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Retorno com o elixir

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Análise da estrutura da Jornada do Herói e mitodológica das obras consideradas representativas

ANÁLISE DAS OBRAS CONSIDERADAS REPRESENTATIVAS 1 A montanha dos sete abutres

12) Retorno com o elixir

Trata-se do fim, em que Charles Tatum se entrega à bebida, ao perceber que foi responsável pela morte de uma pessoa, sentindo-se um completo fracasso.

Fonte: Townsville Classic Movies. Análise mitodológica

Mitocrítica

Considerado um marco na história de filmes sobre jornalistas, é um dos primeiros que traz a notícia transformada como entretenimento, mostrando como a mídia pode ser sensacionalista na busca pela audiência. É um dos primeiros que aborda questões éticas, ao mostrar um jornalista que interfere deliberadamente no rumo dos acontecimentos. Um dos diálogos mostra isso. Quando Tatum se apresenta para o seu novo chefe, o Sr. Boot, editor do The Albuquerque Sun, ele diz: “Sou um ótimo repórter, para grandes histórias e para pequenas histórias. E, se não houver história nenhuma, eu saio para a rua e mordo um cachorro.”

Entre os mitemas presentes no filme estão a do jornalista boêmio e cínico, que se entrega a vícios, como a bebida, como o personagem Charles Tatum (Kirk Douglas). Mesmo tendo uma segunda oportunidade de se regenerar, ele acaba causando a morte de um homem, preocupado em ascender na carreira como jornalista. O final é trágico, mostrando o jornalista completamente entregue aos vícios e se sentindo um fracasso.

Outro mitema presente é o da femme fatale, na figura de Lorraine Minosa (Jan Sterling), mulher de Joe Minosa (Richard Benedict) e que não tem nenhum afeto pelo marido e busca seduzir o jornalista Charles Tatum (Kirk Douglas) apenas por interesse financeiro e buscando a fama.

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Analisando no contexto histórico e social, trata-se do primeiro filme de inúmeras produções cinematográficas que criticaram os jornalistas e o papel da mídia, que utiliza muitas vezes do sensacionalismo, criando um verdadeiro “circo midiático”. Como explica Isabel Travancas no artigo “Jornalista como personagem de cinema”, a visão crítica do diretor Billy Wilder remete à ideia de Theodor Adorno e Max Horkheimer da indústria cultural (apud LIMA, 2002, p. 169-214) como indústria de diversão, cuja ideologia é o lucro:

Quando o filme exibe o “circo” criado em torno da montanha, formado por visitantes das mais diversas regiões dos Estados Unidos que vieram “participar” e se divertir com o salvamento de Leo Minosa, assim como quando Charles Tatum decide que o resgate do mineiro será feito com uma broca, o que levará mais tempo e permitirá aos envolvidos – ele, o xerife e a esposa de Leo – lucrarem mais, é inevitável a associação com os dois autores. Adorno e Horkheimer não acreditam em saída para a indústria cultural. Os jornais visam o lucro e os jornalistas buscam o furo e a notoriedade. E quanto a isso não farão concessões. Por outro lado, o filme faz uma crítica à sociedade consumidora destes produtos, destas notícias sensacionalistas redigidas com o único objetivo de vender jornal. O diretor intensifica seu ponto de vista nos diálogos e no desenrolar da trama, onde tudo é exagerado. O repórter interpretado por Kirk Douglas, um jornalista inteiramente obcecado pela profissão, não tem defeitos amenizados pelo filme, assim como a esposa do xerife. No seu lançamento o filme foi duramente criticado ou ignorado pela imprensa da época (TRAVANCAS, 2001, p. 7-8).

É também uma obra típica do período pós-Segunda Guerra Mundial, em que há uma certa desilusão, que trazem mitemas do personagem cínico (Kirk Douglas) e da femme fatale (Jan Sterling), típicos do film noir, com luzes e sombras.

A obra também contribuiu na conceituação de notícia, com a famosa expressão: “Good news is no news.” (“Notícia boa não é notícia”). Tatum diz a frase quando afirma que a notícia para ser atraente, precisa ter interesse humano, por isso ele busca criar o soterramento. E o repórter busca ao máximo que essa situação perdure, pedindo que tirem o mineiro por meio de brocas, o que leva muito mais tempo e com isso o fato ganha mais destaque na mídia nacional, atraindo um grande número de curiosos ao local. E enquanto Tatum de certa forma fabrica a notícia, ele apenas comenta: “Eu não faço as coisas acontecerem, eu só escrevo”.

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2. Todos os homens do presidente

Na obra Todos os homens do presidente, temos outra imagem do profissional de imprensa: os repórteres Carl Bernstein (Dustin Hoffman) e Bob Woodward (Robert Redford) querem obter um “furo de reportagem”, no entanto, são cuidadosos em relação à apuração e apresentam uma ética que não se observa no personagem Charles Tatum. São comprometidos com o público e a informação e em nome deles, irão buscar a verdade, trazendo a público um dos maiores escândalos da história política norte-americana, episódio conhecido como “Watergate”, nome do edifício do Comitê do Partido Democrata, que foi invadido e espionado por colaboradores do Partido Republicano, do presidente Richard Nixon.

O trabalho dos jornalistas acabaria conduzindo ao impeachment do presidente dos EUA e imortalizaria a figura dos repórteres como exemplo a ser seguido de bom jornalismo. Trata-se do trabalho jornalístico levado às últimas consequencias, um jornalismo informativo e objetivo à prova de suspeitas ou denúncias.

Verdadeira aula de jornalismo, no filme pode-se ver como apurar, como utilizar fontes sigilosas (como o famoso “Garganta Profunda”, nome de filme pornô e fonte que mais ajudou nas investigações) e como juntar as peças de um “enorme quebra-cabeças” que conduziu à deposição do então presidente Richard Nixon. O filme ainda traz a marca da verossimilhança, sendo rodado na própria redação do jornal The Washington Post, a pedido de Robert Redford.

Matthew C. Ehrlich, na obra Journalism in the movies, ressalta a diferença entre os dois repórteres. Carl Bernstein era filho de judeus que eram ativistas políticos e pertenciam ao partido comunista. Nascido em Washington, começou cedo na profissão, aos 16 anos, como copyboy no jornal Washington Star. Ele se mudou para Greenwich Village em 1965 e rapidamente construiu sua reputação no Elizabeth Daily Journal. Segundo o autor da biografia dos repórteres, Adrian Havill, na obra Deep truth, Bernstein era uma mistura de Jack Kerouac com Tom Wolfe.”15

Enquanto Bernstein cresceu simpático à contracultura (ele tentou trabalhar como crítico de rock na prestigiada revista Rolling Stone), Woodward tinha um temperamento oposto. Ele nasceu em uma família protestante em Illinois e fez faculdade em Yale, serviu a Marinha Norte-Americana. Em 1971, ele começa a trabalhar no jornal The Washington Post, onde conhece Carl Bernstein.

15 Havill, Adrian. Deep truth. New York: Birch Lane Press, 1993. pp. 37-39 apud Ehrlich, Matthew. Journalism

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Tudo começou na manhã de 17 de junho de 1972, quando os policiais prenderam pessoas que haviam invadido Watergate, edifício que abrigava o Comitê do Partido Democrático. Woodward e o repórter de polícia Al Lewis cobriram a notícia para o Post. Um dos invasores confessou que havia trabalhado na CIA. Na manhã seguinte, o repórter de polícia Gene Bachinski teve acesso aos itens obtidos pelos invasores. Um deles era um caderno ligando os invasores à Casa Branca. Nos próximos meses o jornal The Washington Post continuou a publicar notícias sobre a história, com Woodward e Bernstein conduzindo a investigação jornalística. Eles descobriram que a invasão ao prédio Watergate estava ligada ao chefe de departamento de Richard Nixon, H.R. Haldeman. Ele tentou desacreditar o jornal, mas logo se confirmou que a história estava correta. Mesmo assim, Nixon foi reeleito duas semanas depois. No entanto, no ano seguinte, as investigações sobre “Watergate” no Senado passaram a ser transmitidas para todo o país e a opinião pública ficou contra o presidente, conduzindo ao seu impeachment em agosto de 1974.

Depois de muita especulação, em 2003 os estudantes da Universidade de Illinois descobriram que a famosa fonte “Garganta Profunda” era o conselheiro da Casa Branca, o deputado Fred Fielding. Bernstein disse que a investigação da classe violou os princípios jornalísticos, revelando uma fonte secreta. O instrutor Bill Gaines respondeu que “se um jornalista quer realmente proteger suas fontes não pode dar pistas de quem seja a fonte ou escrever um livro ou um filme sobre o assunto” (Erhlich, 2004, p. 113).

Ehrlich diz que não importa se Bernstein e Woodward exageraram na descrição de sua fonte, mas queriam contar uma boa história, ainda mais ao perceber o interesse de Hollywood. Quem primeiro se interessou em transformar o livro dos repórteres em filme foi Robert Redford, em 1972, quando promovia seu filme O candidato. Os jornalistas tinham combinado com a editora que escreveriam uma obra sobre a corrupção no governo Nixon desde a década de 1970. Redford os encorajou a escrever só sobre a investigação de “Watergate”, pois achava que renderia um filme melhor e ofereceu US$ 450 mil em direitos autorais:

The movie, starring Redford as Woodward and Dustin Hoffman as Bernstein, accentuated even more the journalist’s role in Watergate and cloak-and-dagger aspects of the story. Under director Alan J. Pakula, the film adopted a noir-like look and feel, portrayed the reporters as serious but small and anonymous figures, and depicted the paper and its editor as fearless foes of corruption. All the

president’s men was the third of what has been called Pakula’s paranoia trilogy,

following Klute (1971) and Parallax view (1974) (EHRLICH, 2004, p.127-128).16

16 Tradução da pesquisadora: “O filme, que era estrelado por Redford como Woodward e Dustin Hoffman como

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A obra recebeu 4 Oscars: Melhor Ator Coadjuvante (Jason Robards), Melhor Direção de Arte (George Jenkins e George Gaines), Melhor Som (Arthur Piantadosi, James E. Webb, Les Fresholtz e Dick Alexander) e Melhor Roteiro Adaptado (William Goldman).

Análise segundo a estrutura da Jornada do Herói

Utilizando a estrutura proposta por Christopher Vogler, o filme pode ser analisado da seguinte maneira:

Primeiro ato:

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