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PRÁTICA PEDAGÓGICA

3.3 A relação entre experiência e aprendizagem

À medida que a criança se torna mais experiente, adquire um número cada vez maior de modelos que ela compreende (VIGOTSKI, 2007). Por isso que a experiência é requisito primordial para o desenvolvimento da aprendizagem. É na experiência que encontramos sentido nas coisas. O ingrediente interativo da experiência é o meio pelo qual construímos identidade. A noção de experiência se refere a todas as transações humanas, todos os encontros entre o mundo físico e o mundo humano, onde a interação respeita tanto as condições internas como as condições objetivas. Não é a sensação entendida em um fundo de passividade trazendo algo de fora para dentro do sujeito e construindo sua subjetividade. Como afirma John Dewey, “toda experiência humana é fundamentalmente social, ou seja, envolve contato e comunicação” (DEWEY, 2010, p. 39).

Cada pessoa trabalha as informações de forma diferente porque cada pessoa tem uma história de vida diferente. Dar sentido a algo é manipular, classificar, analisar e descobrir semelhanças, transformar as experiências em algo significativo. É uma maneira de combinar o conhecimento objetivo aos mundos perceptivos particulares. O autoritarismo do ensino descontextualiza o conhecimento e nega as ferramentas do subjetivismo necessárias para a aprendizagem. É preciso que haja liberdade para aprender,

[...] o direito que cada pessoa tem de utilizar sua experiência da maneira que lhe é própria e de descobrir o seu próprio significado nela, tudo isto representa as potencialidades mais preciosas da vida. Toda pessoa é uma ilha, no sentido muito concreto do termo; a pessoa só pode construir uma ponte para comunicar com as outras ilhas se primeiramente se dispôs a ser ela mesma e se lhe é permitido ser ela mesma (ROGERS, 1997, p. 25).

O psicólogo Carl Rogers, defensor da ideia de liberdade para aprender, defende a experiência como a suprema autoridade, a pedra de toque de toda a validade.

“Nenhuma ideia de qualquer outra pessoa, nem nenhuma das minhas próprias ideias, tem a autoridade de que se reveste minha experiência” (Ibid., p. 29). O processo de aprender é uma organização dos fenômenos da experiência individual frente aos aspectos objetivos, dando-lhe ordem e significado, pois

é sempre à experiência que eu regresso, para me aproximar cada vez mais da verdade, no processo de descobri-la em mim. [...] A investigação é o esforço persistente e disciplinado para entender e ordenar os fenômenos da experiência subjetiva. [...] a razão pela qual me dedico à investigação e à elaboração de teorias é a satisfação de uma necessidade de captar ordem e significado, necessidade subjetiva que existe em mim. (Ibid., p. 29).

Para Rogers, a educação deveria propiciar liberdade para os aprendizes para permitir que eles desenvolvam a sua própria liberdade interior e possam atingir uma interpretação significativa da sua própria experiência (Ibid., p. 32). É a partir da própria experiência que aprendemos e nenhuma abordagem que se baseie apenas no conhecimento objetivo, no treinamento, na aceitação de algo que é ensinado, poderá se transformar em algo útil (Ibid., p. 37). Como todos nós vivemos em relações humanas, a partir do momento que sentimos que determinado aprendizado teve significado pessoal em minha própria experiência é possível que tenha algum significado também para o outro, já que o que uso para significar a minha experiência também é utilizado por quem compartilha dos signos que utilizo.

Papert (1994) também dá a mesma importância à experiência individual e à compreensão de si mesmo quando aconselha confiarmos na intuição e procurar saber como trabalhá-la para mudá-la no caso dela parecer se contradizer frente aos aspectos objetivos da realidade. Para Papert, confiar na intuição é fundamental para a construção de uma aprendizagem significativa.

Conhecer a si mesmo é algo que se descobre somente por meio da própria experiência, e não através de algo imposto sobre esta. (ROGERS, 1997, p. 130). Criar um clima de liberdade para aprender, valorizar a experiência e o comportamento volitivo na aprendizagem parece ser o caminho para se equilibrar os aspectos subjetivos e objetivos do conhecimento e oferecer possibilidades para o desenvolvimento de pessoas criativas, adaptativas e autônomas. Isto é,

47 estudante se tornará um aluno com mais auto-iniciativa, mais original, mais auto-disciplinado, menos ansioso e direcionado pelos outros. Se o administrador, ou líder militar ou industrial, criar esse clima dentro de sua organização, então sua equipe se tornará mais auto- responsável, mais criativa, mais apta a adaptar-se a novos problemas, e basicamente mais colaboradora. (Ibid., p. 43).

O desenvolvimento cognitivo se dá pela organização da experiência individual utilizando-se dos signos objetivos. Para ocorrer a interação sujeito/objeto, é preciso também perceber o âmbito do objeto. A percepção de uma experiência mais comum não ocorre permanecendo na experiência individual, isto é, na consciência mais empírica. É preciso ultrapassar esse lugar do empírico puro a fim de perfazer o caminho todo, necessário para a síntese sujeito/objeto.

O ensino visando à aprendizagem caracteriza-se pela construção de um clima de liberdade para aprender que valoriza o comportamento volitivo, a experiência, o debate e o confronto de ideias. Mas o ensino que visa à transmissão é, em sua essência, alienante, caracteriza-se pelo treino, pela repetição de exercícios, pelo silêncio, pela concordância, pela subserviência, pela aversão à dúvida real, pelo monopólio da informação e da interpretação, pela repressão e até mesmo punição em caso de hipótese divergente.

Mudar não é algo fácil, pois requer transcendência dos fatos, já que os fatos estão marcados por comportamentos que almejam uma sociedade imutável. É preciso contrabalancear os fatos com as reais necessidades da modernidade, uma época que está nos levando a nos desvencilhar de todos os tipos tradicionais de ordem social.