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CAPÍTULO 1 – OS IMIGRANTES E O MERCADO DE TRABALHO:

1.5. A relevância das teorias para o objecto de estudo

Conforme se foi evidenciando ao longo do enquadramento teórico, o caso português partilha várias características com os processos de incorporação de trabalhadores imigrantes noutros contextos, sobretudo do Sul da Europa. Ficou patente que estes processos são multidimensionais e que a ocorrência de padrões de inserção menos favoráveis nos mercados de trabalho não está ainda suficientemente explicada. O que parece certo é que o capital humano, a pertença a redes sociais e o capital social que

nelas se gera, o capital cultural, a discriminação por parte dos empregadores e a existência de uma segmentação no mercado de trabalho que remete os trabalhadores imigrantes para segmentos secundários ou mistos, combinados com o devido enquadramento político, económico e histórico, contribuem para justificar a ocorrência destas modalidades de incorporação.

No início deste enquadramento argumentou-se que a posição laboral dos imigrantes juntamente com as trajectórias de evolução que foram registando ao longo do seu ciclo de vida activa influenciam os impactos que causam no mercado de trabalho. Para estes impactos contribuem também os factores que influenciaram os supracitados posicionamento e evolução. Agora é altura de avançar um pouco mais neste argumento, com a contribuição do último ponto deste enquadramento teórico.

Conforme vimos, os próprios imigrantes podem ser também afectados pela entrada no mercado de trabalho de outros imigrantes com origens distintas. Esta entrada poderá conduzir a uma reorganização da hierarquia de base nacional/étnica que, até ao momento, tinha guiado as contratações dos empregadores, com potencial para desencadear processos de ajustamento da sua posição no mercado e influenciar as suas trajectórias laborais futuras.

A alteração do contingente de imigrantes tem dois efeitos directos imediatos: 1) o aumento da mão-de-obra disponível e 2) a sua diversificação, não só em termos de pertença étnica ou nacional mas também das competências que podem estar-lhe associadas, ou seja, diversifica-se também o capital humano disponível para recrutamento. No caso dos europeus do Leste, esta diversificação foi bem visível: o seu nível de qualificação médio era globalmente superior, bem como as suas experiências profissionais mais diversificadas e, em alguns casos, até bastante relevantes para os sectores em que vieram inserir-se em Portugal – por exemplo, numa entrevista a uma empresa de limpeza98, o entrevistado referiu que a experiência de engenharia industrial dos europeus de Leste foi fundamental para reforçar a sua equipa de manutenção de edifícios, onde esta competência é essencial. No caso dos brasileiros, as habilitações linguísticas e competências de relacionamento interpessoal a que estão associados

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constituíram também um importante reforço das qualificações da mão-de-obra disponível no país.

Para finalizar, convém reter que os principais potenciais impactos da entrada de novos imigrantes são os seguintes:

1) Descida do nível salarial (para os trabalhadores equivalentes ou global) provocada pelo aumento da mão-de-obra disponível no mercado (segundo a abordagem neoclássica isto acontece no caso de os trabalhadores serem substitutos) e/ou pela tendência de aceitação de salários mais baixos por parte dos imigrantes mais recentes;

2) Aumento do desemprego devido a uma maior dificuldade em manter e encontrar novos empregos, caso os imigrantes recém-chegados passem a ser preferidos pela generalidade dos empregadores e/ou quando uma parte dos trabalhadores instalados perde o incentivo para se manter no mercado de trabalho devido à descida dos níveis salariais ou à deterioração de outras condições de trabalho;

3) Tendência para a deterioração das condições de trabalho, quando, no contexto de um aumento da oferta de mão-de-obra disponível, os empregadores, não só perdem o incentivo para melhorar as condições de trabalho com o objectivo de atrair/manter trabalhadores, mas podem chegar a agravá-las, aproveitando os níveis de exigência mais baixos dos recém-chegados (processo referido em López-Sanders 2009: 20/21);

4) Mobilidade ocupacional, ascendente ou descendente, ou inter-sectorial, que ocorre quando os imigrantes já estabelecidos mudam de sector ou de ocupação, com prejuízo para os próprios ou aproveitando a oportunidade de mudança positivamente;

5) Mobilidade geográfica, que inclui mudanças de mercado de trabalho local/regional, ou de país.

Os efeitos sentidos, bem como a sua magnitude dependem, por um lado, da posição laboral, mais ou menos consolidada, destes imigrantes e, por outro, dos mesmos factores que, num primeiro momento, conduziram a essa posição – ou seja, do lado da procura de trabalho depende das visões e experiências dos empregadores com estes imigrantes, da estrutura do mercado de trabalho e das oportunidades que oferece face ao

contexto económico; do lado da oferta depende do capital humano e social dos imigrantes, das suas redes sociais, dos seus atributos demográficos, aspirações e objectivos; e, finalmente, depende também do enquadramento político-institucional, do contexto histórico e da conjuntura económica, global e sectorial.

A reflexão sobre processos de concorrência no mercado de trabalho permitirá também retirar algumas conclusões sobre os próprios processos de incorporação dos trabalhadores imigrantes no mercado de trabalho. Pretende-se, através da análise dos processos de concorrência vividos pelos imigrantes de origem africana, contribuir também para aprofundar o entendimento dos processos integração social, mais amplos, vividos pelos imigrantes destas origens em Portugal, e para os quais, como vimos, os processos de incorporação laboral contribuem decisivamente. A análise preocupa-se nomeadamente com a sustentabilidade destes processos de integração ao longo do tempo.

Foi com base neste enquadramento teórico que se desenvolveu a metodologia de investigação que se apresenta no ponto seguinte.

1.6. Considerações metodológicas, modelo analítico e caracterização-base da