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IDHM Renda

2 ANÁLISE POLÍTICA DA POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL DO TERRITÓRIO DA CIDADANIA PARANÁ CENTRO

2.1 A PROPOSTA DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL RURAL

Para iniciar nosso estudo sobre a Política de Desenvolvimento Territorial no Brasil recorremos a Romano (2009) que aponta que o passo inicial para compreender a alocação pública de recursos é conhecer/analisar o emaranhado constitucional onde o processo foi institucionalizado e é operado. Com base na concepção teórico-metodológica sugerida por Fley (2000) por Romano (2009), iniciamos a análise da Política de Desenvolvimento Territorial com a dimensão institucional ―polity”, que se refere tanto à ordem do sistema político delineada pelo sistema jurídico quanto à estrutura institucional do sistema político-administrativo. Começamos o estudo conhecendo os pressupostos teóricos os que inspiraram a implementação da proposta.

2.1.1 Inspiração na Terceira Itália e no Projeto Leader

No Brasil, Favareto (2010) afirma que o desenvolvimento territorial ganhou espaço tanto no debate científico como nas políticas públicas por razões de conjuntura nacional e por influência das discussões e experiências observadas em outros países, em especial nos da União Europeia. No que tange à literatura científica, um exemplo é a publicação do livro ―Tre italie. La problematica territoriale dello sviluppo italiano”, do sociólogo italiano Arnaldo Bagnasco, de 1977, sobre a problemática territorial do desenvolvimento italiano, obra que representa um marco na associação da ideia de território à ideia de desenvolvimento. Nesse livro, clássico, o autor procura explicar por que, naquele momento, as regiões que apresentavam indícios de dinamismo não eram representadas nem pelo Sul do país, cujos problemas históricos de pobreza se materializam, nem pelo noroeste, fortemente industrializado e com problemas na crise fordista; era sim a região nordeste do país, chamada de ―Terceira Itália‖. A principal contribuição dos estudos originários dessa vertente está em chamar a atenção para as características multidimensionais de determinados territórios e sua importância no estabelecimento da dinâmica econômica local.

Para Favareto (2010), o centro do argumento está em que, no caso italiano, constatou-se uma forte relação entre a distribuição espacial da chamada ―economia difusa‖, marcadamente um grande número de pequenas e médias empresas, associadas com a existência de uma forte base familiar entre as unidades de produção agrícola com um determinado padrão de urbanização que evitava uma fratura entre cidade e campo. A esse argumento se seguiram vários outros, de sociólogos, economistas e geógrafos, que analisam a formação dos chamados ―distritos industriais‖. Brusco (1996)41 apud Favareto (2010), particularmente, enfatiza como essas condições estruturais se transformam num ambiente que associa competição à colaboração, conflito à participação e conhecimento local e prático ao conhecimento científico. Guanzirolli (2006) também chama atenção para a experiência da

―Terceira Itália‖, no sentido de tornar-se uma referência paradigmática para a formulação e para a implantação de estratégias de desenvolvimento territorial em muitos lugares do mundo.

Montenegro Gómez (2006) aponta que o modelo da ―Terceira Itália‖, em função de não precisar de grandes capitais e por sua capacidade de geração de empregos, tem se colocado como objeto de desejo de muitos propositores de políticas públicas, também no meio rural, onde tanto a escassez de capitais como a necessidade de criar novos postos de

41 BRUSCO, Sebastiano. Trust, Social capital and local development – some lessons from the experience of the

―italian disctricts‖. In: OCDE (1996). Networks of enterprises and local development. Paris: OCDE, 1996.

trabalho para reduzir a pobreza são patentes. Todavia há que se ressaltar que a possibilidade de reproduzir a experiência da terceira Itália em outras zonas não tem o acordo dos teóricos do modelo. Segundo Montenegro Gómez (2006), baseado nos estudos de Gurisatti (1999)42, alguns autores insistem na dificuldade de exportar a proposta, por tratar-se de um modelo complexo e adaptado às condições existentes nesta área, logo, induzem que essa realidade não se encontra em qualquer outro lugar, sendo de difícil reprodutibilidade.

Favareto (2010) reforça que o referencial teórico-científico da experiência do desenvolvimento italiano passou a inspirar a literatura normativa, fato que pode ser observado nos estudos da OCDE (199343; 199544) e outros que o seguiram, publicados pelo Banco Mundial (199745; 200146), FAO (200447) e Cepal (200348). Estes passaram a ser o ideal normativo em experimentações no campo das políticas, tomando como referência a iniciativa mais conhecida: o programa Leader Liaisons Entre Actions de Développement de l`Economie Rurale, que, de acordo com o mesmo autor, foi a principal referência para o Desenvolvimento Territorial Rural no Brasil. Essa referência é confirmada por Walter Bianchini49, que fez parte da equipe de transição que participou da elaboração da proposta de implantação da Política de Desenvolvimento Territorial em 2002/2003.

O Programa Leader − Ligações Entre Ações de Desenvolvimento das Economias Rurais − surge em 1991, como Iniciativa Comunitária da União Europeia, nos marcos de um amplo processo de discussão sobre as formas de planejamento de políticas no continente, em crescente preocupação com as discrepâncias entre as regiões. Para Favareto (2010), sua marca inovadora foi, em primeiro lugar, seu viés territorial, em oposição ao caráter marcadamente

42 Gurisatti, Paolo. O nordeste italiano: nascimento de um novo modelo de organização industrial. In: URANI, André; COCCO, Giusepe; GALVÃO, Alexander Patez (orgs). Empresários e empregos no novos territórios produtivos. O caso da terceira Itália. Rio de Janeiro: DP&A, 1999.

43 OCDE. What future for our contryside? A rural development policy. Paris: OCDE, 1993.

44 OCDE. Creating employment for rural development – new policy approaches. Paris; OCDE, 1995.

45 THE WORLD BANK. Rural well-being – From vision to action. Proceedings of the Fourth Annual Bank Conference on Environmentally Sustainable Development. Washington, DC, 1997. políticas‖. Série Seminários e Conferências, n.27. Santiago de Chile, 2003.

49 Walter Bianchini: Engenheiro Agrônomo, Extensionista da EMATER-PR, participou da equipe de transição do Governo Fernando Henrique Cardoso para o Governo Luiz Inácio da Silva (2002/2003), Secretário da SAF/MDA – Secretaria da Agricultura Familiar 2002/2006, Secretário Estadual da Secretaria da Agricultura e Abastecimento do Paraná (2006/2010). Entrevista realizada em: 13/05/2011.

setorial dos investimentos tradicionalmente destinados às áreas rurais; em segundo, pelo tipo de estratégia proposta para a promoção do desenvolvimento rural, com ações baseadas no princípio da parceria, de caráter multissetorial e integradas. Favareto (2010) explicita que essa estratégia, baseada no conceito da competitividade territorial, envolve: a) a estruturação dos recursos do território de forma coerente; b) o envolvimento de diversos atores e instituições;

c) a integração entre setores empresariais em uma dinâmica de inovações; d) a cooperação com outras áreas e políticas nos vários níveis de governo.

Nos termos do programa, a competitividade territorial é alcançada por meio da elaboração de projetos de desenvolvimento que comportem uma visão de futuro, formas de coordenação dos atores e a constituição de um grupo de ação local. Favareto (2010) relata ainda que o Leader em sua primeira fase, de 1991 a 1994, apoiou 217 projetos territoriais, número que saltou para mil na fase seguinte, de 1994 a 1999. Os projetos recebem apoio de acordo com mérito, não havendo uma pré-seleção, como estímulo à competição entre territórios e à mobilização de energias e talentos pela busca por recursos. Duas características essenciais têm sido assim valorizadas pelo Leader: a concepção de que o desenvolvimento rural pode ser alcançado por planejamento e execução de projetos e a importância de que isto aconteça com enfoque participativo (FAVARETO, 2010).

Realçando as características do programa Leader, Guanzirolli (2006) enfatiza que o caráter singular e moderno dessa estratégia de desenvolvimento endógeno, voltada pra ações em pequena escala, é destinado a territórios rurais em desvantagens socioeconômicas, desenvolvendo-se de forma descentralizada, pressupondo parcerias entre todas as esferas de poder envolvidas, assim como a participação ativa de comunidades rurais. Guanzirolli (2006) aponta e reforça que o programa Leader não é setorial, pois, atua no território, e, nele, as atividades econômicas são reorientadas para maximizar a retenção dos benefícios dentro do local, focalizando-se nas capacidades e necessidades do povo da localidade e dando ênfase à participação dos atores nas decisões.

Abramovay (2005) também aponta duas características importantes do Programa Leader: a primeira é que quem define os territórios do programa são os próprios grupos de ação local, e não o governo, sendo esta definição apoiada, na verdade, em uma rede de política composta por diversas agências governamentais, pelo setor privado, por sindicatos, por ONGs e por forças sociais ligadas à arte e à cultura; a segunda é que os projetos submetidos às agências públicas são aprovados de maneira competitiva e em função de sua qualidade. Segundo ele, os planos apresentados são de longo prazo e devem mostrar o horizonte em que vão se tornar autossuficientes depois de certo período de atuação. Salienta

que para o projeto ser aprovado, há a necessidade de constar no plano a obtenção de recursos privados que vão completar os fundos públicos, transferido para as comunidades. Por isso, há necessidade de uma visão clara de empreendedorismo em cada projeto.

Favareto (2010), avaliando esta última característica, levanta que a lógica de seleção de projetos, em princípio, tende a reforçar as diferenças, à medida que os territórios já dotados de maior capacidade tendem a reunir melhores condições de proposição e, portanto, a angariar o apoio oferecido pelo programa. Além disso, a maneira como se dá a elaboração desses projetos de desenvolvimento e a própria articulação dos grupos locais têm de partir da base de recursos disponíveis. Um dos problemas para a dinamização de economias rurais é, muitas vezes, justamente a escassez dos recursos com os quais se pode contar para tais iniciativas.

Para ele, essas críticas revelam uma lacuna teórica na associação entre participação e desenvolvimento. Se por um lado há fortes evidências de que a participação contribui para a eficiência da aplicação de recursos em políticas sociais, por exemplo, onde há um público-alvo e um foco específico, no caso das ações de desenvolvimento, essa condição se revela muito mais complexa pois, são muitos os segmentos envolvidos e os interesses em conflito. E nesse caso, os processos participativos podem aumentar o poder de veto, mas não necessariamente aumentar a coesão entre agentes locais.

O legado negativo das propostas da Terceira Itália e do Leader para a Política de Desenvolvimento Territorial implantado no Brasil é sua a visão estritamente economicista, ligada essencialmente às ações do empreendedorismo descolada das raízes estruturais que impedem o desenvolvimento, tais como estrutura econômica, agrária e política.

2.1.2 O nascimento da Política através das contribuições de estudiosos e mediadores, e não da demanda dos atores e das organizações sociais e políticas

A elaboração/implementação de um novo paradigma de desenvolvimento rural, para Montenegro Gómez (2007), exigiu uma arquitetura institucional complexa e eficaz.

Complexa, porque deve dar conta de integrar as mais diversas escalas (desde a global até a local); eficaz, porque o prestígio do desenvolvimento que assegura a reprodução do capital, enquanto pauta que ordena a dinâmica social, não se pode abandonar na mão de instituições incapazes e com recursos humanos e financeiros limitados. Para podermos ter um pouco de mais profundidade na análise, escolhemos como recorte territorial inicial, embora sem um grande aprofundamento, a escala regional latinoamericana, devido à inserção do Brasil nesta escala, como também pelo avanço desta proposta na região. Montenegro Gómez (2007)

descreve que existe pesquisa bibliográfica e documental ampla sobre desenvolvimento territorial rural na América Latina, revelando que o tema está fortemente concentrado temporalmente. De acordo com o autor, os primeiros trabalhos que são encontrados sobre o assunto remetem ao final dos anos 1990, mas é, sobretudo, a partir do ano 2000 que se depara com a maior parte da produção. Institucionalmente, também há uma intensa concentração dos trabalhos, documentos, organização de seminários, etc.

Montenegro Gómez (2007) aponta que as principais instituições que promovem estudos e encontros para abordar o tema do desenvolvimento territorial rural, na América Latina, são: o IICA (Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura), a CEPAL (Comissão Econômica para América Latina e Caribe), o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA) e a Sociedade Alemã de Cooperação Técnica (GTZ). Além dessas instituições, destaca-se a presença de dois institutos de pesquisa e capacitação, que catalisam uma parte importante dos estudos, reuniões, cursos e oficinas envolvendo questões de desenvolvimento territorial rural:

a Rede Internacional de Metodologia de Investigação de Sistemas de Produção/Centro Latino-americano para o Desenvolvimento Rural (RIMISP), com um perfil mais centrado na pesquisa; e o Projeto Regional de Cooperação Técnica e Formação em Economia e Políticas Agrárias e de Desenvolvimento Rural na América Latina (FODEPAL), com um perfil mais voltado para a formação. Completando o staff que sustenta o discurso e a prática do desenvolvimento territorial rural, na América Latina, temos a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO), o Banco Mundial (BM), a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) e a Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (AECID).

De encontro com informações acima, Guanzirolli (2006) relata que, especificamente no Brasil, algumas organizações internacionais e projetos de cooperação técnica vinham, em meados dos anos 1990, desenvolvendo atividades com esse conceito, através de concepções de resgate de ideias como: capital social, território e descentralização. Pode-se citar o Banco Mundial (Projeto Nordeste, FUMOC) e a FAO, que propunha a realização de diagnósticos regionais que levariam à elaboração de Planos de Desenvolvimento Regional Rural Sustentável, dentro de uma visão de ―Organização do Território‖.

No final da década de 1990, o governo Fernando Henrique Cardoso criou o Programa Comunidade Ativa, inserindo as estratégias de desenvolvimento territorial em suas políticas sociais. Coordenado pela Secretaria-Executiva do Programa ―Comunidade Solidária‖, o Programa Comunidade Ativa foi criado com o objetivo básico de combater a

pobreza e promover o desenvolvimento através da indução do ―Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável‖ (DLIS), um programa de indução ao desenvolvimento local dos espaços mais deprimidos do país. A ênfase estava na descentralização e na focalização dos programas para evitar a dispersão e o desperdício de recursos. O mesmo autor relata que o Ministério de Ciência e Tecnologia e a FINEP entraram, em 1998, também nesta linha de atuação territorial, a promover o desenvolvimento de Arranjos Produtivos Locais (APLs), que eram ―aglomerados de agentes econômicos, políticos e sociais, localizados em um mesmo território, que apresentam vínculos consistentes de articulação, interação, cooperação e aprendizagem e vantagens microeconômicas advindas da proximidade entre os agentes‖

(GUANZIROLLI, 2006, p.12).

Quanto à proposta de desenvolvimento rural, em especial ao desenvolvimento territorial rural no Brasil, para Schneider (2008), ela nasceu das contribuições de estudiosos e mediadores, e não da demanda dos atores e das organizações sociais e políticas do meio rural.

Portanto, segundo ele, a porta de entrada das discussões sobre o desenvolvimento rural no Brasil nos últimos 15 anos foi fortemente influenciada pelo Estado e por suas relações com os mediadores e estudiosos. Isto não significa que os atores, as organizações e as instituições formais que atuam no meio rural não tenham interagido ou pressionado o Estado.

Quanto aos estudos que contribuíram com a proposta, pode ser divididos em duas vertentes, conforme aponta Favareto (2010): estudos que analisaram os processos de mudança no meio rural brasileiro e os que analisaram as políticas públicas para o desenvolvimento rural no Brasil dos anos 1990. Da confluência dessas duas vertentes surgem os consensos (sempre parciais e provisórios) em torno da ideia de desenvolvimento territorial. De acordo com Favareto (2010), alguns destes estudos tiveram a intervenção de entidades sindicais de representação da agricultura familiar, entre elas a CUT/CONTAG, como também de instituições do governo, entre elas o INCRA, com recursos patrocinados por instituições internacionais de cooperação. Com relação aos estudos e estudiosos, eles estão temporalmente situados na década de 90 e deram base empírica e teórica aos conceitos de agricultura familiar e desenvolvimento rural/territorial.

Guanzirolli (2006), Schneider (2008) e Favareto (2010) destacam os seguintes estudos como idealizadores/definidores desta política: o livro de Ricardo Abramovay,

―Paradigmas do capitalismo agrário em questão”, lançado em 1992; o livro publicado no ano anterior por José Eli da Veiga, ―O desenvolvimento agrícola: uma visão histórica”; e os dois volumes da comparação internacional de modelos de unidades familiares, organizados por Hugues Lamarche, em ―A agricultura familiar” – do qual participaram quatro equipes de

pesquisa, tendo sido uma delas composta pelos pesquisadores brasileiros Maria Nazareth Wanderley, Fernando Lourenço, Anita Brumer e Ghislaine Duque. Para os autores, estes foram livros que passaram a ser uma espécie de literatura obrigatória no âmbito dos estudos rurais e serviram para afirmar a relevância da noção de agricultura familiar para parte do vocabulário acadêmico brasileiro, como também na inspiração de políticas públicas para o setor no sentido de incorporar as unidades familiares ao processo capitalista de produção.

Outro estudo em destaque foi o relatório da FAO/INCRA, publicado em 1994, que ofereceu uma tipologia das formas sociais de produção no meio rural brasileiro, servindo de base, dois anos depois, para a criação do PRONAF – Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar. Entre 1996 e 1998 uma pesquisa cobrindo todo o território nacional, realizada a pedido das organizações sindicais de representação da agricultura familiar e patrocinada com recursos de instituições europeias de cooperação, tentou mapear as dinâmicas naquele momento, qualificadas como ―mesorregionais de desenvolvimento‖

existentes no Brasil (Projeto CUT/Contag, 1998), coordenado por José Eli da Veiga (FAVARETO, 2010).

Outro estudo realizado no final da década de 1990 que teve grande repercussão foi o

―Projeto Rurbano‖. Coordenado por José Graziano da Silva, o Projeto Rurbano, de acordo com Schneider (2008), mobilizou mais de quatro dezenas de pesquisadores universitários (vinte e cinco com título de doutor) de onze estados da federação, de vinte diferentes instituições e com um portfólio de mais de vinte subprojetos. O estudo mostrou o surgimento do novo rural brasileiro, decorrente do próprio processo de modernização conservadora de base tecnológica da agropecuária.

Para Graziano (1997) quando este processo de modernização se completa, no final da década de 1980, especialmente nas regiões Centro e Sul do Brasil, emerge no meio rural uma nova conformação econômica e demográfica, que possui como característica fundamental a redução crescente das diferenças entre o urbano e o rural, especialmente no que se refere ao mercado de trabalho, devido ao crescimento da população ocupada em atividades não-agrícolas. O rural deixa de ser sinônimo de atraso e se desconecta da agricultura, que passa a ser apenas uma de suas atividades. Esse novo rural (ou o processo de rurbanização) seria composto, basicamente, por três grupos de atividades, quais sejam: uma agropecuária moderna (agronegócio), baseada em commodities e intimamente ligada às agroindústrias; um conjunto de atividades não agrícolas ligadas à moradia, ao lazer e a várias atividades industriais e de prestação de serviços e, por último, um conjunto de novas atividades agropecuárias, impulsionadas por nichos de mercado.

Além desta faceta moderna,50 o lado atrasado do rural persistiria por meio da manutenção da pobreza e da vulnerabilidade de ampla gama da população, identificado como o grupo social que Graziano da Silva denominou de ―sem-sem”, que seria formado pelos excluídos e desorganizados que, além de não terem terra, emprego, educação, saúde e renda, não teriam sequer uma organização social que os mobilizasse. Este seria o semblante deste

―novo rural‖: famílias pluriativas, que são aquelas que combinam atividades agrícolas e não agrícolas e promovem a integração intersetorial (agricultura com comércio e serviços) e interespacial (rural com urbano) (SCHNEIDER, 2008).

No capítulo quatro discutiremos com maior profundidade a inserção/ligação do DTR com as premissas do Novo Rural também chamado de Nova Ruralidade.

Outro estudo, divulgado em 2000, com bases no Censo Agropecuário de 1996 foi chamado de ―O novo retrato da agricultura familiar: o Brasil redescoberto‖, resultante de um projeto de cooperação técnica entre INCRA/FAO e coordenado por Carlos Enrique Guanziroli (da FAO) e Silvia Elizabeth Cardin (do INCRA). Foi também um marco na discussão da presença da agricultura familiar no Brasil. O trabalho consiste basicamente em uma tipificação das unidades familiares e contribui para a consolidação do PRONAF – Programa Nacional de Apoio a Agricultura familiar.

Entre os autores que tiveram destaque no debate, Schneider (2008) explicita que Veiga (1991) e Abramovay (1992) desenvolveram o argumento de que a capacidade empreendedora e inovadora dos agricultores familiares é a responsável pela diversificação social e produtiva dos territórios rurais em que vivem. A partir deste enfoque, seus trabalhos passam a dialogar de forma mais direta com as discussões sobre o tema dos territórios e do desenvolvimento do espaço rural como um todo. Em decorrência disso, ambos estudiosos influenciaram na introdução da noção de desenvolvimento territorial no Brasil, em geral, fortemente assentada nos seus diálogos com a bibliografia europeia, particularmente com a francesa (a noção de contratos ou projetos territoriais, a ideia de distritos e de ambientes de

Entre os autores que tiveram destaque no debate, Schneider (2008) explicita que Veiga (1991) e Abramovay (1992) desenvolveram o argumento de que a capacidade empreendedora e inovadora dos agricultores familiares é a responsável pela diversificação social e produtiva dos territórios rurais em que vivem. A partir deste enfoque, seus trabalhos passam a dialogar de forma mais direta com as discussões sobre o tema dos territórios e do desenvolvimento do espaço rural como um todo. Em decorrência disso, ambos estudiosos influenciaram na introdução da noção de desenvolvimento territorial no Brasil, em geral, fortemente assentada nos seus diálogos com a bibliografia europeia, particularmente com a francesa (a noção de contratos ou projetos territoriais, a ideia de distritos e de ambientes de