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2. O PERCURSO METODOLÓGICO E DE REFLEXÃO CRÍTICA

2.3. O Diagnóstico Rápido Participativo DRP

2.3.3. A compreensão

2.3.3.1. A Matriz Lógica para Identificação do Perfil Comunitário MLIPC

A concepção da matriz MLIPC, utilizada para este patamar investigativo, iniciou- se a partir dos resultados da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO – 92), realizada no Rio de Janeiro em 1992, contidos no documento final aprovado e denominado de Agenda 21. Este documento representa um pacto de compromissos pela mudança do modelo de desenvolvimento mundial, compatibilizando-o com o equilíbrio ambiental e a justiça social, sob a égide do Desenvolvimento Sustentável (que atenda as necessidades sociais e econômicas mediante o uso adequado dos recursos naturais, socializando os seus resultados e desenvolvendo politicamente a população). Para viabilizar esta proposta, estabeleceram-se como premissas a participação dos diferentes segmentos sociais nos processos de gestão ambiental, participação esta que implicou na ampliação do acesso à informação e na descentralização dos processos de decisão, planejamento e execução das ações necessárias, promovendo-se uma esfera pública ampliada (poder público e sociedade atuando em conjunto).

A partir desta conferência e com base nas suas decisões, o governo brasileiro implementou a elaboração da Agenda 21 Brasileira (MMA, 2000; Consumers International, 2002; MMA, 2003) que induziu o surgimento de experiências de planejamento local com base nos mesmos princípios. Dentro deste contexto surgiu a iniciativa metodológica “Inovation Compass”, idealizada pelo austríaco Robert Lukesh com os objetivos de:

a) instrumentalizar sociedade e poder público locais para a tarefa de investigar sistematicamente a realidade em que se situam;

b) sistematizar este conhecimento sob a ótica do desenvolvimento sustentável, identificando pontos fortes e fracos desta realidade;

c) planejar participativamente as ações necessárias para reforçar os aspectos positivos e corrigir as deficiências;

d) implementar estas ações mediante projetos específicos mas interligados pela necessidade holística do desenvolvimento sustentável;

e) avaliar periodicamente a realidade sob intervenção, viabilizando a identificação dos avanços e de falhas passíveis de replanejamento.

A primeira aproximação regional da metodologia “Inovation Compass”, porém, em função das próprias especificidades locais da Amazônia, apresentou necessidades de adequações operacionais, tais como simplificação da linguagem, do preenchimento e redução das variáveis investigadas, entre outras. Este trabalho foi elaborado à época pelo pesquisador11, para aplicação no município paraense de Acará, onde se realizou uma tentativa de implementação de desenvolvimento sustentável nos moldes preconizados pela Agenda 21. O método (denominado então de “Bússola Inovadora”) teve como concepção global que as ações para o desenvolvimento local deveriam ser geradas de forma participativa, alicerçadas em estudo sistemático e compartilhadas da realidade local, com base em informações oficiais e do saber tradicional das populações locais envolvidas. E concebia nove fatores de desenvolvimento para a matriz a ser preenchida por grupos de estudo, contendo perguntas específicas e passíveis de notas variáveis entre 1 e 5 (identificando-se como problemas a enfrentar aquelas respostas com nota < 3) :

1. Meio Ambiente (qualidade ambiental, consciência ambiental da população, características regionais, potencial produtivo sustentável dos recursos naturais, estrutura fundiária e infraestrutura de serviços públicos sociais básicos);

11 MIRANDA et all, 2002

2. Recursos Financeiros (a dinâmica local de investimentos, a existência e suficiência dos serviços financeiros, arrecadação municipal frente às demandas sociais, grau de endividamento público e privado, políticas de incentivos, capitalização da população e sistemas informais de trocas de bens e produtos); 3. Gestão Pública (o grau de democratização dos processos públicos de decisão e

administração, a eficiência e efetividade das políticas de desenvolvimento, a autonomia e o poder de negociação público/sociedade);

4. Recursos Humanos (saúde, demografia, oportunidades de trabalho e renda, bem estar social e relações sociais);

5. Mercados (graus de desenvolvimento das cadeias produtivas locais e de aproveitamento dos recursos naturais, nível acesso dos produtores aos processos de beneficiamento de produtos e de comercialização);

6. Capacidades (níveis de organização social e suas influências reais, oportunidades de educação e profissionalização, tecnologias e conhecimentos tradicionais utilizadas);

7. Imagens (consciência territorial e cultural da população, auto-imagem, nível de mobilização social para mudanças, divulgação extra-município de produtos, bens e serviços);

8. Atividades Produtivas (infraestrutura econômica e tecnológica, estrutura e consciência empresarial, produtividade e geração de trabalho e renda, além do nível de acesso da população aos meios de produção);

9. Identidades (normas e comportamento, valores e sistemas de crenças, mediação de conflitos, senso de identidade comunitária e normas sócio- culturais).

A partir desse diagnóstico inicial, a matriz foi sistematicamente testada e reformulada pelo pesquisador ao longo dos últimos sete anos, a partir das observações realizadas nas aplicações da mesma em outros diagnósticos, buscando torná-la fundamentalmente um instrumento de expressão dos atores sociais (pesquisando-se os dados oficiais em separado e das formas tradicionais), com linguagem acessível e inserida nas especificidades locais. Além disso, criou-se um referencial de notas mais facilmente assimilável pelos atores e também uma nova ótica de discussão dos resultados: considerando- se os problemas (média < 3), mas também as potencialidades locais (média > 3). Chegou-se assim, à matriz utilizada no presente estudo de caso, estruturada em cinco eixos de

desenvolvimento, com dez perguntas relacionadas em cada eixo, totalizando 50 indagações a serem avaliadas e pontuadas pelos grupos de estudo, com ajuste final em discussão plenária:

Quadro 2:Estrutura da Matriz Lógica para Identificação do Perfil Comunitário-MLIPC

MATRIZ LÓGICA PARA IDENTIFICAÇÃO DO PERFIL COMUNITÁRIO - MLIPC

1.Capital Ambiental 2.Capital 3.Governança 4.Capital Social 5.Capital Humano

e Sócio-cultural Produtivo

Qualidade hídrica Acesso à terra Participação no Solidariedade interpessoal Formação escolar

Fauna ictiológica Titulação da terra planejamento público União interlideranças Formação profissional Flora nativa Energia Elétrica Participação nos Mobilização para a ação Conhecimentos locais Fauna silvestre Transporte Conselhos Municipais coletiva organizada Criatividade e interação

Solos Mercados Saúde Participação eleitoral das lideranças

Clima Investimentos próprios Educação Participação sindical Criatividade e interação Conhecimento e uso Acesso ao crédito Água e Saneamento Participação associativa dos agentes externos dos Recursos Naturais Assistência técnica Transporte Percepção s/ a atuação atuantes localmente Consciência ambiental e Fomento Segurança local de agentes externos Qualidade de Vida local

Fonte: MIRANDA (2002; 2004; 2005; 2007; 2009), com base em LUKESH, 1997 e MMA, 2000 (ver anexo III).

E a partir das informações fornecidas por este instrumento, realizaram-se as discussões e tomadas de decisões sobre as potencialidades econômicas, sociais, ambientais, políticas e culturais disponíveis para o desenvolvimento local, conforme descrito no próximo capítulo.