diversas vezes em diferentes plataformas, não é como uma pintura em que é necessário ir a uma galeria ou museu para a ver, ou como uma peça teatral que se assiste em um teatro. Pois como Gomes (2011) comenta “a presença da música na sociedade encontra-se de diferentes formas, acompanhando o quotidiano da humanidade de uma forma mais próxima e constante que qualquer outra arte” (p.1).

A música possui uma importância social, pois “envolve aspectos artísticos e emocionais ao mesmo tempo em que é uma indústria planetária altamente mediatizada e de elevada importância econômica nos mercados mundiais” (Gomes, 2011, p.1); é neste sentido que se pode afirmar que a música é uma Indústria Cultural, é considerada um bem cultural com elevada procura por parte dos indivíduos em experimentá-la; torna-se um

tipo de mercadoria e passa a ser padronizada através dos critérios do mercado (Adorno e Horkheimer, apud Cabrito, 2018).

O conceito de Indústria Cultural foi abordado pela primeira vez em 1947 pelos teóricos Theodor Adorno e Max Horkheimer da Escola de Frankfurt em seu livro Dialectic of Englightenment com o objetivo de descrever o papel dos media na sociedade contemporânea; este conceito surgiu para substituir a expressão “cultura de massa” porque os autores queriam argumentar contra a ideia então prevalente de que a cultura surgiu espontaneamente a partir das próprias massas (Moeran e Pedersen, 2011). Em vez disso, Adorno e Horkheimer sugeriram que os produtos culturais, ou seja, a música, o teatro, o cinema, etc., foram cuidadosamente adaptados para serem consumidos pelas massas (Moeran e Pedersen, 2011), daí o nome “Indústria Cultural”. Os autores ainda ressaltaram que a expressão “indústria” não estava ligada diretamente à produção, mas sim à padronização e distribuição dos produtos culturais pelos públicos. Adorno e Horkheimer, 1947 explicam que:

“O cinema e o rádio não precisam mais se apresentar como arte. A verdade de que não passam de um negócio, eles a utilizam como uma ideologia destinada a legitimar o lixo que propositalmente produzem. Eles se definem a si mesmos como indústrias, e as cifras publicadas dos rendimentos de seus diretores gerais suprimem toda dúvida quanto à necessidade social de seus produtos” (apud Goulart, 2014, p.106).

Nesse sentido, todos os produtos da indústria cultural são produzidos para serem vendidos para o maior público possível, alguns autores, como Alcântara, Coelho e Santos (2014), são contra essa padronização porque a cultura deixa de ser a expressão de um povo e torna-se a representação de algo sem valor e símbolo do conformismo, ou seja, ela se materializa e passa a ser uma característica da nova era do consumismo. Já Sousa (2013) destaca o facto de a indústria cultural agir de forma meticulosa e fazer com que o indivíduo consuma algo de que aparentemente não tem nenhuma necessidade, contudo a padronização da cultura acaba por se transformar em uma via para democratizar a arte, a música, o cinema, etc., ou seja, a indústria cultural faz com que todos tenham acesso à cultura.

A popularização da Indústria Cultural nos anos 50, 60 e 70 fez com que o mercado artístico e os meios de comunicação evoluíssem gradativamente, logo o termo “indústria

cultural” passou do singular para o plural, assim optou-se por “indústrias culturais”, pois o termo surge devido à grande complexidade do mercado que envolve os produtos e serviços culturais (Miège, 2000; Bourdieu, 2002, citado em Cabrito, 2018), e não apenas a espaços unificados ligados à revolução industrial e à produção cultural como pré-definiu Adorno e Horkheimer (Cabrito, 2018).

Já nos anos 90, surge o conceito de “indústrias criativas”, que se desenvolve através das forças da globalização, incluindo mudanças nos padrões económicos nacionais e internacionais, na cultura e na comunicação (Rennie, 2005) com o objetivo de reorganizar conhecimentos, ideias, relacionamentos e a criatividade na sociedade, pois Moeran e Pedersen (2011) apontam que as atuais “indústrias criativas” ultrapassaram as “indústrias culturais”, não basta apenas produzir bens e serviços culturais, é necessário criatividade; o atual mercado exige isso, a criatividade é explorada para fins sociais, políticos e económicos.

Para perceber melhor o conceito de indústrias criativas, destacam-se aqui algumas definições:

“As indústrias criativas são formadas a partir da convergência entre as indústrias de mídia e informação e o setor cultural e das artes, tornando-se uma importante (e contestada) arena de desenvolvimento nas sociedades baseadas no conhecimento [...] operando em importantes dimensões contemporâneas da produção e do consumo cultural [...] o setor das indústrias criativas apresenta uma grande variedade de atividades que, no entanto, possuem seu núcleo na criatividade” (Jeffcutt, 2000, p. 123-124).

“A ideia de indústrias criativas busca descrever a convergência conceitual e prática das artes criativas (talento individual) com as indústrias culturais (escala de massa), no contexto de novas tecnologias midiáticas (TIs) e no escopo de uma nova economia do conhecimento, tendo em vista seu uso por parte de novos consumidores cidadãos interativos” (Hartley, 2005, p. 5).

Em resumo, o conceito de indústrias criativas engloba três vertentes: a indústria cultural, a criatividade e pessoas. Esse conceito faz parte da nova economia mundial, onde o valor surge através do processamento de informações e da criação de experiências através da cultura (Moeran e Pedersen, 2011); vale ressaltar que as indústrias criativas exigem processos mais criativos e difusos do que as tradicionais.

É nesse sentido que paramos para analisar onde a música se encaixa no mercado atual, pode-se considerar que, através do pensamento de autores como Theodor Adorno e Max Horkheimer, a música é uma indústria cultural. Contudo, ela vem convergindo as novas tecnologias e o mercado das indústrias criativas, e desta forma acaba por proporcionar diferentes experiências aos públicos, ou seja, hoje conseguimos ter experiências musicais produzidas de diversas formas; uma delas é através da participação dos indivíduos em festivais de música, que é o principal tema desta dissertação.