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CAPÍTULO 2 – PATRIMÔNIO CULTURAL E EDUCAÇÃO PATRIMONIAL

2.1 PATRIMÔNIO CULTURAL

2.1.4 A Proteção do Patrimônio no Paraná

2.1.4.2 A Proteção no âmbito Estadual

As primeiras notícias de preservação no Paraná, por meio de iniciativas próprias locais, remontam a 1855, quando o Presidente da Província, Zacarias de Góes e Vasconcelos, por intermédio da Lei nº 33 de 07 de abril de 1855, criava um Arquivo Público na Secretaria de Governo da Província. Esse arquivo tinha por “finalidade ‘coligir’ todas as memórias impressas ou manuscritas relativas à história e geografia da Província, como: cartas geográficas, cópias de projetos de obras públicas, mapas estatísticos, relatórios de Presidente da Província e do Secretário, entre outros” (WESTPHALEN, 1991, p.29).

Em 1876, com a criação do Museu Paranaense, iniciou-se no Paraná um trabalho mais sistematizado de coleta e guarda de peças oriundas dos sambaquis no litoral paranaense (LYRA, 1994). Foram essas as primeiras iniciativas no século XIX, por parte dos paranaenses, de guarda de vestígios materiais.

No período republicano, as primeiras iniciativas de preservação ocorrem a partir de 1900, com a criação do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná, que tinha

por objetivo coligir, estudar, publicar e arquivar todos os documentos que servissem à historiografia do paranaense, promovendo a difusão de seu conhecimento pela imprensa e pela tribuna.

Este momento da produção e preservação estava intimamente ligado à experiência de construção de uma identidade cultural do estado, em função da própria ascensão do Regime Republicano. Afirma Pereira (1997, p.21) que “além da necessidade de construção de uma nova imagem nacional, de uma nova idéia de Nação, através das representações, abre-se pela descentralização política, espaço para os regionalismos”.

Surgiu então, no Paraná, o Movimento Paranista, que pretendia construir uma identidade cultural, em uma época carente de representações necessitando de “invenção das tradições” (HOBSBAWN, 1984), em particular por meio das artes plásticas. Constroem-se, no período, símbolos, lendas, histórias e tradições que representassem o ideal de ser paranista. E nessa linha de pensamento, em 1948, o Estado passou a se preocupar com a preservação do patrimônio cultural, criando o Conselho Consultivo do Patrimônio Histórico e Artístico.

Após cinco anos, baseada no Decreto 25/37, foi instituída a Divisão do Patrimônio Histórico e Artístico, ligada à Divisão de Assuntos Culturais da Secretaria de Educação e Cultura e sancionada a Lei nº 1.211 de 1953, passando então a legislar sobre o Patrimônio Histórico, Artístico e Natural do Estado do Paraná. Esse fato foi considerado uma iniciativa pioneira, em um período em que a proteção do patrimônio dos Estados era exercida, em grande parte dos estados brasileiros, unicamente pelo SPHAN.

Uma das polêmicas geradas em torno da Lei 1.211, que na verdade é uma cópia do Decreto Lei 25, que possibilitava ao Estado a instituir seus bens culturais, é a respeito da necessidade do Estado (ou mesmo o Município) ter uma lei de tombamento. Necessária ou não, o que se pode destacar é que, enquanto não existir uma consciência preservacionista, um conjunto de leis tem que estar à mão para coibir o uso (e abuso) sem critérios, pois esse abuso é uma marca constante em relação ao patrimônio cultural da sociedade. A partir do momento em que existir uma conscientização, como afirmou Aloísio Magalhães, a comunidade é a melhor guardiã de seu patrimônio, onde leis coercitivas (tombamentos, restrições e multas) para a defesa e constituição da memória histórica não precisarão existir mais.

As primeiras medidas de tombamento pela Lei 1.211 ocorreram sobre os bens que já haviam sido tombados pelo SPHAN. O primeiro tombamento estadual efetuou- se sobre a Igreja da Ordem Terceira de São Francisco de Chagas, em Paranaguá, tombada pelo SPHAN em 1962. Dentro de uma política estadual de preservação até 1979, ocorreram no Estado 60 tombamentos em diversos municípios.

A partir de 197923, no governo de Ney Braga, foi efetivada a Secretaria de

Estado da Cultura e do Esporte e, com ela, criou-se a nova estrutura relativa à proteção do Patrimônio Histórico no Paraná. Extinta a antiga Diretoria de Assuntos Culturais e Divisão do Patrimônio Histórico e Artístico, foi efetivada, então, a Coordenadoria do Patrimônio Cultural que sancionou a criação da Curadoria do Patrimônio Histórico e Artístico sendo ela a unidade técnica responsável pelos processos de inventário, tombamentos, bem como as propostas de preservação dos bens que são considerados de interesse histórico e/ou artístico. Além disso, tem a responsabilidade de prestar assessoria técnica, na fiscalização dos bens tombados e das áreas de interesse de preservação.

Nesse período (1979 - 1982), a Secretaria investiu principalmente em três áreas,

[...] inventário, preservação e conservação do patrimônio histórico cultural; levantamento do perfil sócio-cultural da população paranaense, promoção do intercâmbio cultural, valorização e difusão dos aspectos relevantes das manifestações culturais do Paraná. No que se refere à ação preservacionis t a, ela foi dirigida para a preservação da memória cultural e artística, da paisagem urbana, dos sítios ecológicos e panorâmicos, o que já demonstrava

a emergência de uma preocupação com a preservação ambiental

(LUPORINI, 1997, p. 117).

Esse crescimento da amplitude, do conceito e da política de preservação colocou no rol dos tombamentos a preservação de áreas urbanas e naturais, não privilegiando somente o patrimônio edificado ou coleções históricas, o que já vinha sendo praticado no Paraná desde 1974, como, por exemplo o tombamento da paisagem Urbana da Rua XV de Novembro, em Curitiba, e o tombamento da Ilha do Mel, na Baía de Paranaguá em 1975. Em 1985, uma das maiores ações de preservação deu-se com o tombamento da Serra do Mar, ato que deu origem, no Paraná, a uma política de incentivo para criação de Associações de Preservação do Patrimônio Histórico e Natural.

23 Ano em que ocorre também a mudança da direção do SPHAN e consequentemente a ampliação do

Essas práticas levaram a Secretaria de Estado, a partir do final da década de 1980 a criar, na estrutura da Coordenadoria do Patrimônio Cultural a Curadoria do Patrimônio Natural. A política de preservação encerrou a década com o tombamento do Setor Histórico Urbano da Lapa e iniciou a outra com o tombamento do Setor Histórico de Paranaguá, porém não se realizou nenhuma prática efetiva voltada a Educação Patrimonial ou a inserção de conteúdos voltados ao processo de preservação como um todo nos currículos escolares. Destaca-se também que a preocupação era bastante efetiva com a questão do tombamento e preservação de edificações, por diversas vezes arbitrárias e desvinculadas da participação da comunidade. Pode-se notar assim, como a questão do poder simbólico e, por conseguinte, a violência simbólica operaram em todo o processo de afirmação do patrimônio como discurso de construção de uma identidade.

A década de 1990 foi profícua do ponto-de-vista cultural em relação ao seu Patrimônio, quando foi lançado, pela Secretaria da Cultura, o projeto Paraná da Gente: Terra, História e Memória24, com a ambiciosa meta de atingir a maioria dos municípios.

Tinha como objetivo central o levantamento, cadastramento e classificação dos bens de interesse para a preservação do patrimônio histórico, artístico, natural e arqueológico de cada município25

Um aspecto desse projeto chama a atenção, pois o Governo do Estado do Paraná, na época representado pelo Governador Roberto Requião, além de querer “resgatar” a cultura paranaense, esperava também recolher aquilo que Luporini (1997, p.150-151) chama de “dividendos” culturais e sócio-políticos, a possibilidade de melhoria da imagem do Governo junto à sociedade em geral, pelo tratamento integrado a questões ligadas a valores paranaenses e à possibilidade de uma ampla repercussão do projeto, apresentando um baixo custo. “ Percebe-se que havia uma certa urgência na execução, pois Roberto Requião renunciaria no final de 1994, para concorrer a uma vaga no Senado” (LUPORINI, 1997, P.152). E os dividendos políticos que o projeto poderia apresentar são um dado bastante interessante, se pensar que ainda permanece forte a influência do imaginário nacionalista forjado de 1930 em

24 O projeto Paraná da Gente: terra, história e memória, teve como objetivo básico o levantamento e cadastramento dos bens de interesse para o patrimônio histórico, artístico e natural dos municípios interessados em participar do projeto. Este inventário (termo também utilizado) deveria contar com a ampla participação das comunidades locais, indicando o que consideravam seus bens representativos Projeto de amplitude que envolveu diferentes órgãos estaduais e municipais. 25 Dados retirados do projeto: O Paraná da Gente, Terra, História e Memória, lançado publicament e

conjunto, no Paraná, com o ideário paranista. Apesar desta colocação, não se pode negar que, a partir de 1990, houve um crescente número de tombamentos e, principalmente, uma crescente preocupação com outro aspecto, que não somente o tombamento oficial, ou seja, a Educação Patrimonial, que está sendo levada às escolas. Posteriormente, em 2003, o projeto foi relançado novamente somente com o nome Paraná da Gente, utilizando a mesma metodologia anterior, porém com as facilidades de que muitos municípios já possuíam seus inventários e diagnósticos culturais e já estavam conectados com a internet. Essa nova etapa de coleta cultural ficou conhecida como: Terra, Cultura e Poder – A Arqueologia de um Estado, cujos resultados foram amplamente divulgados em publicações temáticas, com o título de Cadernos Paraná da Gente.26

Esse projeto deu origem a valorização dos patrimônios locais, assim é possível identificar a quantidade e diversidade que o Paraná possui de bens tombados (Quadro 4), além de vários municípios terem dado início a campanhas de preservação e de agilização para a criação de Leis Municipais de Preservação do Patrimônio Cultural, que começou a delinear-se em Ponta Grossa desde o ano de 1999.

Quadro 4 – Diversidade dos Tombamentos no Paraná27

Centro Histórico 02 Residência 37

Edificações Religiosas 18 Palácio e Palacete 07

Estação de Passageiros 14 Monumento 06

Edifício Público ou de uso Coletivo 28 Paisagem Urbana 06

Edifício de Ensino 10 Árvore Urbana 07

Fortificação e Indústria 04 Parque e Área Natural 09

Ponte 04 Imagem, Escultura e Pintura 09

Fazenda 3 Documento e Objetos 05

Fonte: Coordenadoria do Patrimônio Cultural do Paraná28