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CAPÍTULO 3 A PRÁTICA DA COPRODUÇÃO CINEMATOGRÁFICA NO BRASIL: QUATRO CASOS

3.4 O caso “O Céu de Suely”

3.4.1 A relação Brasil-Alemanha

Um primeiro acordo firmado entre Brasil e Alemanha para coprodução cinematográfica foi assinado em 1974. Carecendo de reformulação, recebeu nova redação em 2005, quando foi celebrado em Berlim pelas autoridades diplomáticas e cinematográficas dos dois países. Porém, apenas três anos depois, em 2008, o novo acordo foi promulgado no

Brasil. Nesse novo texto, o conceito de filme foi alterado, ampliando a regulação para produções de televisão, vídeo e mídias digitais, extinguindo assim a antiga exclusividade das intenções do documento para o mercado cinematográfico, que se referia apenas aos filmes de longa-metragem para exibição em salas de cinema.

Tanto no acordo de 1975 como no de 2008, do lado alemão os interesses são notadamente econômicos, tanto que a autoridade competente designada da República Federal da Alemanha era um membro do então Instituto Federal da Economia Industrial, enquanto o chefe da delegação brasileira era um representante do então Instituto Nacional do Cinema. No artigo 6º, outro indício da prevalência dos interesses econômicos:

Poder-se-á dar preferência à contratação de um diretor e de um ator principal de renome internacional de um terceiro país, sempre que sua colaboração assegurar ao filme maiores possibilidades de venda no mercado internacional. (BRASIL, 2008b)

Já em 2008, a autoridade competente para o novo acordo, do lado da República Federal da Alemanha, passa a ser o Departamento Federal de Economia e Controle das Exportações, enquanto, do lado da República Federativa do Brasil, passa a ser a Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura. Assim, o modelo de coprodução cinematográfica internacional permanece, então, para o Estado alemão, como um assunto de um órgão que cuida dos interesses econômicos do país.

Entre as principais mudanças no acordo de 1975 e no de 2008, está a relação à língua. O de 1975 determina que “as versões definitivas do filme deverão ser em idioma alemão e português, salvo trechos do diálogo para os quais o roteiro prescreva outra língua”. Já o de 2008 é mais flexível, elimina a obrigatoriedade da realização do filme nos dois idiomas. O artigo 9 do novo acordo diz que a trilha sonora original dos filmes em regime de coprodução “será feita em um dos idiomas oficiais ou dialetos da República Federativa do Brasil ou da República Federal da Alemanha ou em qualquer combinação desses idiomas ou dialetos aprovados”. (BRASIL, 2008b) E permite também “a narração, a dublagem e a subtitulagem em qualquer outro idioma ou dialeto comumente usado na República Federal da Alemanha ou na República Federativa do Brasil”. (BRASIL, 2008b)

Outra mudança para facilitar a realização de coproduções refere-se às exigências quanto à divisão das participações. No acordo de 1975, a participação mínima obrigatória dos produtores, que deveriam contribuir financeira, artística e tecnicamente para a coprodução, era de trinta por cento, sendo que as contribuições artísticas e técnicas deveriam corresponder

à percentagem da participação financeira. Porém, no item 2 do artigo 4°, o acordo flexibilizava as contribuições:

A participação financeira mínima de um produtor numa co-produção, de acordo com o item 1, poderá ser, ao contrário do que estabelece o Artigo 3.°, item 2, 8, de vinte por cento, se o total do custo de produção do filme exceder DM 2.000.000,00 (dois milhões de marcos alemães). (BRASIL, 1975)

No acordo de 2008, aumenta a flexibilidade, independente do orçamento do filme: “A contribuição financeira bem como a participação do elenco e da equipe técnica, artística e criativa de cada co-produtor devem representar em conjunto no mínimo 20 (vinte) por cento do total do orçamento do filme de co-produção”. Além disso, as autoridades competentes podem, em conjunto, aprovar filmes, a título excepcional, se:

a) a contribuição de um dos co-produtores se limitar à participação financeira, caso em que tal contribuição financeira deverá corresponder a 20 (vinte) por cento ou mais do total do orçamento do filme; ou

b) as autoridades competentes considerarem que o projeto, apesar de não atender às regras de participação, favorece os objetivos do presente Acordo, devendo, por isso, ser aprovado. (BRASIL, 2008b)

Com a ideia de divulgar o novo acordo e estimular a relação cinematográfica entre os dois países, em 2007, o Ministério da Cultura do Brasil, a Secretaria do Audiovisual, o Fundo Nacional de Cultura e a ANCINE, em parceria com o Goethe Institut e o apoio do Fundo de Cinema e TV da Baviera realizaram o Encontro de Coprodução Audiovisual entre Brasil e Alemanha, na cidade de Munique. O evento foi organizado pela Organisation Polemika e Goethe Institut durante o 9º Festival Brasil Plural - Festival de Cinema Brasileiro - que desde 1999 percorre vários países de língua alemã, através do Programa Copa da Cultura, cuja missão é promover a cultura brasileira no exterior, “buscando a formação de plateia para o cinema brasileiro e a aproximação e o intercâmbio entre produtores brasileiros, alemães e distribuidores estrangeiros”, funcionando ainda como uma “plataforma de visibilidade de talentos brasileiros, ainda desconhecidos fora do país, visando o engajamento e conseqüente inserção desses profissionais no mercado mundial”. (BRASIL PLURAL, 2007)

Apesar do acordo bilateral celebrado entre os dois governos desde 1974, a relação entre Brasil e Alemanha tem sido esporádica. Dados da ANCINE registram apenas uma obra produzida em coprodução com a Alemanha no período de 1995 a 2010: “O Céu de Suely”, o filme que será analisado neste item.

Um importante instrumento alemão para o financiamento de filmes de baixo orçamento é o World Cinema Fund, criado em 2004 por meio de uma iniciativa do Festival de Berlim de Cinema Internacional e da Fundação Federal da Cultura da Alemanha, em cooperação com o Instituto Goethe, o Ministério da Cooperação Econômica e Desenvolvimento, e produtores alemães. O objetivo é apoiar a atividade cinematográfica de regiões com uma baixa infraestrutura no setor, oferecendo suporte (até 100 mil euros) a longas-metragens de ficção ou documentários que, por adotarem uma abordagem estética não convencional, teriam dificuldades em obter outras fontes de financiamento. Uma das vantagens diferenciais é que o produtor deve gastar o dinheiro no seu próprio país, o que facilita a viabilização da obra. Sendo que as regiões centrais para o fundo são: América Latina, América Central, Caribe, África, Oriente Médio, Ásia Central, Sudeste Asiático e Cáucaso.

Quanto à relação do Brasil com a França, não iremos tratar aqui, pois o filme “O Céu de Suely” está apenas sob o acordo do Brasil com a Alemanha. Sobre a relação do Brasil com Portugal, como já tratada no item 3.3, não há necessidade de trazer novamente tal contextualização.