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A saída legal para a representação parlamentar de um “partido clandestino”: O

CAPÍTULO 1. O BRASIL DO FINAL DO SÉCULO XIX E INÍCIO DO XX: O

1.6. A clandestinidade do Partido e seus problemas

1.6.1 A saída legal para a representação parlamentar de um “partido clandestino”: O

Em 1927, aproveitando os poucos meses de legalidade vivida pelo PCB, como apontado no item anterior, e em função das deliberações de seu II Congresso, os esforços partidários são concentrados na criação de uma “...frente única eleitoral que desse unidade à classe operária, frente baseada num programa também unitário” (SEGATTO, 1989, p. 31).

Foi de fundamental importância a utilização de jornal diário e legal da capital federal, chamado A Nação, como órgão a serviço do Bloco Operário e, portanto, também de divulgação dos comunistas. Na edição de 05 de janeiro de 1927, este jornal publica “Carta aberta” da Comissão Central Executiva do PCB, conclamação à formação do Bloco

Operário, bem como daquilo que deveriam ser as propostas desta frente política. O último número deste jornal é de 11 de agosto do mesmo ano, sendo logo após fechado pelo governo.

Nas eleições federais de 24 de fevereiro de 1927, o Bloco Operário elege deputado pelo Rio de Janeiro, então capital da república e maior centro urbano do país, o aliado do PCB João Batista de Azevedo Lima.

Novamente na ilegalidade desde agosto de 1927, mas aproveitando-se dos benefícios da curta democracia vivida, o partido, na avaliação contida na obra “Breve História do PCB”, conhecia a seguinte condição:

Em 1928, o PCB já era um partido com uma estrutura interna razoavelmente consolidada, com uma certa influência no movimento operário e reconhecido ao nível internacional. De alguns poucos militantes quando de sua fundação, contava, em 1928, com aproximadamente 1.200 membros. Nesse período de formação (1922-28), o PCB, apesar das dificuldades políticas, teóricas e ideológicas, tornou-se um partido atuante, vivo, capaz de intervir de forma ativa em, praticamente, todos os níveis e de elaborar uma linha política nacional- popular (SEGATTO, 1989, p. 33).

Na avaliação de diversos estudiosos do tema, Azevedo Lima exerce o mandato em consonância com as expectativas do PCB, atuando firmemente na defesa das causas populares e da democracia. Luta em vão pela não aprovação da lei Celerada, denuncia as perseguições movidas pelo estado brasileiro contra o movimento social em geral e aos comunistas em particular, tenta até o estabelecimento de relações diplomáticas do Brasil com o jovem estado soviético.

Em 1928, buscando ampliar o alcance da fachada legal do PCB, e também sob influência da política aprovada no VI Congresso Mundial da Internacional Comunista (IC), o Bloco Operário é transformado em Bloco Operário e Camponês, o BOC. Michel Zaidan Filho nos informa sobre o BOC:

Sob a nova denominação (Bloco Operário e Camponês), foram assim fundadas seções nas mais importantes cidades brasileiras: São Paulo, Niterói, Petrópolis, Santos, Recife, Juiz de Fora, Ribeirão Preto. Apesar das intenções, o BOC não teve qualquer penetração nas zonas rurais, ficando confinado às grandes cidades (ZAIDAN FILHO, 1989, p. 55).

Ainda sobre o Bloco Operário e Camponês, e o contextualizando com o III Congresso do PCB, recorremos novamente a Zaidan Filho:

Como se percebe facilmente, o desdobramento da campanha eleitoral do Bloco Operário e Camponês, bem como seu resultado, foi uma consequência do giro sectário e voluntarista da política de alianças do PCB após o seu III Congresso. Na busca de uma “linha política marxista- leninista” e de fidelidade às diretrizes da IC, o PCB voltava as costas à sociedade brasileira, abandonando a sua política de alianças com interlocutores reais (a pequena burguesia urbana civil militar); identificando a Aliança Liberal com os interesses de uma facção da classe dominante eventualmente na oposição e manipulada pelo imperialismo americano; reduzindo o Conselho Municipal a mero instrumento de agitação e propaganda; defendendo a divisão (ou estreitamento) da frente política representada pelo BOC e vislumbrando na cena brasileira uma situação pré-revolucionária. Naturalmente, com tal posição os comunistas brasileiros caminhavam a passos largos para o isolamento (e a derrota), em consonância, aliás, com a linha de “classe contra classe” do VI Congresso da IC (ZAIDAN FILHO, 1989, p.57)

Mais uma vez evidencia-se no texto acima a inter-relação entre PCB e o movimento comunista internacional.

Figura 8. Material de Propaganda do BOC, 1928

Em função de acesso a novas informações, inacessíveis quando da elaboração do trabalho acima citado, pode-se suspeitar da afirmação de que o BOC não teria tido nenhuma presença nas zonas rurais. Em material referente apenas ao estado de São Paulo e a partir de 1930, especificamente no levantamento feito nos fichários do Departamento de Ordem Política e Social (DEOPS) da polícia paulista, constata-se que camponeses foram presos/fichados em 1930 e anos logo subsequentes. Citamos abaixo trecho do texto que acompanha o levantamento das fichas do Deops SP feito por Emiliana Andréo da Silva:

Constatamos que, nos anos de 1930, houve uma intensa movimentação camponesa em diversas regiões do Estado de São Paulo, possivelmente em decorrência da crescente atuação do Partido Comunista Brasileiro que, na ilegalidade, procurava estender sua proposta revolucionária também aos homens do campo. A adesão formal desses camponeses ao Partido Comunista pode ser constatada através das fichas apreendidas, que os identificavam não apenas como camponeses mas também como operários agrícolas ou colonos (SILVA, 2003, p. 33).

Em face destas informações a que Zaidan Filho não poderia ter acesso quando da escrita de seu trabalho, vimos a considerar que o BOC (e o PCB) deve ter tido alguma penetração nas zonas rurais, ainda que a escassez de fontes não permita precisar o tamanho disso. Se já em 1930 existiram camponeses comunistas presos e fichados, isso é indício de que, talvez até antes de 1928, existia adesão ao PCB entre o campesinato, considerando-se que uma liderança não se forma e é identificada e presa de forma tão rápida, ainda mais com os poucos recursos científico-tecnológicos disponíveis na época.

Ainda sobre o Bloco Operário e Camponês, é importante relatarmos que nas eleições municipais de 1928, o BOC elege dois vereadores (na época chamados intendentes) para a Câmara Municipal do então Distrito Federal (cidade do Rio de Janeiro), ambos do PCB, Otávio Brandão e Minervino de Oliveira Neto, ambos veteranos militantes e o primeiro, também teórico e dirigente desta agremiação partidária.

Na Figura 9 reproduzimos cartaz utilizado na campanha dos dois eleitos do BOC no Rio de Janeiro.

Figura 9. Lançamento do Bloco Operário e Camponês (BOC)

Fonte: <http://pcb.org.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=5437:ha-85-anos- 01021928-o-pcb-lancava-o-bloco-operario-e-campones-boc&catid=56:memoria>. Acesso em 12 nov. 2014.

Ano: 1928.

Material de propaganda dos candidatos comunistas eleitos pelo Bloco Operário e Camponês.

O crescimento do BOC, ainda que limitado pelo aumento do autoritarismo da sociedade brasileira, dialeticamente, ao mesmo tempo em que era fruto de enormes esforços do PCB, era também um problema, como Nélson Werneck Sodré demonstrou:

A prática, em 1928, colocaria em evidência o problema do BOC: constituído em fase legal do Partido, assumiu o BOC, pouco a pouco, o papel que cabia ao Partido. Mas não era o Partido, nem a forma de luta eleitoral era a única, nem a predominante no Partido. A vitória nas eleições de outubro de 1928, quando o BOC conquistou duas cadeiras no Conselho Municipal do então Distrito Federal, contribuiu para agravar a confusão nesse sentido.... Surgiram dúvidas: elementos pequeno-burgueses exerceriam no BOC, mais influência do que o PCB (SODRÉ, 1984, p. 69- 70).

Corroborando com a análise acima exposta, temos o escrito pelo fundador e na época, principal dirigente do PCB, Astrojildo Pereira:

Muitos perigos, que rondavam o BOC desde o início, acentuaram-se com o correr do tempo, e entre eles o “eleitoralismo”, campo aberto à proliferação de oportunistas e carreiristas da pior espécie. Na discussão interna que se travou no Partido, em 1928, uma das questões mais acesamente debatidas foi a do BOC e erros consequentes cometidos na política eleitoral do Partido. Outro perigo, mais grave ainda, consistia numa certa tendência a não só esconder o Partido por trás do BOC mas também fazer o Partido dissolver-se em suas fileiras (PEREIRA, 1976, p. 125).

Nesta época ocorrem outros fatos de grande relevância, inclusive para a vida do PCB, como os contatos feitos em 1927, na Bolívia e em 1929, na Argentina, pelos dirigentes dos comunistas brasileiros com Luís Carlos, fato este que ainda será abordado de forma mais extensa neste trabalho.