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A responsabilidade (indireta) dos/das magistrados/as

PARTE III- ANÁLISE CRÍTICA DE MAGISTRADOS/DAS ACERCA DA (NOVA)

CAPÍTULO 5. A (NOVA) LEI TUTELAR EDUCATIVA: ANÁLISE CRÍTICA DE MAGISTRADOS

2. Dimensão Estratégica

2.1 A responsabilidade (indireta) dos/das magistrados/as

Num nível estratégico, impõe-se suscitar a análise crítica dos magistrados, em relação à primeira alteração à Lei Tutelar educativa através da Lei n.º 4/2015 de 15/01, que mudanças essenciais foram introduzidas na LTE e que mudanças essenciais ficaram por se concretizar ao nível estratégico. Neste sentido, exploramos inicialmente se o magistrado entende que tem responsabilidade para a concretização da melhoria da resposta formal ao fenómeno da delinquência juvenil. Observamos nos discursos a designação de responsabilidade indireta:

“Os magistrados diretamente não têm responsabilidade, os magistrados são aplicadores e não são os criadores da lei. As leis são aprovadas e criadas na Assembleia da República. Nós somos aplicadores, do que é aprovado em sede do parlamento. Mas, a discussão à volta daquilo que está legislado pode fazer com que os vários intervenientes e sua audição dos próprios aplicadores (magistrados)...podem ser obtidos pareceres da Procuradoria-Geral da República, do Supremo da Magistratura...quando há uma proposta de lei, os conselhos são ouvidos e aí os magistrados podem dizer quais as dificuldades que sentem, podem ter alguma palavra a dizer mas de uma forma indireta. Também nos fóruns, congressos, encontros as questões podem ser debatidas e ser levado à consideração da Procuradoria-Geral do Ministério Público... Tem sido dada voz aos magistrados, cada vez que há um projeto de lei, são ouvidos os Conselhos Superior do Ministério Público e da Magistratura Judicial, são pedidas aos magistrados que estão na área que se pronunciam sobre os projetos e isso aconteceu com as leis no âmbito de família e menores.” (E4- Procuradora da República, 10 anos de experiência TFM).

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“Tem tido e para já devem ter, nós somos os principais interessados. Tem tido porque quando nós pensamos em referências a nível da intervenção tutelar educativa, logo à cabeça vem um conjunto de pessoas que são magistrados, pelo trabalho que desenvolveram. Tem a ver com a necessidade que todos sentem quando passam por esta atividade e se prolonga mesmo depois de estarem a exercer em outras áreas. Está área (jurisdição de família e menores) é uma área que nos apaixona e nos vai mantendo atentos e críticos, eu consigo ver isso em colegas já deixaram de exercer esta atividade em termos profissionais alguns anos, fica a preocupação e o gosto pela evolução e de as coisas que vão sendo tratadas.” (E6 - Juiz de Direito, 9 anos de experiência em TFM –

Comarca de Lisboa).

Enquanto atores no sistema tutelar educativo, os magistrados enquanto aplicadores da legislação que regula o fenómeno da delinquência juvenil em Portugal, sentem qua a sua responsabilidade é indireta. Na discussão da alteração legislativa, os conselhos de mudança, sempre que solicitados, são ouvidos e debatidos para a redação de alteração legislativa que se prepara.

Indiretamente, os magistrados são intervenientes na mudança legislativa, sendo “ouvidos” (E4) por o Conselho Superior de Magistratura, e a Procuradoria – Geral do Ministério Público, órgãos que os representam profissionalmente. Num âmbito menos informal, segundo (E6) existem um conjunto de magistrados, considerados como referências a nível da intervenção tutelar educativa que desenvolvem trabalho e promovem a discussão em redor das questões que preocupam no âmbito do tratamento da delinquência juvenil em Portugal. Neste sentido, alguns dos nossos sujeitos de pesquisa, visível no discurso de (E4), também as discussões em fóruns, congressos, encontros são formas de debater as questões fazendo com que estas sejam consideradas pelos Conselhos Superiores de Magistratura e Ministério Público. Mais uma vez, a entidade do Centro de Estudos Judiciários segundo (E5) é considerada na discussão por desenvolver um papel importante no evoluir da legislação de justiça juvenil através dos seus docentes/magistrados/as:

“Os magistrados são as pessoas que trabalham no terreno com os casos e que lhes tem que aplicar a Lei que existe é evidente que, cabe aos magistrados o papel de junto das

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instâncias devidas e competentes fazer, pugnar pela alteração ou pela inovação do que não está a correr bem ou precisa de ajustes. Parece-me que a Lei é boa, penso é que há ajustes que podem ser feitos e aí o papel dos magistrados é essencial nem sempre aquele acontece, infelizmente os magistrados por tendência limitam-se ao processo, ao caso e ao tribunal e também o tempo não lhes resta para mais para outras intervenções. O CEJ nessa matéria tem conseguido que os seus magistrados e docentes e os seus convidados tenham tido um papel muito importante, julgo eu, neste evoluir da nossa legislação de delinquência juvenil.” (E5- Procuradora da República, 7 anos de experiência em

TFM- Comarca de Lisboa Oeste).

Apesar de a sua responsabilidade ser classificada como indireta, os magistrados entendem que enquanto aplicadores da lei, e atores no sistema tutelar educativo, observam as falhas na aplicação da lei sendo os mais “habilitados”, considerando que devem ser consultados (E2) e assumir “um papel assíduo nas mudanças” (E8).

“Responsabilidade sim. Quando nos consultam, temos influência na mudança da Lei. São os que estão mais perto e habilitados a perceber dessa eficácia do sistema, devendo ser consultados.” (E2- Juíza de Direito, 8 anos de experiência em TFM – Comarca de Lisboa

Norte).

“Os magistrados como aplicadores da lei, deveriam assumir um papel assíduo nas mudanças políticas para tratar deste tipo de fenómenos. Um magistrado consegue ao longo do processo visualizar as causas da manifestação daqueles comportamentos qualificados como crime, consegue perceber que a família falhou, que a escola falhou, que a comunidade influenciou e que os jovens apresentam alguns fatores individuais tais como problemas de saúde mental, incapacidade de controlo….Depois conseguimos perceber o que falha na aplicação da lei. A nossa responsabilidade tem sido indireta, visto que não somos nós que produzimos a lei, as políticas…” (E8, Procurador da

República, 10 anos de experiência em TFM – Comarca de Lisboa Oeste).

Assumindo uma responsabilidade indireta na mudança das políticas na legislação que regula o fenómeno, os mesmos assumem a necessidade de terem uma influência assídua na mudança da Lei, concretizam que ao longo do desenrolar do processo tutelar educativo, enquanto aplicadores da lei para além das falhas que surgem na sua

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aplicação, são capazes de visualizar os problemas por detrás da manifestação dos comportamentos delituosos nos jovens. Isto sugere, a importância da sua participação na(s) mudança(s) política(s) legislativa(s) que regulam o fenómeno, por observarem as diversas falhas numa visão sistémica, que desencadeiam a prática de factos qualificados pela lei como crime e que avançam com os jovens para o contacto com o sistema de justiça juvenil em Portugal.