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CAPITULO I – SERVIÇO SOCIAL E AMBIENTE

3. Políticas ambientais e questões urbanas

3.1 A questão do ambiente e do desenvolvimento sustentável

A génese dos problemas ambientais remonta do século XVII com a ciência moderna, que foi desenvolvida para melhorar as condições do ser humano e eliminar a miséria do ser humano. É com Francis Bacon (1561-1626) que se assume um optimismo científico e a ilusão do ser humano como senhor e dono da natureza, com poder e conhecimento para fazer dela o que bem entender.

A revolução industrial do século XIX e o consequente desenvolvimento tecnológico permitiram a exploração em grande escala dos recursos naturais, conduzindo: a um aumento do crescimento económico, estabelecendo uma nova ordem mundial em que a produção e o consumo se tornaram cada vez maiores; a um crescimento desmedido das zonas urbanas e a uma aceleração do crescimento da população mundial; e a uma profunda alteração do ser humano com o meio (Schmidt, 2008).

Tudo isto teve implicações e provocou alterações radicais na relação do ser humano com o meio ambiente. É por isso que, a par dos enormes e inegáveis benefícios resultantes das grandes invenções e descobertas da ciência, o progresso tecnológico trouxe também impactos negativos, tais como: poluição industrial, com produção excessiva de detritos; contaminação das águas e da atmosfera; exploração ilimitada de recursos naturais com a consequente eliminação de áreas florestais e de outros recursos naturais; como por exemplo a contaminação de solos e o perigo de extinção de espécies animais (Schmidt, 2008).

Foi este cenário que levou cientistas e intelectuais a constatar a existência dos desequilíbrios e dos prejuízos que a acção do ser humano estava a provocar na natureza, e

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a alertar para as consequências ecológicas do modelo de desenvolvimento adoptado pelos países industrializados (Schmidt, 2008).

É no contexto da consciencialização de profundos desequilíbrios ambientais provocados pelo desenvolvimento tecnológico acelerado que o conceito de ecologia desenvolvido pela primeira vez por Ernst Haeckel em 1869, assume importância. Enquanto preocupação generalizada as questões ambientais surgiram no século XX entre finais dos anos sessenta e início de setenta, mas as raízes do ambientalismo e os movimentos pioneiros, sobretudo ingleses e norte-americanos, remontam ao século XIX (Schmidt, 2008). As primeiras organizações e leis de cariz ambiental, surgem no Reino Unido como reacção aos danos da revolução industrial, e dizem respeito aos fumos poluentes provocados pela combustão do carvão. A primeira legislação que visava regular os problemas de saúde consequentes das actividades produtivas são a Manchester Association for the Prevention of Smoke (1843) e a Britain’s Alkali and Public Health Acts (1863) (McCormick, 1995:18). Com o objectivo principal de proteger o campo da expansão urbana (Buller, 1997) surgem também os movimentos pioneiros de protecção da natureza, nomeadamente os Commons, Open Spaces and Footpaths Preservation Society (1865); East Riding Association for the Protection of Sea Birds (1867); Association for the Protection of British Birds (1870).

Posteriormente, nos EUA surgiram também organizações pioneiras como a American Ornithologists Union (1883) e a Audubon Society (1986), e criaram-se os primeiros parques nacionais dos quais se destacam o Yellowstone, em 1872. Cerca de vinte anos mais tarde nasce a associação norte americana Serra Club (1892), cujo objectivo era igualmente preservacionista, conservar a floresta e outros recursos naturais nas serras da Califórnia, mas com uma vocação muito mais activista do que era habitual nos movimentos conservacionistas ingleses (Markham, 1994).

A tradição colonialista europeia deixa as suas marcas, no início do século XX, com as primeiras convenções para proteger a fauna de África - Convenção para a Preservação de Animais, Pássaros e Peixes em África, assinada em Londres em 1900 e o primeiro Congresso Internacional para a Protecção da Natureza, realizado em Paris, data de 1909.

Uma outra linha de preocupações, embora menos marcante, na origem da consciência ecológica, também no século XIX, decorre de uma tradição humanista europeia ligada aos efeitos da industrialização sobre as populações operárias urbanas recrutadas nos campos ingleses. Villermé e Engels traçam esse testemunho de um quadro

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de vida e de trabalho em condições de extrema insalubridade, e a medicina do trabalho desenvolver-se-á, em parte, para lhes dar resposta (Beaud et al., 1993).

Contudo, não será nem sob o impulso destas preocupações humanistas, nem mesmo pela continuidade do pensamento e movimento naturalista, que o campo temático do ambiente ganha projecção e se instala nas preocupações públicas, sociais e políticas, a que Portugal também se subscreveria (Flores, 1937). A maioria destes movimentos, convenções, leis e causas inscrevem-se numa perspectiva restrita, de tradição marcadamente conservadora, revelando uma preocupação dominante ora com a gestão dos recursos naturais, ora com a simples preservação da natureza em si própria.

Em Portugal surge sobretudo pela pressão de factos políticos, nomeadamente a mediatização pública de depoimentos científicos, sejam individuais, sejam organizados em conferências e que encontram um terreno de acolhimento que se vinha a preparar desde o final da Segunda Grande Guerra. Por um lado, com os problemas da fome e da demografia que afectavam o terceiro Mundo e com os programas desenvolvidos pela ONU, FAO, e UNESCO e, por outro lado, com a questão nuclear e a inquietação civil desencadeada na sequência da explosão da bomba de Hiroshima-Nagasaki, geradora dos movimentos civis pelo desarmamento.

Na genealogia das questões ambientais surgem três ordens de problemas dominantes que, por sua vez, marcaram a génese das diferentes tradições ambientais: a denominada “velha” questão conservacionista/natureza selvagem sempre presente mas nunca muito incisiva; a fome/demografia; e a bomba atómica/nuclear, os quais, nos anos setenta, irão dar origem ao “ambientalismo moderno” reunindo várias bases de apoio.17

A preocupação com a fome com que se confrontavam os países subdesenvolvidos esteve na origem da formação da FAO em 1945. Nessa altura, a fome era um problema que estava longe de ser considerado “ambiental”, não se articulando com a explosão demográfica e sendo tratado basicamente como um problema de economia e de justiça social. É, aliás, ainda nesta perspectiva que Josué de Castro18ao pôr a descoberto o carácter artificial da subalimentação e o papel nefasto das monoculturas, se opõe às teses neo- malthusianas, e aponta as contradições insustentáveis do tipo de desenvolvimento para que o mundo caminhava. Um modelo de desenvolvimento que se havia imposto e também já se

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VI Congresso Português de Sociologia, 2008.

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Primeiro presidente da FAO, a Geografia da Fome (1946, 1975) e a Geopolítica da Fome (1951) são duas obras essenciais no que concerne a problemática da fome.

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tornara um desafio para a parte da humanidade que o economista Alfred Sauvy qualificou em 1952 como “Terceiro Mundo”, alertando para aquele “quinto” da população mundial que não dispunha, então, nem de “um dólar por dia” para viver.

Com base nestes dados o Clube de Roma (1972), uns anos mais tarde, chamou a atenção para o problema, sublinhando que a questão da fome no Terceiro Mundo, articulada agora ao exponencial salto demográfico, iria acabar por vitimar o próprio Ocidente.

De 1940 a 2010 as descobertas científicas, medidas políticas, convenções e protocolos sobre energia e clima, acidentes com repercussões mundiais, assinaladas como datas de relevo nas acções da União Europeia, sintetizam-se no quadro 1A (ver anexo 1).