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países desenvolvidos entraram num processo de modernização, mudança e reforma administrativa (Kettl, 2000). Este esforço para melhorar a máquina administrativa e o serviço público em todos os seus aspectos (qualidade, custos, eficiência, eficácia, melhor cidadania, adequação ás necessidades de mercado) continua, ainda hoje, inserido na agenda política. De todas estas mudanças, surge o conceito de Nova Gestão Pública (New Public Management) identificando um paradigma emergente da Administração Pública. Os impactos deste processo de reforma foram sentidos a diferentes níveis e nas mais variadas dimensões de análise da Administração Pública. Neste caso destacamos sobretudo as consequências que advieram no campo das configurações organizacionais. Assim, como resultado da reforma administrativa, muitos dos serviços públicos foram autonomizados, privatizados ou viram mudados os seus modelos de gestão em prol de uma maior flexibilidade organizacional e de uma melhor especialização de competências (Fimreite & Lægreid, 2005; Rocha, 2001). Basicamente, o serviço

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público passou a ser feito através da acção conjunta de vários agentes, quer através do mecanismo de contratação ao mercado10, quer através da concessão a novas entidades

(semi) públicas. Como tal, o conceito de coordenação evoluiu de uma noção de princípio organizacional, cuja responsabilidade ficaria a cargo de uma organização isolada, para uma dimensão muito mais abrangente. Essa dimensão expressa-se na necessidade de agilizar a acção de várias entidades, que obriga as organizações a ter uma percepção das suas acções como parte de um todo, ou seja, uma noção de coordenação inter-organizacional (Metcalfe, 1994).

A Nova Gestão Pública (NGP) como modelo de gestão é difícil de ser correctamente definida. A própria comunidade académica está bastante dividida em considerar ou não a NGP como uma verdadeira teoria de gestão pública (McLaughlin, 2002). Esta denominação serve sobretudo para identificar os esforços levados a cabo nas últimas décadas do século XX para modernizar e reformar o modelo de gestão pública. Para Hood (1991) e Lane (2000) trata-se de um movimento internacional de reforma administrativa, baseado na insatisfação com o modelo de gestão adoptado pelo Welfare

State e nas crescentes cargas fiscais sobre os cidadãos (Rocha, 2000). Pretende-se tornar a gestão pública mais eficiente e mais adequada à era da informação; enfim, passá-la para um paradigma pós-burocrático (Gray & Jenkins, 1995). Assim, a NGP pode ser definida como sendo um conjunto de práticas gestionárias ligadas à introdução de mecanismos de mercado e à adopção de ferramentas de gestão privada na Administração Pública (Osborne & Gaebler, 1992; Pollitt, 1990). Promove-se a competição entre fornecedores de bens e serviços públicos na expectativa da melhoria do serviço para o cidadão (ao nível da qualidade), ao mesmo tempo que se tentam reduzir os custos de produção (Hartley, Butler, & Benington, 2002).

Hood (1991) apresenta-nos diferentes dimensões de análise que sintetizam e caracterizam as mudanças da NGP bem como mudanças paradigmáticas ao nível da gestão pública. Nota-se uma preocupação pelo controlo financeiro, nomeadamente na redução dos gastos; na profissionalização e descentralização da gestão pública; na introdução de novas ferramentas de gestão (reformular e flexibilizar a contratação de

10 A concorrência de mercado já era utilizada como mecanismo de coordenação há muito tempo. No

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pessoal, o processo de aquisição de bens e serviços e o sistema orçamental); no controlo e avaliação da gestão pelos resultados em detrimento dos processos.

Tabela 10 - Componentes da Nova Gestão Pública

Doutrina Significado Justificação

1 . Gestão Profissional O gestor público com liberdade para gerir.

A responsabilização implica gestores bem identificados

2 . Medidas de Desempenho Definição de objectivos e indicadores de desempenho.

Responsabilidade e eficiência

3 . Controlo de Resultados Despesas e recompensas ligados ao desempenho.

Ênfase nos resultados e não nos processos

4 . Fragmentação das Unidades Públicas

Criação de unidades mais flexíveis e descentralizadas. Ganhos de eficiência, proliferação do "Contracting out" 5 . Competição no Sector Público

Liberalização do mercado e uso de contratos.

Competição faz baixar custos

6 . Instrumentos de Gestão Privada

Liberdade de contratação e do sistema de punição e

recompensas

Melhor gestão e aproveitamento das oportunidades do mercado.

7 . Disciplina na Gestão Corte nos custos;

aumento de produtividade.

Necessidade de "fazer mais com menos".

Fonte: Adaptado de Hood 1991

A introdução da NGP protagoniza a descentralização do poder decisório pelas unidades públicas, transferindo o poder para os gestores de cada unidade administrativa e cessando as relações de dependência hierárquica entre os diversos níveis da Administração Pública. O controlo burocrático cede o seu lugar a novos sistemas de auditorias (Hood, James, Jones, Scott, & Travers, 1998). Reestruturam-se os processos e lógicas de funcionamento, redefinindo-se os objectivos estratégicos em prol de uma maior preocupação pela satisfação dos seus clientes e promotores (Denhardt & Denhardt, 2000). A NGP produz também alterações ao nível dos processos de financiamento, de orçamentação, da transparência e responsabilização dos actos da Administração Publica. Incentiva ainda o estabelecimento de parcerias com outras entidades, promovendo a combinação de competências entre agentes (Mathiasen, 2005).

1.3.1. ALTERAÇÕES NAS CONFIGURAÇÕES ORGANIZACIONAIS

Das várias implicações da Nova Gestão Pública, não menosprezando todas as outras, interessa para a nossa análise, destacar aquelas com maior impacto nas configurações

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organizacionais da Administração Pública, quer através da mudança de estruturas quer através da introdução de novos actores envolvidos.

As tendências reformadoras da NGP apontam para o facto das pesadas organizações burocráticas, geridas como sistemas mecanicistas, terem dificuldades em se adaptar a ambientes instáveis, em proceder à redefinição da sua estratégia e em adequar quer o processo de gestão quer as suas estruturas organizacionais (Bilhim, 2000). São criadas à partida para a prossecução de um determinado objectivo e são apetrechadas com meios físicos e humanos para lhe dar resposta. O problema põe-se quando é necessário modificar os objectivos ou quando há alterações no ambiente externo. A introdução de novas tecnologias, ou o surgimento de novos segmentos de mercado, podem provocar uma necessidade de alteração estratégica a que o modelo de gestão anterior não conseguiu dar resposta. Perante este cenário, em termos organizacionais, a Administração Pública enveredou por duas estratégias alternativas mas também, por vezes, complementares.

A primeira, conhecida como Escola Gestionária, advoga a necessidade de maior autonomia, maior liberdade e maior responsabilidade para o gestor público (Rocha, 2000; 2001). Em vez de condenar o modelo de gestão, pretende reabilitá-lo graças à aproximação às práticas de gestão privada (Pollitt, 1990). Assenta no pressuposto que as estruturas administrativas deixem de ser organizações multi-objectivo, com um vasto campo de acção, sendo reorganizadas em agências com um core business perfeitamente identificado. Desta autonomização espera-se proporcionar ao gestor maior capacidade de controlo sobre a sua organização, maior flexibilidade e capacidade de adaptação/reacção aos desafios do meio externo. Concentrando-se nas actividades nucleares e definindo-se indicadores de desempenho por actividade, os objectivos tornam-se mais fáceis de identificar e prosseguir. É também mais fácil verificar de onde provêm os desvios, o que permite redefinir e adoptar um plano de acção de maneira a corrigi-los (Pollitt, 1990; Osborne & Gaebler, 1992). Trata-se então de uma estratégia de fragmentação através de mecanismos de especialização vertical e horizontal (Pollitt & Bouckaert, 2000; Christensen & Lægreid, 2007).

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Tabela 11 - Comparação entre as agências do NGP e as tradicionais estruturas burocráticas

Estruturas Tradicionais Agências Competitivas Ênfase no cumprimento das normas Ênfase na eficiência Actuam num ambiente

de monopólio

Actuam num mercado de livre concorrência

Estrutura hierárquica Sistema orgânico – virado para o cliente

Ênfase na estabilidade e previsibilidade

Ênfase na adaptação e na inovação Competição muito limitada

entre agências

Competição entre agentes públicos e privados Ênfase na política Ênfase na produção de

bens e serviços públicos Fonte: Adaptado de Rehfuss 1991

A segunda, a Public Choice, assumindo uma posição severa perante a burocracia administrativa, considera-a como um elemento que deturpa e modifica esta vontade popular, perpetuando regulamentos, organizações e monopólios públicos obsoletos. A fragmentação das unidades públicas produtoras de serviços públicos é condição para a existência da competição que, segundo esta corrente académica, é o modo mais adequado para promover eficiência e satisfação dos cidadãos (Ostrom & Ostrom, 1971). Assenta na ideia que as soluções de mercado produzem soluções mais eficazes, já que se consegue a maximização da escolha e das liberdades do cidadão, a eliminação da ineficiência, a coordenação mais eficaz dos serviços e do trabalho, o que proporciona condições favoráveis ao florescimento da iniciativa privada (Hood, 1994; Kettl, 2000; Williamson & Winter, 1993; Ferris & Graddy, 1997). A produção directa do Estado é vista como um mecanismo que encoraja a criação de monopólios, suprimindo a iniciativa privada e criando inclusive áreas de mercado reservadas ao sector público. Limita assim as escolhas dos cidadãos e não submete as organizações públicas à concorrência, o que elimina o mecanismo que poderia evitar a produção em excesso de serviços que, por vezes, não são necessários.

Portanto, como já analisamos, a coordenação formal através de um mecanismo de governação hierarquizado implica que haja um nível elevado de formalização e está associado à autoridade e dominação do vértice estratégico sobre os restantes elementos da organização. Assenta na distribuição de responsabilidades e no estabelecimento de

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linhas directas de controlo. Ora, a NGP implica outros mecanismos de governação. A governação através do mercado que se baseia na competição natural entre os agentes, onde o interesse próprio conduz à coordenação de esforços e a afectação eficiente dos recursos (Bradach & Eccles, 1991). E a governação pela criação de parcerias entre os actores que está assente na contínua interacção entre os diferentes agentes protagonistas do serviço público, fomentando a criação de sistemas de informação e de tomada de decisão integrada.