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CAPÍTULO 1 – A CONSTRUÇÃO DOS CONCEITOS DE MEMÓRIA,

1.2 WALTER BENJAMIN E A TEORIA CRÍTICA

1.2.2 Leitura de Walter Benjamin

Sua caminhada teórico-metodológica faz com que escreva quase toda a sua obra em textos curtos, composto de aforismos, ensaios e fragmentos, que ele considerava como ruínas. Para Benjamin, “cada objeto, fragmento ou insignificância contam o todo. A totalidade se revela na singularidade e os estilhaços se compõem em imagens como as de um caleidoscópio” (KRAMER, 2009, p. 290). Dessa maneira, uma das questões centrais a ser trabalhada pelo historiador é “escovar a história a contrapelo” Essa expressão aparece em suas teses sobre o conceito de história, onde afirma,

[...] nunca houve um monumento da cultura que não fosse também um monumento da bárbarie. E, assim como a cultura não é isenta de barbárie, não o é tampouco, o processo de transmissão da cultura. Por isso, na medida do possível, o materialista histórico se desvia dela. Considera sua tarefa escovar a história a contrapelo (BENJAMIN, 1994, p. 225).

Com um pensamento aberto, antidogmático, reflete sobre o mundo contemporâneo, e é considerado um filósofo marxista, com características e inspiração na área do humanismo, também valorizando a reflexão teológica. Mesmo sendo considerado um filósofo e um teórico marxista, Benjamin contesta a ideia de progresso (seja da social-democracia, seja do marxismo), aplicando a teoria crítica da história. Ele critica a história como continuidade e busca na descontinuidade, os momentos críticos, pois são nesses momentos que as mudanças podem acontecer. E, é assim, na descontinuidade que o pesquisador pode e deve se apropriar de pensamentos e lembranças, para trabalhar questões relativas à historicidade do patrimônio, a partir de narrativas daqueles que viveram um determinado momento de sua vida e que hoje se configura em histórico.

Ele rompe com a linearidade, pois se preocupava com que tipo de herança a história linear iria deixar para o mundo. Ao romper com isso, seus escritos (em formulações metafóricas ou expressões alegóricas), define que a história é a história que o sujeito vive no seu cotidiano, nas suas realizações micro, no seu convívio social. Sendo assim, a linearidade prende o sujeito a um tempo determinado e fixo, como se o mundo que o rodeia fosse algo fora de sua realidade de vivência. Nos encontros, nos fazeres diários, nos gestos, nas narrativas, se elaboram as condições de uma historicidade onde os fragmentos fazem parte de todo um processo, que conduz ao processo de aprender, do saber e do fazer do homem simples e muitas vezes desconhecido, um sujeito presente no ambiente histórico.

A discussão acerca da existência de um método e de um padrão de estudo que possa ser utilizado nos estudos de Benjamin, ainda é presente nas pesquisas que buscam analisá-lo. A partir de afirmações de que suas ideias devem ser tratadas não como métodos, mas sim como concepções filosóficas e que ele não era um cientista social, mas sim um ensaísta, as opiniões divergem. Segundo Gaeta (2005, p.3),

[...] para autores como Jöel Lefebvre (1994), as análises de Benjamin apresentam graves distorções e não podem servir de caminho. Já Willie Bolle (2000) identifica particularidades significativas em suas análises. Sérgio Rouanet, Olgária Matos, Jeanne Marie Gagnebin entre outros, afirmam um método.

Para Sérgio Rouanet (1984, p.12), em sua obra A origem do drama barroco alemão,

[...] fazer justiça ao livro de Benjamin, significa antes de mais nada, elucidar o que ele tem de mais enigmático: as considerações epistemológicas e metodológicas que servem de pórtico ao trabalho e que incluem, no essencial, uma reflexão sobre as ideias e as coisas, sobre o nome e a palavra, sobre a origem e a gênese, e sobre a filosofia e o sistema.

Walter Benjamin, trabalha com questões relativas à experiência, ao tempo, a tradição, à narração e também à memória. Matos (1989, p. 31) afirma que a tradição é, para ele, uma dimensão e dentro dela se aloja a aura do tempo, “a consolidação da experiência coletiva, a sanção, a autoridade que garante ao indivíduo à dimensão de sua ancestralidade, tradição que pulsa em cada instante do agora”. Por sua vez, Bolle (1984), considera-o com um dos mais importantes filósofos do século XX, e destaca que em seu texto “A vida dos estudantes”, apresenta uma reflexão sobre: o que hoje se teria a dizer ou ser conhecido pelas futuras gerações. Ao valorizar a questão da narração, destaca a importância da memória e também efetua a crítica ao historicismo. Em sua reflexão, ele não nega o progressismo, na atividade humana, mas nega uma ideia de progresso baseada nas teorias da história com fundamentos escatológicos, critica o historicismo como procedimento aditivo, pois o mesmo culmina legitimamente na história universal, que por sua vez não tem qualquer armação teórica, ela utiliza a massa dos fatos, para com eles preencher o tempo homogêneo e vazio e para a história esse tempo está saturado de agoras, que precisam ser investigados e estudados (BENJAMIN, 1994).

Criticou o historicismo positivista que privilegiava a documentação oficial e também negou a possibilidade de causalidade histórica, quando afirma,

O historicismo se contenta em estabelecer um nexo causal entre vários momentos da história. Mas nenhum fato, meramente por ser causa, é só por isso um fato histórico. Ele se transforma em fato histórico postumamente, graças a acontecimentos que podem estar dele separados por milênios. O historiador consciente disso renuncia a desfiar entre os dedos os acontecimentos, como as contas de um rosário. Ele capta a configuração em que sua própria época entrou em contato com uma época anterior, perfeitamente determinada. Com isso, ele funda um conceito do presente como um “agora” no qual se infiltraram estilhaços do messiânico (BENJAMIN, 1994, p. 232).

Quando nega a causalidade histórica, acaba valorizando o poder de interpretação do historiador e na realidade propõe que se recupere a memória como uma forma de relacionamento com o passado. Destaca-se também que a crítica de Benjamin se apresenta em muitas de suas obras, sustentadas por uma teori a do conhecimento que não submete as ideias aos conceitos (DROPA; OLIVEIRA, 2015).

Ao pensar na indiferença que caracteriza muitas vezes a relação do sujeito com o passado, as teses de Benjamin oferecem uma fonte inesgotável de “belas citações” para historiadores, educadores, e pesquisadores preocupados com o patrimônio cultural, sua preservação e divulgação de uma comunidade.