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A morte vira notícia

No documento A metamorfose de Zero Hora (páginas 103-107)

MATÉRIA PRINCIPAL

5 Criminalidade e segurança pública

5.1 A morte vira notícia

Relatório divulgado na Conferência Mundial sobre Armas Leves, promovida pelas Nações Unidas, “afirma que, a cada ano, 500 mil pessoas morrem, em média, devido a disparos de armas convencionais, e que o fato de quase a metade das vítimas ser jovens

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indica que é afetado o setor mais produtivo da população.” (Diário Do Povo do Piauí, 27/06/2006: 16)

Ao todo, há em circulação 639 milhões de armas leves no mundo, ou seja, uma por cada 10 pessoas. Essas armas são fabricadas por 98 países diferentes. Os principais países exportadores de armas pequenas e leves são Brasil, Rússia, Estados Unidos, Itália, Alemanha e China. Os maiores países importadores são o Chipre, e os próprios Estados Unidos e Alemanha (...). (Diário Do Povo do Piauí, 27/06/2006: 16)

Segundo o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania, ligado à Universidade Cândido Mendes, a taxa de homicídios dos países da Europa Ocidental é de aproximadamente três por grupo de 100 mil habitantes e a dos Estados Unidos é de cinco por 100 mil. “Estudo comparativo de Luke Dowdney (Crianças no tráfico. 7 Letras, 2003) mostrou que se morre mais por armas de fogo no Rio de Janeiro do que em países que estiveram em conflito armado, como Iugoslávia, Serra Leoa, Afeganistão, Uganda, Israel e Colômbia” (RAMOS e PAIVA: 16).

De 1980 a 2002, 695 mil brasileiros foram assassinados. A taxa de homicídios no Brasil mais que duplicou nesses vinte e três anos, passando de 11,7 para 28,5 homicídios por 100 mil habitantes – índice que coloca o Brasil entre os países mais violentos do mundo. Durante muito tempo a sociedade e as instituições brasileiras assistiram a essa matança em silêncio. Afinal, as mortes atingem majoritariamente grupos desfavorecidos: jovens do sexo masculino (especialmente na faixa de 15 a 24 anos), na maioria pobres, quase sempre negros e moradores de periferias ou favelas dos grandes centros urbanos. (RAMOS e PAIVA: 01)

A quantidade de homicídios projeta negativamente o país. Apenas a Venezuela ostenta mais mortes por armas de fogo que o Brasil. O ranking, elaborado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), com dados de 2000 a 2003, leva em consideração 57 países. No Japão, último colocado na lista, o índice não chega a uma pessoa para cada grupo de 100 mil (ZH, 06/05/2005: 72).

Em anos mais recentes, a quantidade de homicídios dolosos se estabiliza, em decorrência de mudanças na legislação, em especial a criminalização do porte de armas e as campanhas em favor do desarmamento.

As Polícias Civis registraram 54.696 ocorrências de crimes violentos letais intencionais no Brasil, em 2004, e 55.312 ocorrências, em 2005. Estes crimes são compostos pela agregação dos homicídios dolosos, lesões corporais seguidas de morte, roubos seguidos de morte e mortes a

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esclarecer (...). Os homicídios dolosos correspondem a 74% dos crimes violentos letais e intencionais. (Análise das Ocorrências Registradas pelas Polícias Civis, 2006: 20)

Quase três quartos dos crimes com mortes praticados no Brasil, em 2004 e 2005, são intencionais.

As Polícias Civis registraram 40.240 homicídios dolosos no Brasil, em 2004, e 40.845 homicídios dolosos, em 2005. Deste total, aproximadamente 45% ocorreram na região sudeste e 28% ocorreram na região nordeste. São Paulo foi o Estado onde ocorreu o maior número destes crimes em 2004 e 2005, concentrando cerca de 20% dos crimes ocorridos no Brasil. (...) Em termos de taxas do número de registros por 100 mil habitantes, verificamos que a região norte é a que possui a maior taxa, seguida pela região nordeste. Comparando as taxas dos diversos Estados, verificamos que as maiores taxas encontram-se no Rio de Janeiro, Pernambuco, Alagoas e Espírito Santo, e as menores taxas encontram-se no Piauí e Santa Catarina. (Análise das Ocorrências Registradas pelas Polícias Civis, 2006: 60)

Rodrigo Azevedo, doutor em sociologia e integrante do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, explica que:

O homicídio tem três grandes dinâmicas. No Brasil, 30% dos assassinatos são praticados por quadrilheiros ou por policiais. Outros 30% são passionais, no lar. E 30% eventuais, fruto de desentendimento na rua ou em bares. Nas grandes cidades, os homicídios entre quadrilhas superam 50% do total, em função do tráfico de drogas. – Para inibir os homicídios passionais e eventuais, as campanhas de desarmamento dão certo. Para acabar com as mortes entre quadrilhas, há dois caminhos, ambos envolvendo a polícia: investigação e patrulhamento das ruas. (ZH, 29/05/2005: 38)

Se os homicídios são um problema em todo o país, é nas regiões metropolitanas que ele se agrava. Entre 1998 e 2002, pesquisa realizada pelo Senasp indica que a média da taxa de vítimas de homicídio por 100 mil habitantes nas regiões metropolitanas foi de 46,7. Este valor está bem acima da média da taxa nacional de vítimas de homicídio neste mesmo período, que foi de 28,6 vítimas por 100 mil habitantes. Ou seja, a incidência de homicídios nas regiões metropolitanas é quase duas vezes maior que a incidência nacional. Em Porto Alegre, de 2000 a 2004, a taxa média anual de homicídios por grupo de 100 mil habitantes foi de 23,2, segundo a Secretaria de Estado da Justiça e da Segurança38. Já na região metropolitana a situação é um tanto mais grave:

A análise dos dados de vítimas de homicídios registrados pelo Ministério da Saúde por municípios de residência das vítimas, entre 1998 e 2002, na

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Região Metropolitana de Porto Alegre, mostra que apenas a capital Porto Alegre concentra 39,1% do total de homicídios. Em 2000, cerca de 36% da população da Região Metropolitana de Porto Alegre concentravam-se na capital. (...) Entre 1998 e 2002, o crescimento percentual das taxas de vítimas de homicídios registrados por 100 mil habitantes para o Brasil foi de 5,6%, sendo que o estado do Rio Grande do Sul cresceu 16,4% e a Região Metropolitana de Porto Alegre apresentou crescimento de 23,8%. (...) A imensa maioria das vítimas de homicídios, na Região Metropolitana de Porto Alegre, em 2002, era do sexo masculino (91%), sendo que a maior parte das vítimas possuía entre 15 e 24 anos de idade (39%).39

Entre 1998 e 2002, aproximadamente 30 mil pessoas morreram a cada ano, vítimas da violência, em apenas 26 Regiões Metropolitanas pesquisadas pela Senasp. Nesse período, ocorreu um aumento de 9,4% no número de homicídios40. Mas não apenas os crimes contra a vida afetam a rotina dos brasileiros. Roubos e furtos têm crescido bastante em todo o país, oferecendo farto material para análise da imprensa e para a produção de pequenas notas ou grandes reportagens.

As Polícias Civis registraram 907.116 roubos no Brasil, em 2004, e 942.036 roubos, em 2005. Deste total, aproximadamente 53% ocorreram na região sudeste e 20% ocorreram na região nordeste. Comparando as taxas dos diversos Estados, verificamos que as maiores taxas

encontram-se no Rio de Janeiro, São Paulo, Ceará, Rio Grande do Sul e

Distrito Federal (...). (Análise das Ocorrências Registradas pelas Polícias Civis, 2006: 99. Grifo nosso)

(...)

As Polícias Civis registraram 2.156.812 furtos no Brasil, em 2004, e 2.152.681 furtos, em 2005. Deste total, aproximadamente 46% ocorreram na região sudeste e 22% ocorreram na região sul. São Paulo foi o Estado onde ocorreu o maior número destes crimes em 2004 e 2005, concentrando cerca de 30% dos crimes ocorridos no Brasil. (...) Comparando as taxas dos diversos Estados, verificamos que as maiores

taxas encontram-se no Distrito Federal, São Paulo, Acre, Rio Grande do Sul e Roraima (...). (Análise das Ocorrências Registradas pelas

Polícias Civis, 2006: 106. Grifo nosso)

Confirmando uma tendência já identificada no final do Século XX, em 2004 e 2005 os crimes contra o patrimônio no país são mais freqüentes que os outros crimes analisados. Conforme mostra a pesquisa,

a chance de um brasileiro ser vítima de roubo foi 23 vezes maior do que ser vítima de um homicídio doloso. (...) é possível identificar que os crimes violentos letais e intencionais e os não letais contra a pessoa passam por um período de estabilidade, os crimes violentos contra o

39 http://www.mj.gov.br/senasp/estatisticas/custos/estat_custos_econ.htm 40http://www.mj.gov.br/senasp/estatisticas/custos/estat_custos_econ.htm

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patrimônio e delitos envolvendo drogas passam por um período de incremento (...). Em relação aos indicadores criminais específicos, é importante destacar a queda de homicídios dolosos e furtos entre os

anos de 2004 e 2005. Por outro lado, os roubos aumentaram

significativamente neste período. (Análise das Ocorrências Registradas pelas Polícias Civis, 2006: 16. Grifo nosso)

Devido a fatores relacionados à realidade social revelados nas estatísticas e outros (políticos, econômicos, institucionais) que não são tão evidentes, os assuntos sobre a segurança pública ganham especial relevância na última década, no RS. Mas, sem dúvida, um dos elementos que podem ter influenciado o destaque do tema em Zero Hora é o acesso a informações sobre o crime.

O grau de cobertura das informações encaminhadas pelas Polícias Civis, ou seja, do total de delegacias da Polícia Civil existentes em cada Estado e quantas nos enviaram informações estatísticas, varia principalmente em função da maturidade e informatização dos sistemas de registro de ocorrências já existentes nos Estados. Assim, por exemplo, há Estados onde já existem redes informatizadas que interligam todas as delegacias e bases de dados que sistematizam periodicamente as estatísticas coletadas destas delegacias. Por outro lado, há Estados onde inexistem estruturas como estas e o esforço para produzir uma estatística estadual se transforma em uma atividade difícil, demorada e de baixa garantia da qualidade da informação.

(...)

Avaliando as informações sobre cobertura dos dados, verificamos que a maior parte dos Estados possui alta cobertura, com valores acima de 90%. Os Estados que se destacam por ter cobertura de praticamente 100% são Bahia, Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Rio Grande

do Sul, Rondônia, São Paulo, Sergipe, Goiás e Tocantins. (Análise das

Ocorrências Registradas pelas Polícias Civis, 2006: 13. Grifo nosso)

Se no final dos anos 90 poucas são as UF que possuem delegacias informatizadas e um sistema central que analisa e trata as informações sobre o crime, a realidade observada no final de 2005 é bem melhor. Contudo, ainda persistem realidades regionais nas quais a qualidade das informações é muito precária.

No documento A metamorfose de Zero Hora (páginas 103-107)