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2 EXCLUSÃO FINANCEIRA: DIRECIONAMENTO DE PESQUISA,

3.2 A metodologia

Apesar de este estudo tratar de exclusão financeira e, portanto, de uma questão econômica, há uma discussão que percorre o comportamento do indivíduo e, por conseguinte, podem-se transpor alguns limites das disciplinas acadêmicas. É possível se prever o diálogo de fatores e elementos pertencentes à economia financeira, economia da pobreza, sociologia e, até mesmo psicologia. Isto se esclarece quando se propõe a abordagem de sistemas econômicos, dos quais atores individuais livres e responsáveis pelas suas escolhas influenciam a efemeridade e temporalidade de uma determinada realidade social.

Este trabalho considera a vertente teórica que descreve a economia enquanto uma ciência social moral (Bresser-Pereira, 2003; Boulding, 1969), seguindo a ideia da teoria econômica como um conjunto de conceitos e modelos (nem sempre coerentes entre si) que permite o estudo do sistema econômico sob diferentes ângulos. Isto é, a noção da economia como uma ciência social que possui como objeto de investigação o comportamento, de certa forma, livre dos indivíduos e as suas próprias normas e políticas que eles constituem para direcionar seus comportamentos. Dessa maneira, pretende-se desenvolver um trabalho que siga a condição do fazer científico de qualidade moral, a modéstia, a qual é necessária para que o pesquisador, diante de um modelo explicativo melhor, reconheça este fato e refute suas verdades defendidas até então.

Ainda, para este estudo é fundamental se considerar as condições e limitações impostas aos agentes pelas características estruturais, culturais e institucionais da sociedade, que são acima de tudo históricas. Na esfera social, causas e consequências se misturam, visto que a consequência tende a retroalimentar a suposta causa. Segundo Bresser (2009), a realidade social por estar em constante mudança e por ser composta por atores individuais é inerentemente histórica e contraditória. Esta condição se dá, em grande parte, pelo fato de que os atores individuais, embora estejam sujeitos ao seu entorno social, são livres e responsáveis por suas escolhas e ainda, estão em processo de aprendizado (mudam com a experiência), o que implica que eles alteram as estruturas sociais e criam cultura e instituições que, por sua vez, influenciam diversamente as preferências individuais.

A pesquisa de acordo com seus propósitos apresentados anteriormente, então, considera o método histórico-dedutivo, segundo a abordagem do fato histórico novo proposta por Bresser (2009), a qual, apesar de se basear na observação da realidade econômica histórica, supõe que o pesquisador estará sempre alerta para o surgimento de novos fatos no contexto social e econômico atual. Tal método exige que o pesquisador inclua na realidade social e econômica, que é objeto de seus modelos explicativos, as convenções, as rotinas ou as instituições estabelecidas pelo homem (fatores que atribuem o caráter efêmero à realidade social e aos sistemas econômicos).

Ressalta-se, novamente e enfaticamente, que os fatos econômicos ou as relações econômicas são efêmeros e temporais, o que implica que as generalizações que são necessárias à formação de uma teoria devem ser limitadas e provisórias. As realidades complexas que compõem os sistemas econômicos exigem modelos abertos (Dow, 1996, Chick, 2004). Segundo Dow (1996), ao considerar o sistema aberto, não há conhecimento ou a possibilidade de conhecimento de todas as variáveis que o compõe e de todas as relações estruturais, o que impossibilita a noção de seus limites.

Assim, a investigação desenvolvida aqui está fundamentada no que foi descrito acima e se caracteriza como exploratória, uma vez que aborda uma inserção nos espaços sociais, foco deste trabalho, onde foram realizados estudos etnográficos.

A metodologia utilizada, adequada aos propósitos e condições possíveis, foi a descritiva e qualitativa, ou seja, que expõe as características de determinadas populações ou determinados fenômenos e analisa a problemática através da observação do ambiente estudado e dos agentes envolvidos.

3.2.1 O estudo etnográfico – outro olhar sobre a etnografia

A etnografia se iniciou no âmbito da antropologia como um trabalho de “coleta de objetos e vivências” em expedições pelos locais reconhecidamente mais exóticos do mundo (Valsiner, 2002). A princípio, então, envolvia registros descritivos de uma comunidade ou cultura alheia ao que era considerado usual na rotina das regiões do ocidente em geral, ou seja, referindo-se às análises comparativas e históricas de sociedade e de culturas não ocidentais. Dessa maneira, surgiu para denotar uma integração da investigação empírica e da interpretação teórica e comparativa relativa à organização social e à cultura (Hammersley e Atkinson, 2007).

O termo etnografia, reconhecidamente, com o passar dos tempos, toma uma vasta proporção e se fundamenta em uma história um tanto interessante e respeitável, envolvendo também a ideia de esforços realístico e sociologicamente aplicados na tentativa de elucidar um número limitado de temas específicos. A verdade, porém, é que se deve admitir que o significado deste termo pode variar e, embora represente uma das abordagens possíveis de uma pesquisa social, sofre uma sobreposição de denominações consideráveis, como “pesquisa qualitativa”, “trabalho de campo”, “método interpretativo, “estudo de caso”, refletindo claramente, através destas, limites semânticos vagos, marcadamente indistintos (Hammersley e Atkinson, 2007).

A condução da etnografia pode ser vista como enganosamente simples, contrastando-se com a busca de uma pesquisa quantitativa. Talvez esta consideração se fundamente, em geral, na consciência do fato de que a pesquisa etnográfica não pode ser programada, de que sua prática é repleta de eventos inesperados. Diante disso, há que se admitir que o curso de tal trabalho não pode ser predeterminado, da mesma forma que os problemas não podem ser

antecipados e não há como se prever as estratégias para lidar com eles. Entretanto, ressalta-se que, apesar de tais argumentações, um projeto de pesquisa é crucial para o sucesso de todo o processo.

O trabalho etnográfico envolve a imersão do pesquisador no dia-a-dia dos indivíduos, por um período de tempo considerável, de forma que permita a observação do que ocorre no local, a escuta do que é dito entre os moradores, realizando perguntas em entrevistas informais ou formais, coletando dados e artefatos - arrecadando qualquer tipo de informação que seja disponível para elucidar as questões que fundamentam o foco principal da pesquisa (Hammersley e Atkinson, 2007).

Atualmente, pode-se observar uma transformação corrente dos objetivos das pesquisas sociais, de forma a incluir novas possibilidades no que se refere aos problemas enfrentados pela sociedade contemporânea e, juntamente a este novo movimento, a etnografia também está evoluindo para se adaptar a esta nova urgência de se compreender o que ocorre nas comunidades próximas e nos locais usuais, ou seja, os eventos de rotina da área antes reconhecida comumente como “lado ocidental” ou “parte civilizada” do mundo. A consciência de que os problemas atuais enfrentados nos países em geral precisam ser estudados de perto, estimulam a pesquisa etnográfica nas áreas mais acometidas por eles. Dessa maneira, há desmistificação de que para se fazer etnografia é necessário ir até o “fim do mundo” a fim de encontrar um campo de trabalho e o esclarecimento de que pode ser mais enriquecedor voltar-se à área mais próxima no intuito de realizar uma investigação etnográfica (Valsiner, 2002).

Diante deste outro olhar sobre a etnografia, destaca-se que é possível cobrir a maior parte dos aspectos imagináveis da vivência das pessoas através destes procedimentos etnográficos – saúde, doenças, crime, educação, desvios comportamentais, ciência, infância, objetos materiais, dentre outros. Além disso, processos sociais tais como comunicação, relações econômicas e outros, são também analisados por investigações etnográficas. Talvez o principal desafio seja a consistência a ser mantida na pesquisa etnográfica com relação às áreas de aplicação empírica, assumindo-se o compromisso com a descrição verídica e o método sistemático associado à consciência reflexiva (Valsiner, 2002).

O desenvolvimento das abordagens etnográficas nas ciências sociais proporciona ao amplo público a possibilidade de acessar informações, em narrativas extremamente ricas e verídicas, sobre contextos significantes em que vivem as pessoas da sociedade em geral, incluindo detalhados aspectos políticos, sociais, econômicos e culturais. A etnografia direcionada ao estudo dos problemas sociais (objetos das ciências sociais), ao proporcionar uma rica e detalhista descrição, fundamentada por um método de análise científica (definição de problemas, formação de hipóteses e testes), assegura a significância do empirismo qualitativo (contrariando a dominância geral do empirismo quantitativo). Assim, contraria a opinião e prática de muitos que consideram a etnografia uma vertente de uma literatura de caráter jornalístico, sem valor consistente enquanto pesquisa científica (Liebow,1967, Elijah,1999, Elijah, 2011). Vale ressaltar que o procedimento etnográfico, com o objetivo de seguir esta metodologia qualitativa, proporciona uma riqueza de informações contextuais que permitem conhecimentos das condições e situações adversas características de um universo específico, os quais não se podem obter através dos mais sofisticados métodos quantitativos.