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Como já discutido, a busca de soluções sustentáveis para as questões sociais e econômicas, no Brasil e na Amazônia, tem alimentado rediscussões da visão desenvolvimentista local, acrescentando-lhe os ingredientes do desenvolvimento territorial e endógeno e da sustentabilidade ambiental, econômica e social, consolidando-se no conceito de desenvolvimento territorial sustentável.

Dentro desta lógica, surgiu na última década a abordagem dos Arranjos Produtivos Locais – APL’s, como modelo de integração econômica territorial e de sua inserção na economia globalizada, considerando os interesses e demandas das economias locais. Nessa linha de raciocínio, Barquero (2002), deixa implícita a necessidade da aglomeração produtiva, processo que tem como uma de suas alternativas os APL’s, que Lima e Lopes (2003) conceituaram como “um aglomerado de empresas (constituído por unidades de pequeno e médio porte, com ou sem a presença de uma grande empresa), localizado em um território, com foco em um conjunto específico de atividades econômicas e que mantém vínculos de articulação entre as unidades participantes e delas com outros atores institucionais (governo, associações, estabelecimentos de crédito, etc)”. Ou como aglomerações territoriais de agentes econômicos, políticos e sociais (focado em conjunto específico de atividades econômicas), articulados entre si, mesmo de forma incipiente (ADA, sd). Ou ainda como aglomerações de empresas localizadas em um mesmo território, com especialização produtiva e com vínculos de articulação, interação, cooperação e aprendizagem, entre si e com outros atores locais, tais como: governo, associações empresariais, instituições de crédito, ensino e pesquisa (SEBRAE, 2009).

Essa abordagem sobre APL’s surgiu a partir do crescimento da globalização da economia, quando se intensificou a necessidade da reorganização dos fatores produtivos e os modos de gestão empresarial com a finalidade de compatibilizar a organização com padrões internacionais de qualidade e produtividade (OLAVE e NETO, 2009). As organizações passaram a adotar novas formas de gestão, de trabalho e inovação nos seus produtos e nos seus processos produtivos, buscando se ajustar às exigências mundiais. E essas novas formas implicaram, principalmente, em estratégias de formação de redes entre empresas para garantir a sobrevivência e a competitividade das pequenas e médias empresas (id ibid). Nesse sentido, as redes de empresas formam-se com o objetivo de reduzir riscos e incertezas, organizando a gestão com base na coordenação e cooperação entre empresas, configurando-se como redes flexíveis, clusters (aglomerados) de empresas, cadeias produtivas, ou como redes de cooperação (LEON, 1988). Representando uma nova forma de organização econômica em um contexto particular de estrutura social (conexões de interesses mútuos e reputação, pouco vinculadas a estruturas formais de autoridade) (POWEL, 1990, apud OLAVE e NETO, 2009). Ou ainda, um modo de agrupamento de empresas destinado a favorecer o funcionamento de cada uma delas pelo compartilhamento dos meios produtivos e das redes de distribuição, sem laços financeiros obrigatórios entre si (RIBAULT, 1995). E que como características principais apresentam (ADA, sd):

a) dimensão territorial, ou seja, espaço definido de ocorrência dos processos produtivos (município, áreas de um município, conjunto de municípios, microrregião, conjunto de microrregiões, etc);

b) diversidade (de atividades, de atores econômicos, políticos e sociais); c) conhecimento tácito (não codificado mas implícito, de compartilhamento e

socialização de tecnologias e estratégias operacionais);

d) governança (formas centralizada, descentralizada, mais ou menos formalizada, de gestão das atividades, produção, distribuição, além da geração, disseminação e uso de conhecimentos e inovações).

Na região amazônica, essa concepção de APL foi introduzida pelo SEBRAE (por volta de 2002) e mais recentemente adotada pela Agência de Desenvolvimento da Amazônia – ADA.

A primeira instituição objetivou, com a incorporação do conceito, promover no universo produtivo em que atua a cultura de cooperação e aprendizado coletivo, a geração, aquisição e difusão do conhecimento, o fortalecimento de governança e identidade local, além da construção de parcerias econômicas em âmbito nacional, regional e local.

A segunda, como órgão estatal de desenvolvimento regional, internalizou o conceito operacionalizando estudos sobre a realidade amazônica 6 objetivando a indicação dos APL’s mais ajustados aos critérios de um desenvolvimento regional sustentável e formar um portfólio para norteamento das ações da instituição, do Ministério da Integração Nacional e outros órgãos federais (ADA, sd).

Na região amazônica e no cenário das pequenas coletividades (principalmente rurais e baseadas na economia familiar), todavia, esse conceito de desenvolvimento endógeno com base nos APL’s, encontra-se limitado em suas perspectivas concretas. A significativa ausência do Estado na microeconomia, a incipiente organização social dos produtores, a ausência objetiva de modelos sustentáveis para explorar os recursos naturais disponíveis, a reduzida e dispersa escala de produção, a restrita agregação de valor à produção local, a informalidade econômica predominante, além do atrelamento histórico dos produtores aos intermediários comerciais, impedem a utilização vigente do conceito de APL em estudos de casos como este, que aborda comunidades tradicionais. Isso não significa rejeição à idéia dos APL’s, pois em termos gerais ela se enquadra perfeitamente na lógica de sobrevivência

6 SANTANA, Antonio Cordeiro de. Arranjos Produtivos Locais da BR-163: contribuição ao planejamento estratégico territorial. Belém, ADA, 2005.

comunitária regional: como os pequenos produtores familiares se organizam no cotidiano econômico, para sobreviverem. O que limita a adoção do conceito atual é a sua configuração a partir de empresas (por menores que sejam), e que implica em graus de organização, cooperação e inserção mercadológica que as coletividades tradicionais ainda não possuem. Em face disso, utilizou-se este tipo de abordagem sistêmica das pequenas economias locais sob uma ótica de subsistência, abandonando a caracterização empresarial por uma configuração de negócios, em prol de uma análise de arranjos produtivos locais dentro da realidade tradicional cabocla, onde:

a) a produção é de pequena escala, baseada em um leque diversificado e não- especializado de produção;

b) inexiste maneira formal de gestão, sendo a mão de obra de base familiar e alicerçada no trabalho informal;

c) a produção é voltada para a manutenção da unidade familiar, com reduzidos excedentes para o mercado;

d) as experiências associativas e/ou cooperativas são frágeis e com histórico significativo de fracassos;

e) as unidades familiares de produção encontram-se fortemente atreladas aos intermediários (locais ou externos) nos processos de comercialização;

f) a assistência técnica, creditícia, de fomento e mercadológica encontra-se muito aquém do necessário.

Nesse sentido, analisou-se as atividades econômicas (existentes e/ou desejadas) do lócus da pesquisa, como Arranjo Produtivo Local de Subsistência - APLS, entendido como sistema de produção local articulado informalmente com base nas redes sociais estabelecidas, pelas unidades familiares de produção localizadas no território, com foco em um conjunto específico de atividades econômicas e que mantém vínculos tradicionais de articulação entre si e marginalmente com o mercado e as instituições (governo, associações, estabelecimentos de crédito, etc). Isto é: pequenos negócios que, embora não se enquadrem no conceito formal de APL, potencialmente poderão vir a sê-lo, na medida em que as forças produtivas locais avancem em termos organizacionais, tecnológicos, gerenciais e de escala produtiva.