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4 A POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL RURAL: O ESTADO SEM “ESTADO” EM TERRITÓRIOS RURAIS

1.2 UTOPIAS AGRÁRIAS E CONFLITOS NA LUTA PELA TERRA: MARCAS DA HISTÓRIA NO TERRITÓRIO DO TERRITÓRIO PARANÁ CENTRO

O desafio deste subcapítulo é descrever os episódios que marcaram os sonhos, as lutas e as resistências, que se configuraram como conflitos que compõem a história da construção do Território da Cidadania Paraná Centro. Muitos destes episódios são pouco conhecidos na Região e no Estado e, por vezes, escondidos ou negados por parte das lideranças locais/regionais. O que estes episódios têm em comum é o caráter propositivo do conceito de ―utopia‖, que de acordo com Jasmin (2008), é o que dizer de ―algo que não existe previamente‖, é a mobilização e a busca que os atores realizam no interior de uma determinada perspectiva de mundo, resultando em uma arma ou ferramenta de luta, seja por uma posição no debate, seja em uma situação de enfrentamento ou resistência, ou ainda na produção de alianças e até mesmo no sentido de desqualificar seus adversários. O ponto em comum nessas utopias agrárias é a defesa pela ―terra‖, vista como chão onde se vive e onde foram enterrados os antepassados; é de onde se tira o sustento do corpo; lugar de descanso e espaço de celebração do sagrado. Para esses atores, a ―terra‖ é sempre uma coisa além de um lugar de posse ou propriedade privada (STARLING, RODRIGUES E TELLES, 2008).

Este subcapítulo está dividido em quatro partes: a primeira esboça a experiência de socialismo utópico empreendido por Jean Maurice Faivre na Colônia Thereza Cristina; a segunda parte é dedicada à luta dos índios Kaingang contra sua desterritorialização; a terceira consiste na descrição do conflito dos povos quilombolas com os fazendeiros na comunidade

―Invernada Paiol de Telha‖; na quarta parte procuramos relatar os episódios que marcam a luta dos camponeses do Território contra a grilagem de terras, com ênfase ao episódio ―Grilo do Tigre – a revolta dos colonos‖, em Boa Ventura de São Roque. Nesta última parte, também procuramos fazer de forma muito breve, um registro dos conflitos pela terra ou aqueles que tenham algum tipo de relação, ocorridos no período de 1990 a 2010.

1.2.1 A Colônia Thereza Cristina e a sua experiência de socialismo utópico

No final do século XIX, a região de Guarapuava, que vivia do impulso econômico promovido pela sociedade campeira, iniciava uma experiência comandada pelo médico francês Jean-Maurice Faivre14. Sua ambição era implantar, partindo do modelo de um

―socialismo utópico‖, uma Colônia Agrícola às margens do Rio Ivaí, distante 18 léguas de Guarapuava. De acordo com Josué Correa Fernandes, autor do livro ―Saga da Esperança:

Socialismo utópico à beira do Ivaí‖, Jean-Maurice certamente teve inspiração em homens expoentes do socialismo utópico15. No entanto, não se agregou e nem se vinculou a qualquer um deles, embora sua obra possua um pouco de cada um.

Para Fernandes (2006), Faivre, na verdade, não se perfilhou a nenhuma das respectivas doutrinas, nem teve o objetivo de segui-las ao pé da letra. Não foi, por isso, um ideólogo do saint-simonismo ou do fourierismo, muito embora, em suas ações e em seus manuscritos percebam-se alguns pontos de contato com tais doutrinas. O respeito e o amor ao próximo que não cansa de recomendar aos seus companheiros como lei maior, a exortação ao nome de Deus que seguidamente faz em cartas e documentos; e a condenação da escravidão e da exploração do próximo, porém, identificam-se, plenamente, com os postulados do Conde de Saint-Simon quando advoga os valores da Igreja primitiva na resolução da crise econômica e social da humanidade. De Charles Fourier, parece que Faivre adotou a ideia do retorno à agricultura, do trabalho comedido e espontâneo e da reunião de famílias em locais mais ou menos assemelhados, onde avulta a ideia de associação e de cooperação.

A Colônia Agrícola teve o nome Thereza Christina em homenagem à Imperatriz esposa de D. Pedro II, que foi sua amiga e apoiadora da ideia da colonização, inclusive fornecendo recursos financeiros da coroa imperial para o financiamento do projeto.

Fernandes (2006) relata que a escolha do local feita por Faivre se deu devido a fatores como o clima bom, pois as estações se apresentam sem calor excessivo e sem inverno rigoroso, e pela proximidade com o Rio Ivaí, através do qual poderia se fazer o transporte dos produtos a outros centros.

14 Ver biografia completa com detalhes de sua vida e obra no livro: Saga da Esperança de Josué Correa Fernandes. Curitiba: Imprensa Oficial. 1986.

15 Robert Owen (1771/1858), Saint-Simon (1760/1825), François Marie Charles Fourier (1772/1834), Pierre-Joseph Proudhon (1809/1865), Louis Blanc (1811/1882), foram chamados de utópicos por Marx e Engels, fundadores do socialismo científico, porque objetivaram dar novos perfis à sociedade, não através da organização e da ação revolucionária dos trabalhadores para tomar o poder. Ao contrário, pretendiam reconstruir a sociedade, acabando com a miséria e com as desigualdades, mediante atos de boa vontade e de compreensão da burguesia (FERNANDES, 2006, p.103).

O projeto teve início em 1847, com 63 imigrantes franceses selecionados por Faivre, incluídos aí: médicos, agricultores, oleiros, professores, moças e rapazes em idades para casar e pessoas com habilidades em cortes de madeira, marcenaria e construção. Fernandes (2006) discorre que o projeto proposto por Faivre destinado ao desenvolvimento da Vila Agrícola Thereza tinha como diretrizes: a) ser composto por quatro grupos, de dez a doze famílias cada um, distanciados uma légua, aproximadamente, uns dos outros; b) que nenhum escravo seria admitido na Colônia, os trabalhos de toda espécie deveriam ser feitos, obrigatoriamente, por homens livres, argumentava que os negros eram homens como eles e não uma espécie de

―brutos animais‖, pois afinal também sentem e pensam; c) que as terras que seriam concedidas à Colônia, de antemão, seriam comunais e que cada um receberia a porção correspondente às necessidades balizadas pelo número de membros da família e pela respectiva capacidade de cultura, nunca podendo exceder, no entanto, a trezentas braças de frente por seiscentas de fundos. Na mesma linha, a propriedade do colono que ficasse mais de dois anos sem ser habitada, voltaria ao domínio comunal; d) ao diretor da vila ainda caberia traçar um plano de construções e de plantações, o qual todos os colonos deveriam anuir e respeitar; e) as máquinas, os demais equipamentos e todos os trabalhos já feitos anteriormente destinados ao uso comum, poderiam ser utilizados por todos, dentro de certas normas; f) o pagamento à comunidade dar-se-ia através de jornadas de trabalho em tarefas de utilidade pública, como abertura e limpeza de caminhos, construção de pontes e outros; g) a criação de um Conselho Municipal, composto em consonância com as leis pátrias, o qual decidiria sobre os trabalhos e sobre os melhoramentos de utilização comum, assim como sobre a distribuição de terras aos indivíduos e as reservas comuns a serem criadas e conservadas.

Fernandes (2006) assinala que o maior problema da Colônia foi-e continuou sendo nos anos subsequentes-a absoluta falta de estradas ou vias secundárias que ligassem Thereza Christina às duas vilas mais próximas, Guarapuava e Ponta Grossa. Os próprios colonos foram construindo vias de acesso, com muito trabalho penoso e, frequentemente, infrutífero.

Um ano depois, já haviam desertado vários dos compatriotas de Faivre e começou o ingresso de várias famílias brasileiras e uma portuguesa na colônia.

Em 1855, após a instalação da Assembleia Provincial do Paraná, pois até então a região pertencia à Província de São Paulo, o Presidente Zacarias de Góes e Vasconcelos (amigo de Faivre da época do Rio de Janeiro) propôs que se tomasse alguma providência para ajudar a Colônia (MARCONDES, 2010). Assim, em 1º de maio de 1855, a Colônia Thereza passou à jurisdição da Vila de Guarapuava, pela Lei nº 26 da Assembleia Provincial, passando a ser atendida, inclusive, pelos padres da Paróquia de Nossa Senhora de Belém. De acordo

com Fernandes (2006), Faivre também solicitou ao Presidente a criação de uma escola de

―Instrução Primária‖, o qual foi atendido com a designação de professores.

O mesmo autor relata que 1858 existiam quarenta e três famílias, compostas de duzentas e quarenta e quatro pessoas (onze francesas, uma portuguesa e o restante [118]

brasileiras). A maioria das pessoas era do sexo masculino, com oito nascimentos, quatro óbitos e dois casamentos. Havia, ainda, nove engenhos de cana, quatro alambiques, uma

―fábrica de licores‖, uma ―fábrica de fumo‖, olaria, forno de cal, moinho de atafona, máquina hidráulica de serrar madeira, estando em vias de instalação, e outra à vapor. Além dos agricultores, existiam três carpinteiros, um ferreiro, um torneiro, dois sapateiros, um funileiro e um armeiro. As importações eram quase sempre as mesmas: pólvora, chumbo, sal, fazendas e carne seca, cujo montante ficava bem abaixo daquele apontado pelas saídas de produtos oriundos dali. Vê-se, assim, que os sucessos obtidos na Vila Agrícola foram muito mais significantes do que os eventuais fracassos e que Faivre, pela ação firme e resoluta, demonstrou ser possível o êxito em meio a dificuldades que pareciam invencíveis.

Nivaldo Krüger, em seu livro ―Guarapuava – fases históricas e ciclos econômicos:

das missões jesuíticas do século XVI à modernidade do século XXI‖, relata que na Colônia Thereza Cristina, pela primeira vez no Paraná, cultivou-se cana de açúcar, produzindo aguardente e também, pela primeira vez, cultivou-se o fumo no Estado. Krüger (2010), também descreve que foi Faivre que trouxe da corte os dois primeiros arados que o Paraná conheceu, deixando um deles em Curitiba e levando o outro para a colônia.

Faivre foi sempre incansável nas buscas de recursos para a colônia. Além de cartas enviadas às autoridades, com frequência, via-se obrigado a se retirar dali, a fim de se dirigir ao Rio de Janeiro e à Curitiba, ou ainda às outras Vilas e Freguesias do velho Paraná, como:

Guarapuava, Ponta Grossa, Castro, Lapa e Paranaguá. Também se dirigia para atender a chamados de agricultores que viviam isolados nas regiões dos Campos Gerais e no vale existente entre os rios Ivaí e Tibagi (FERNANDES, 2006).

Sofrendo de moléstia que contraíra nos sertões do Tibagi, Jean Maurice Fraive morreu em 31 de agosto de 1858 (FERNANDES, 2006).

Em abril de 1871, a Colônia Thereza foi elevada à categoria de freguesia, com denominação de Therezina, emancipando-se de Guarapuava e, em 1891, passou a ser distrito judiciário, com a denominação de Tereza Cristina. Hoje é distrito do município de Cândido de Abreu, sofrendo dos mesmos problemas que os pioneiros enfrentaram, entre eles a falta de infraestrutura e as condições precárias.

Fernandes (2006) lembra que Faivre é citado como precursor do cooperativismo no Brasil em grande parte dos estudos sobre a temática no país. O médico francês é mencionado, costumeiramente, como o legítimo precursor do sistema econômico que faz das cooperativas uma das bases das atividades de produção agropecuária. Observa-se, inclusive, que suas ideias desenvolvidas na Colônia também estão ainda presentes nas reivindicações dos movimentos camponeses, tais como as propostas de a terra seja destinada para quem nela trabalha, bem como as perspectivas de a ações coletivas e respeito ao meio ambiente. Porém, no interior do Território, Faivre e suas experiências na Colônia Thereza Cristina são totalmente desconhecidas pela maioria da população, inclusive pelos movimentos e organizações sociais ligados as lutas pela terra.

Assim também o fazem alguns autores que descrevem a historiografia da região de Guarapuava, tais como Abreu (1986) e Marcondes (2010), que ao relatarem o caso da Colônia, fazem uma leitura simplista e reducionista de sua história, ressaltando-a apenas como uma experiência ―mal sucedida‖ e se utilizando somente de dados oficiais, não levando em conta a intencionalidade e o conteúdo teórico do projeto, tampouco os méritos do médico humanista. Este fato vem de encontro às características de um território conservador de poder, que nega qualquer tipo de experiência ou movimento que contrarie as práticas tradicionais fundadas no clientelismo e mandonismo. Igualmente são negadas as resistências e os conflitos dos povos tradicionais, como veremos no próximo item, dedicado à luta dos índios Kaingang na garantia do seu território.

1.2.2 Conflitos e desterritorialização dos índios Kaingang

A região que compreende o município de Guarapuava era ocupada, até o início do século XIX, segundo Marcondes (1998), pelos grupos indígenas da etnia Kaingang, subdivididos em: Kamé, que habitavam os sertões de Guarapuava até Campo Mourão e de Palmas até o Rio Uruguai; e Votorões, que habitavam Candói, Pinhão e Palmas. Todos estes territórios pertenciam à Guarapuava e foram se ampliando ao longo do tempo. Os grupos pertenciam à família linguística ―Jê‖. De acordo com a autora, de provável origem no Brasil Central, os Kaingang ocuparam vastas áreas do Sul do Brasil. Sua ocupação predominante no centro-sul do Estado do Paraná deve-se à ocupação Guarani no litoral e no vale dos rios, que os empurrou para as áreas planálticas, em territórios interfluviais.

Os Kaingang têm como um dos marcos de suas lutas pela manutenção de seus territórios no Paraná, de acordo com Mota e Novak (2008), a ―derrota que impuseram às

tentativas de ocupação do tenente-coronel Afonso Botelho nos campos de Guarapuava‖, que durou de 1768 a 1774. Foram sete anos de exploração dos rios Iguaçu e Ivaí, além dos campos e das florestas de suas adjacências. Ao todo foram enviadas onze expedições militares para a região, marcadas por encontros aparentemente pacíficos, seguidos de choques e escaramuças, até que finalmente, em 1774, Botelho retirou-se da região sem conseguir seu objetivo:

conquistar os campos de Guarapuava. Para os autores, desde a expulsão de Afonso Botelho e suas tropas dos ―Campos de Guarapuava‖, em 1772, os Kaingang, encorajados, faziam incursões cada vez mais ao ocidente. No início do século XIX, eram senhores dos territórios à oeste da ―estrada do Viamão‖ e atacavam constantemente fazendas, vilas e viajantes nas suas imediações.

Com a chegada de Dom João VI ao Brasil, o Império resolveu que as populações indígenas deveriam ser combatidas, catequizadas e ―civilizadas‖ e que seus territórios deveriam ceder lugar às prósperas fazendas de gado. Mota e Novak (2008) descrevem que o governador da província de São Paulo convocou o experiente militar Diogo Pinto de Azevedo para organizar a ocupação dos territórios dos Kaingang e mantê-los afastados das fazendas de gado. O objetivo da expedição era ocupar esses campos, abrindo espaço para as fazendas de criação, e sua principal consequência foi a derrota dos Kaingang.

Os Kaingang foram derrotados em 1810, porém, a sua resistência continuou. Para Mota e Novak (2008), muitas foram as ideias e as práticas de como tratar e o que fazer com os índios no primeiro período imperial, momento em que começava a se constituir o Estado Nacional. O gradiente de propostas variava desde guerras, passando até mesmo às intenções de ―branqueamento‖ das populações indígenas, por meio da miscigenação com as populações brancas. Também se propunha civilizá-los ou catequizá-los em aldeamentos religiosos ou mesmo a manutenção da sua própria cultura em áreas reservadas. Predominou no Paraná a proposta de aldeamento, porém os resultados obtidos eram quase nulos. O que não se percebia era que os índios tinham uma política em relação aos aldeamentos que se pautava em utilizar e em aproveitar os recursos ali encontrados, ao mesmo tempo em que rejeitavam o enquadramento no modo de vida branco, pregado pela catequese, e continuavam a defender seus territórios diante do processo de desterritorialização imposto, quer pela política imperial de aldeamentos, quer pela conquista militarizada levada a cabo pelas elites locais.

No final da década de 1870, evidenciaram-se as ações do grupo Kaingang, liderado pelo cacique Francisco Luís Tigre Gacom, que exigia do governo provincial e imperial sua antiga sesmaria de Atalaia e Sepultura nas imediações de Guarapuava, que havia sido doada por D. João em 1819. Começa a haver, neste período, uma mudança na forma de agir por

parte dos Kaingang em toda província. Uma nova forma de luta que não consistia somente no ataque contra as fazendas e os viajantes, e também não se resumia apenas em exigências por mais recursos nos aldeamentos oficiais; agora a luta era pela demarcação de suas terras (MOTA E NOVAK, 2008).

Após muitas discussões, embates e lutas, Mota e Novak (2008) complementam que foi demarcada uma área de terras para os Kaingang. Foi demarcada a ―Terra Indígena Marrecas‖, no município de Guarapuava, sendo a primeira área reservada a um grupo indígena no Paraná.

Se os Kaingang situados na margem esquerda do Rio Ivaí tinham conseguido a demarcação de Marrecas, os grupos da margem direita também vinham lutando pela demarcação das suas. Eles ocupavam extensas áreas em todo Vale do Rio Ivaí, desde sua nascente até a região abaixo da antiga Vila Rica do Espírito Santo, na foz do Rio Corumbataí.

Como resultado dessas demandas, durante o governo de Francisco Xavier da Silva, através do Decreto n° 8, de 9 de setembro de 1901, foi concedida uma área aos Kaingang, chefiados por Paulino de Arak-xó e Pedro dos Santos, localizada na margem direita do Rio Ivaí, no município de Guarapuava. Apesar de estarem com seus toldos na margem direita do Ivaí, os Kaingang faziam incursões constantes nos extensos e férteis territórios da margem esquerda.

Em 4 de maio de 1912, os Kaingang novamente chefiados pelo cacique Paulino Arak-xó, propuseram ao governo do Estado uma permuta de parte das terras da margem direita do Rio Ivaí, concedidas anteriormente, por outras terras na margem esquerda, nas corredeiras do Ubá. O documento16 enviado, grosso modo, pareceu ser vantajoso para os Kaingang, já que propunha o aumento de seu território. Mas, ao mesmo tempo, agradava o governo, pois definia intenções em utilizar as terras da margem direita do médio Rio Ivaí para o estabelecimento de núcleos coloniais. Em 1913, foi concedida a permuta de terras requeridas pelo cacique, por meio do decreto 294 de 17 de abril.

Ao mesmo tempo em que publicavam decretos estabelecendo áreas para fixação dos índios, o governo incentivava a ocupação da região por imigrantes europeus. Já em 1912, a região passou a receber colonizadores estrangeiros, alemães, poloneses e ucranianos. A colônia federal de Cândido de Abreu teve início em 1915, formada por colonizadores brasileiros, alemães, ucranianos e poloneses (MOTA E NOVAK, 2008).

As políticas de ocupação territorial apregoadas pelo governo estadual e pela história oficial dos colonizadores, de acordo com Eurich (2010), sempre afirmaram que as terras

16 O documento com demais detalhes desta operação se encontra em Mota e Novak (2008, p.146 e 147).

indígenas do terceiro planalto do Paraná constituíam um imenso ―vazio demográfico‖, pronto a ser ocupado pelos pioneiros. Apontava-se a necessidade de colonização destas regiões, mas não levavam em consideração as populações indígenas que eram nativas.

Nas primeiras décadas do século XX, uma série de leis e decretos do governo paranaense regulamentou as terras indígenas no Estado. Foram várias leis estaduais que marcaram e remarcaram os territórios indígenas. No entanto, nem o governo do Estado e nem o SPI (Serviço de Proteção ao Índio), na prática, fizeram a demarcação dessas terras. É interessante também observar no Decreto n° 294 que o governo estadual, ao conceder as terras da margem esquerda do Rio Ivaí aos Kaingang do cacique Paulino Arak-xó, afirmou a existência de propriedades particulares dentro da área reservada ao grupo indígena, ficando, desta forma, garantidas em sua plenitude, as posses ali existentes, amparadas por documentos legais. Esta política contraditória do governo paranaense acabou fortalecendo o clima de tensão e insatisfação tanto dos índios quanto dos moradores brancos. Uma das consequências da não demarcação das terras permutadas pelo cacique Paulino Arak-xó, nas margens esquerdas do Rio Ivaí, foi o sangrento episódio da ―Guerra de Pitanga‖ (MOTA E NOVAK, 2008), também chamada de ―Massacre da Serra da Pitanga‖17, por Barthelmess (1997) e Vaz (2002), ocorrida no mês de abril de 1923.

Uma das razões para este conflito, segundo Camargo (1999), era o fato dos colonos, ao reduzirem a reserva dos Kaingang, também reduzirem a área de caça, fazendo com que diminuísse a sua alimentação. Ao mesmo tempo, a caça era indiscriminadamente praticada pelos colonos. Em razão disso, os indígenas iniciaram a onda de saques aos sítios, furtando porcos para suprir sua alimentação. Quando pegos com o produto furtado, os índios eram

Uma das razões para este conflito, segundo Camargo (1999), era o fato dos colonos, ao reduzirem a reserva dos Kaingang, também reduzirem a área de caça, fazendo com que diminuísse a sua alimentação. Ao mesmo tempo, a caça era indiscriminadamente praticada pelos colonos. Em razão disso, os indígenas iniciaram a onda de saques aos sítios, furtando porcos para suprir sua alimentação. Quando pegos com o produto furtado, os índios eram