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A Representação em Juízo dos Direitos Transindividuais

Um dos aspectos mais tortuosos e polêmicos da doutrina processual coletiva refere-se à questão da legitimidade para agir, vale dizer, a quem cabe a proposição das ações coletivas. Os ordenamentos jurídicos contemporâneos adotam soluções diversas, havendo sistemas que valorizam a legitimação dos particulares, outros que privilegiam a atuação dos órgãos públicos, e ainda há aqueles que estabelecem uma legitimação restrita a determinados grupos sociais.

A dificuldade reside no fato de que no processo civil tradicional há um esquema rígido de legitimação para agir em juízo, preceituado pelo art. 6º do Código de Processo Civil (CPC)14, em que o titular do direito individual postula, em nome próprio, direito próprio, o que não se conforma ao processo coletivo, vez que os titulares dos direitos transindividuais correspondem a uma coletividade, impondo-se, portanto, uma nova configuração do instituto da legitimidade ativa.

Na tutela individual, a regra da legitimação ordinária, estabelecida pelo art. 6º do CPC, somente pode ser excepcionada em virtude de expressa previsão legal. A exceção corresponde à hipótese em que alguém, em nome próprio, está autorizado a discutir em juízo direito alheio, o que corresponde à legitimação extraordinária.

Antes da edição da Lei nº 7.347/85 (LACP), duas correntes doutrinárias tentaram justificar a legitimação para agir nas ações coletivas, com o objetivo de viabilizar a tutela coletiva de direitos. A corrente liderada por José Carlos Barbosa Moreira defendia a tese de que, no processo coletivo, haveria substituição processual (ou legitimação extraordinária), afirmando não ser necessária a autorização legal expressa, vez que esta poderia ser deduzida do sistema jurídico15 (DIDIER JR.; ZANETI JR., 2009, p. 190).

14 “Art. 6º, CPC - Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei”. 15 Barbosa Moreira entendia que, por força do art. 513 da CLT e art. 1º, §1º, do antigo Estatuto da OAB (Lei nº 4.215/63), a substituição processual poderia ser deduzida do sistema, ainda que não houvesse expressa autorização legal.

A outra corrente teve como principal expoente Kazuo Watanabe e buscou interpretar a regra estabelecida pelo art. 6º do CPC de maneira ampla, de modo a verificar na representação dos direitos transindividuais uma espécie de legitimação ordinária de entidades civis na defesa de direitos coletivos ligados às suas finalidades institucionais (DIDIER JR.; ZANETI JR., 2009, p. 191).

Mais recentemente, após a LACP e a legislação subseqüente, especialmente o CDC, o sistema processual pátrio criou um modelo bem definido de proteção aos direitos transindividuais, em que se estabeleceu a titularidade desses direitos e se definiu expressamente os legitimados a defendê-los em juízo.

Considerando o sistema vigente, Nelson Nery Júnior denominou de “legitimação autônoma para a condução do processo” a legitimidade de agir nos processos coletivos. Nestes, segundo o mencionado autor, não existe a figura da legitimidade extraordinária, pois acredita não ser possível substituir a coletividade ou pessoas indeterminadas, pelo que se mostra necessária a criação de uma categoria autônoma, própria do direito processual coletivo (NERY JUNIOR; Nery, R., 2006, p. 339).

Para DIDIER JR.; ZANETI JR. (2009, vol. 04), a atual sistemática de representação em juízo dos interesses corresponde a uma legitimação extraordinária, por substituição processual, dada a diversidade entre os titulares do direito e os legitimados à sua tutela.

Apesar das discussões doutrinárias relacionadas ao tema, verifica-se, na prática, que essa controvérsia acerca da natureza jurídica dessa legitimação ad causam não possui muitas implicações, em virtude da existência de um rol de legitimados para a propositura das ações coletivas. Nesse sentido, LENZA (2003, p. 174):

A partir do advento dos dispositivos legais já relacionados, contudo, a preocupação

que se deve ter não é tanto com a natureza jurídica da legitimação, mas, em particular, com a problemática da efetividade do processo, buscando-se saber se as alterações propostas cumpriram o seu objetivo maior que era o de proporcionar uma adequada representação jurídica dos interesses transindividuais.

Com efeito, o microssistema processual coletivo optou por um esquema de legitimação plúrimo, por conjugar diversos legitimados, e misto, por autorizar a representação coletiva em juízo a indivíduos16, órgãos públicos e associações civis.

A expressa previsão legal dos legitimados, bem como a amplitude da legitimação, de modo a abarcar entes públicos diversos e particulares representou uma forma de melhor tutelar os direitos coletivos lato sensu, pondo fim às controvérsias acerca de quem poderia propor ações coletivas e democratizando a legitimidade ad causam, o que constitui um importante passo para a proteção e efetivação desses direitos. “Essa postura adotada no Brasil tem a força e se apresenta como uma verdadeira e autêntica ‘política de liberação dos mecanismos de legitimação ad causam’” (DIDIER JR.; ZANETI JR., 2009, vol. 04, p. 199).

Vê-se, pois, que o ordenamento nacional combinou as soluções adotadas em vários países no que pertine à legitimação nas ações coletivas, acompanhando a “[...] tendência generalizada à ampliação da legitimidade ad causam ativa, de modo que com mais agilidade o Poder Judiciário possa positivar soluções mediante uma só atividade envolvendo toda uma comunidade de pessoas ligadas por interesses comuns [...]” (DINAMARCO, C., 1998, p. 218).

No sistema de legitimidade coletiva vigente, conforme classificação aceita pela maior parte da doutrina17, a legitimação é disjuntiva, concorrente, autônoma e exclusiva. Diz-se disjuntiva porque qualquer um dos legitimados previstos na LACP18 e no CDC19 poderá propor a

16 Como no caso da ação popular, prevista pelo art. 5º, LXXIII, da Constituição Federal e regulamentada pela Lei nº 4.717/65.

17 Nesse sentido, Fredie Didier Jr e Hermes Zaneti Jr.; ob. cit; Gregório Assagra de Almeida (2003) e Pedro Lenza (2003).

18 Lei nº 7.347/85 – “Art. 5º- Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: I - o Ministério Público; II - a Defensoria Pública; III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista; V - a associação que, concomitantemente: a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil; b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico”.

19 Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados concorrentemente: I - o Ministério Público; II - a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal; III - as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos protegidos por este código; IV - as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos protegidos por este código, dispensada a autorização assemblear.

ação devida, sem que seja necessária a presença de outros co-legitimados. É concorrente porque existe mais de um sujeito autorizado a discutir a situação jurídica coletiva posta sob apreciação judicial. Autônoma, uma vez que a presença do titular do direito discutido em juízo, quando identificado, é dispensada. Por fim, considera-se exclusiva, pois somente os legitimados expressamente previstos podem propor a ação coletiva20.

Apesar da abrangência do referido sistema de legitimação, verifica-se uma insuficiente participação da sociedade civil na defesa dos direitos supraindividuais, o que gera uma concentração da representação desses interesses pelo Ministério Público. Segundo dados fornecidos por CÂMARA (2008, p. 45), entre os anos de 1987 e 1996, o Ministério Público foi autor de mais de 60% (sessenta por cento) das ações civis públicas propostas no Rio de Janeiro, de que resulta um sobrecarregamento da instituição, levando a uma indesejada subrepresentação dos direitos coletivos lato sensu.

Embora a atuação do Ministério Público ainda seja predominante, é crescente a participação dos sindicatos e associações na defesa dos interesses metaindividuais, sobretudo das organizações não-governamentais, as quais, tendo por foco principal a atuação na defesa e promoção dos direitos humanos, têm se multiplicado e consolidado sua atuação.

Nesse contexto, e considerando as violações diárias praticadas contra direitos fundamentais coletivos, a legitimação da Defensoria Pública para a propositura de ação civil pública, incluída pela Lei nº 11.448/2007, representa um importante passo para a efetivação desses direitos, em claro cumprimento do papel constitucional atribuído à referida instituição, assim como em perfeita consonância com o princípio da máxima efetividade dos direitos fundamentais.

Cumpre consignar, nesse passo, a necessidade de repensar o sistema de legitimação estabelecido na ação civil pública, de forma a abranger o indivíduo, e não apenas entes públicos e

20 Existem exceções legais à característica da exclusividade, tais como a ação popular (Lei nº 4.317/65) e a ação de improbidade administrativa (Lei nº 8.429/92).

associações civis. No Brasil, o particular somente possui autorização para discutir direitos coletivos em juízo no caso da ação popular21.

A legitimação ampla aqui defendida, também chamada a nível doutrinário de universal, está em consonância com a evolução e sistematização do direito processual coletivo, sendo, inclusive, adotada por outros ordenamentos jurídicos, a exemplo da class action no direito norte-americano. Para DIDIER JR. (2008b, p. 3):

A ampliação dos legitimados à tutela coletiva é uma tendência no direito brasileiro, que se iniciou em 1985, com a permissão de que associações pudessem promover ações coletivas, e terminará com a aprovação do projeto de codificação da legislação coletiva, que prevê a legitimação do cidadão.

Conforme dispõe o art. 20 do Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, formulado pelo Instituto Brasileiro de Direito Processual e já apresentado ao Congresso Nacional:

Art. 20 Legitimação – São legitimados concorrentemente à ação coletiva ativa: I - qualquer pessoa física, para a defesa dos interesses ou direitos difusos, desde que o juiz reconheça sua representatividade adequada, demonstrada por dados, como: a – a credibilidade, capacidade e experiência do legitimado; b – seu histórico na proteção judicial e extrajudicial dos interesses ou difusos e coletivos; c – sua conduta em eventuais processos coletivos em que tenha atuado;

II – o membro do grupo, categoria ou classe, para a defesa de interesses ou direitos coletivos e individuais homogêneos, desde que o juiz reconheça sua representatividade adequada, nos termos do inciso I deste artigo; [...]

Como se vê, a atribuição de legitimidade a qualquer pessoa para a defesa dos direitos coletivos lato sensu não se daria de qualquer maneira. Com efeito, a atribuição isolada de legitimidade ao particular é deficiente, tendo-se em vista as suas claras desvantagens em relação aos litigantes habituais que geralmente integram o pólo passivo da relação processual e a alta complexidade de boa parte das demandas coletivas22.

21 “Art 5º, LXXIII, CF - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência”.

22 Diante das mencionadas desvantagens, destaca-se a solução segundo a qual a desistência da ação por parte do indivíduo (autor originário) não obsta o prosseguimento da ação, autorizando que os outros legitimados continuem o feito, uma vez que o interesse perseguido pela demanda coletivo não é individual, havendo interesse social no

Impõe-se, destarte, que a inclusão do particular no rol dos legitimados para a ação civil pública seja acompanhada de um controle judicial da possibilidade, idoneidade e aptidão do legitimado de representar eficientemente os interesses da coletividade, cabendo ao juiz analisar no caso concreto, portanto, uma série de requisitos, a fim de determinar se há ou não a representatividade adequada.

Tal já ocorre nas class actions americanas, em que a atribuição conferida ao juiz de verificar em cada caso a adequação da representação na demanda coletiva possibilita a existência da legitimação ad causam universal, permitindo ao indivíduo, desde que atenda a todas as exigências requeridas, defender interesses socialmente relevantes. Para DINAMARCO, P. (2001, p.135):

O fator mais critico a ser esmiuçado da apuração da adequacy of representation é se existe relevante conflito ou antagonismos de interesses entre o representante e os outros membros da classe, devendo a atuação dos representantes exprimir os anseios da categoria, ainda que não haja unanimidade dos integrantes da classe sobre a pessoa do representante

No sistema processual brasileiro já há uma tendência, ainda que tímida, para aplicação do instituto da representatividade adequada, seja a partir da aplicação do princípio do devido processo legal à tutela coletiva, seja por meio de uma interpretação sistemática do art. 82, §1º do CDC23, seja através da atuação dos tribunais, em que se destacam decisões do Supremo Tribunal Federal, que se pautam na exigência de um vínculo de afinidade temática entre o legitimado e o objeto do processo, denominado de “pertinência temática”.

Em verdade, a decisão acerca dos sujeitos a quem deve ser atribuída legitimidade para atuar em defesa dos direitos coletivos lato sensu possui um conteúdo eminentemente

conhecimento do mérito da demanda. Tal medida encontra-se prevista no art. 5º, §3º da LACP e no art. 9º da Lei da Ação Popular (nº 4.717/65). Nesse último caso, em caso de desistência, o Ministério Público, mesmo não possuindo legitimidade ativa, pode promover o prosseguimento da ação.

23 Nesse sentindo, GRINOVER (2002, p. 3-12): “O art. 82, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor permite ao juiz dispensar a associação do requisito da pré-constituição há pelo menos um ano, quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido. A análise atribuída ao juiz no caso concreto, para o reconhecimento da legitimação, está muito próxima do exame da representatividade adequada, podendo-se afirmar que, a contrario sensu, o juiz pode negar a referida legitimação, quando entender não presentes os requisitos da adequação”.

político, devendo a análise do tema orientar-se pela necessidade de garantir uma tutela efetiva destes direitos, buscando-se a sua máxima efetividade, com o mínimo de riscos para os representados que, mesmo não presentes em juízo, são atingidos pela decisão prolatada. Daí emerge a necessidade da implantação expressa do controle judicial da representatividade adequada, que deve atingir não só o indivíduo, no sistema aqui proposto, mas também os demais legitimados, inclusive o Ministério Público, a fim de se evitar um distanciamento entre os interesses da coletividade representada e os interesses defendidos judicialmente pelos representantes24.

24 Nessa linha de entendimento, transcreve-se lição de GRINOVER (2002, p. 3-12): “[...] problemas práticos têm surgido pelo manejo de ações coletivas por parte de associações que, embora obedeçam aos requisitos legais, não apresentam a credibilidade, a seriedade, o conhecimento técnico-científico, a capacidade econômica, a possibilidade de produzir uma defesa processual válida, dados sensíveis esses que constituem as características de uma “representatividade” idônea e adequada. E, mesmo na atuação do Ministério Público, têm aparecido casos concretos em que os interesses defendidos pelo parquet não coincidem com os verdadeiros valores sociais a classe de cujos interesses ele se diz portador em juízo. Assim, embora não seja esta a regra geral, não é raro que alguns membros do Ministério Público, tomados de excessivo zelo, litiguem em juízo como pseudo-defensores de uma categoria cujos verdadeiros interesses podem estar em contraste com o pedido. Para casos como esse, é que seria de grande valia reconhecer ao juiz o controle sobre a legitimação, em cada caso concreto, de modo a possibilitar a inadmissibilidade da ação coletiva, quando a “representatividade” do legitimado se demonstrasse inadequada”.

3 A LEGITIMIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA PROPOR AÇÃO CIVIL PÚBLICA

A Constituição Federal de 1988, ao instaurar o Estado Democrático de Direito com fundamento axiológico na dignidade da pessoa humana, além de assegurar uma série de direitos fundamentais, individuais e coletivos, determinou a imediata aplicabilidade destas normas25. Segundo SARLET (2007, p. 387), “o postulado da aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais pode ser compreendido como um mandato de otimização”26, e, como tal, impõe ao poder público e aos particulares o dever de reconhecer e conferir às normas definidoras de direitos fundamentais a maior eficácia e efetividade possível.

A aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais encontra fundamento na força normativa do princípio da dignidade da pessoa humana e na concepção de que os direitos fundamentais representam, em maior ou menor grau, concretizações deste, pois remetem à “idéia de proteção e desenvolvimento das pessoas, de todas as pessoas” (MIRANDA, J., apud SARLET, 2008, p. 83)27.

Desse modo, cumpre efetivar os direitos fundamentais28 assegurados pela ordem constitucional, sobretudo os direitos coletivos, os quais possuem destacada repercussão política e

25 “Art. 5º, § 1º - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.”

26 Tal orientação segue a teoria dos direitos fundamentais de ALEXY (1993, p. 86-87), para quem “os princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes. Portanto, os princípios são mandatos de otimização [...]”.

27 SARLET (2008, p. 83-88), em sua clássica obra Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais, afirma ser discutível a afirmação de que todos os direitos fundamentais em nossa ordem constitucional possuem fundamento direto, imediato e igual na dignidade da pessoa humana. Aduz o autor que apenas haveria essa vinculação direta e imediata “em se partindo de um conceito exclusivamente material de direitos fundamentais, considerando como tais unicamente os que puderem encontrar seu fundamento direto na dignidade, concepção esta que, todavia, não se harmoniza com a Constituição Federal de 1988. Daí porque considera que os direitos fundamentais constituem, com intensidade variável, explicitações da dignidade humana, o que leva ao entendimento de que “em cada direito fundamental se faz presente um conteúdo ou, pelo menos, alguma projeção da dignidade da pessoa.

28 Adota-se, para fins da presente monografia, a concepção de Ingo Wolfgang Sarlet: “Direitos fundamentais são, portanto, todas aquelas posições jurídicas concernentes às pessoas, que, do ponto de vista do direito constitucional positivo, foram, por seu conteúdo e importância (fundamentalidade em sentido material), integradas ao texto da Constituição (fundamentalidade formal), bem como as que, por seu conteúdo e significados, possam lhe ser equiparados, agregando-se à Constituição material, tendo, ou não, assento na Constituição formal” (SARLET, 2007, p. 91).

social. A Constituição, nos atuais parâmetros, não pode ser considerada mera declaração de direitos, na medida em que suas disposições possuem força normativa, vinculante e obrigatória.

Em verdade, a intensa conflituosidade que envolve os direitos coletivos em sentido lato - mormente em razão das tensões existentes no modelo capitalista, pautado pela busca desenfreada pelo lucro e caracterizado pela estrutural desigualdade socioeconômica -, assim como a necessidade de proteger os direitos fundamentais de coletividades protegidas a nível constitucional, tais como os povos indígenas, quilombolas, crianças, mulheres e idosos, impõem uma reformulação na ciência do direito, centrada na preocupação com o bem-estar social e efetividade dos direitos fundamentais coletivos.

Avulta, pois, a importância do direito de acesso à justiça, o qual, em seus diversos enfoques, garante não somente o direito de acionar o Poder Judiciário, mas o acesso a uma ordem jurídica justa que assegure a todos os meios adequados à efetivação dos direitos previstos no ordenamento jurídico. Assim, o direito processual coletivo surgiu da premente necessidade de oferecer uma tutela jurisdicional adequada aos direitos coletivos, rompendo com a tradição individualista e privatística do processo, conforme já exposto.

Nesse contexto, a legitimidade da Defensoria para propor ação civil pública, na defesa de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, representa um importante passo para a efetivação do direito de acesso à justiça e, conseqüentemente, dos diversos direitos fundamentais coletivos assegurados pela ordem constitucional.