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4. A FORMAÇÃO TERRITORIAL DE ITABATÃ: do povoado rural ao distrito urbano

4.1. A GÊNESE DE ITABATÃ (MEADOS DE 1960 A 1972)

4.1.1. A rodovia BR-101, elemento embrionário de Itabatã

A rodovia federal BR-101, denominada oficialmente de Rodovia Governador Mário Covas, teve sua construção iniciada na década de 1950, sendo realizada pelo Exército Brasileiro. Assim como muitas estradas pelo Brasil, levanta-se a hipótese de que esse importante eixo rodoviário tenha sido originado a partir de rotas indígenas, criadas antes mesmo da chegada dos portugueses. Nessa perspectiva, autores como Sérgio

Buarque de Holanda (1994) e Gloria Kok (2009) afirmam que, os “caminhos de terra” e “os caminhos de mar” já existiam no período colonial e imperial do Brasil (BOTECHIA, 2017, p. 10). Em vista disso, acredita-se que os portugueses podem ter usufruído de alguns dos caminhos previamente criados pelos povos nativos, para, assim, interligarem as províncias. Principalmente no contexto do Extremo Sul da Bahia, território que historicamente apresentou dificuldades à abertura de estradas pelos colonizadores, conforme dissertado no capítulo anterior.

No período imperial, há referências à chamada “Estrada Geral da Costa”, tanto em cartografias da época quanto nos Relatórios de Presidentes da Província, mas não há registros de quando a estrada foi construída (BOTECHIA, 2017). É provável que trechos da rodovia BR-101 tenham sido originados a partir dessa estrada interprovincial. Esta seguia junto à costa marítima, ou em suas proximidades, conectando as Capitanias do Rio de Janeiro à Bahia, conforme relatado pelo Governador Francisco Alves Rubim (1812-1819). O Governador também informa a respeito das distâncias entre as povoações ao norte da Capitania do Espírito Santo, e a Capitania da Bahia:

Da povoação de Linhares à barra do Rio Doce, na margem do Norte, tem 8 legoas; 1 legoa acima se acha estabelecido com lavouras, e gado Antônio José Martins, homem branco, casado, com uma família de 16 pessoas: da casa d´este segue pela costa do mar a estrada geral d´esta Capitania para a Bahia [...] (Rubim, 1840/2003, p. 17) .

A rodovia BR-101 se inicia no Rio Grande do Norte, chegando até o Rio Grande do Sul, paralela a quase todo o litoral leste do país (Figura 52). A rota da atual estrada conecta diversas regiões brasileiras, como ocorre no trecho de Itabatã, passagem da região Nordeste à Sudeste. Logo, o distrito de Itabatã está inserido no trecho Rio- Salvador, que começou a ser construído ainda na década de 1950, e finalizado ao final da década de 1960, quando o Brasil já estava sob o regime ditatorial. Nesse período, haviam chegado no Extremo Sul da Bahia as grandes madeireiras, com técnicas modernizadas para a extração de madeira em maior escala. Ao mesmo tempo, desenvolvia-se a atividade pecuária, iniciando o processo de concentração fundiária na região.

Figura 52 - Mapa de extensão da rodovia federal BR-101

Fonte: SOARES et al., 2018, p. 194.

Para recompor a narrativa histórica da formação territorial de Itabatã, relacionada à construção da rodovia BR-101, foi necessário também resgatar legislações e dados históricos do IBGE sobre municípios vizinhos, como Pedro Canário (ES) e Posto da Mata (BA). Dessa maneira, constatou-se que a empreiteira encarregada de construir o trecho São Mateus-ES/Mucuri-BA chegou ao povoado de Pedro Canário em 1957. Nessa época, Pedro Canário era referência, e ponto de parada, para caminhoneiros e viajantes a caminho de Nanuque (MG). O trecho de São Mateus até o início do município de Mucuri foi concluído em 1962. Por isso, estima-se que a construção do trecho seguinte, onde se insere o atual distrito de Itabatã, tenha ocorrido próximo a essa data, ou seja, em meados da década de 1960. A respeito da construção da rodovia federal, tem-se o seguinte relato:

Em 1967 começaram a fazer a terraplenagem [...] e também logo a primeira ponte do Rio Mucuri. Primeiro construiu uma de madeira, (que teve) a duração de 20 anos; pra poder também construir a outra (ponte), pra navegar né [...] E aí, surgiu a notícia de que ia fazer uns comércios aqui, em Itabatã (NASCIMENTO, Entrevista, 2018).

Nesse relato, declara-se que havia uma modesta ponte de madeira sobre o Rio Mucuri, entretanto, sua altura dificultava as navegações. Sendo assim, foi necessário construir uma segunda ponte sobre o Rio Mucuri, de estrutura mais elevada, que atualmente integra a rodovia BR-101. Ambas pontes são exibidas na fotografia da Figura 53, a antiga em madeira (à esquerda), e a mais recente em concreto (à direita).

Figura 53 - Fotografia da antiga ponte de madeira sobre o Rio Mucuri, início da década de 1970

Fonte: Wesley Lima (morador entrevistado).

Antes da construção da rodovia BR-101, os moradores contam que havia uma estrada de chão, e o acesso de automóveis à localidade onde surgiria Itabatã era custoso, pois não havia ao menos um ponto de ônibus intermunicipal. Em razão disso, as pessoas precisavam ir a outras localidades como Posto da Mata (BA), ou Pedro Canário (ES), para pegar o transporte intermunicipal.

Sendo uma obra de grande impacto, mesmo nesse momento inicial de abertura da rodovia, em meados de 1960, são evidentes as transformações na paisagem da região. Para a construção da BR-101, as empreiteiras contratavam muitos trabalhadores, que permaneciam por um tempo nas localidades dos trechos em

construção. Essa permanência, mesmo que temporária, provavelmente teria alterado a dinâmica do local, antes praticamente isolado. Nesse período, segundo relatos do Frei Ronaldo Zwinkels: “[...] o local transformou-se num pátio de máquinas, e a concentração de trabalhadores da importante estrada fazia com que o povoado aumentasse para um total de aproximadamente 1.000 habitantes” (CARVALHO e COELHO, 2011, p. 20). É importante informar que, em 1950 a sede de Mucuri, principal aglomeração urbana, tinha apenas 402 habitantes (SEI, 2012, p. 57). Esse dado deixa evidente a dimensão do impacto produzido com a chegada de cerca de 1.000 trabalhadores, provocando outra dinâmica nos povoados e localidades ao longo da rodovia em construção.