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A montanha dos sete abutres

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A questão das apropriações

DESCRIÇÃO DOS DEBATES

1. A montanha dos sete abutres

Os debates foram realizados nos dias 26, 29 e 30 de abril de 2013 após a exibição dos filmes mencionados para as turmas do segundo semestre de Jornalismo. Somando as três turmas, foram respondidos 37 questionários.

O primeiro debate foi realizado no dia 26 de abril com a turma do segundo semestre de Jornalismo do FIAM-FAAM Centro Universitário do campus Morumbi. Esta pesquisadora lecionou a disciplina Informação e Formação da Opinião Pública para a turma. O filme exibido foi A montanha dos sete abutres, dirigido por Billy Wilder. A obra foi apresentada das 8h às 10h30 e depois foi realizado um debate conduzido por um ex-aluno, entre 10h30 e 11h15.

Pode-se perceber alguns aspectos interessantes no debate, que foi gravado. O posicionamento do jornalista Charles Tatum, mais preocupado com sua carreira e dar um furo jornalístico do que com a vida de Leo Minosa, preso em uma caverna, foi o grande tema discutido no debate. O condutor perguntou: “Até onde você está disposto a ir por uma boa história? Vocês trocariam uma história mediana e verdadeira por uma fantástica e falsa. Ele ultrapassou a ética. E vocês, fariam o mesmo? Até onde vocês se acham capazes? Vocês conhecem seus limites?” A maioria dos alunos comentou que é contra o posicionamento do jornalista e que não se deve fazer tudo em nome de uma notícia. Uma aluna disse:

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Ter uma grande história é uma coisa e criar uma grande história é algo totalmente diferente. Você pode perder o rumo da história, afetando a vida de uma pessoa. Uma estudante disse que cada área tem seus limites:

Cada área tem um ponto de vista próprio. E também tem a questão de o que é certo para mim, para você não é.

Outra estudante diz que ele faz um circo, estavam ali esperando um espetáculo:

Se parar para analisar, ninguém estava se importando se o cara estava vivo. Eu achei isso um absurdo. Ele cria uma situação e acaba matando uma pessoa. E ele usou a família. Você tem de ter ética mesmo em situações menores, no trabalho. Você deve buscar ser um profissional o mais correto possível.

No entanto, a aluna considera a situação real e que apesar de não desejar ser uma jornalista como a apresentada, achou o filme realista e a situação plausível. Uma estudante explicou que infelizmente na televisão isso ocorre com frequência e que o público deseja mesmo ver catástrofes e notícias ruins, algo que o personagem de Kirk Douglas destaca na obra com a frase “Good news is no News”:

Infelizmente as pessoas querem ver catástrofe. O jornalista é induzido a abordar a notícia de outra forma, principalmente nesse tipo de meio.

Outra estudante reiterou essa percepção:

Notícia é notícia ruim, ele falou para o outro repórter. A gente tem de concordar que infelizmente é verdade.

Quanto ao papel do jornalista, a maioria acredita que o jornalista é um formador de opinião e por isso pode influenciar positivamente ou negativamente na trajetória de um fato, como no caso da Escola Base, em que os proprietários de uma escola foram acusados injustamente pela imprensa pelo abuso sexual de alguns alunos:

Eu acho que o jornalista forma opinião, tanto para o bem quanto para mal. E ele não só persuade, ele conduz a história.

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2. Intrigas de Estado

O segundo debate foi realizado no dia 29 de abril de 2013 e foi conduzido por uma ex- aluna, após a exibição do filme Intrigas de Estado. Ela começou o debate comentando que o filme trazia vários temas que podem ser debatidos. Um deles é o sensacionalismo, maneira como a mídia aborda a morte de Sonia Baker, assistente do deputado interpretado por Ben Affleck e que teria tido um caso com ele.

Um aluno disse que todos os veículos estavam comentando, então é preciso abordar o assunto também e procurar chamar a atenção dos leitores, mas que muitos fazem isso abusando da emoção, drama, notícias sobre a vida íntima das celebridades, características do jornalismo sensacionalista, como o presente em tabloides ingleses como The sun e The mirror e no Brasil em jornais como Meia hora, no Rio de Janeiro e programa de televisão como Cidade Alerta. Uma aluna comentou:

Então se mostra a verdade nua e crua e eles resolveram publicar (sobre a morte de Sonia Baker, assiste do congressista interpretado por Ben Affleck).

Outro tema é a questão do conflito de interesses, pois o personagem Cal (Russel Crowe) é amigo de faculdade do deputado e prefere não escrever sobre ele enquanto não tiver mais dados para não prejudicar a amizade. Além disso, Cal teve um caso com a esposa de seu amigo e sente-se culpado por isso. Ela perguntou aos alunos como fica essa questão do conflito de interesses. Uma aluna respondeu que era necessário cuidado para não se deixar levar pela situação. Outra estudante disse:

Ele manteve a ética jornalística na apuração dos fatos, mas em relação ao amigo ele foi parcial.

Já um estudante que faz estágio na área de televisão disse que o que confere credibilidade em uma reportagem é que o repórter fazer entradas ao vivo:

Entradas ao vivo conferem credibilidade às reportagens. Provam que “o repórter esteve lá”. Além disso, seguram o público, que espera para saber o que vai ocorrer.

Depois a debatedora comentou que a obra mostra as diferenças na forma de apuração e divulgação do jornalismo impresso e do online e questionou o que os estudantes pensavam

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sobre o tema. Um aluno comentou que todos os veículos haviam abordado sobre a morte de Sonia Baker, então o veículo mostrado no filme, The Washington Post, foi obrigado a apresentar uma notícia sobre o tema, pelo menos na internet, que é mais rápida. Na versão impressa, tiveram mais tempo de investigar, entrevistar fontes e analisar os fatos.

Não existe a possibilidade de deixar aquilo passar, se não começa a esfriar. Tudo é publicado conforme critérios de noticiabilidade, tanto no impresso como no online.

Foram também comentadas as questões de gênero e as diferenças na forma como atuam os dois personagens principais, Cal (Russel Crowe) e Rachel McAdams. Enquanto o primeiro gosta de levantar detalhes e ir a fundo em uma investigação jornalística, procurando montar o quebra-cabeça, a personagem de Rachel McAdams é mais ágil, típica da geração que convive com internet desde cedo. Como diz Cameron Lynne, a chefe interpretada por Helen Mirren: “Gosto dela. Ela é rápida, barata e produz dez notícias por hora”.

Quanto à oposição entre jornalista mais jovem e mais experiente, que é explorado também em Todos os homens do presidente, os alunos consideraram positiva a troca entre os dois. Cal ajuda Della a conquistar mais confiança e a se impor perante a editora, quando ela deseja colocar um jornalista com mais experiência. O jornalista também deu apoio quando ela viu um homem ser morto na sua frente quando fazia a vigília de uma vítima em coma no hospital, que é baleado por saber demais sobre o responsável pela morte da assistente do congressista, Sonia Baker. Os alunos disseram que ela também ajudou Cal a se tornar mais rápido e também não se influenciar pela amizade que tinha com o congressista, o que fazia com que ele preferisse retardar a publicação da reportagem.

Outro aluno comentou que o jornalismo investigativo é caro para as empresas, por isso há preferência por alguém que consiga escrever muitas notícias e mais rápido, como a personagem de Rachel McAdams, que escreve para o blog do jornal e segue mais a linha de infotainment (informação e entretenimento):

No jornalismo investigativo demoram meses para chegar a um resultado, que é o perfil de um jornalismo mais antigo. E esse tipo de reportagem pode não ser divulgado, se apresentar algum conflito e interferir em questões econômicas. Depois a debatedora perguntou quais eram os rumos da mídia mundial na opinião dos estudantes. Uma aluna comentou que a maior preocupação hoje é conseguir audiência e

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devido à internet, os editores querem mais e mais textos para abastecer os portais com conteúdos:

Querem sempre mais histórias e versões dos fatos.

Dessa forma, o jornalismo investigativo, mais caro e trabalhoso, fica de lado. Ela ainda destacou que a mídia prefere muitas vezes o caminho do sensacionalismo, falar sobre celebridades. Outro aspecto abordado foi a questão de interesses comerciais em jogo, das empresas que patrocinam os meios de comunicação e acabam interferindo no conteúdo editorial das publicações. Uma aluna comentou:

Quando uma notícia envolve o nome de uma empresa, ela não deseja que as pessoas saibam o que está ocorrendo. E aí mesmo se o repórter conseguir descobrir fatos importantes, não pode divulgar pela questão do patrocínio.

Durante o debate os alunos lembraram de outros filmes que analisaram para o trabalho da disciplina Informação e Formação da Opinião Pública, como Obrigado por fumar, Repórteres de guerra e Tropa de Elite 2.

A respeito de Obrigado por fumar (Thank you for smoking, EUA, 2004 – Direção: Jason Reitman), destacaram o comportamento pouco ético da jornalista interpretada por Kate Holmes que tem um envolvimento amoroso com o vice-presidente da Academia de Estudos do Tabaco, Nick Naylor (Aaron Eckhart) para conseguir informações confidenciais de como atua a indústria do tabaco.

Cena do filme Obrigado por fumar. Fonte: Globo.com.

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Sobre Tropa de Elite 2: o inimigo agora é outro (Brasil, 2010 - Direção: José Padilha) os alunos destacaram as diferenças de uma investigação jornalística no Brasil, envolvendo questões políticas e o tráfico de drogas e o perigo que o jornalista que faz esse tipo de cobertura sofre. Na obra, a jornalista Clara (Tainá Müller) acaba sendo assassinada, quando encontra material de campanha política em uma casa de uma comunidade no Rio de Janeiro, o que comprova que traficantes estavam ajudando no financiamento de uma campanha política. Ela acaba sendo morta barbaramente e seu corpo é queimado, como ocorreu com o repórter Tim Lopes, morto quando fazia uma investigação sobre exploração sexual e tráfico de drogas.

Cena do filme Tropa de Elite 2, o Inimigo agora é outro. Fonte: YouTube.

A respeito de O quarto poder, disseram que se trata de um filme em que o jornalista interpretado por Dustin Hoffman, Max Brackett conduz totalmente a notícia, levando um homem que foi despedido de um museu, Saim Baily (papel de John Travolta) fazer crianças reféns. Comentaram também como o filme aborda a questão de estereótipos, pois como ele atira sem querer em um guarda negro e o público pode pensar que ele é racista, o jornalista interpretado por Dustin Hoffman pede que libere uma garota negra. Nesse momento lembraram também temas abordados em sala de aula relativos ao livro Opinião pública, de Walter Lippmann, que traz questões sobre estereótipos e criação de pseudoambientes (imagens criadas na mente das pessoas a partir das informações que obtêm pela mídia). No entanto, o filme acaba em tragédia, mostrando os perigos do jornalismo que busca apenas audiência, sem se importar com vidas humanas.

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Cena do filme O quarto poder. Fonte: Filmes e Games.

Outro filme citado no debate foi Repórteres de guerra, que mostra a vida de quatro repórteres que cobrem os conflitos presentes na África do Sul pouco antes de sua primeira eleição democrática, após um longo período de apartheid. O filme foi exibido em sala de aula e os alunos destacaram o papel do fotógrafo Greg Marinovich (Ryan Phillippe) que buscou a verdade na história entre o conflito entre os Inkatha e os meninos de Mandela. Ele sofreu riscos para ouvir os dois lados da história, pois os jornalistas preferiam falar apenas com os meninos de Mandela, pois consideravam os Inkhata perigosos. Ao buscar a verdade, Greg conseguiu assim não só atuou como fotógrafo, mas conseguiu obter os dois lados da notícia, entendendo melhor a posição dos Inkhata, que não queriam fazer greve como proposto pelos meninos de Mandela, pois tinham que sustentar suas famílias.

Foto mostrada no filme Repórteres de Guerra. Fonte: El Observador.

Comentaram também sobre o filme a questão da responsabilidade do jornalista ao presenciar uma cena triste ou a eminência de uma tragédia. No filme, o fotógrafo Kevin Carter (Taylor Kitsch) vê uma menina bem fragilizada, à beira da morte, ser observada por

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um urubu. Ele vê a foto como um símbolo da miséria da África e tira uma imagem que vira capa em jornais de todo mundo, como Le Monde e The New York Times. A imagem chama a atenção da opinião pública pelo seu impacto e para a situação de fome que passam muitas pessoas em países da África. No entanto, o fotojornalista acaba sendo criticado por colegas de profissão, que o questionaram sobre se ajudou fisicamente a menina. Carter explicou na época que não a ajudara, pois não podia fazer nada naquele momento. Mas que ao registrar a imagem, ajudou muito mais. Os alunos comentaram sobre a responsabilidade do jornalista e se o mais importante é registrar um momento ou salvar uma pessoa que corre risco de morte.

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