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4 AS ORGANIZAÇÕES: CARACTERÍSTICAS E AÇÕES AMBIENTAIS

4.2 A SAMARCO

Com suas operações iniciadas em 1977, a Samarco Mineração S. A., uma empresa que tem hoje a sua composição acionária dividida ao meio pela CVRD brasileira e pela BHPBILLITON australiana, é a segunda maior exportadora transoceânica de pelotas de minério de ferro do mundo. Seu processo total é composto de mina, beneficiamento, transporte através de mineroduto, pelotização, operações portuárias e geração de energia.

A lavra e o beneficiamento desse minério fino se desenvolvem na chamada Unidade de Germano, nos municípios de Mariana e Ouro Preto, no Estado de Minas Gerais. Após isso, a mistura de 70% de minério concentrado e 30% de água é bombeada a uma velocidade de 6 km/h através do mineroduto de 396 km até a unidade de Ponta Ubu, no município de Anchieta, onde se localizam a Usina de Pelotização e o Porto.

Como os processos industriais da Samarco são intensivos na utilização de energia, a empresa foi autorizada pelo Departamento Nacional de Água e Energia Elétrica – DNAEE a construir duas usinas hidrelétricas, uma delas no rio Piracicaba, em Minas Gerais, e outra no rio Pardo, no Município de Muniz Freire, no Espírito Santo.

A história da organização pode ser contada em seus fatos principais da seguinte forma: em 1971, a S.A. Mineração Trindade (Samitri) e a Marcona Corporation iniciaram conversações para explorarem juntas o minério itabirítico, com baixo teor de ferro e que era, até então, rejeitado. A Samitri era detentora de grandes jazidas

desse minério, e a Marcona detinha a tecnologia para sua pelotização. Dessas conversas, em 1973, foi criada a SAMARCO MINERAÇÃO S.A. Em fevereiro de 1977, o terminal portuário e o mineroduto foram concluídos, e em maio, esse último entrou em operação, após a conclusão da usina de Germano, em Minas Gerais. Em junho, a usina de pelotização de Ubu começou a produzir, e o primeiro embarque ocorreu em agosto. O então presidente Ernesto Geisel inaugurou o complexo industrial-portuário em setembro8.

A australiana BHP tornou-se acionista da Samarco em 1984, com 49% das cotas. Em 1990, foi criada a Comissão Interna de Meio Ambiente (CIMA), e em 1993, foi atingida a marca de 100 milhões de toneladas de minério de ferro produzidas, vendidas e embarcadas. Nesse mesmo ano começaram os primeiros cursos de educação ambiental nas unidades e nas comunidades. Já em 1977, foram inauguradas a segunda usina de pelotização em Ubu e as usinas hidrelétricas de Muniz Freire e Guilman-Amorim. Em 1998, com a implantação do Sistema de Gestão Ambiental, a Samarco obteve a certificação ISO 14001 para todas as etapas de seu processo produtivo, da mina ao porto. Em 1999, o programa Portas Abertas possibilitou a visitação da companhia pelo público em geral. Em 2002, quando a Samarco completou 25 anos, a Samitri foi comprada pela Cia. Vale do Rio Doce, que passou a dividir o controle acionário com a BHPBilliton.

Na unidade de Ubu, alvo da pesquisa, trabalham cerca de 550 empregados da Samarco e 350 de contratadas permanentes, empresas que prestam serviços à Samarco com contrato por tempo indeterminado, possuindo inclusive escritório dentro da área da empresa. Além desses, há um número de aproximadamente 150 a 200 funcionários de empresas com contratos eventuais, totalizando pouco mais de 1.000 funcionários.

A empresa projeta a produção de 12 milhões de toneladas de pelotas para o ano de 2002, num crescimento de 27.7% em relação à produção de 9,4 milhões de toneladas de 2001. Além disso, produzirá mais três milhões de toneladas de finos. O mercado da Samarco, em 2001, foi distribuído entre China (30%), Europa (25%), África e Oriente Médio (22%), Ásia (15%) e Américas (8%).

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A Samarco é ”benchmark em gestão de clima organizacional”, com destaques nos

rankings elaborados por consultorias como a Hay do Brasil, sobressaindo-se

também na lista anual da revista Exame das melhores empresas para se trabalhar no Brasil, além de ter sido relacionada por pesquisa da revista Carta Capital entre as empresas mais admiradas do setor mineral por quatro anos consecutivos (1998 a 2001)9. A empresa é detentora de Certificações de Qualidade (ISO 9002) desde 1996, de Saúde e Segurança do Trabalho (OHSAS 18001) desde 2001 e de Gestão Ambiental (ISO 14001) para todo o seu processo “da mina ao porto” desde 1998.

O histórico da gestão ambiental na Samarco é similar ao de outras companhias do ramo de mineração. Inaugurada no final da década de 1970, quando o país vivia os efeitos de um grande desenvolvimento econômico, alguns procedimentos ambientais foram observados, como lagoas de estabilização para efluentes líquidos e sistemas de despoeiramento. Não existia uma visão sistêmica em termos de gestão ambiental. Com o amadurecimento dos órgãos ambientais, a companhia foi atuando de forma reativa às solicitações cada vez maiores das legislações.

Segundo Feitosa (2001)10, não existia uma estrutura específica que encarasse o tema ambiental, visto como um embaraço e não como uma característica inerente ao negócio. As pessoas eram indicadas para trabalhar na área mais por disponibilidade do que por competência. Mas com o passar do tempo, o relacionamento da companhia com órgãos ambientais e população se mostrou inevitável, e a decisão foi pelo caminho da proatividade, com a construção do seu SGA e a estruturação da área de meio ambiente. Depois da certificação em qualidade (ISO 9000) em 1994, a necessidade da certificação ambiental foi imediatamente identificada. O trabalho foi iniciado já com a meta de, em 1998, alcançar a certificação, apesar de ficar ressaltado que a certificação ambiental ISO 14001 não seria o objetivo principal do trabalho, mas apenas uma conseqüência desejável do sucesso da implantação do SGA. Uma das características definidas para esse SGA é que ele deveria ser construído sem a contratação de consultorias externas por tratar-se de um assunto

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De acordo com dados retirados das entrevistas.

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FEITOSA, V. M. N. Vencendo o Desafio da Mineração com Qualidade Ambiental: O Exemplo

da SAMARCO. 2001. Disponível em: <http://www.arvore.com.br/artigos/htm/0405_1.htm.> Acesso

novo e para não correr o risco de desrespeito à cultura da empresa. Outra diretriz desse trabalho era que o SGA deveria abranger todo o processo da empresa, compreendendo a mina, o mineroduto, a usina de pelotização e o porto.

A empresa escolheu três funcionários da produção e os designou para montar o sistema de gestão ambiental. Apesar de não conhecerem muito sobre o assunto, eles tinham profundo conhecimento da empresa e deveriam se dedicar integralmente à nova função. As consultorias externas serviram de suporte apenas em alguns momentos específicos, como no levantamento da legislação aplicável ao processo da empresa e no treinamento dos facilitadores, compostos por empregados de diversos níveis, em especial do operacional. A construção e implementação se deram num período de três anos, e a empresa obteve o certificado em 1998. Uma característica interessante na construção desse sistema é que além do meio ambiente externo, ele levou também em consideração o ambiente interno, incorporando a área de higiene e segurança do trabalho. O sistema de gestão ambiental da Samarco envolveu toda a estrutura gerencial da organização, passando os gerentes de linha a serem os responsáveis pelos resultados ambientais das suas áreas e a serem avaliados por esses resultados operacionais de produção, qualidade ou custo.

Na estruturação da sua área ambiental, a Samarco considerou o fato de operar no Espírito Santo e em Minas Gerais, bem como as diferentes demandas dos órgãos ambientais e comunidades desses dois estados. A ação deveria levar em consideração como meio ambiente o conjunto de aspectos naturais e sociais afetados pela ação da empresa. A elaboração de estratégias de ação corporativa preocupou-se em passar a desenvolver o caráter de proatividade e continuar a atender às demandas de órgãos ambientais e comunidades. Os trabalhos principais do grupo de pessoas do SGA eram a preparação de planos de monitoramento, a discussão de legislações, o levantamento de impactos ambientais e de seu grau de significância.

A construção dos sistemas de gestão ambiental das duas organizações teve características semelhantes. Os primeiros equipamentos, que faziam parte dos projetos iniciais, não conseguiram uma eficiência satisfatória.

Com a partida da empresa houve alguns problemas que não estavam previstos, mas aconteceram. Então houve um trabalho junto à direção da empresa no sentido de melhorar a performance, e de avançar num melhor desempenho. Um trabalho mais de controle ambiental. Os equipamentos não estavam com uma boa performance e tinha que se trabalhar neles, melhorar a engenharia, para se atingir aqueles padrões de emissões que estavam no projeto. Os primeiros anos foram nesse sentido, trabalhar nesse sentido (Especialista CST 2).

A evolução rápida do tema ambiental em várias frentes, no mercado, na sociedade e nos governos atropelou as organizações e elas se viram impelidas a um tratamento diferente dos impactos causados. As considerações sobre o que sejam impactos, como tratá-los e o que é aceitável em termos de índices fizeram parte de uma grande construção, que começou a partir do início da produção dessas empresas e continua hoje com as evoluções da legislação, das percepções da sociedade, do mercado e de todos os aspectos derivados dos temas surgidos do encontro da ação das organizações com o meio ambiente.

O grande tema que envolve esta pesquisa é esse encontro. A interface empresa/meio ambiente, catalisada pelo amadurecimento do tema ambiental, produziu a necessidade da gestão ambiental. E dentro do pensamento do desenvolvimento sustentável, essa gestão tem inúmeras responsabilidades e assume um anunciado papel de fazer o casamento entre o “necessário” desenvolvimento econômico e a preservação das características ambientais do planeta, numa preocupação com a sobrevivência.

O ponto de partida é a compreensão do que seja gestão ambiental nas organizações estudadas. As práticas de gestão ambiental nascem dos desdobramentos dessa compreensão e têm aspectos objetivos muito definidos, assim como uma série de subjetividades que as envolvem. As organizações constroem o seu SGA, a sua imagem e as suas relações com os stakeholders, partindo dessa compreensão.