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Capítulo 3 – As gestões do PSDB e do PT: O importante período das políticas de

3.3. A primeira gestão de Luís Inácio Lula da Silva (2002 a 2006): Entre a

Pronaf para Pronat).

A primeira gestão de Luis Inácio Lula da Silva (Lula) foi iniciada a partir de certa desconfiança/continuidade com as orientações teóricas da política macroeconômica introduzidas pelo governo de FHC, que tinha a simpatia do mainstream brasileiro. Boa parte da população se surpreendeu em seus primeiros anos de governo, com o posicionamento de continuidade dado às macropolíticas, que tinham como pressuposto básico a inspiração da abordagem de mercados eficientes, onde a ênfase se dá na “competitividade” e na estabilidade monetária como prioridade da agenda de governo (FERRAZ et al, 2003).

Sendo assim, Lula manteve as políticas macroeconômicas fundadas no famoso tripé monetário, que é a aderência às metas de inflação, câmbio flutuante e uma política fiscal visando manter um superávit primário que compensasse o déficit nominal das contas públicas. É importante frisar, que as demais políticas elaboradas a essa época, início da década de 1990, eram também fortemente associadas a estes pressupostos ideológicos, que defendiam: a) uma liberalização comercial; b) desregulamentação financeira; c) uma crescente abertura da conta de capitais e; d) outras reformas microeconômicas coerentes com o suposto da eficiência intrínseca dos mercados.

Este posicionamento, por sua vez, passou a ser negado por parte de integrantes do governo, que reivindicavam uma politica econômica mais heterodoxa em substituição ao modelo da eficiência dos mercados. Neste sentido, verifica-se que há uma correlação de forças presente no governo Lula e que a ortodoxia advinda do governo FHC passa a perder força e começa a ganhar cada vez mais espaço na agenda de governo, uma nova orientação para a política econômica, denominada por alguns

autores como “novo-desenvolvimentismo” (ou neodesenvolvmentismo)26, atrelada ao pensamento heterodoxo de importantes quadros da gestão Lula. Estas novas propostas funcionaram como instrumento de intervenção no debate dentro e fora do governo Lula e foi com base nelas que, a partir de 2006, o governo passa a adotar novas iniciativas e políticas que se mesclam às políticas macroeconômicas neoliberais, estabelecendo-se, dali em diante, uma política híbrida que caracterizará esse governo até 2010, e que parece ter influenciado decisivamente os rumos das políticas de desenvolvimento territorial rural em suas duas gestões.

No que se refere às políticas de desenvolvimento agrário, uma das ações de maior impacto foi a mudança na estrutura do MDA, sendo criada a Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT), que ficou responsável pela gestão do Pronaf Infra- estrutura, e também deu início a missão de:

[...] apoiar a organização e o fortalecimento institucional dos atores sociais locais na gestão participativa do desenvolvimento sustentável dos territórios rurais e promover a implementação e integração de políticas públicas (BRASIL, 2005b, p. 3).

Após a criação da SDT, inicia-se uma mudança na perspectiva de escala para atendimento do público-alvo do Pronaf, que passa a beneficiar iniciativas intermunicipais. Nesta concepção, a SDT estabelece o conceito de território rural, para o qual adota a seguinte definição:

É um espaço físico, geograficamente definido, geralmente contínuo, compreendendo cidades e campos, caracterizados por critérios multidimensionais, tais como o ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições, e uma população, com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos específicos. (BRASIL, 2005a, p. 28).

Em razão da consideração, por parte do MDA, de que os municípios apresentam fortes limitações para acesso às políticas federais, a nova Secretaria passou a atuar com base na ideia de territórios, como um espaço físico, geograficamente definido, geralmente contínuo, caracterizado por critérios multidimensionais, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade, coesão social, cultural e territorial (MDA/SDT/CONDRAF, 2003). É a partir dessa nova concepção por parte do MDA que o atual governo muda então o enfoque da política pública rural brasileira: Se

26 O termo "novo-desenvolvimentismo" é denominado um conjunto de políticas econômicas alternativas às políticas neoliberais (especialmente pós-Consenso de Washington) e foi introduzido por Bresser- Pereira, que o utilizou no capítulo 20 de seu livro Desenvolvimento e crise no Brasil (BRESSER- PEREIRA, 2003). Esta denominação conceitual passou a ser ainda mais difundida a partir de 2005, quando veio a público o livro Novo-Desenvolvimentismo, uma coletânea de artigos organizada por Sicsú, et al (2005).

antes os objetivos do programa eram mais centrados no provimento de infraestrutura, agora estes passaram a atuar mais no fortalecimento da organização social dos agricultores familiares e a estimular a participação das instituições de representação. Além disso, o novo formato previa que as iniciativas locais e municipais se submeteriam a uma lógica de elaboração de projetos a partir das demandas dos territórios em que estão inseridos ou a partir de agências ou instituições que já estivessem formalmente constituídas na forma de consórcios ou associações.

É a partir deste cenário que surge o Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais (Pronat), originalmente advindo de uma linha de ação do Pronaf, chamada Pronaf Infra-Estrutura e Serviços Municipais, operado de 1997 a 2002. Este programa, que antes apenas destinava recursos para a construção de obras e a aquisição de serviços comunitários a partir de uma concepção focada no desenvolvimento municipal e com um modelo de gestão pouco participativo, passa a alterar seu desenho institucional e a ter em seu eixo de atuação nos territórios, o fomento das comunidades nos conselhos territoriais (LEITE et al, 2008).

Sendo assim, o Pronat teve sua origem fundamentada nas múltiplas dimensões do desenvolvimento e foi criado com o objetivo de promover o planejamento, a implementação e a autogestão do processo de desenvolvimento sustentável dos territórios rurais e o fortalecimento e a dinamização da sua economia, mediante quatro eixos estratégicos: I) a gestão social dos territórios; II) o fortalecimento do capital social; III) a dinamização das economias territoriais e IV) a articulação interinstitucional (BRASIL, 2011a).

Nestes anos, no que se refere às reformulações legais que afetaram as diferentes modalidades do Pronaf de 2002 a 2006, verifica-se:

a) Criação, pela resolução 3.001 do Banco Central, de 2002, da linha de crédito de investimentos para silvicultura e sistemas agroflorestais (Pronaf Florestal), destinada aos agricultores de baixa renda, com o objetivo de apoiar os investimentos em florestas;

b) Criação, na safra 2003/04, de novas modalidades: Pronaf Alimentos, com o objetivo de estimular a produção de cinco alimentos básicos (arroz, feijão, milho, mandioca e trigo); Pronaf Pesca, com o objetivo de apoiar os pescadores artesanais; Pronaf Agroecologia, com o objetivo de apoiar a produção agropecuária que não utiliza produtos químicos e também os agricultores que se encontram em transição para este tipo de produção; Pronaf Turismo Rural, com

o objetivo de apoiar a implantação de atividades turísticas nas propriedades rurais; Pronaf Mulher; Pronaf Jovem Rural; Pronaf Semi-Árido e Pronaf Máquinas e equipamentos.

Já quanto ao estabelecimento de diretrizes do Pronat nos anos de 2002 a 2006, verifica-se:

a) Estabelecer o território enquanto limite e potencial para a promoção do desenvolvimento rural sustentável;

b) Compreender o desenvolvimento sustentável enquanto articulação integrada de diversas dimensões;

c) Valorizar a participação e a gestão social das políticas públicas;

d) Atuar em sinergia com vários níveis de governo, entidades e organizações da sociedade civil;

e) Priorizar a redução das desigualdades sociais e econômicas;

f) Incentivar a dinamização econômica dos territórios (BRASIL, 2005b).

3.4. A segunda gestão de Luís Inácio Lula da Silva (2006 a 2010): O difícil