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A precariedade laboral dos jovens graduados: contextualização político-

educativa

Isabel Ramos, Universidade de Aveiro Evelyn Santos, Universidade de Aveiro

Daianne Xavier, Universidade Federal do Rio de Janeiro

resumo

Este artigo, baseado numa revisão sistemática de literatura, teve como principal objetivo apresen- tar uma análise cuidada sobre as políticas educativas e o paradigma educacional atual vivenciado pelos alunos no Ensino Superior ou na precariedade que vivem depois de graduados.

Em função deste objetivo aborda-se também o estado do Ensino Superior em Portugal.

Conclui-se desta análise que o Ensino Superior tem vindo a sofrer profundas transformações, acompanhado de uma crise económica que tem levado os estudantes portugueses a abandonar a formação superior, ou extrema dificuldade na procura de emprego.

Palavras-chave: Ensino superior, políticas educativas, precariedade

AbstrAct

The purpose of this article, which is based on a systematic revision of literature, is to present a meticu- lous analysis about educational politics and the current educational paradigm under which the Higher Education students are living in as well as the precariousness that they live in after their graduation. In response to this same goal, the Higher Education state in Portugal will be approached.

After this analysis we can conclude that the Higher Education has been suffering deep transforma- tions, which are accompanied by an economical crisis that has been leading the Portuguese stu- dents to abandon their education or to experience some difficulties in their search for employment. Keywords: Higher Education, educational politics, precariousness

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introdução

Nas últimas três décadas, as interações transnacionais conheceram uma intensificação dramática, desde os sistemas de produção e das transferências financeiras até à divulgação mundial de infor- mações e imagens através dos meios de comunicação, ou os movimentos em massa de pessoas, quer como turistas ou imigrantes trabalhadores ou refugiados. A extraordinária variedade e profundidade destas interações transnacionais levaram os cientistas sociais e políticos a vê-los como uma rutura com as formas anteriores de interações transfronteiriças através de um novo fenómeno denominado ‘globalização’. O termo ‘global’ refere-se tanto aos processos como aos resultados da globalização

(Santos, 2006).

No que toca a Portugal, está atualmente a ser afetado por uma crise que é, na verdade, um entre- laçamento de um conjunto de crises de diversas naturezas e estruturas espaço temporais. A crise financeira de curto prazo e a médio prazo, a crise económica global que se juntou a uma crise política e uma crise cultural e de identidade de longo prazo, coloca Portugal numa situação difícil relativa- mente ao mundo e à sua própria estrutura de governança e de (re)produção da sociedade.

Nesta altura, a nossa realidade, ressente-se também nos jovens, no desemprego, na crise económica e na precariedade constante de jovens graduados. Vivemos no momento, uma época de assimilação de novas problemáticas, a questão social, as desigualdades ou as solidariedades, à luz de um pensa- mento crítico, não pode limitar-se a adaptar o que já existe mas temos de romper radicalmente com os conceitos atuais e partir para a construção de novos (Dale, 2004). As questões ligadas ao ensino superior têm sido, nos últimos anos, alvo crescente de debate, quer por parte dos políticos, quer por parte dos educadores e a própria integração dos licenciados no mercado de trabalho não tem passa- do indiferente a essas preocupações.

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Conhecer e analisar os percursos profissionais dos licenciados do ensino superior (Universidades e Politécnicos), as estratégias de gestão de mão-de-obra qualificada das empresas e as suas especifici- dades setoriais e regionais, bem como, as modalidades de interação entre as universidades e o merca- do de trabalho, são contributos relevantes para fornecer informação importante para os educadores, para as empresas e para as instituições do ensino superior e, também, para afincar prioridades e estudar ou renovar políticas educativas e de emprego.

1. A reformuLAção dA educAção

Os processos hegemónicos de globalização estão a provocar a intensificação da exclusão social e da marginalização de grandes massas de população em todo o mundo. Tais processos estão a ser vistos com resistências, com movimentos populares que tentam combater a exclusão social, abrindo espaços para a participação democrática, para a construção da comunidade, para alternativas às formas dominantes de desenvolvimento e conhecimento, em suma, para fins sociais de exclusão (Neto-Mendes, 2007).

Mas, nas últimas décadas, as transformações sociais, políticas e económicas foram tão acentuadas que, quando refletimos sobre a sociedade no princípio dos anos 70, verificamos que os pontos de contacto com a realidade atual são muito ténues. A situação é idêntica no sistema educativo. A sim- ples constatação destas mudanças basta para justificar as tentativas de reforma do ensino recente- mente levadas a cabo em todos os países europeus. Mas estas reformas surgem num momento de desencanto, sendo olhadas com grande ceticismo (Neto-Mendes, 2014).

Ao nível do Estado, há de momento um pacto para o emprego, com a missão da manutenção e criação de emprego. O governo vigente propõe uma uniformização dos trabalhadores, eliminando fossos existentes. O relançamento de estágios profissionais na administração pública, com o objetivo de colmatar a falta de oportunidades dos recém-licenciados, é também uma realidade.

Mais recentemente, o memorando da TROIKA (designação atribuída à equipa composta pelo Fundo Monetário Internacional, Banco Central Europeu e Comissão Europeia) veio resumir as medidas or- çamentais que o governo português havia de cumprir tendo em vista a descida do défice público para valores acordados pela União Europeia. No Ensino Superior, tarefas como a qualificação do corpo do- cente e o objetivo de reduzir para metade a taxa de insucesso são destacadas. Pontos como o aumento de vagas para adultos, aumento das vagas em medicina, fomentação dos Cet’s tomam lugar no docu- mento. Atingir o valor médio da União Europeia, respeitante ao investimento em Investigação e Desen- volvimento (I&D), com o objetivo de preparar o país para o futuro, estimulando as parcerias entre as empresas e instituições de ensino, pertencem à rota definida pelo governo para um Portugal científico. Este é o caminho para contornar a situação precária que grande parte dos jovens portugueses gra- duados atravessa.

1.1. A Educação e o Mercado de Trabalho em Portugal

Se antes na sociedade se referia à juventude como uma das etapas iniciais do ciclo de vida, hoje, ser jovem é um tempo da vida cada vez mais incerto e diversificado dadas as características complexas onde se inserem: aumento do tempo de dependência financeira dos pais ou adiamento de diversas decisões (morar sozinho, comprar um carro, casar ou ter filhos, entre outros).

Atualmente, a visão que a sociedade tem dos jovens está ligada ao descontentamento dos mesmos, ao ceticismo, ao pragmatismo e, sobretudo, ao individualismo. Os problemas mais sentidos pelos jovens, um pouco por todo o mundo, correspondem à dificuldade de entrada no mercado de trabalho e à crise do emprego (Cachapa, Mendes & Rego, 2012).

Nas sociedades contemporâneas os sistemas que acompanham a mudança para a vida adulta têm vindo a sofrer grandes modificações, não só em função dos contextos socioeconómicos, políticos e culturais particulares de cada país ou região, mas também nas formas como são vivenciados pelos jovens. Por exemplo, pode acontecer os jovens trabalharem antes de terem finalizado os seus estudos, ou retorna- rem ao sistema de ensino após um período mais ou menos longo na atividade, assim como a permanên- cia em casa dos pais pode não ser um impeditivo para a formação de uma nova família. A transição para a vida adulta pode-se reconhecer esquematicamente quatro grandes factos: a conclusão dos estudos, o acesso ao emprego, a saída de casa dos pais e a formação de uma nova família (Andrade, 2010).

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Ao longo das últimas décadas, na Europa, a procura de Ensino Superior tem evoluído também de for- ma positiva, nos vários países: a par dos objetivos da política pública de ter populações com maiores níveis de educação formal e qualificação, os próprios indivíduos começaram a manifestar maior inte- resse na participação no sistema educativo, aos vários níveis, devido à perceção dos ganhos privados associados. Por isso, a participação nos vários graus de ensino aumentou de forma significativa, o que também potencia a maior participação no ensino superior (Barroso, 2006). O ensino superior tem, assim, vindo a estar muito ligado ao conceito de desenvolvimento quer a nível individual, quer social. A evolução sentida ao nível da sociedade do conhecimento está associada à maior relevância, social e económica, dos sistemas educativos e de investigação e está fortemente correlacionada com a melhoria da capacidade competitiva da economia.

O mundo do ensino e o mundo do trabalho constituem duas realidades que, infelizmente, não só têm andado ‘de candeias às avessas’, como mantêm, entre si, relações que nem sempre são pacíficas. Ceitil (2006) refere que apesar das diferenças e das distâncias, deveríamos avançar para plataformas de maior articulação entre estes dois universos, o que seria, sem dúvida, reciprocamente vantajoso: as empresas e organizações teriam muito a lucrar se os alunos saídos das universidades fossem de- tentores das competências que fossem mais necessárias para o seu crescimento e desenvolvimento e as universidades poderiam enriquecer os seus currículos com um maior conhecimento de como o saber se faz substanciar nos contextos da vida prática.

Com base em dados disponíveis no site do Instituto Nacional de Estatística (INE), na prática o desem- prego é a realidade de muitos dos alunos saídos das universidades. Para que se entenda, o número de desempregados inscritos nos Centros de Emprego da rede do Instituto do Emprego e Formação Profissional, aumentou de 327.434 em 2000 para 525.827 em 2010 e 641.222 no final de maio de 2012. À medida que aumentava o número de desempregados e a taxa de desemprego, registaram-se também alterações significativas na composição dos grupos dos desempregados, sobretudo em termos de distribuição por escalões etários e níveis de escolaridade. Em termos de escalões etários, sobressai o aumento particularmente forte do número de desempregados com idades entre os 25 e os 54 anos e, entre estes, os que se encontram no escalão entre os 35 e os 44 anos. Da mesma forma, o efeito do aumento da escolaridade média entre as gerações mais jovens faz-se também sentir ao nível da incidência e evolução do desemprego por níveis de escolaridade que varia consideravelmente entre grupos etários. No ano 2000, a característica mais saliente do desemprego entre os indivíduos mais jovens era, sem dúvida, o desequilíbrio registado entre os que não possuíam nenhum nível de escolaridade completo (18,5%) e todos os restantes (6,6%-8,6%). Em 2010, a situação é totalmente diferente: a taxa de desemprego varia menos com o nível de escolaridade (entre 18,9% no caso dos trabalhadores com ensino secundário e 25,1% no caso dos trabalhadores com o 1.º ou 2.º ciclos do ensino básico) e, sobretudo, verifica-se que a incidência do desemprego entre jovens com ensino superior é agora relativamente elevada (taxa de desemprego igual a 21,1%) (INE). O sentido da evo- lução registada indica que, no caso dos trabalhadores jovens, ocorreu uma penalização relativa dos trabalhadores com mais qualificações académicas, reflexo, sem dúvida do aumento da oferta num período de contenção da procura.

Mas como contornar tais adversidades? Na verdade, assiste-se a par deste enorme desemprego, num aumento significativo da aposta contínua em formação. Decorrente disto, entende-se por emprega- bilidade a oportunidade e capacidade, por parte das pessoas, da aquisição de competências que lhes permitam encontrar, manter e enriquecer a sua atividade e mudar de emprego. A empregabilidade significa possibilidades acrescidas ao longo da vida de trabalho isto é, uma “transição bem-sucedida da escola para o primeiro emprego, reentrada no mercado de trabalho a partir de uma situação de desemprego, mobilidade horizontal e vertical entre e dentro de empresas, aptidão para responder a conteúdos e requerimentos de emprego” (Kóvacs, 2002, pp. 82-83).

Kóvacs (2002) aponta que numa economia onde as forças de mercado podem funcionar livremente, as empresas tendem a assumir claramente o seu objetivo, que é produzir lucro para serem compe- titivas. É este que se torna o principal critério que dita a utilização dos recursos humanos quer em termos quantitativos quer em termos qualitativos. Criam-se empregos, dá-se formação, mudam-se as formas de organização do trabalho e os métodos de gestão, desde que a empresa se torne mais competitiva relativamente aos seus concorrentes.