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A PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO NO BRASIL: “SINGULARIDADES” DOS

4 EM TEMPOS INSTÁVEIS E VIOLENTOS, A FLEXIBILIZAÇÃO E A

4.1 A PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO NO BRASIL: “SINGULARIDADES” DOS

DOS ANOS 1990

A centralidade da categoria trabalho na formação societal contemporânea é o ponto de destaque do ensaio de Antunes (2000b) sobre os sentidos do trabalho para a “classe- que-vive-do-trabalho”, em um contexto de crise experimentada pelo capital, em nível mundial, a partir dos anos 1970. Para este autor, o capital  sob proteção do Estado, desprovido de uma orientação humanamente significativa e conduzido pela lógica societal voltada prioritariamente para a produção de mercadorias, em um processo de reorganização

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do seu sistema ideológico e político de dominação  impõe uma ação destrutiva contra a força humana no trabalho. No Brasil, conforme sua argumentação, esta crise do capital aparece com maior nitidez a partir da década de 1990 e as suas respostas, em consonância com a adoção da acumulação flexível em países centrais, são expressas pela política neoliberal e pela reestruturação produtiva cujas consequências são as profundas mutações no interior do mundo do trabalho com a precarização e a desregulamentação dos direitos do trabalho, a desmontagem do setor produtivo estatal, o processo de “liofilização” organizacional da “empresa enxuta”, a destruição do sindicalismo de classe e o aumento significativo do número de desempregados.

O Brasil, conforme Krein (2007b, p. 1-2), ao contrário dos países centrais, incorporou, de forma tardia, intensa e singular, a flexibilização das relações de trabalho nos anos 1990, em um “contexto de uma crise econômica, abertura comercial e financeira com valorização cambial, redefinição do papel do Estado, reestruturação produtiva e opção política pelo neoliberalismo”. A singularidade, para o autor, é o fato de que “o Brasil sempre teve um mercado de trabalho flexível”. Neste sentido, a flexibilidade imposta ao mercado de trabalho brasileiro pela lógica das transformações do capitalismo, nos anos 1990, em meio ao processo de fragilização e enfraquecimento dos sindicatos, possibilitou “maior liberdade às empresas na determinação das condições de uso, de contratação e de remuneração do trabalho” e, ao mesmo tempo, permitiu “ajustes no volume e no preço da força de trabalho na perspectiva de reduzir seu custo de acordo com as diferentes conjunturas econômicas”, que ocorreram por meio da supressão de benefícios e de direitos trabalhistas anteriormente consolidados ou pela introdução ou adaptação de legislação e normas específicas para controlar a remuneração, a jornada de trabalho, as formas de contratação e de alocação da força de trabalho, o que significou a eliminação, a diminuição ou o afrouxamento da frágil proteção trabalhista e social no Brasil.

Com base nesses elementos, Krein (2007a) defende a tese de que, no Brasil, temos mais um processo de flexibilização do que de desregulamentação, visto que as mudanças ocorreram mais pela dinâmica da economia e do mercado de trabalho e pela introdução de novas regulamentações do que pela derrogação da legislação. No balanço do conjunto de mudanças, que foram subordinadas à acumulação de capital e totalmente desfavoráveis aos trabalhadores, o avanço da flexibilização e da precarização do trabalho no Brasil, a partir dos anos 1990, ocorreu com o fortalecimento da regulação privada das relações de trabalho, com o aumento do poder discricionário do empregador, com a mercantilização da força de trabalho e, consequentemente, pela diminuição do poder de barganha dos trabalhadores e dos

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sindicatos. Dentre os impactos gerados pela flexibilização no mundo do trabalho, em total sintonia com a ordem econômica, política e social do capitalismo vigente no último quartel do século XX, registra-se a submissão de trabalhadores a permanente tensão; a incidência das novas doenças do trabalho (estresse, angústia e ansiedade); a nítida segmentação entre os trabalhadores mais e menos qualificados; a fragilização e a redução do papel dos sindicatos; e a descentralização das negociações para os locais de trabalho.

O processo de reestruturação produtiva no Brasil, na década de 1990, de acordo com José Ricardo Ramalho (1999, p. 85-86), “repete outras experiências do mundo industrializado no que diz respeito aos modos de intensificação e exploração do trabalho e à redução de direitos conquistados pelos trabalhadores ao longo do século”. Para este autor, apesar de uma ação sindical com certo poder de barganha em setores mais modernos para enfrentar a reestruturação produtiva no Brasil, houve “um processo gradativo de precarização do trabalho e fragilização da organização coletiva dos trabalhadores”. Dentre as novas estratégias de gestão implantadas pelo processo de reestruturação produtiva em nosso país, ele ressalta “a imposição ideológica do chamado modelo japonês como caminho inexorável para a ‘modernidade’, associado ao discurso ‘civilizador’ sobre os trabalhadores até a eficácia da aplicação de novas formas de gestão da força de trabalho na indústria [...]” cujos desdobramentos, em termos de precarização do trabalho, formam os “retratos da crise na década neoliberal”, também analisados por Cardoso (2003), que são: redução do nível de emprego; agravamento das condições de trabalho com a terceirização e a subcontratação; aumento da informalidade do mercado de trabalho; incremento do trabalho em domicílio e da mão de obra feminina; desmobilização dos sindicatos; crescimento da informalidade; assalariamento disfarçado pela contratação do trabalho autônomo; e aumento de empregados sem carteira assinada.

Antes de expor “os retratos da crise na década neoliberal”, Cardoso (2003, p. 41) registra que as relações de trabalho, no Brasil, sempre foram marcadas por regimes autoritários de trabalho, pelo uso predatório da força de trabalho, pela presença de uma gerência despótica, por baixos salários, por altas taxas de rotatividade, pela extensão obrigatória de horas extras de trabalho. Neste ambiente, as bandeiras do sindicalismo, especialmente nos anos 1980, eram pautadas por demandas de justiça e dignidade no trabalho. Na década de 1990, após a reestruturação industrial e as novas formas de organização da produção baseadas no toyotismo – “produção enxuta”, “zero defeito”, “just-in-time”, “controle de qualidade total” –, o local de trabalho sofre uma reconfiguração e as novas relações de trabalho, caracterizadas por parcerias e cooperação entre os agentes de produção,

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passam a ser, aparentemente, mais democráticas e seus problemas passam a ser diretamente negociados entre trabalhadores e gerência, sem interferência dos sindicatos e, por isto, as queixas dos trabalhadores não deveriam ultrapassar os portões da fábrica.

Apesar desse suposto acordo aparente, as queixas dos trabalhadores foram além dos portões da fábrica e se transformaram formalmente em reclamações perante a Justiça do Trabalho, em um processo de judicialização intenso das relações de trabalho, reflexo de que as relações continuavam despóticas e os direitos trabalhistas ainda mais desrespeitados. O desemprego, a recessão, a redução do mercado formal e o crescimento de relações precárias de trabalho compõem o “retrato fiel dessa crise na década neoliberal”. Por sua vez, as centrais sindicais e os respectivos sindicatos se mostraram incapazes de enfrentar as políticas neoliberais, apoiando, muitas vezes, os projetos de flexibilização e precarização do trabalho, perdendo, por conseguinte, o poder de assegurar segurança socioeconômica aos trabalhadores por eles representados (CARDOSO, 2003).

Essa insegurança econômica imposta pela política neoliberal, de acordo com Cardoso (2003, p. 251), que não pode ser controlada pelo poder sindical, ganha “estatuto constitutivo estrutural da condição de vida das classes que vivem do trabalho” e pode ser percebida nas seguintes dimensões, que são essenciais para a compreensão das décadas seguintes, com a precariedade das condições de vida: a) quanto ao emprego ou à ocupação: novos padrões de concorrência, risco de falência, fusões e incorporações, adequação do quadro de pessoal; b) quanto ao salário e à renda: ganho por desempenho, participação nos lucros, concorrência entre os empregados; c) quanto às condições de trabalho: intensificação do ritmo de trabalho, trabalho por estresse, subcontratação em cascata nas cadeias de produção; d) quanto à representação de interesses: debilitação dos sindicatos – diminuição do poder de mobilização e de ação coletiva; e e) quanto aos prospectos para a vida no futuro  crise dos sistemas previdenciários e serviços sociais básicos. A década de 1990, conforme o autor, rompeu definitivamente com a promessa de um mercado formal de trabalho e emprego com carteira de trabalho assinada com garantia de direitos trabalhistas e trouxe de volta a mercantilização da força de trabalho, apresentando um incremento do mercado informal e uma extensão dos contratos ilegais de trabalho.

Alves (2013, p. 134-135), quando discute a precarização do trabalho no Brasil, assinala um corte histórico ocorrido na década de 1990 e define, a partir daí, uma linha contínua de degradação do mundo do trabalho. Nesta fase, que seria “a terceira reorganização

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do capitalismo industrial do Brasil”48, implantada após a liberalização comercial, como já analisado anteriormente, há o ajuste neoliberal e a reestruturação produtiva para adequação às novas condições impostas pela concorrência internacional. Com as modificações conduzidas pela nova dinâmica do capitalismo global, surge, segundo o autor, “uma singularidade crucial da década de 1990 no Brasil: uma década da precarização em sua forma extrema”. Nesta década neoliberal, por ele denominada de “década do chumbo”, os locais de trabalho passaram por transformações importantes em termos de avanços tecnológicos, organização e gestão do trabalho e, por isto, “o complexo de trabalho no Brasil foi atingido por um processo disruptivo de reestruturação produtiva na indústria, serviços e, inclusive, administração pública, que alterou o perfil do trabalhador coletivo no País”, promovendo alterações significativas de amplo espectro na objetividade e subjetividade do mundo do trabalho do Brasil.

No Brasil e, em particular, na Bahia, uma das primeiras pesquisas sobre a gestão do trabalho e a terceirização e seus impactos sobre as condições de trabalho e saúde dos trabalhadores, foi realizada por Franco et al. (1994) com o desenvolvimento dos projetos Trabalho industrial, saúde e meio ambiente e Relações de trabalho e saúde, pelo Centro de Recursos Humanos da UFBA (CRH). No estudo, que contempla o período de 1988 e 1993, e é baseado em uma pesquisa efetuada em 44 empresas do Complexo Petroquímico de Camaçari (COPEC), as pesquisadoras analisaram as mudanças do modelo de gestão brasileiro do trabalho – crise do fordismo e implantação do toyotismo – e suas implicações sobre as situações de risco encontradas no ambiente intra e extrafabril no trabalho industrial. A análise é centrada em um setor de ponta da economia brasileira, as indústrias química, petroquímica e petroleira cujas atividades produtivas são reconhecidas como de altos riscos ambientais, e tem como foco as práticas de gestão da produção e do trabalho em busca das reais condições de trabalho, de saúde ou de vida dos trabalhadores.

Quando da realização desta pesquisa – Era Collor –, as empresas se encontravam inseridas em um cenário de profunda crise no Brasil e em um processo recessivo mundial, entre o acirramento da competitividade no mercado internacional e o envolvimento em um processo de concentração de capitais, por meio de fusão, incorporação e privatização, delineado pela aplicação da política neoliberal. Neste contexto, facilitado pelas ações do Estado com vistas a “modernizar” as relações de trabalho e o objetivo de reduzir custos e

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“A primeira reorganização do capitalismo industrial ocorreu na década de 1930 sob o governo Vargas; com a industrialização pesada e o desenvolvimento do capitalismo monopolista no Brasil nas décadas de 1950/1960, ocorre a segunda reorganização capitalista no país, quando se constituíram os pilares da nossa modernidade salarial”, conforme Alves (2013, p. 134).

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adquirir competitividade, foram inseridas as mudanças nas práticas de gestão e organização do trabalho pela reestruturação produtiva industrial e pela adoção do modelo japonês, especialmente a “Qualidade Total” e a “terceirização”, gerando, consequentemente, o enxugamento das empresas, pela redução dos cargos e níveis hierárquicos, e de pessoal e, ao mesmo tempo, o crescimento acelerado da terceirização tradicional (limpeza, transporte, vigilância e segurança patrimonial e manutenção predial) e ampliação externa de atividades para áreas e setores nucleares da empresa (produção/operação; laboratórios/processos; manutenção corretiva/preventiva).

Dentre as consequências das transformações implantadas nessas indústrias, as pesquisadoras perceberam um alto custo social advindo com o desemprego e a queda do emprego, a precarização das relações formais de trabalho – processo de terceirização (perigosamente precária) e exclusão de benefícios dos trabalhadores estáveis (plano de saúde) –, a progressiva deterioração das condições de trabalho – intensificação do trabalho, concorrência entre os próprios trabalhadores, insegurança e medo nas relações com as chefias e gerências, aumento do número de acidentes e de doenças profissionais – e, também, a degradação do meio ambiente. A pesquisa constata, de forma pioneira e em plena vigência da década neoliberal, que o objetivo para a contratação de serviços por meio da terceirização é não apenas a redução de pessoal ou de postos de trabalhos, mas, também, promover a diminuição das resistências e reivindicações dos trabalhadores estáveis, ou seja, minar, aos poucos, o poder de barganha dos sindicatos mais organizados e com capacidade de enfrentar a ofensiva neoliberal (FRANCO ET AL., 1994).

As conclusões dessas pesquisadoras, em “Mudanças de gestão, precarização do trabalho e risco industriais”, sobre o processo de reestruturação produtiva em um dos complexos petroquímicos mais importantes do Brasil, em 1994, apontam para um quadro geral de “fogo cruzado contra o trabalho”, conforme análise de Pochmann (2002) sobre a ampliação do desemprego, da exclusão social, da precarização no padrão de uso e remuneração da força de trabalho do mercado brasileiro pós anos 1980. Para este autor,

[...] a redução quantitativa e as transformações qualitativas no mercado de trabalho internos nas grandes empresas (redução de hierarquias, novas formas de gestão de pessoal e de relações de trabalho) contribuem ainda mais para tornar abundante a força de trabalho (POCHMANN, 2002, p. 18).

Nesse movimento do capitalismo contemporâneo totalmente desfavorável à produção e propenso ao esvaziamento absoluto dos empregos no setor primário e no setor

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secundário, Pochmann (2002, p. 18) coloca que “a inserção dos trabalhadores torna-se crescentemente precária e instável”, o que “limita as possibilidades de ampla difusão de um padrão de crescimento sustentado e de melhor enfrentamento da exclusão social”.

Na década de 1990, para o mercado brasileiro, Pochmann (2002, p. 65) registra que “os sinais de desestruturação do mercado de trabalho assumiram maior destaque, consolidando a tendência de redução do assalariamento com registro e de expansão do desemprego e de ocupações não-organizadas”. Ao fazer a análise do comportamento da oferta e da demanda de trabalho neste período, o autor demonstra as tendências do emprego no Brasil: nível de escolaridade tradicionalmente baixo, o que dificulta a oferta de trabalho pautada em maior qualificação profissional; elevada taxa de rotatividade, indicando a flexibilidade quantitativa do mercado de trabalho; e o setor de serviços como principal responsável pela ocupação, modificando a qualidade do emprego.

Quanto ao desemprego, reflexo da insuficiência e da inadequação das políticas públicas para expansão do emprego, evidencia Pochmann (2002, p. 151) que houve acréscimo para: trabalhadores com escolaridade mais baixa; pessoas com idade mais avançada, especialmente os homens; para os não-chefes de família (cônjuge); pessoas negras; e primeiro emprego. Além do quadro estrutural de desemprego, a combinação de outros fatores contribuiu para colocar o Brasil entre os países com maiores taxas de demissão: “o padrão flexível de uso e remuneração da força de trabalho assalariada está associado às facilidades legais e informais quanto à contratação, à demissão e à existência de uma oferta abundante de mão-de-obra”, bem como à “ausência de organização dos empregados por local de trabalho que também favorece a ampla autonomia do empregador na gestão do quadro de pessoal, em conformidade com a dinâmica da atividade econômica”. O aparecimento de outras formas de expulsão do trabalho é adicionado àquelas tradicionais no Brasil, o que mantém a classe trabalhadora ainda mais fragilizada e distante de uma sociedade mais justa e com pleno emprego.

Em Terceirização: (des)fordizando a fábrica, resultado de uma pesquisa que envolve os projetos coletivos já citados – Trabalho Industrial e Meio Ambiente e Terceirização: Relações de Trabalho e Saúde – desenvolvidos pelo CRH/UFBA, Druck (1999)49 analisa, também, as mudanças nos padrões de gestão de organização do trabalho no Estado da Bahia, a partir da reestruturação produtiva do COPEC, entre 1988-1993 e 1994- 1995, em 39 empresas, utilizando também como fonte de pesquisa entrevistas com dirigentes

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Esse livro é resultado da Tese de Doutoramento defendida no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH)/UNICAMP, em setembro de 1995.

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sindicais dos trabalhadores do ramo químico, boletins, jornais e cadernos especiais produzidos pelo sindicato da categoria. Neste trabalho, cujo título indica a transformação das relações de trabalho em nosso país e nos leva a pensar, imediatamente, na retirada dos direitos e garantias dos trabalhadores pela precarização das relações de trabalho daquele segmento produtivo desde o final da década de 1980, a pesquisadora sustenta o posicionamento de que a reestruturação produtiva no Brasil e, em particular, na Bahia, ocorre por meio de escolhas do empresariado para manter historicamente a reprodução do capital assim como destruir radicalmente a resistência operária através do desmantelamento, da desintegração e da individualização dos coletivos de trabalhadores.

Ao afirmar que a terceirização é uma escolha política do empresariado do setor químico e petroquímico, antecipando o pensamento construído posteriormente por Bourdieu (1998)50 de que a precariedade é uma vontade política e não uma fatalidade econômica, Druck (1999), em sua tese de doutoramento defendida em 1995, demonstra, por meio de dados empíricos e indicadores sociais, o quadro desenhado pela terceirização e pelo seu processo de precarização intra e extra fabril na Bahia, cuja composição, no âmbito da fábrica:

[...] evidencia-se nas condições de trabalho e salariais e na criação de duas categorias de trabalhadores: os efetivos – ainda fordistas –, constituindo-se cada vez mais uma minoria, uma ‘elite’, e os subcontratados – segmento que se amplia rapidamente –, trabalhadores precários, em geral, discriminados e considerados ‘desclassificados’ (DRUCK, 1999, p. 11).

Do lado de fora da fábrica, um crescimento do mercado informal de trabalho “com a precarização dos vínculos empregatícios e com o aumento dos trabalhadores por conta própria, em grande parte prestadores de serviços terceirizados para as grandes empresas”. A tese de Druck (1999, p. 11) é “a existência de um processo de (des)fordização da fábrica, provocado, essencialmente, pela terceirização”, ou seja, uma metamorfose do mundo do trabalho, intensificada, no Brasil e na Bahia, a partir da década de 1990.

Alves (2013, p. 137), que avalia as transformações do mundo do trabalho no mesmo período, registra que “ocorre o aumento contundente do desemprego aberto e trabalho precário nas metrópoles”, com “uma alteração significativa da dinâmica do mercado de trabalho e da luta sindical (e política) dos trabalhadores organizados” e que a “mancha da precarização do trabalho assume dimensões inéditas”. Sob a vigência das políticas neoliberais,

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A intervenção de Bourdieu, A precariedade está hoje por toda parte, foi apresentada, pela primeira vez, em dezembro de 1997, nos Encontros Europeus contra a Precariedade. O livro Les

métamorphoses de la question sociale, de Robert Castel, foi publicado, originalmente em francês,

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nesta década, ocorreu uma das mais profundas e amplas reestruturações capitalistas no Brasil. Dentre as singularidades desta nova morfologia social do trabalho e do “choque” do capitalismo nesta fase, o autor destaca, ainda, em sintonia com os pesquisadores brasileiros já mencionados, a fragmentação da classe trabalhadora; a empresa flexível e enxuta; a saída do trabalhador incentivada pelo plano de demissão voluntária; a terceirização (e, inclusive, a quarteirização); uma maior concentração da riqueza social; e um mundo do trabalho cada vez mais precário cuja “degradação candente contribuiu sobremaneira para aprofundar o cenário de barbárie social”, inclusive com a nova fenomenologia de adoecimento do trabalhador e dos acidentes de trabalho. A precarização do trabalho, em seu aspecto sistêmico, é caracterizada pela degradação das condições de trabalho e de salário e pela redução de benefícios e direitos trabalhistas. A década de 1990 é, conforme o autor, a década da transição para a nova precariedade do trabalho que iria se constituir, de forma intensa, nos anos 2000, atingindo tanto empresas reestruturadas do setor privado quanto do setor público, com a imposição de um novo padrão de exploração da força de trabalho.

Dentre os diversos setores da economia brasileira que passaram por um intenso processo de reestruturação produtiva nos anos 1990, destaca-se o setor financeiro nacional, que se internacionalizou e provocou mudanças nas condições de trabalho, emprego e salário dos trabalhadores em bancos. De acordo com Nise Jinkings (2002), o setor é marcado por desemprego, precarização, retrocesso dos direitos sociais e fragmentação do trabalho, em um processo de aprofundamento da dominação do capital privado transnacional no Brasil. O bancário é submetido à intensificação e ao prolongamento da jornada de trabalho, em uma realidade assinalada pela instabilidade e acentuada pelo medo, pela insegurança, pelo desgaste