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2 EXCLUSÃO FINANCEIRA: DIRECIONAMENTO DE PESQUISA,

2.4 Uma revisão teórica sobre Exclusão Financeira – Conceitos e Concepções

2.4.2 Breve revisão literária mais recente sobre a exclusão financeira: os

sistema financeiro

Ao se considerar indivíduos que possuem condições de vulnerabilidade social e econômica consideráveis, ao ponto de não conseguirem participar dos processos sociais que determinam as chances de vida das pessoas ou, ao menos, resistir aos possíveis choques de forma favorável (sem se prenderem em situações cíclicas de débitos) e, diante disso, os mesmos são desprovidos de qualquer ajuda, oferta de serviços adequados ou atividades relacionadas por parte das instituições financeiras formais, tem-se a visualização clara da exclusão financeira associada de maneira óbvia à exclusão social (Lenton e Mosley, 2012).

Diante disso, resgata-se a discussão sobre cidadania financeira desenvolvida acima e destaca-se as denominações não bancarizados e sub-bancarizados que, respectivamente, se referem aos seguintes graus daquela condição: ausente e limitada. No primeiro caso, estariam aqueles que não utilizam ou acessam a conta bancária em qualquer instituição financeira formal. No segundo caso, são os indivíduos que possuem acesso limitado ou utilizam de forma restrita os serviços e produtos financeiros (Dymski, 2007b, Barr, 2004).

Lento e Mosley (2012) apontam enfaticamente a necessidade de serviços financeiros acessíveis em termos de preços e de condicionantes para que as pessoas de baixa renda sejam capazes de evoluir e construir um capital mínimo, ainda que aos poucos. Criticam, portanto, assim como outros investigadores deste tema, as estratégias dos bancos convencionais, uma vez que, visando a maior lucratividade, eles seguem políticas preestabelecidas de riscos e custos, as quais favorecem as pessoas mais abastadas em detrimento daqueles indivíduos que sofrem por estarem presos a uma situação de intensa vulnerabilidade – ou seja, que se encontram à margem da sociedade (Crocco, Santos, Figueiredo, 2013, Dymski, 2007b).

Os graus de exclusão financeira analisados anteriormente, em um estudo das regiões brasileiras realizado por Crocco, Santos e Figueiredo (2013), são apontados como adequados à ênfase necessária às peculiaridades existentes de

cada área investigada, corroborando a ideia de que aquela possui, realmente, um componente territorial marcante. Argumentam, portanto, que o sistema bancário é incapaz não somente de atender o território de forma equilibrada (determinando a exclusão financeira por acesso), mas também de prover produtos e serviços que sejam adequados às especificidades locais de onde atua (configurando a exclusão financeira por serviço). Assim, como não há diversificação dos serviços e produtos financeiros oferecidos pelas instituições formais, os indivíduos assumem a condição de sub-bancarizados, uma vez que não se enquadram no perfil específico idealizado segundo as políticas de oferta. As características regionais, dessa maneira, são apontadas como uma das dimensões a serem exploradas do que seria um fenômeno mais geral de exclusão social, a exclusão financeira.

Dymski (2007b) atenta para a importância de se compreender o que significa realmente a cidadania financeira. Mais do que não ter acesso aos serviços básicos financeiros, ou ter um acesso restrito aos produtos e serviços financeiros, sob tarifas e taxas injustas, há que se focar o quanto tais condições prejudicam a sustentabilidade da família ou dos indivíduos e se elas realmente interferem na falta de funcionalidade econômica de uma parcela da população. Sugere, com base nestes fatores, que no Brasil, dividir a população entre os que possuem serviços bancários e os que não possuem fornece pouca indicação sobre quem é excluído financeiramente, uma vez que há uma oferta crescente por parte de instituições e agentes formais e informais direcionados à população de baixa renda, a qual é formada por famílias cada vez mais fragilizadas e enterradas em obrigações de dívidas. O autor propõe, assim, termos alternativos como: financeiramente incluído, financeiramente explorado e financeiramente isolado. Dessa maneira, dilui a responsabilidade direcionada somente aos bancos como os vilões das taxas e custos abusivos, apontando a existência e a atuação de outras instituições e agentes (dentre estes se incluem financeiras, lojas comerciais que oferecem crediários, dentre outros), considerados também como aqueles que possuem (incluindo os bancos) uma parte da culpa sobre a marginalização social dos indivíduos não bancarizados e ou tomadores de empréstimos sobreviventes.

A partir deste ponto, resgatando-se a pesquisa organizada pelo Ministério de Desenvolvimento Social de Combate a Fome (MDS, 2010-2011), ressalta-se a importância de se discutir sobre a racionalidade por trás das ações financeiras das famílias, apesar de não ser possível a previsão prévia em uma investigação do que é “racional” e do que “não é racional” com relação ao comportamento das mesmas. Isto remete ao fato de que não há o certo ou o errado em pesquisas com o público, as lógicas das comunidades dependem de suas vivências e do que é realmente necessário às suas vidas. Este trabalho foi desenvolvido com famílias fragilizadas que apresentavam dificuldades de realizar um planejamento financeiro, dadas suas condições vulneráveis, mas que possuíam interesse em educação financeira e a consciência da importância de se guardar dinheiro. Tal trabalho, dessa maneira, conclui que há uma demanda reprimida e um problema social a serem equacionados por meio da implementação de políticas públicas de educação financeira voltada para os pobres.

2.5 Conclusão

A discussão apresentada neste capítulo introduz a exclusão financeira como associada à exclusão social, o que reflete a ausência de oportunidades favoráveis àqueles que possuem condições de desvantagens, impedindo que estes evoluam socialmente e economicamente.

Este trabalho considera a literatura que trata de Moeda e Espaço, envolvendo a ideia básica de que a economia é profundamente “sensível” às variáveis financeiras, de forma que, o nível de desenvolvimento financeiro (a localização e os tipos de agências financeiras/filiais, a geografia dos serviços financeiros) afeta o fluxo de crédito em determinadas áreas geográficas (“periferias regionais”). Não compreende, porém, um objetivo desta pesquisa focar nas relações importantes e complexas que existem ou que podem não existir em nível regional ou nacional e que estão relacionadas ou são manifestações da exclusão financeira (“macro exclusão financeira”).

Portanto, este estudo, desenvolvido nos próximos capítulos, propõe uma análise dos “microfundamentos” da exclusão financeira, destacando “como” os indivíduos

veem e vivenciam esta situação, abordando também todas as dimensões da mesma. Desse modo, uma parte da concepção desta pesquisa é mostrar como as diferentes ideias sobre a exclusão financeira se relacionam entre si. Esclarece-se, entretanto, que não é somente uma questão de acesso aos serviços e produtos financeiros, discutindo também sobre as práticas exploratórias e outros condicionantes, de tal forma a desenvolver uma análise diferenciada e, portanto, a ideia de desigualdade financeira induzida.

Por fim, ressalta-se, o que será evidenciado adiante, que a exclusão financeira não é somente uma questão territorial física, mas também está associada às estruturas sociais que acompanham as estruturas econômicas e aos sentidos sociais que estão envolvidos nestas estruturas socioeconômicas. Tudo isto, de certa forma, determina a participação ou o não envolvimento com os produtos e processos financeiros e pode conduzir a uma nova forma de se entender a exclusão financeira.

3 METODOLOGIA DO ESTUDO

Revela-se aqui o propósito desafiador de se realizar uma análise “micro” da exclusão financeira, elucidando o efeito dos aspectos espaciais sobre a relação dos indivíduos com o sistema financeiro, discutindo as possíveis dimensões que esta situação pode revelar, a depender do local abordado.

Esclarece-se, então, a maneira como foi realizada a pesquisa exploratória em três “campos” distintos, mas que compartilham a classificação em cada área de “locais com grande vulnerabilidade social e econômica”. Isto permite a análise de exclusão financeira e pobreza, já mencionada anteriormente, voltando-se para o ponto fundamental de como os indivíduos, em cada localidade fragilizada, podem enfrentar o “estrangulamento financeiro”, tendo em vista as situações adversas, as urgências de necessidades básicas e as condições desfavoráveis de privações econômicas e desvantagens sociais.

O questionário aplicado em cada área considera, dessa forma, as particularidades locais, bem como as instituições financeiras presentes (ou não) e os serviços aos quais as pessoas podem ter acesso ou devem utilizar, ainda que representem um prejuízo desigual econômico.

Ressaltam-se as dificuldades enfrentadas em cada campo de pesquisa e a possibilidade dos dados primários simples gerados, com o fim de retratar a realidade descrita de maneira honesta. Isto caracteriza a riqueza do estudo etnográfico desenvolvido, e, portanto, o conhecimento específico gerado sobre determinados locais em condições de grande vulnerabilidade social e econômica e a relação de seus residentes, em sua maioria, de baixa renda com os serviços financeiros disponíveis (impossível de se obter e visualizar através de uma investigação que envolva somente dados secundários).