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2.2 Reforma Psiquiátrica: o novo lugar social da loucura

2.2.2 A REFORMA PSIQUIÁTRICA E A LUTA ANTIMANICOMIAL

No Brasil, a precursora do movimento de luta antimanicomial e da Reforma Psiquiátrica foi a psiquiatra alagoana Nise da Silveira. Ela foi responsável por humanizar o tratamento dos doentes. Era veementemente contrária às formas agressivas utilizadas para a contenção e o tratamento dos pacientes, como, por exemplo, o eletrochoque. Inspirando-se em Carl Jung, a psiquiatra maceioense, nos anos 1940, foi pioneira na terapia ocupacional, método que utiliza atividades recreativas no tratamento de distúrbios mentais133, tais como a pintura. Assim,

a obra de Nise ganhou importante dimensão para a humanidade ao trazer à luz os dramas dos sujeitos psicóticos que se encontravam reduzidos aos rótulos de cronicidade demencial. Estes ressurgiram, por meio da criatividade e do acompanhamento terapêutico, como seres capazes de produzir, de interagir e de criar belíssimas obras de arte. Trata-se, portanto, de uma profunda reflexão que confrontou o universo da psiquiatria e ultrapassou os seus limites, tornando-se referência para a saúde mental, as artes, a filosofia, a antropologia e a cultura nacional.134

No início da década de 1970, Franco Basaglia iniciou um processo de desinstitucionalização dos hospitais psiquiátricos da Itália. E, baseando-se nos resultados por ele obtidos em sua prática nos manicômios, o movimento da Psiquiatria Democrática Italiana impulsionou a edição, no ano de 1978, da Lei nº 180, que proibia a construção de novos hospitais psiquiátricos na Itália e incentivava a desativação dos já existentes.

A Reforma Psiquiátrica representa um processo “social complexo que visa a negação e a desconstrução da instituição psiquiátrica e, ao mesmo tempo, a invenção contínua de novos

132 ROTELLI, Franco. Superando o manicômio: o circuito psiquiátrico de Trieste. In: AMARANTE, Paulo

(org.). Psiquiatria social e reforma psiquiátrica. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 1994, p. 151.

133 Nise da Silveira: a mulher que revolucionou o tratamento mental por meio da arte. Disponível em:

<https://www.brasildefato.com.br/2018/02/15/nise-da-silveira-a-mulher-que-revolucionou-o-tratamento-da-louc ura-por-meio-da-arte/>. Acesso em 29 mar. 2018.

134 MELO, Walter; FERREIRA, Ademir Pacelli. Clínica, pesquisa e ensino: Nise da Silveira e as mutações na

psiquiatria brasileira. Rev. latinoam. psicopatol. fundam., São Paulo, v. 16, n. 4, p. 555-569, Dez. 2013, p.

saberes e práticas que sejam capazes de construir, garantir e afirmar a cidadania das pessoas”135 com doença mental.

A Reforma Psiquiátrica tem como um dos principais objetivos promover a desinstitucionalização, a qual

deve ser entendida sobretudo como um trabalho de reconstituição das pessoas enquanto pessoas que sofrem, mas também enquanto pessoas que podem viver bem em sociedade, apesar do sofrimento e de eventuais crises, a partir das relações/conexões a serem estabelecidas com elas e os mundos fora dos quais sempre estiveram: mundo do trabalho, da moradia digna, do lazer, da sociabilidade, da cidade, da liberdade.136

No período de abertura do regime militar no Brasil, surgiram as primeiras manifestações no setor da saúde, que seguiram a trajetória de vários outros movimentos sociais do país. Nessa época, foi criado, então, o Movimento dos Trabalhadores de Saúde Mental, que passou a denunciar as práticas de tortura realizadas nos serviços de assistência psiquiátrica, reivindicando sua humanização, bem como melhores condições de assistência aos pacientes. Em 1987, foram realizados dois eventos demasiadamente importantes: a I Conferência Nacional de Saúde Mental e o II Congresso Nacional do Movimento dos Trabalhadores de Saúde Mental. Este último contou com a presença não apenas de profissionais da saúde, mas de novas associações, o que faz com que se transformasse em um movimento mais amplo. Naquele mesmo ano, foi instalado o lema do movimento: “por uma sociedade sem manicômios”.137

O movimento de luta antimanicomial, que se baseia na Reforma Psiquiátrica, critica as atrocidades cometidas no interior dos manicômios, tais como o uso de eletrochoque, a medicalização excessiva, o enclausuramento, as práticas de tortura. O manicômio funcionava como o local por meio do qual a psiquiatria, enquanto ciência da higiene pessoal, buscava controlar o louco.

Mas a luta antimanicomial não se resume a pôr fim ao hospital psiquiátrico, tendo em vista que ela busca mudanças em vários âmbitos:

do teórico ao cultural, passando pelo campo de construção de políticas e modelos de atenção. Busca-se não só constituir novas práticas no campo da assistência à saúde mental como também produzir transformações no que diz respeito ao lugar social dado à loucura, ao diferente, questionando uma cultura que estigmatiza e marginaliza determinados grupos sociais. Tal proposta acaba por colocar em questão valores e representações sobre a loucura há muito arraigados em nossa sociedade e que estão na base de nossa constituição como sujeitos. [...] A reaproximação dos

135 SILVA, Alyne Alvarez. Das vidas que não (se) contam: dispositivos de desinstitucionalização da medida

de segurança no Pará. Tese (Doutorado em psicologia social) – PUC-SP. São Paulo, 2015, p. 105.

136 SILVA, Alyne Alvarez. Das vidas que não (se) contam: dispositivos de desinstitucionalização da medida

de segurança no Pará. Tese (Doutorado em psicologia social) – PUC-SP. São Paulo, 2015, p. 113.

137 LUCHMANN, Lígia Helena Hahn; RODRIGUES, Jefferson. O movimento antimanicomial no Brasil. In: Ciência & Saúde Coletiva, vol.12, nº 2, Rio de Janeiro: Abrasco, p. 399-407, mar./abr. 2007, p. 402 et. seq.

campos da loucura mobiliza também aspectos de ordem psíquica, o medo frente ao diferente, àquilo que por longos anos ficou depositado e recluso no interior dos muros do hospital psiquiátrico.138

Esse movimento se justifica, sobretudo, porque, dentre as mais diversas práticas e mecanismos de poder, de exclusão e de controle que se operaram em nossa sociedade, a situação “do doente e da doença mental” se destaca em seus mais variados aspectos. Por ter sido transformada, pelo saber-poder psiquiátrico, em doença, alienação, desordem, imoralidade, desajuste, irracionalidade, maldade e perversão, a loucura abarca um conjunto de práticas, ideias e saberes que, fundamentando-se numa concepção imposta pela moral e os bons costumes, pela ordem e pelo trabalho produtivo, faz desligar, de forma violenta, os diferentes laços de construção e de pertencimento humanos. O doente mental é colocado completamente à margem da sociedade, por ser diferente, improdutivo e anormal. O hospital psiquiátrico é a representação mais profunda dessa exclusão, desse controle, desse poder e dessa violência. Dentro de seus muros, esconde-se a violência física e simbólica por meio de uma punição travestida de terapia.139

Os reflexos da Reforma Psiquiátrica e do movimento de luta antimanicomial puderam ser vistos em várias partes do mundo. Tanto que, em 1990, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) realizaram a Conferência Regional para a Reestruturação da Assistência Psiquiátrica, que ensejou na elaboração da chamada Declaração de Caracas140. No encontro, foi solicitado às organizações, associações, autoridades da saúde, profissionais de saúde mental, legisladores e juristas que apoiassem a reestruturação da assistência psiquiátrica, assegurando o êxito no seu desenvolvimento para o benefício das populações da região. Isto se justiçou porque foi verificado:

1. Que a assistência psiquiátrica convencional não permite alcançar objetivos compatíveis com um atendimento comunitário, descentralizado, participativo, integral, contínuo e preventivo;

2. Que o hospital psiquiátrico, como única modalidade assistencial, impede alcançar os objetivos já mencionados ao:

a) isolar o doente do seu meio, gerando, dessa forma, maior incapacidade social; b) criar condições desfavoráveis que põem em perigo os direitos humanos e civis do enfermo;

c) requerer a maior parte dos recursos humanos e financeiros destinados pelos países aos serviços de saúde mental; e

138 KODA, Mirna Yamazato; FERNANDES, Maria Inês Assumpção. A reforma psiquiátrica e a constituição de

práticas substitutivas em saúde mental: uma leitura institucional sobre a experiência de um núcleo de atenção psicossocial. In: Cad. Saúde Pública, vol.23, nº 6, Rio de Janeiro: Ensp/Fiocruz, p. 1455-1461, jun. 2007, p.

1455 et. seq.

139 LUCHMANN, Lígia Helena Hahn; RODRIGUES, Jefferson. O movimento antimanicomial no Brasil. In: Ciência & Saúde Coletiva, vol.12, nº 2, Rio de Janeiro: Abrasco, p. 399-407, mar./abr. 2007, p. 402.

140 ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE; ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE.

Declaração de Caracas. 1990. Disponível em:

d) fornecer ensino insuficientemente vinculado com as necessidades de saúde mental das populações, dos serviços de saúde e outros setores.

No referido encontro internacional, houve o reconhecimento de que o modelo de saúde mental centrado nos manicômios não é capaz de fornecer um tratamento adequado aos pacientes e que, portanto, deve haver uma reestruturação e a utilização de métodos alternativos, sempre focando na garantia dos direitos humanos e na sociabilidade dos indivíduos. Declarou-se o seguinte:

1. Que a reestruturação da assistência psiquiátrica ligada ao Atendimento Primário da Saúde, no quadro dos Sistemas Locais de Saúde, permite a promoção de modelos alternativos, centrados na comunidade e dentro de suas redes sociais;

2. Que a reestruturação da assistência psiquiátrica na região implica em revisão crítica do papel hegemônico e centralizador do hospital psiquiátrico na prestação de serviços;

3. Que os recursos, cuidados e tratamentos dados devem: a) salvaguardar, invariavelmente, a dignidade pessoal e os direitos humanos e civis; b) estar baseados em critérios racionais e tecnicamente adequados; c) propiciar a permanência do enfermo em seu meio comunitário;

4. Que as legislações dos países devem ajustar-se de modo que: a) assegurem o respeito aos direitos humanos e civis dos doentes mentais; b) promovam a organização de serviços comunitários de saúde mental que garantam seu cumprimento;

5. Que a capacitação dos recursos humanos em Saúde Mental e Psiquiatria deve fazer-se apontando para um modelo, cujo eixo passa pelo serviço de saúde comunitária e propicia a internação psiquiátrica nos hospitais gerais, de acordo com os princípios que regem e fundamentam essa reestruturação;

6. Que as organizações, associações e demais participantes desta Conferência se comprometam solidariamente a advogar e desenvolver, em seus países, programas que promovam a Reestruturação da Assistência Psiquiátrica e a vigilância e defesa dos direitos humanos dos doentes mentais, de acordo com as legislações nacionais e respectivos compromissos internacionais.

A Reforma Psiquiátrica também teve reflexos diretos no Brasil. E, no ano de 2001, foi promulgada a Lei nº 10.216141, que positivou muitas de suas reivindicações, ao dispor sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redirecionar o modelo assistencial em saúde mental.

Art. 2º Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e seus familiares ou responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos enumerados no parágrafo único deste artigo.

Parágrafo único. São direitos da pessoa portadora de transtorno mental:

I - ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades;

II - ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade;

III - ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração; IV - ter garantia de sigilo nas informações prestadas;

V - ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não de sua hospitalização involuntária;

141 BRASIL. Lei nº 10.216, de 6 de abril de 2001. Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras

de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. PLANALTO. Brasília, 2001. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10216.htm>. Acesso em: 20 ago. 2017.

VI - ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis;

VII - receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu tratamento;

VIII - ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis; IX - ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental. Art. 3º É responsabilidade do Estado o desenvolvimento da política de saúde mental, a assistência e a promoção de ações de saúde aos portadores de transtornos mentais, com a devida participação da sociedade e da família, a qual será prestada em estabelecimento de saúde mental, assim entendidas as instituições ou unidades que ofereçam assistência em saúde aos portadores de transtornos mentais.

Art. 4º A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes.

§ 1º O tratamento visará, como finalidade permanente, a reinserção social do paciente em seu meio.

§ 2º O tratamento em regime de internação será estruturado de forma a oferecer assistência integral à pessoa portadora de transtornos mentais, incluindo serviços médicos, de assistência social, psicológicos, ocupacionais, de lazer, e outros. § 3º É vedada a internação de pacientes portadores de transtornos mentais em instituições com características asilares, ou seja, aquelas desprovidas dos recursos mencionados no § 2º e que não assegurem aos pacientes os direitos enumerados no parágrafo único do art. 2º.

Art. 6º A internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo médico circunstanciado que caracterize os seus motivos. [...]

Percebe-se, portanto, que o ordenamento jurídico brasileiro passou a prever que a internação psiquiátrica só deveria ocorrer em casos excepcionais, que deverão ser devidamente fundamentados. A regra então passa a ser a do tratamento extra-hospitalar.

Houve uma verdadeira quebra de paradigmas, com a passagem da compreensão punição-contenção para a da humanização-socialização. Dessa forma, com o advento da referida lei, os doentes mentais passaram a ser colocados – ao menos no âmbito teórico – na posição de verdadeiros sujeitos de direitos.

Esta lei deveria ser aplicada, inclusive, aos doentes mentais que são submetidos às medidas de segurança, posto que o artigo 1º da Lei142 veda qualquer forma de discriminação. No entanto, pelo fato de tal instituto jurídico se basear na noção de periculosidade, seus pacientes ainda são colocados à margem desta legislação.

No entanto, na Itália, após um longo processo de mudanças e da forte atuação de movimentos em prol da luta antimanicomial, foi publicada, em 31 de março de 2015, uma lei que determinava o fechamento de todos os manicômios judiciários no país. Tal evolução só foi possível porque a Corte Constitucional Italiana iniciou uma desconstrução da relação,

142 Art. 1o Os direitos e a proteção das pessoas acometidas de transtorno mental, de que trata esta Lei, são

assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto à raça, cor, sexo, orientação sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade, família, recursos econômicos e ao grau de gravidade ou tempo de evolução de seu transtorno, ou qualquer outra.

sempre afirmada e reafirmada, entre periculosidade e doença mental.143

O Brasil, no entanto, ainda está longe de tamanho avanço, mas algumas mudanças já podem ser vislumbradas. Existem dois projetos pioneiros no país que foram inspirados na luta antimanicomial e na Reforma Psiquiátrica, os quais se apresentaram como alternativas ao tratamento de portadores de sofrimento mental em conflito com a lei. O primeiro deles vem sendo realizado em Belo Horizonte desde o ano de 2000, sendo denominado de Programa de Atenção Integral ao Paciente Judiciário do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (PAI-PJ), já o segundo foi criado em Goiás no ano de 2006, tendo se baseado no primeiro, e é chamado de Programa de Atenção Integral ao Louco Infrator (PAILI), o qual “reúne os atores jurídicos e os agentes de saúde mental, com o objetivo de reintegrar o paciente judiciário no meio que vive”144.

A intenção dos programas é acompanhar mais de perto e com maior frequência a situação dos portadores de doença mental, reduzindo consideravelmente o número de internações, haja vista que, segundo a Lei nº 10.216/2001, estas só devem ocorrer em casos excepcionais. Dessa forma, “a transferência de pessoa com transtorno mental condenada à medida de segurança para a rede pública de saúde – Centros de Apoio Psicossocial (CAPs) do Sistema Único de Saúde (SUS)”145 – vem ocorrendo nos estados citados, entretanto ainda não se expandiu para o restante do país.

Um ponto que merece destaque é o fato de que o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, por meio da Resolução nº 05/2004146, dispôs a respeito das diretrizes para o cumprimento das medidas de segurança, buscando adequá-las à previsão contida na Lei nº 10.216/01. O item 12 da resolução prevê a desinternação progressiva como diretriz a ser aplicada às medidas de segurança:

A medida de segurança deve ser aplicada de forma progressiva, por meio de saídas terapêuticas, evoluindo para regime de hospital-dia ou hospital-noite e outros serviços de atenção diária tão logo o quadro clínico do paciente assim o indique. A regressão para regime anterior só se justificará com base em avaliação clínica.

Posteriormente, no ano de 2010, o Conselho Nacional de Política Criminal e

143 SILVA, Alyne Alvarez. Das vidas que não (se) contam: dispositivos de desinstitucionalização da medida

de segurança no Pará. Tese (Doutorado em psicologia social) – PUC-SP. São Paulo, 2015, p. 129.

144 CARVALHO, Salo de; E WEIGERT, Mariana de Assis Brasil. A punição do sofrimento psíquico no Brasil:

reflexões sobre os impactos da Reforma Psiquiátrica no sistema de responsabilização penal. In: Revista de Estudos Criminais, ano XI, n. 48, São Paulo: Síntese, p. 55-90, jan./mar. 2013, p. 87.

145 CARVALHO, Salo de; E WEIGERT, Mariana de Assis Brasil. A punição do sofrimento psíquico no Brasil:

reflexões sobre os impactos da Reforma Psiquiátrica no sistema de responsabilização penal. In: Revista de Estudos Criminais, ano XI, n. 48, São Paulo: Síntese, p. 55-90, jan./mar. 2013, p. 86.

146 BRASIL. Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Resolução nº 05/2004. Disponível em

<http://www.justica.gov.br/seus-direitos/politica-penal/cnpcp-1/resolucoes/resolucoes-arquivos-pdf-de-1980-a-2 015/resolucao-no-05-de-04-de-maio-de-2004.pdf>. Acesso em: 06 mar. 2018.

Penitenciária editou a Resolução nº 04147, que prevê o seguinte:

Art. 1º - O CNPCP, como órgão responsável pelo aprimoramento da política criminal, recomenda a adoção da política antimanicomial no que tange à atenção aos pacientes judiciários e à execução da medida de segurança.

§ 1° - Devem ser observados na execução da medida de segurança os princípios estabelecidos pela Lei 10.216/2001, que dispõe sobre a proteção dos direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial de tratamento e cuidado em saúde mental que deve acontecer de modo antimanicomial, em serviços substitutivos em meio aberto;

§ 2° - Devem ser também respeitadas as seguintes orientações:

I - Intersetorialidade como forma de abordagem, buscando o diálogo e a parceria entre as diversas políticas públicas e a sociedade civil e criando espaços e processos integradores de saberes e poderes;

II - Acompanhamento psicossocial contínuo, realizado pela equipe interdisciplinar que secretaria o transcurso do processo e oferece os recursos necessários para a promoção do tratamento em saúde mental e invenção do laço social possível compartilhando os espaços da cidade, bem como realiza a coleta de subsídios que auxiliem na adequação da medida judicial às condições singulares de tratamento e inserção social;

III - Individualização da medida, respeitando as singularidades psíquicas, sociais e biológicas do sujeito, bem como as circunstâncias do delito;

IV - Inserção social, que promove a acessibilidade do sujeito aos seus direitos fundamentais gerais e sociais, bem como a sua circulação na sociedade, colocando-o de modo responsável para com o mundo público;

V - Fortalecimento das habilidades e capacidades do sujeito em responder pelo que faz ou deixa de fazer por meio do laço social, através da oferta de recursos simbólicos que viabilizem a resignificação de sua história, produção de sentido e novas respostas na sua relação com o outro.

Art. 4º - Em caso de internação, mediante o laudo médico circunstanciado, deve ela ocorrer na rede de saúde municipal com acompanhamento do programa especializado de atenção ao paciente judiciário.

Parágrafo único - Recomenda-se às autoridades responsáveis que evitem tanto quanto possível a internação em manicômio judiciário.

Art. 5º - O paciente judiciário há longo tempo internado em cumprimento de medida de segurança, ou para o qual se caracterize situação de grave dependência institucional, decorrente de seu quadro clínico ou de ausência de suporte social, será encaminhado para política específica de alta planejada e reabilitação psicossocial assistida, conforme previsão no art. 5º da Lei 10.216, de 2001.

Art. 6º - O Poder Executivo, em parceria com o Poder Judiciário, irá implantar e concluir, no prazo de 10 anos, a substituição do modelo manicomial de cumprimento de medida de segurança para o modelo antimanicomial, valendo-se do programa específico de atenção ao paciente judiciário. [...]