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Entendemos que a pesquisa é uma ação pela qual buscamos conhecer determinado fenômeno, “colhendo para isso os elementos que consideramos importantes para esclarecer nossas dúvidas, aumentar nosso conhecimento, ou fazer uma escolha” (GATTI, 2012, p. 9). Desse modo, o nosso estudo será fundamentado pela abordagem da hermenêutica crítica reconstrutiva.

Segundo Prestes (2002), a hermenêutica provém de uma longa tradição humanística voltada para a interpretação de textos bíblicos, para a jurisprudência e para a filologia clássica. A hermenêutica, no seu sentido tradicional, é vista como a arte de interpretar; no entanto, com os avanços dos estudos científicos, surge com a pretensão de defender que não existe apenas um caminho para a busca da verdade, conforme foi pensado pela corrente positivista e pela teoria clássica.

De acordo com a autora, “o sentido que a hermenêutica busca na atualidade é validado no diálogo com outras possíveis interpretações” (PRESTES, 2002, p. 15), diferente do que foi a sua origem, na qual a ideia da absoluta verdade estava apenas relacionada aos dados empíricos. Dessa maneira, “o processo da aprendizagem dos conhecimentos aconteceria não apenas pelo processo de solução discursiva das pretensões de verdade tornadas problemáticas, mas também pelo testemunho do mundo da vida” (DEVECHI; TREVISAN, 2012, p. 46), visto que os contextos sociais se tornam espaços de legitimação dos conhecimentos.

Nesse prisma, nossa pesquisa está fundamentada por um arcabouço que reconhece “as outras discussões historicamente já realizadas, com os modelos de formação existentes,

com diferentes autores, com diferentes teorias, enfim, com as múltiplas compreensões sobre o mesmo assunto” (DEVECHI; TREVISAN, 2011, p. 420). Buscamos, neste estudo, compreender a formação do professor para o PROEJA a partir dos pressupostos explícitos e implícitos nos documentos oficiais e os seus sentidos na prática pedagógica, visto que “a interpretação na hermenêutica vai além das motivações e caprichos particulares do investigador” (GAMBOA, 2009, p. 137).

Ou seja, apoiamos a nossa investigação na perspectiva da hermenêutica crítica e reconstrutiva. Crítica, pelas objeções múltiplas que sustentam o discurso; reconstrutiva, pelo fato de buscar uma desproblematização a partir dos acertos entre múltiplas interpretações. Ou seja, tal perspectiva valoriza o diálogo entre as diferentes abordagens teóricas, em que “os interpretes têm que alcançar um saber que se apoia em pretensões de validez adicionais” (HABERMAS, 1989, p. 43). Para Habermas (1989), na medida em que as pretensões reconstrutivas colocam em debate o saber dito universal, elas assumem um papel reconstrutivo, a legitimação e a validação de um novo conhecimento.

Seguimos a dimensão da racionalidade comunicativa, que “é medida pela própria capacidade que os falantes e ouvintes têm de se orientar por pretensões de validade suscetíveis de críticas que devem ser intersubjetivamente reconhecidas” (DEVECHI, 2009, p. 5). Segundo Boufleuer (1997), essa perspectiva concebe que só a partir do entendimento e da validação dos saberes é possível estabelecer um equilíbrio adequado para atender as exigências do mundo da vida, ou seja, para superar a ideia da razão monológica, principal problema enfrentado nas práticas sociais pelos homens, “especialmente ao que diz respeito à formação e constituição dos sujeitos nas e através de suas interações sociais” (BOUFLEUER, 1997, p. 24).

Prestes (1999, p. 63) aponta que “a racionalidade comunicativa aposta também na possibilidade de uma razão dialógica que, de certa forma, recupere a unidade da razão na multiplicidade das vozes interpretativas”. Ou seja, um agir comunicativo no qual os interlocutores reconheçam as outras vozes que permeiam a validação do conhecimento, sem abandonar as pretensões de validade universal.

Dessa maneira, acreditamos que, por meio da hermenêutica reconstrutiva, “é possível alcançar uma interação rumo à validade intersubjetiva, em que a força do melhor argumento é elemento crucial da tomada de decisão” (DEVECHI; TREVISAN, 2011, p. 416). Nesse sentido, tratamos de compreender as percepções e as ideias que os professores apresentam sobre a política educacional do PROEJA e quais seriam as limitações que têm sofrido ao executarem os pressupostos do programa, em especial, no que diz respeito à

formação docente e à prática educativa Além disso, acreditamos que, por meio da pesquisa de natureza reconstrutiva, o pesquisador não conhece apenas a sua perspectiva de estudo, mas também estabelece um diálogo de validação com as outras concepções acerca das experiências dos sujeitos investigados:

É possível investigar não somente sobre o que está presente no conceito de formação, ou sobre algo que tende exclusivamente para ele, mas que aposta na reconstrução de argumentos com os diversos conceitos e discursos atualizados, ou mesmo que estão sendo gestados (DEVECHI; TREVISAN, 2011, p. 420).

Nesse sentido, propomos um estudo além do esquema relacional sujeito e objeto, sustentando a investigação numa perspectiva intersubjetiva de compreensão, buscando “resultados de entendimentos racionalmente construídos, e não de forma dogmática” (PRESTES, 1999, p. 57). Ou seja: “no lugar de uma interpretação solitária, entraria em voga uma investigação intersubjetiva em que a perspectiva do outro seria sempre crucial para a validação de verdades” (DEVECHI, 2008, p. 162).

Para Devechi (2008), o importante não é anular determinada crença acerca do objeto em estudo, mas sim encontrar uma orientação que direcione para uma validação do conhecimento a favor de todos. Com essas considerações, acreditamos que a política de formação docente para o PROEJA, analisada sob essa abordagem, pode criar um espaço no qual as multiplicidades de vozes venham a se somar e a se complementar como exercício da compreensão sobre o assunto. Nesse sentido, as considerações alcançadas nesta pesquisa devem ser entendidas como “pretensões de verdade” históricas e provisórias, que precisam alcançar a sua validade no discurso.