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A MATERIALIZAÇÃO DO PROJETO ÉTICO/POLÍTICO DA PROFISSÃO

D) AS TENDÊNCIAS DOS PERFIS PEDAGÓGICOS NO EXERCICIO

4. O PROJETO ÉTICO-POLÍTICO E OS PERFIS PEDAGÓGICOS NO

4.1 A MATERIALIZAÇÃO DO PROJETO ÉTICO/POLÍTICO DA PROFISSÃO

SUA EFETIVAÇÃO.

O perfil pedagógico de “emancipação” está vinculado a um direcionamento critico/reflexivo que propõe o projeto ético/político da profissão, isto é, falar de um perfil pedagógico numa perspectiva de emancipação é defender um sentimento de pertencimento ao projeto ético/político da profissão que tem como propósito uma atuação crítica, propositiva, que busque a ampliação e defesa dos direitos à classe trabalhadora, porém, mais que isso, propõe a contribuição na construção de uma nova ordem societária, comprometidos com a democratização, cidadania, direitos humanos, equidade e justiça social, dentre outros princípios.

Logo, sobre o projeto ético/político destacam-se como subsídios para sua efetivação as instâncias políticos/organizativas da profissão (CFESS/CRESS - Conselho Federal e Conselhos Regionais de Serviço Social; a ABEPSS - Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social, o conjunto de CAs e DAs -Centros e Diretórios Acadêmicos das unidades de ensino, e pela ENESSO- Executiva Nacional de Estudantes de Serviço Social); juntamente com a dimensão jurídico/política da profissão composta pelo Código de Ética 1993, pela Lei de Regulamentação da Profissão e pelas Diretrizes Curriculares dos Cursos de Serviço Social e as demais leis sociais que permitem a apropriação em cada área de atuação.

Assim, o conjunto desses subsídios dá materialidade ao projeto ético/político que tem como princípios para o exercício profissional do assistente social em qualquer âmbito que venha trabalhar o comprometimento com:

O reconhecimento da liberdade como valor central – a liberdade concebida historicamente, como possibilidade de escolha entre alternativas concretas; daí um compromisso com a autonomia, a emancipação e a plenaexpansão dos indivíduos sociais Consequentemente, este projeto profissional se

vincula a um projeto societário que propõe a construção de uma nova ordem social, sem exploração/dominação de classe, etnia e gênero. A partir

destas opções que o fundamentam,tal projeto afirma a defesa intransigente dos direitos humanos e o repúdio do arbítrio Correspondentemente, o projeto se declara radicalmente democrático –considerada a democratização como

socialização da participação política e socialização da riqueza socialmente produzida. (NETTO,1999, p.16, grifo do autor)

Os princípios e valores constitutivos do projeto ético/político como o da liberdade, autonomia, democratização e emancipação dos indivíduos direcionados a uma perspectiva pedagógica de emancipação nem sempre fizeram parte do projeto da profissão. Este perfil pedagógico foi construído, como já observado, na direção profissional em determinadas conjunturas que ao longo da história foi se redimensionando, logo, o direcionamento ético/político articulado as outras dimensões profissionais, também o foram, exemplo disso, pode-se observar nos Códigos de Ética80 (1947; 1965; 1975; 1986 e 1993), os quais representaram e representam o direcionamento de cada época e a expressão formal do “ethos” profissional. Isto é, do “modo de ser” da profissão, que possibilitou as tendências dos perfis pedagógicos da “ajuda” e da “participação” e “emancipação” no exercício profissional.

A dimensão ética na origem da profissão corresponde à ideologia neotomista e positivista, isto é, o direcionamento profissional estava ligado à educação moral dos usuários no sentido de eliminar os “desajustes sociais” sob um viés individualista e psicologizante, uma vez que o Serviço Social trabalhava “com pessoas humanas desajustadas ou empenhadas no desenvolvimento da própria personalidade.” (CÓDIGO DE ÉTICA, 1947)

Compreende-se que as implicações éticas do assistente social da época contribuíram, apesar de todo viés de uma “ação boa” para a reprodução dos valores capitalista de adaptação da classe trabalhadora a exploração, uma vez que colocava a questão social em uma questão moral que deveria ser “solucionada” com a educação, sob a perspectiva católica de reforma para obter a “harmonia” da sociedade e a integração dos indivíduos “desajustados”.

Este direcionamento demonstra uma tendência de perfil pedagógico direcionado à “ajuda”, com base na “psicologização” e na ação moralizante e individualista deste exercício profissional, devendo seguir os preceitos de Deus, em que a ética e a moral teriam a finalidade de fazer o “bem” e evitar o “mal”. Tem-se também que o assistente social deveria:

Cumprir os compromissos assumidos, respeitando a lei de Deus, os direitos naturais do homem, inspirando‐se, sempre em todos seus atos profissionais, no bem comum e nos dispositivos da lei, tendo em mente o juramento prestado diante do testemunho de Deus. (CÓDIGO DE ÉTICA, 1947, secção I- deveres fundamentais)

80 O Código de Ética é um instrumento educativo e orientador do comportamento ético profissional do assistente

social: representa a autoconsciência ético-política da categoria profissional em dado momento histórico. Assim, é mais do que o conjunto de normas, deveres e proibições; é a parte da ética profissional: ação prática mediada por valores que visa interferir na realidade, na direção da sua realização objetiva, produzindo um resultado concreto. (BARROCO, 2012, p. 35, Grifo do autor)

Observa-se que a educação moralizante do assistente social não consistia apenas com seus usuários, mas também se remetia ao próprio profissional, pois este era um “vocacionado” com um perfil ético-moral propicio a exercer essas atividades. O direcionamento educativo seria tanto possuir um perfil que correspondesse a uma pessoa de “conduta” religiosa quanto de “educar” as famílias e os usuários no sentido de um perfil pedagógico psicologizante de “ajuda”.

Como já analisado foi apenas em 1960, no cenário das lutas revolucionárias que apontaram os primeiros questionamentos do Serviço Social no âmbito dos movimentos sociais, contra o caráter conservador da profissão, porém rebatido em razão do golpe de 1964, que se estabeleceu repressão e ditadura. É neste contexto que foi pensado o Código de Ética de 1965, o qual reforçou o conservadorismo da profissão, uma vez que foi combatido a vertente mais “radical” do Serviço Social direcionada ao marxismo e reformulado o conservadorismo, apenas com algumas modificações como o aperfeiçoando das técnicas e comprometido com o Desenvolvimento de Comunidade com o objetivo de que “O assistente social estimulará a participação individual, grupal e comunitária noprocesso de desenvolvimento, propugnando pela correção dos desníveissociais.” (CÓDIGO DE ÉTICA, Art. 9°, 1965).

Isto é, o assistente social deveria “corrigir” as desigualdades sociais buscando a “promoção social” do individuo para o desenvolvimento do país, direcionando esse exercício profissional conforme os valores de um perfil pedagógico da “participação”, em que o assistente social objetivava a participação da comunidade e indivíduos para a superação da condição de pobreza em que se encontrava. Além é claro, de manter o mesmo perfil profissional de “boa conduta” que profissional de Serviço Social deveria ter.

Entretanto, apontam-se alguns elementos que diferencia este Código de Ética de 1965 do de 1947 e do posterior de 1975, pois apresentam questões nunca antes mencionadas referentes à democracia, a justiça social, a vida cívica e ao pluralismo, mesmo que de forma desarticulada da sociabilidade presente, como exemplo, tem-se: “No exercício de sua profissão, o assistente social tem o dever de respeitar as posições filosóficas, políticas e religiosas daqueles a quem se destina sua atividade, prestando‐lhes osserviços que lhe são devidos (...)” (CÓDIGO DE ÉTICA, 1965,Art. 5°)

Desta maneira o Código de 1965 apresentou alguns avanços mesmo que de maneira acrítica e descontextualizada, porém devido a grande repressão do sistema ditatorial em 1975 foi elaborado outro Código de Ética profissional que retrocedeu nos aspectos acrescidos no de 1975. Exemplo desse retrocesso tem-se a retirada de aspectos relacionados à diversidade, ao

pluralismo profissional, demonstrando claramente a oposição e a repressão a qualquer manifestação profissional contrária a conjuntura ditatorial e a algum avanço “democrático”.

O Código de 1975 continuou com o direcionamento ao perfil pedagógico de “participação”, entretanto, retrocedeu elementos do de 1965, defendendo, então, os seguintes princípios de:

I. Autodeterminação – que possibilita a cada pessoa, física ou jurídica, o agir responsável, ou seja, o livre exercício da capacidade de escolha e decisão; II. Participação – que é presença, cooperação, solidariedade ativa e corresponsabilidade de cada um, nos mais diversificados grupos que a convivência humana possa exigir;

III. Subsidiariedade que é elemento regulador das relações entre os indivíduos, instituições ou comunidades, nos diversos planos de integração social.

Observa-se, então, que os Códigos de 1965 e 1975 reafirmam o caráter conservador da profissão, reproduzindo a base filosófica cristã moralizante do exercício profissional e aprofundando um direcionamento político de reprodução da ordem capitalista, com um perfil pedagógico da “participação” reprodutor das relações capitalistas.

Com os primeiros questionamentos contra o regime ditatorial e a luta da sociedade pela redemocratização do país surgem condições políticas propicias para o amadurecimento da categoria e o processo de “ruptura” do Serviço Social com o tradicionalismo, a integração social e o confessionalismo. Isto é, da negação de toda essa base neotomista e conservadora presentes nos Códigos de Ética anteriores. Essa “ruptura”, como já observadas no início do trabalho, aconteceu mais precisamente na década de 1980 do século XX, através das leituras, produção e análise marxista da profissão. Todavia, essa aproximação ocorreu sem o efetivo conhecimento das fontes, apenas por uma leitura enviesada de outros autores acerca do marxismo.

Apreende-se que com a reflexão marxista foi elaborado em 1986 outro Código de Ética profissional, o qual demostrou pela primeira vez desde o Código de 1947 a ruptura com a condição conservadora da profissão, apresentando o compromisso real com a classe trabalhadora e buscando uma nova moralidade profissional. Entretanto, o Código de 1986 refletiu os equívocos de uma leitura mecanicistas do marxismo e a constituição de uma ética sem uma verdadeira reflexão critica na perspectiva de totalidade, mas pensando em uma ética “como uma ciência prescritiva do comportamento moral e, dependendo das condições, num instrumento de controle ideológico” (BARROCO, 2007, p. 158)

Baseado neste entendimento de ética, já pela leitura enviesada do marxismo, o Serviço Social passou a negar a trabalhar nas instituições do Estado que se apresentavam como “aparelhos ideológicos” e reproduziam apenas o interesse da classe dominante. Além disso, o Código de 1986 se compromete com a classe trabalhadora como se esta fosse à detentora de valores positivos, associa a questão destes valores com a classe trabalhadora, visando “aprimorar de forma continua os seus conhecimentos, colocando‐os a serviço do fortalecimento dosinteresses da classe trabalhadora” (CÓDIGO DE ÉTICA, 1986, Art. 3°) sem, no entanto, compreender o caráter contraditório da profissão, confundindo prática política com a dimensão politica da profissão, o que gerou a visão de um militante social e não com um profissional de Serviço Social.

Entretanto, com a releitura da profissão através da apropriação principalmente das leituras mais fiéis ao pensamento de Marx, além das conquistas políticas da sociedade em um contexto de redemocratização da sociedade brasileira, possibilitou um avanço teórico- metodológico muito importante, principalmente na discussão sobre ética, contudo, o Código de Ética de 1986 e seu direcionamento não conseguiu responder teoricamente e operacionalmente a especificidade do exercício profissional. Logo, foi reelaborado em 1993 o Código de Ética81 que continuou a se comprometer com a classe trabalhadora, porém reconhecendo a contradição inerente a profissão, o seu caráter educativo, e a luta de classes nas instituições, de maneira a se perceber como uma profissão assalariada, mas com um comprometimento e princípios ético/político.

Os princípios e a direção social condizem a um perfil pedagógico direcionado a “emancipação”, comprometido com os usuários dos serviços sociais na defesa do principio da liberdade, na busca da autonomia, emancipação e plena expansão dos indivíduos; na defesa dos direitos humanos e da cidadania; no aprofundamento da democracia; na universalidade de acesso; na eliminação de qualquer tipo de preconceito; no respeito ao pluralismo; na articulação com movimentos de outras categorias e com a luta dos trabalhadores, no exercício profissional sem ser discriminado nem discriminar. Estes princípios estão articulados com a finalidade de um projeto profissional “vinculado ao processo de construção de uma nova

81O Código de ética de 1993 é a expressão do ethos profissional vigente na profissão em determinado contexto

histórico, bem como a sua projeção ideal, em termos do perfil ético desejado pela categoria, em consonância com o projeto ético-político profissional. Criado a partir de certas condições históricas, o Código forneceu suporte à coexistência entre uma base normativa elementar acessível a totalidade da categoria e uma orientação teórica e valorativa que expressa o nível mais avançado alcançado pela profissão naquele momento. Portanto o CE contém um dever ser e uma projeção ideal do que poderia ser no sentido das possibilidades éticas ali indicadas. (BARROCO, 2011, p.76)

ordem societária sem dominação e exploração de classe, etnia e gênero,” por isso, deve ser pensada coletivamente e de forma vinculada a sociedade.

Entretanto, em 1990, pelas mesmas condições que possibilitaram essa reflexão e a materialização de uma ética profissional, também se contextualizou um período de grande influência ideológica do capitalismo orquestrado pela ideologia neoliberal, que retrocedeu grande parte dos direitos conquistados pela pressão popular nos anos 1980. Esta ideologia neoliberal privatizou os serviços públicos e as empresas estatais, onde os direitos estabelecidos em lei continuaram apenas na lei e foram ainda mais fragilizados com a intervenção mínima do Estado, pela via da transferência da garantia destes direitos para a sociedade civil, na viabilização da seletividade e a focalização das políticas públicas, e aumentando o desemprego e a miséria social.

Essas questões colocaram em grandes dificuldades as conquistas da população por direitos sociais e, consequentemente, na efetivação de um projeto ético/político direcionado numa perspectiva de um perfil de emancipação. Soma-se a estes aspectos a não superação total do conservadorismo da profissão, uma vez que, por mais que se tenha “rompido” com sua base, ainda é bem presente no exercício profissional o perfil historicamente conservador. Por outro lado, a respeito dessa conjuntura e o projeto ético-político profissional do Serviço Social tem-se:

O acúmulo teórico-politico no âmbito do Serviço Social brasileiro, nesses mais de 30 anos, nos possibilita transitar com radicalidade na defesa intransigente dos direitos sem ignorar as condições sócio-históricas impostas pelo capitalismo, especialmente dos dias atuais, época de criminalização da pobreza, dos movimentos sociais e de suas lideranças; de regressão dos direitos, focalização das políticas sociais, do avanço do conservadorismo e do fundamentalismo, do espraiamento de desvalores e de experiências desumanizantes que interditam o desenvolvimento das potencialidades humanas, como o desemprego, o subemprego, a discriminação, o preconceito e a violência. É tempo de barbárie. (BARROCO; TERRA, 2012, p.20)

Compreendido as dificuldades e contradições da atual conjuntura e a materialização do projeto ético/político da profissão, como também a historicidade dos Códigos de Ética como subsídios de melhor entendimento do direcionamento ético/político da profissão, de maneira a justificar também as tendências pedagógicas dos perfis, principalmente o perfil da “emancipação”, pode-se analisar com mais propriedade as tendências observadas no

cotidiano82 profissional do assistente social na educação em Natal/RN sob a perspectiva de materialização do projeto ético/político, uma vez que:

É preciso demonstrar, no tempo miúdo do trabalho profissional, nas situações singulares com que o assistente social se defronta no exercício profissional- situações essas carregadas tanto de dimensões universais quanto particulares- a viabilidade da direção social impressa ao projeto do Serviço Social brasileiro: seu potencial renovador da profissão na afirmação dos direitos sociais dos cidadãos e cidadãs, na atenção e no respeito às suas necessidades e interesses que, por inúmeras mediações, se transmutam em demandas sociais e profissionais. E com isto, avançar na legitimação da profissão na sociedade, na apropriação e ampliação dos espaços ocupacionais, reforçando a identidade do assistente social. (IAMAMOTO, 201, p. 233)

Desta maneira, a fim de analisar as tendências dos perfis pedagógicos apontadas no cotidiano do exercício profissional e as condições da efetividade do projeto ético/político da profissão versus o projeto societário de hegemonia neoliberal, têm-se as seguintes afirmativas dos assistentes sociais pesquisados a respeito da materialização deste projeto ético/ político no seu cotidiano na educação e a própria concepção deste mesmo projeto. Entende-se que a pergunta sobre como o profissional observa a materialização deste projeto já está inclusa também a sua concepção sobre este, tem-se então:

“Olha, eu tenho que ser sincera com você porque aquela questão da teoria com a prática tem diferença (...) então assim o que a gente vai vivenciando vai enriquecendo o ético-politico, é uma troca de aprendizagem, todo o meu dia-a-dia está enriquecendo o que eu vi na faculdade. Têm muitas barreiras da instituição, que nem sempre você consegue colocar o que aprendeu na pratica, eu percebo isso, você tem limites.” (AS.5)

“São desafios que a gente vê todo dia na nossa pratica ética e política, é difícil porque muitas vezes você não sabe o que queria, eu me deparo com mediar um processo que não é o que eu acredito, mas você vai tentando mediar pra que ninguém saia perdendo. Eu acho que o grande desafio de um assistente social de empresa, independente de escola, é encontrar o caminho da mediação, que ninguém saia perdendo, até porque eu não posso ser hipócrita de ficar tão contra a minha empresa. O tempo todo eu tenho que fazer o caminho de pensar em todos da instituição pra que ninguém saia prejudicado, porque eu tenho a possibilidade de ver o todo. É uma articulação que só a gente percebe a importância. São situações que são muito desgastantes.” (AS.4)

82A vida cotidiana é o espaço de reprodução do trabalho do assistente social. As demandas típicas das

instituições rebatem na dinâmica da cotidianidade, ganhando consistência, pois a heterogeneidade, a repetição, a falta de critica, o imediatismo, a fragmentação, o senso comum, o espontaneísmo são atitudes típicas da vida cotidiana repetidas automaticamente em face da burocracia institucional. Ou seja, a burocracia favorece essa dinâmica. Contudo, não é necessário que seja assim. (BARROCO, 2012, p.73)

As afirmativas deixam entrever de forma geral as dificuldades que os profissionais têm em falar do como este projeto ético-político se materializa em seu fazer profissional. As falas entrecortadas na busca de um recurso teórico isolado, fragmentado como a teoria é diferença na prática, na primeira afirmativa, e a busca da categoria “mediação” - entendendo-a como articulação de interesses para que ninguém saia perdendo- na segunda afirmativa, denotam bem essas dificuldades: a não apropriação do entendimento e compreensão do projeto ético- político em sua essência.

Observa-se que na primeira afirmativa embora enfatize a questão da diferença entre a teoria e a prática, o profissional traz a questão da vivência no seu fazer profissional, que o leva ao enriquecimento da dimensão ético-político. Para o mesmo, verifica-se uma troca de aprendizagem, uma vez que “todo o seu dia-a-dia está enriquecendo o que ela viu na faculdade". Abstrai-se daí a reflexão da dimensão educativa que tem o trabalho profissional, considerando que se verifica um redimensionamento e reelaboração dos conhecimentos adquiridos na formação profissional nos espaços ocupacionais, embora contraditoriamente enfatize que não consegue aplicar na prática o que aprendeu na formação profissional em razão das dificuldades institucionais.

Ademais, não colocou quais são essas dificuldades, de que forma percebe a materialização do projeto ético/político nas suas atividades cotidianas e o que entende por esse projeto. Apenas fica entendido que o projeto ético-político é aquilo que se aprendeu na teoria, porém não se compreende o que significa este na concepção do entrevistado.

Na segunda afirmativa ao tentar falar da materialização do projeto ético/político o recurso da “mediação” é visto como um grande desafio, uma vez que ela se concretiza na articulação entre os interesses da instituição, os interesses do profissional na sua prática e os dos usuários. O profissional pela via de mediação, enquanto articulador nas relações sociais no âmbito institucional intervém na perspectiva de que os interesses de todos da instituição sejam garantidos, inclusive o seu enquanto assistente social. Para o profissional, seu grande desafio na “empresa” escolar é fazer essa mediação de interesses, até porque não pode ir contra ao seu contratante, mesmo que discorde, é precisa fazer “conciliação” entre o que a profissão defende, as demandas dos usuários e o que a instituição determina.

Verifica-se, portanto, a tensão existente entre o exercício profissional com sua relativa autonomia dotado de liberdade e de teleologia83 e a sua condição de assalariado que precisa responder ao seu empregador, na maioria das vezes, com demandas burocráticas que vão de

83 Capacidade do homem em realizar projeções futuras e materializar seus projetos na realidade concreta.