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O Direito Internacional Privado é o ramo da ciência que estuda o conflito de leis no espaço, determinando qual norma, lei interna ou lei estrangeira, deverá ser aplicada em casos que envolvem relações privadas que contenham conexões internacionais113. Nessa esteira, por

meio de sua legislação interna ou através de tratado internacional (instrumento do Direito Internacional Público), um Estado irá determinar qual lei será aplicada quando um negócio ou fato jurídico contar com elementos de estraneidade (estrangeiro) que envolvam dois ordenamentos jurídicos diferentes.

No Brasil, por exemplo, a LINDB – Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - e o próprio Código de Processo Civil, contêm dispositivos que irão apontar o elemento de conexão e qual norma deverá ser seguida, bem como os tratados que o Estado brasileiro faz parte. Ou seja, a lex fori é quem vai indicar qual norma deverá ser observada na questão conflituosa.

Constitui, portanto, exceção ao princípio da territorialidade, qual seja, o de que em um determinado território será aplicado as normas internas desse Estado. Nesse caso, em virtude de uma lei interna ou tratado internacional que indique que a norma a ser aplicada ao caso seja uma lei estrangeira, o próprio Poder Judiciário estará obrigado a aplicar a norma alienígena dentro do território pátrio.114

Dessa forma, o Direito Internacional Privado tem suas fontes no direito interno e no Direito Internacional Público. O primeiro constitui a própria produção normativa de cada

113 PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Op. Cit. 114 Idem

Estado. Já o segundo são as normas internacionais, manifestadas através de tratados. Além desses, os costumes, os princípios gerais do direito, os princípios do Direito Internacional Privado, a doutrina, a jurisprudência, os atos de organizações internacionais e o soft law também constituem fontes dessa disciplina115.

Esse ramo do direito tem como principais institutos, dentre outros, a qualificação, a ordem pública, o reenvio, a reciprocidade e o direito adquirido. Assim, para melhor compreensão do tema, faz-se primordial um breve estudo acerca do instituto da ordem pública no Direito Internacional Privado.

A ordem pública, nas palavras de Paulo Henrique Gonçalves Portela116, constitui os

aspectos fundamentais de um determinado ordenamento jurídico, da estrutura do Estado e da sociedade, abrangendo as noções de soberania e bons costumes. Beat Walter Rechsteiner117

complementa dizendo que o instituto será aplicado nos casos em que um ato ou norma estrangeira está incompatível com os princípios da ordem jurídica interna. Desse modo, uma norma estrangeira não será aplicada no território de um Estado se aquela ofender a ordem pública deste. No Brasil, a LINDB traz essa previsão em seu artigo 17118.

Segundo Valério de Oliveira Mazzuoli119, o instituto acima está presente em quase todos

os países com o intuito de limitar a aplicação da lei estrangeira dentro do território de um Estado soberano, negando a aplicação daquelas que ofenderem seus direitos fundamentais, a justiça, a moral e seus costumes. Além disso, o autor informa que a exceção de ordem pública é de uso excepcional, somente devendo ser lançada quando houver real ofensa ao ordenamento de um país.

Assim, usando o tema da pesquisa como exemplo, uma decisão brasileira que determinou a prisão civil ao devedor de alimentos que reside em outro Estado nacional, caso a legislação interna deste não preveja a aplicação do instituto, estaria a decisão ofendendo, cumulativamente ou não, a ordem pública, a soberania ou os bons costumes daquele país e,

115 Ibidem

116 Idem

117 RECHSTEINER, Beat Walter. Direito Internacional Privado: teoria e pratica. 6a ed. São Paulo: Saraiva,

2003.

118 Art. 17. As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer declarações de vontade, não terão eficácia

no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes.

119 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional Privado. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense,

desse modo, a decisão não irá ser aplicada no território estrangeiro por faltar os pressupostos básicos do Direito Internacional Privado.

Nesse ínterim, percebe-se que a ordem pública remete a aplicação, ou não, de uma norma ou um ato de um Estado estrangeiro no território nacional. Oscar Tenório120 discorre que

o citado instituto constitui defesa jurídica de um país contra leis e atos provenientes do exterior que, eventualmente, possam causar perigo aos princípios estabelecidos no ordenamento jurídico interno. Jacob Dolinger121 aduz que é princípio mais importante da disciplina.

No entanto, é importante destacar que a ordem pública pode ser aplicada no direito internacional e em âmbito interno. É uma só, mas que incidirá, no primeiro caso, na relação entre os estrangeiros e os Estados como uma barreira, uma espécie de proteção ao seu ordenamento jurídico. No segundo caso, atua com relação aos seus cidadãos, na relação entre eles e entre eles e o próprio Estado, não podendo, por ato voluntário, as partes afastar uma norma imperativa a todos. Restringe, dessa forma, a vontade destes122. Negi Calixto123 destaca,

ainda, que a ordem pública é intrínseca a própria figura do Estado, possuindo duas funções: internacional e interna, como já visto alhures.

Portanto, como informa a LINDB, os efeitos da declaração de exceção de ordem pública em ato ou decisão proveniente do estrangeiro não terão eficácia no Brasil. Do mesmo modo, em um processo de cooperação jurídica internacional ativa, a lei ou decisão brasileira, para ter eficácia no território estrangeiro, deverá estar de acordo com os princípios da ordem jurídica do país requerido, sem incompatibilidades com sua ordem interna.

120 TENÓRIO, Oscar. Direito Internacional Privado. Vol. I. 7 ed. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1961. 121 DOLINGER, Jacob. Direito Internacional Privado (Parte Geral). 2 ed. atualizada. Rio de Janeiro: Renovar,

1993.

122 HUMPHREYS, Luís Fernando Lisbôa. A exceção de ordem pública no direito internacional privado.

Universidade Federal do Paraná. Monografia. Curitiba, 2005.

123 CALIXTO, Negi. Ordem Pública: exceção a eficácia do direito estrangeiro. Paraná: Editora Universidade

4 AS CONVENÇÕES INTERNACIONAIS SOBRE ALIMENTOS QUE O BRASIL FAZ PARTE

No presente estudo, precisamente por meio desse tópico, serão abordadas brevemente as principais convenções internacionais sobre alimentos dos quais o Brasil faz parte. Tais convenções se revestem de uma importância singular para a solução de demandas alimentares quando há ordenamentos jurídicos distintos. Em nosso país, os procedimentos internos para a cobrança alimentar estão bem regulamentados juridicamente. Ocorre que, quando envolve diferentes ordenamentos, como é o caso de existir uma das partes residindo no exterior, o processo se torna mais lento por existir incompatibilidades legais e procedimentais. Daí a importância das convenções internacionais para solucionar ou, ao menos, diminuir as barreiras existentes para que o objeto da obrigação alimentar seja cumprido.

Nesse sentido, na existência de uma demanda alimentar onde há uma parte situada no Brasil e a outra no exterior, a convenção em que ambos os Estados fazem parte ditará o procedimento a ser seguido para a solução do caso. No entanto, caso o outro Estado não seja signatário de nenhuma das convenções das quais o Brasil é signatário, a solução será por meio da cooperação jurídica internacional, com fundamento na reciprocidade.

Assim, não são todos os países que fazem parte das Convenções Internacionais de Alimentos em que o Brasil é Estado contratante. Nesse caso, a cooperação jurídica internacional se mostra primordial para o regular processamento de ações alimentícias, bem como sua execução, quando envolver de um lado o Brasil e de outro um Estado sem um tratado internacional com o nosso país.

Dessa forma, o Código de Processo Civil em seu art. 26, §1º, aduz que na ausência de tratado internacional, a cooperação poderá se dar por meio da reciprocidade, manifestada por via diplomática. Entretanto, a reciprocidade não será exigida quando se tratar de homologação de sentença estrangeira (art. 26, §2º, do CPC). Ainda, quando estiver em curso a cooperação jurídica internacional, o código processual declara que não será admitido ato que contrarie ou produza resultado incompatível com as normas que regem o ordenamento jurídico pátrio (art. 26, §3º, do CPC), e designou o Ministério da Justiça/DRCI para exercer a função de autoridade central (art. 26, §4º, do CPC).

Nesse ínterim, o procedimento padrão nos casos que envolvem matéria civil, pensão alimentícia, por exemplo, pode se dar por meio de cartas rogatórias ou através do auxílio direto, os quais serão formulados pelo Poder Judiciário e levados até a autoridade central. Assim,

estando o pedido apto, a autoridade central (Ministério da Justiça/DRCI) transmitirá o mesmo ao Ministério das Relações Exteriores (MRE) para que realize os procedimentos necessários junto à representação diplomática do Brasil no exterior. Depois, o pedido será levado até a autoridade estrangeira responsável por encaminhar os pedidos e esta, por seu turno, levará o pedido para o órgão responsável pelo cumprimento.

Portanto, o Brasil é Estado signatário das seguintes convenções internacionais sobre questões alimentares: Convenção de Nova Iorque Sobre a Prestação de Alimentos no Estrangeiro (1956); Convenção Interamericana Sobre Obrigação Alimentar (1989); e Convenção de Haia Sobre a Cobrança Internacional de Alimentos para Crianças e Outros Membros da Família (2007).

4.1 CONVENÇÃO DE NOVA IORQUE SOBRE A PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS NO