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4.4 Cassação do registro ou do diploma

4.5.1 A proporcionalidade

A proporcionalidade consiste numa relação de congruência entre os meios e os fins perquiridos. Para a sua aplicação, é preciso haver, necessariamente, uma relação entre um meio e uma finalidade. Com isso, torna-se possível proceder ao exame dos seus corolários: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito223.

regularidade das campanhas, a caracterização da hipótese legal em apreço não requer que o fato tenha potencialidade para desequilibrar as eleições ou o resultado delas. Basta que haja gravidade do evento e das circunstâncias que o cercam.”. (GOMES, José Jairo. Direito eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 838).

220 “Representação. Conduta vedada. Art. 73, VI, b e § 10, da Lei nº 9.504/97. 1. Segundo a atual jurisprudência

do Tribunal Superior Eleitoral, quanto ao tema das condutas vedadas do art. 73 da Lei das Eleições, deve ser observado o princípio da proporcionalidade e somente se exige a potencialidade do fato naqueles casos mais graves, em que se cogita da cassação do registro ou do diploma. 2. Caso exigida potencialidade para configuração de qualquer conduta vedada descrita na norma, poderiam ocorrer situações em que, diante de um fato de somenos importância, não se poderia sequer aplicar multa, de modo a punir o ilícito. [...].”. (BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Agravo de Instrumento nº 12.165. Relator: Ministro Arnaldo Versiani Leite Soares. Diário de Justiça

Eletrônico. Brasília, 1 out. 2010, p. 32-33. Disponível em:

<http://www.tse.jus.br/jurisprudencia/decisoes/jurisprudencia>. Acesso em: 30 nov. 2017).

221 “[...]. Eleições 2012. Prefeito. Representação. Conduta vedada aos agentes públicos em campanha.

Comparecimento a inauguração de obra pública. Princípio da proporcionalidade. [...] 1. É incontroverso que o agravante José Bento Leite do Nascimento compareceu a inauguração de obra pública no Município de Soledade/PB faltando menos de quinze dias para o pleito, em violação ao art. 77 da Lei 9.504/97. 2. Todavia, deve ser aplicado no caso dos autos o princípio da proporcionalidade, notadamente diante da ausência de participação ativa do agravante no referido evento, não tendo havido, assim, quebra da igualdade entre os candidatos. [...]”. (BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Recurso Especial Eleitoral nº 47.371. Relator: Ministra Laurita Hilário Vaz. Diário de Justiça Eletrônico. Brasília, 27 out. 2014, p. 57-33. Disponível em: <http://www.tse.jus.br/jurisprudencia/decisoes/jurisprudencia>. Acesso em: 30 nov. 2017).

222 Segundo o Ministro Luiz Fux, na Ação Cautelar nº 107.495, “[...] o postulado da proporcionalidade,

notadamente em sua dimensão de vedação ao excesso (Übermaßverbot), é o parâmetro normativo adequado para aferir a gravidade ou a relevância jurídica (ou a ilegalidade qualificada) dos ilícitos em processos em que se apuram a prática de abuso de poder econômico ou político, em AIJE, AIME e RCED, e de captação ou gasto ilícito de recursos em campanhas eleitorais, em Representações do art. 30-A da Lei das Eleições; [...].”. (BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ação Cautelar nº 107.495. Relator: Ministro Luiz Fux. Diário de Justiça Eletrônico. Brasília, 30 jun. 2017, p. 99-102. Disponível em: <http://www.tse.jus.br/jurisprudencia/decisoes/jurisprudencia>. Acesso em: 7 dez. 2017).

223 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 17. ed. São Paulo:

É adequada a restrição ao direito fundamental que se mostrar apta a atingir os fins colimados. Trata-se de critério negativo destinado a eliminar os meios não adequados224. Sob o

prisma da necessidade, dentre as todas as restrições adequadas de semelhante eficácia, a restrição eleita deve promover o menor prejuízo possível direito fundamental restringido. Já a proporcionalidade em sentido estrito busca aferir a compatibilidade entre os prejuízos causados ao direito fundamental restringido e os benefícios trazidos ao direito fundamental prevalente225.

Esclarece Virgílio Afonso da Silva226 não é em qualquer ordem que se deve proceder a sua

análise. Deve-se iniciar pela adequação, seguida pela necessidade e ultimando-se pela proporcionalidade em sentido estrito. Há também uma relação de subsidiariedade entre elas, porquanto somente se avança à próxima quando a anterior for insuficiente para resolver a colisão.

Dado o seu elevado grau de abstração, não raras vezes os direitos fundamentais colidem entre si. Consoante Robert Alexy227,

Uma restrição a um direito fundamental somente é admissível se, no caso concreto, aos princípios colidentes for atribuído um peso maior que aquele atribuído ao princípio de direito fundamental em questão. Por isso, é possível afirmar que os direitos fundamentais, enquanto tais, são restrições à sua própria restrição e restringibilidade.

[...]

Restrições que respeitem a máxima da proporcionalidade não violam a garantia do conteúdo essencial nem mesmo se, no caso concreto, nada restar do direito fundamental. A garantia do conteúdo essencial é reduzida à máxima da proporcionalidade.

A conformação com a proporcionalidade permite que, do embate entre dois direitos fundamentais, ainda que um deles seja totalmente suprimido, no caso concreto, inexistiria violação ao mínimo intangível do direito mitigado. Somente diante de uma colisão entre direitos fundamentais em caso concreto é que se poderia aplicar a proporcionalidade. Ao tratar da discricionariedade dos meios, Robert Alexy228 explana que,

A discricionariedade para escolher meios praticamente não suscita problemas se os diferentes meios forem aproximadamente adequados para realizar ou fomentar a finalidade e se não tiverem nenhum ou praticamente nenhum efeito negativo em outras finalidades ou princípios. Mas isso é diferente nos casos em que os diversos meios fomentarem a finalidade em graus distintos, ou se for incerto em que grau eles

224 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. 2. ed. São Paulo:

Malheiros, 2015, p. 590.

225 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 17. ed. São Paulo:

Malheiros, 2016, p. 217-218.

226 SILVA, Virgílio Afonso da. O proporcional e o razoável. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 91, n. 798,

2002, p. 34-35.

227 ALEXY, Robert, op. cit., p. 296-297. 228 Ibid., p. 586.

o fazem, ou se tiverem efeitos negativos em diferentes graus nas outras finalidades ou em outros princípios ou, ainda, se for incerto em que grau isso ocorre. Nesses casos, a decisão depende de sopesamentos e da possibilidade de identificar os respectivos graus de fomento e de prejuízo em relação a outras finalidades e princípios. Isso suscita novos problemas relacionados à discricionariedade.

Intermedeia o direito de votar e o direito de ser votado a prática de um ato ilícito eleitoral, a captação ilícita de sufrágio, cujas respectivas sanções, previstas em lei, exsurgem em defesa do direito ao voto livre e em mitigação do direito de ser votado. Tem-se uma relação entre a sanção (meio) e a tutela da liberdade de voto (fim), com a consequente restrição do direito fundamental de ser votado.

Nesse contexto, “a doutrina identifica como típica manifestação do excesso de poder legislativo a violação do princípio da proporcionalidade ou da proibição de excesso [...], que se revela mediante contraditoriedade, incongruência e irrazoabilidade ou inadequação entre meios e fins”229. À vista do caso concreto, haverá será desproporcional o meio que não mantiver

uma relação de congruência com o seu resultado. Acrescenta Gilmar Mendes e Paulo Branco230,

que “os direitos fundamentais enquanto direitos de hierarquia constitucional somente podem ser limitados por expressa disposição constitucional (restrição imediata) ou mediante lei ordinária promulgada com fundamento imediato na própria Constituição (restrição mediata)”.

Conquanto não esteja expressamente disposto no texto constitucional, o voto secreto é intrínseco à liberdade de votar. Não é menos que razoável concluir que o cidadão tem direito de votar livre, direta e secretamente. Aplicando-se a estrutura triádica proposta por Robert Alexy231, o direito ao voto livre pode ser encarado sob a seguinte perspectiva: o titular

do direito é o eleitor; o destinatário do direito é tanto o estado quanto os demais particulares; e o objeto do direito é o voto. O eleitor tanto tem, em face do Estado, direito a que este não o impeça de votar livremente, quanto tem, em face do Estado, um direito a que este proteja a sua liberdade de votar contra a atuação de terceiros.

Por sua vez, o direito de ser votado integra a esfera jurídica do cidadão que atenda às condições de elegibilidade e não incida em nenhuma das causas de inelegibilidade. Em sua estrutura triádica: o titular do direito são os cidadãos que disponham da capacidade eleitoral passiva, que pressupõe a ativa; o destinatário do direito de ser votado é o Estado e os demais particulares; e o objeto do direito é ser votado.

229 MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 10. ed. São

Paulo: Saraiva, 2015, p. 225.

230 Ibid., 2015, p. 200.

231 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. 2. ed. São Paulo:

Encontra, a vedação à captação ilícita de sufrágio, fundamento imediato na Constituição Federal, com fulcro no direito ao voto livre. A aferição da proporcionalidade232

da cassação do registro ou do diploma por captação ilícita de sufrágio, em qualquer grau de lesão do bem jurídico tutelado, desponta na colisão entre dois direitos políticos fundamentais233:

o direito de votar e o direito de ser votado.

Sob prisma do direito de voto, coube ao estado criar a norma contida no art. 41-A da Lei nº 9.504/97, como forma de ação positiva normativa234 eleita de acordo com a

discricionariedade dos meios, dirigida à proteção da liberdade de voto. Assim, ao captar ilicitamente, em sentido estrito, o voto, o direito fundamental de ser votado, titularizado pelo candidato responsável, é confrontado pela proteção jurídica conferida ao direito de voto, qual seja, a previsão de punição ao candidato responsável com a cassação do registro ou do diploma, eliminando-o da disputa.

Relevante então averiguar como tem decidido o TSE, a partir da análise de decisões prolatadas desde a promulgação da Lei nº 9.840/99, acerca da aplicação da proporcionalidade à sanção de cassação do registro ou do diploma por captação ilícita de sufrágio.